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O layout de argumentação de Toulmin passou a ser considerado como um dos marcos da teoria contemporânea sobre a argumentação, com a publicação, no ano de 1958, da obra The Uses of Argument. A partir de então, este layout tem sido frequentemente utilizado como uma ferramenta metodológica, por pesquisadores de diversas áreas do conhecimento, para fazer uma análise de processos argumentativos desenvolvidos em sala de aula, com destaque para a área de ensino de Ciências (ABI- EL-MONA; ABD-EL-KHALICK, 2006; JIMÉNEZ-ALEIXANDRE et al., 2000; ERDURAN et al., 2004).

O layout de Toulmin representa uma poderosa ferramenta que pode ser utilizada para identificar e qualificar a estrutura de argumentos científicos. Este layout consegue demonstrar o papel das evidências na construção de afirmações, concatenando dados e conclusões por meio de justificativas hipotéticas, muitas das vezes. Caso os alunos possam ter contato com argumentos completos e, a partir disso, passem a prestar atenção a estas sutilezas, provavelmente poderão compreender essa imprescindível faceta do conhecimento científico (CAPECCHI; CARVALHO, 2002).

O layout proposto por Toulmin (1958) descreve um argumento a partir de seus componentes e das relações funcionais existentes entre eles. Esse layout leva em consideração o desenvolvimento das abordagens críticas e dialogais sobre o pensamento e a linguagem. Os componentes de um argumento são o dado (D), a conclusão (C), a justificativa (J), os qualificadores (Q), a contra argumentação ou refutador (R) e o conhecimento básico ou fundamentos (B). A estrutura mais complexa de um argumento, de acordo este modelo, está representada na figura 1.

Figura 1: Layout de Toulmin para análise de um argumento

Fonte: Santos (2017) adaptado de Toulmin (2006)

Os dados representam os fatos que levam a uma conclusão; as conclusões são afirmativas cujos valores necessitam ser constituídos; as justificativas são asserções gerais, de caráter hipotético, que são utilizadas como elo de ligação entre os dados e as conclusões, cujos desdobramentos permitem se levar às conclusões por meio dos dados contidos no argumento; os conhecimentos básicos ou fundamentos funcionam como suporte para as justificativas do argumento, servindo, dessa forma, para validá- las. O fundamento, assim como os dados, é de natureza factual, entretanto, os dados são eventos de caráter singular, já o fundamento apresenta um caráter mais geral; o qualificador constitui um operador que atenua e/ou reforça o status da conclusão

(VIEIRA; NASCIMENTO, 2008 apud PENHA, 2012), ou seja, uma afirmativa que possui, como característica básica, uma condição modal na composição do argumento. Ou ainda, o qualificador apresenta as condições na qual a afirmação é válida, ou seja, representam as limitações da afirmação (DRIVER; NEWTON; OSBORNE, 2000 apud PENHA, 2012), ou, ainda, podemos considerar que o qualificador é substanciado por uma situação particular que conduz a uma conclusão. Já a refutação ou contra afirmação2, em sentido oposto ao qualificador, constitui uma

condição de ressalva para o argumento. Nesse sentido, acaba sendo uma circunstância ou uma condição em que, sendo contrariada, a autoridade do fundamento acaba por invalidar a conclusão (TOULMIN, 1958; TEIXEIRA, 2010).

Teixeira (2010) ressalta que, nesse layout, a qualidade de um argumento é verificada a partir dos componentes que o constituem e da relação que há entre eles. Isso faz do modelo de argumentação de Toulmin um eficaz instrumento a ser utilizado para analisar e avaliar a qualidade de uma argumentação, fato que justifica a sua utilização, sobretudo no ensino de Ciências.

Toulmin foi um dos primeiros estudiosos da argumentação a levar em consideração o papel dos elementos que compõem um argumento e as funções que estes desempenham dentro deste argumento, promovendo dessa forma uma ruptura com o tradicional campo da lógica ao analisar as formas como as pessoas argumentam em ambientes naturais (DRIVER; NEWTON; OSBORNE, 2000; OSBORNE; ERDURAN; SIMON, 2004).

O atributo que este layout apresenta em relação à independência contextual admite que ele seja utilizado como padrão para a construção e análise do argumento nos mais diversos campos das humanidades e das ciências. Entretanto, exatamente no alcance de sua aplicabilidade, é que estão assentadas as principais críticas sobre a falta de considerações específicas pertinentes aos diversos campos nos quais esta estrutura pode ser aplicada.

Ainda que o próprio Toulmin tenha ressaltado a relevância de se analisar a campo dependência do argumento, sobretudo nas questões relacionadas às

2 Todas as vezes que nos referirmos às condições impostas pelo indivíduo para a validade de sua própria afirmação, utilizaremos o termo contra afirmação e reservaremos a utilização do termo refutação apenas quando se referir à elaboração de um argumento utilizado para indicar a discordância sobre uma afirmação concorrente (KUHN, 1991 apud PENHA, 2012, p. 99).

justificativas e conteúdos específicos pertencentes no argumento, Sampson e Clark (2008) afirmam que o padrão de argumento de Toulmin (TAP) não exibe, na sua estruturação, informação suficiente acerca destas características de campo dependência.

