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4.1 AS PRÁTICAS DE ENSINO NAS TURMAS DE PLE/PEC-G DA UFPA: AS

4.1.1 O agir dos professores de PLE à luz da dimensão do trabalho

4.1.1.3 O Manual do Aplicador do Exame Celpe-Bras

O terceiro documento que nossa pesquisa revelou ser prescritivo das ações docentes dos professores das turmas PEC-G/UFPA foi o Manual do Aplicador do Exame Celpe-Bras (doravante, Manual do aplicador). A seguir, apresentamos um excerto da seção que trata das concepções teóricas que estão na base deste exame.

[09] Excerto de Documento Prescritivo (Manual do Aplicador do Exame Celpe-Bras, p. 8, 2015)

Verifica-se que este documento é bastante claro e objetivo no que diz respeito à natureza do exame Celpe-Bras. Este, de modo bastante pragmático, visa avaliar a capacidade do examinando em se valer da língua portuguesa como instrumento de ação e interação social no contexto brasileiro e, para tanto, ancora-se, pelo menos na parte escrita, na realização de tarefas como ferramenta de avaliação das habilidades de comunicação. Embora não tenhamos encontrado nenhum tipo de menção direta, neste documento, ao QECR (2001), consideramos que esse modus

operandi do Celpe-Bras tem muito em comum com a perspectiva acional que

fundamenta esse documento europeu e, muito provavelmente, é neste aspecto que reside a essência mais inovadora do referido exame.

O documento esclarece, também, o seu posicionamento com relação ao lugar da gramática no Celpe-Bras: avalia-se o uso adequado das formas gramaticais na produção dos textos (orais e escritos) e não a identificação e classificação dessas formas, tal como é bastante comum, ainda, em alguns exames de proficiência em línguas estrangeiras. Isso, incontornavelmente, conflita com a concepção tradicional de língua, dominante no manual Novo Avenida Brasil, adotado no curso.

Outra questão que consideramos bastante divergente entre esses dois documentos diz respeito ao lugar da produção escrita em todo esse processo. Observe-se o excerto seguinte:

[10] Excerto de Documento Prescritivo (Manual do Aplicador do Exame Celpe-Bras, p. 22-23, 2015)

Como se vê, não está prevista uma dissociação ou protagonismo de uma habilidade em relação a outra, no que diz respeito à avaliação deste exame. Ao contrário do que ocorre no manual de PLE adotado, que reserva a prática escrita ao caderno de exercícios, o manual do aplicador orienta que a produção escrita será avaliada de modo integrado com a compreensão oral, tendo essa habilidade, portanto, a mesma importância que tem a de produção e interação oral.

Com relação à oralidade, destacamos os seguintes excertos do manual do aplicador:

[11] Excerto de Documento Prescritivo (Manual do Aplicador do Exame Celpe-Bras, p. 30, 2015)

[12] Excerto de Documento Prescritivo (Manual do Aplicador do Exame Celpe-Bras, p. 32, 2015)

No que diz respeito à avaliação da dimensão especificamente oral do exame, ainda que o manual do aplicador destaque a consideração de questões de ordem lexical, gramatical e pronúncia, claro está que seu foco principal reside no aspecto interacional. É, pois, a capacidade comunicacional de se manter no fluxo de uma interação, bem como de garantir a progressão referencial dos temas sugeridos pelos elementos provocadores que carregam o maior peso nesta parte do exame. Uma vez mais destacamos a incompatibilidade desses parâmetros avaliativos com o tipo de trabalho que se observa no manual Novo Avenida Brasil: concentrar-se em funções comunicativas e na aprendizagem de estruturas linguísticas, embora possa ter os seus resultados positivos, não é suficiente para que um aprendente de PLE alcance a competência comunicativa requerida no exame Celpe-Bras.

Ao longo desta seção, vimos insistindo numa relação entre os três documentos que nossa pesquisa considera como prescritivos do agir dos professores das turmas PEC-G/UFPA. De modo particular, retomamos, em diversas passagens da discussão, o manual adotado no curso, o Novo Avenida Brasil, com o intuito de colocar em proeminência não apenas as incongruências existentes entre este documento, os planejamentos da coordenação e o manual do aplicador, como também as incongruências desse conjunto de documentos prescritivos do agir docente com o perfil plurilíngue e pluricultural das turmas e seus objetivos de aprendizagem.

Relembremos que o manual didático adotado é, inquestionavelmente, o documento prescritivo principal da maioria dos professores participantes de nossa pesquisa. No entanto, nem de longe pode ser considerado o mais adequado para orientar o agir desses professores. De igual modo, os planejamentos de 2013 e 2014, a nosso ver, por estarem muito atrelados ao Novo Avenida Brasil, compartilham dessa mesma ineficácia em orientar um coletivo de professores- estagiários de PLE que atuam em turmas heterogêneas do ponto de vista linguístico- cultural e que visam a uma preparação para o exame Celpe-Bras.

O planejamento de 2015, assim como o manual do aplicador parecem se configurar de modo mais favorável como um documento prescritivo para esses professores. O primeiro porque, mesmo ancorado no manual didático adotado, oferece valiosas orientações no que diz respeito ao agir docente em sala de aula, o que é muito proveitoso para professores em formação. O segundo por descrever de modo objetivo as concepções teóricas do exame Celpe-Bras e, também, os seus

requisitos de avaliação, proporcionando ao professorado informações que, sem dúvida, podem ajudar na tomada de decisões didático-metodológicas.

No entanto, é preciso destacar que nenhum dos documentos prescritivos aqui elencados dedicou explicitamente atenção à questão central sobre a qual nos debruçamos nesta investigação: o peso da diversidade das línguas-culturas dos aprendentes sobre o agir dos professores. Em se tratando do manual didático Novo Avenida Brasil e do manual do aplicador, temos consciência de que se trata de documentos que foram concebidos para fins específicos (entre o quais não se incluem o ensino e aprendizagem de PLE para grupos plurilíngues e pluriculturais) e, portanto, não se pode esperar que eles se harmonizem integralmente ao perfil desses alunos. Porém, seria importante que os planejamentos focalizassem essa referida questão, uma vez que esses documentos, por serem internos, têm a prerrogativa da flexibilidade, ou seja, admitem, na medida do possível, a adequação e/ou abertura às particularidades que permeiam contextos de aprendizagem como este de nossa pesquisa.

Apesar de nossa pesquisa ter evidenciado essa questão supramencionada, o objetivo desta seção era basicamente apresentar e problematizar os documentos prescritivos que circundam o agir dos professores de PLE investigados e, assim, poder delinear essa dimensão do trabalho docente de modo a estabelecer uma relação com as demais dimensões (o trabalho real e o trabalho representado) que abordaremos na sequência deste capítulo e que se voltam mais especificamente para como o professor age em sala de aula e seus efeitos na aprendizagem de turmas plurilíngues e pluriculturais.

Antes de concluir essa parte do capítulo, no entanto, é importante explicitar, no que diz respeito aos documentos prescritivos aqui arrolados, que o cruzamento de nossos dados revelou que entre os professores que participam de nossa pesquisa há uma tendência a considerar como orientador de suas práticas um documento em detrimento de outro. Em entrevista, os docentes P1, P2, P3 e P4 declararam que seguiam como horizonte de seu trabalho o manual didático adotado no curso. P6, por sua vez, declarou que seguia a sequência didática do manual, mas que procurava incluir em suas aulas, por conta própria, conteúdos e tarefas que fossem interessantes para os alunos. Ademais, considerava as diretrizes do exame Celpe- Bras para planejar suas aulas. Por fim, os docentes P5 e P7 declararam não utilizar o manual didático como elemento norteador de suas práticas e que preferiam

preparar suas aulas a partir daquilo que é necessário para que o aluno possa submeter-se ao exame Celpe-Bras. Nenhum dos professores declarou que o planejamento da coordenação do curso tivesse alguma influência sobre suas ações de ensino. De modo geral, a análise das práticas observadas desses professores corroboraram suas afirmações, o que nos levou a organizar o seguinte quadro:

Quadro 10

Principais documentos prescritivos dos docentes da pesquisa

A dimensão do Trabalho Prescrito

Docente Documento(s) Prescritivo(s) do Agir

P1 O Manual Didático

P2 O Manual Didático

P3 O Manual Didático

P4 O Manual Didático

P5 O Manual do aplicador

P6 O Manual Didático e o Manual do aplicador

P7 O Manual do aplicador

(Fonte: o autor, 2016)

À primeira vista, poderíamos afirmar que a análise dessa primeira dimensão já nos sinaliza o perfil das práticas dos referidos professores. No entanto, a essência da interação didática na sala de aula não reside apenas naquilo que os documentos prescritivos do trabalho docente podem sugerir. Trata-se de um processo mais complexo que envolve tanto os professores Ŕ com seus distintos e variados repertórios didáticos Ŕ quanto os alunos, com suas particularidades como pessoa e suas diferentes culturas educativas e, portanto, é necessário voltar-se, especialmente, para as ações efetivas de sala de aula. De todo modo, o que aqui se discutiu será retomado nas análises das práticas de ensino observadas que faremos, a seguir, ao tratar do trabalho real dos professores de nossa pesquisa.

4.1.2 O agir dos professores de PLE das turmas plurilíngues e pluriculturais: o