Driver, Newton e Osborne (2000) ressaltam também que o TAP restringe-se à análise somente em termos da estrutura do argumento e, por conta disso, indicam a necessidade de outros métodos para análise e avaliação dos conhecimentos que estão incorporados e correlacionados a este argumento. Estes autores ressaltam ainda que o layout não leva em consideração aspectos semióticos relevantes, tais como gráficos, ilustrações, a comunicação com gestos, língua de sinais, entonação vocal e os mais diversos contextos sociais nos quais esta argumentação se insere. Por conta disso, concordamos com Driver, Newton e Osborne (2000) que em nossa pesquisa somente o TAP não daria conta para avaliar a argumentação produzida pelos estudantes, sobretudo porque temos como objetivo avaliar a qualidade e os níveis de complexidade dos argumentos produzidos pelos surdos e ouvintes, respectivamente, em LIBRAS e em língua portuguesa.

Entretanto, ressaltamos que a discussão de Toulmin sobre a campo dependência é justamente para apontar a importância dos critérios de cada campo de conhecimento como fundamentos para avaliar um argumento científico dentro do próprio campo. A presença e a distinção entre os elementos justificativa e fundamento, no seu modelo, é para estabelecer quais elementos, dentro da estrutura, têm função avaliativa de um argumento. Ao fazer isso, ele não restringe seu layout aos aspectos formais (estruturais) do argumento. Entretanto, ele não propõe um instrumento para fazer esta avaliação, não é função do seu trabalho. Mas, não significa dizer que seu

layout está preocupado apenas com os aspectos formais. Quando ele discute os

argumentos substanciais ele está apontando exatamente isso.

Driver, Newton e Osborne (2000) apontaram também algumas limitações do

layout de Toulmin (1958), que devem ser levadas em consideração para a análise da

argumentação de estudantes no contexto do ensino de Ciências. A primeira delas está relacionada à falta de julgamento da precisão dos mesmos, dessa forma, em algum momento, pode ocorrer ambiguidade na interpretação de um determinado argumento. Porém, este problema pode ser minimizado a partir do momento em que se estabelecem as relações de causa entre os argumentos, no decorrer do raciocínio.

Outra limitação do TAP está relacionada à análise e interpretação das interações sociais entre os sujeitos, quando se constrói um argumento coletivamente, uma vez que este layout está restrito aos conteúdos dos argumentos (sua estrutura e seus componentes), não se concentrando, portanto, no papel das interações sociais entre os sujeitos no momento da construção dos argumentos. Além disso, este layout não leva em consideração o contexto em que os argumentos são construídos.

Ressaltamos que estas limitações apontadas por Driver, Newton e Osborne (2000) não constituem um defeito do TAP, uma vez que ele não foi construído com esta finalidade. Ele é um layout analítico do argumento, que entende argumentação do ponto de vista lógico e não dialógico, logo não teria sentido tratar das interações sociais na construção argumentativa. Entretanto, põe a necessidade de usar outro modelo para tratarmos destas interações discursivas no contexto de sala de aula, como é o caso de nossa pesquisa.

Compreendemos que esta estruturação do argumento representa algo muito complexo e refinado. Porém quando o conhecimento científico é construído levando em consideração dados empíricos (ou mesmo hipotéticos), a explicação deste conceito, bem como o seu entendimento, pode se apresentar de maneira semelhante (ainda que não siga a ordem direta do layout).

Jiménez-Aleixandre, Reigosa Castro, Álvarez-Pérez (1998), Driver e Newton (1997), Capecchi, Carvalho e Silva (2002), Villani e Nascimento (2003), Teixeira (2010), Santos (2017), dentre vários outros pesquisadores têm utilizado esse layout de Toulmin em suas pesquisas, de modo a contribuir de forma significativa para sua consolidação como um valioso instrumento de análise, a ser ajustado e adaptado às mais variadas situações de ensino de Ciências.

Pensando nas aulas de Física, sobretudo em um contexto de inclusão de surdos e ouvintes, pode ocorrer de o argumento, seja em língua portuguesa ou em LIBRAS, se completar tão-somente após várias colocações, o que pode dificultar a percepção acerca da estrutura do argumento. Ainda assim, acreditamos que os elementos propostos por Toulmin aparecerão, quer na língua portuguesa, quer na LIBRAS, permitirão uma análise da argumentação bastante precisa sobre os conteúdos a serem investigados. Por conta disso, iremos apresentar na próxima seção alguns referenciais teórico-metodológicos que podem ser utilizados para avaliar a argumentação no ensino de Ciências. A partir de então, iremos apresentar

a estrutura analítica que utilizaremos, de forma adaptada à nossa pesquisa, na análise dos argumentos, em níveis de qualidade e de complexidade, para analisar os argumentos produzidos pelos surdos e ouvintes, em LIBRAS e em língua portuguesa, respectivamente.