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A DINÂMICA DOS EMPREENDIMENTOS TERCIÁRIOS EM SÃO PAULO

5.3 A EXPANSÃO DO MERCADO IMOBILIÁRIO DO SETOR TERCIÁRIO EM SÃO PAULO

5.3.2 O MERCADO IMOBILIÁRIO DE ESCRITÓRIOS EM SÃO PAULO

Apesar das semelhanças do crescimento do mercado imobiliário do setor terciário de São Paulo e outras metrópoles do mundo, existem diferenças nesses processos em função das particularidades de cada local. De Magalhães (1999) chama a atenção para os diferentes contextos e fatores que levaram ao crescimento do mercado imobiliário terciário, principalmente de edifícios de escritório, em cidades de países como os Estados Unidos e o Reino Unido e na cidade de São Paulo.

Além do fator do aumento das atividades voltadas aos setores financeiros e administrativos nos países centrais, esse crescimento está relacionado com as facilidades de crédito e crescimento do mercado de capitais ocasionados pela desregulamentação econômica. Some-se a isso o fato de as cidades incentivarem através da desregulamentação do uso do solo ou de incentivos fiscais, a promoção imobiliária como política de desenvolvimento econômico (Fainstein, 1991; 1994).

1970 1980 1990 1998 0 1.000 2.000 3.000 4.000 5.000 6.000 7.000 área útil em 1.000 m2

No caso de São Paulo, além dos fatores da reorganização espacial do trabalho que de forma análoga têm beneficiado o setor financeiro-adiministrativo (Capítulo III), esse crescimento foi ocasionado pela segurança que o mercado imobiliário apresentou frente às demais aplicações financeiras num período de hiperinflação e instabilidade econômica (De Magalhães, op. cit.). Em menos de dez anos a economia brasileira passou por oito planos econômicos, com cinco moedas diferentes e inflação atingindo patamares de 3.000% ao ano (gráfico 5.3).

Gráfico 5.3: Variação percentual de índices financeiros entre 1987 e 1994. Fonte: Silva, 2000.

Mecanismos de indexação de aluguéis mantiveram a rentabilidade dos investimentos no mercado imobiliário apesar da inflação. Nesse aspecto, as taxas de retorno dos edifícios de escritório não chegavam a concorrer com outras aplicações financeiras, ou com o mercado de ações e commodities, porém representavam uma aplicação sólida, com "liquidez", num mercado volátil, hiperinflacionado e sujeito às alterações das políticas econômicas (ABRAPP, 1995, pág. 93).

No caso dos edifícios de escritórios, a crescente demanda por locação de escritórios de melhor qualidade e tecnologicamente mais adequados criou a demanda de propriedade para os investidores, individuais ou corporativos, levando à consolidação do mercado de investimento em propriedade comercial (De Magalhães, op. cit.).

1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 CBD Dólar Inflação 0% 500% 1000% 1500% 2000% 2500% 3000%

Mudanças de conceito da função do edifício na organização do trabalho ocasionaram essas modificações, pois as grandes corporações deixaram de vê-lo apenas como estrutura física de suporte, para se tornar o ambiente adequado ao desenvolvimento dos negócios e parte integrante desses (Brookfield, 1988).

Sistemas de ar-condicionado central, de automação, controle de energia, conforto e segurança predial, infra-estrutura sofisticada de telecomunicações e de processamento de dados, lajes grandes e flexíveis, cabeamento de fibra ótica, vagas de estacionamento passaram a ser requisitos básicos desses edifícios para atender melhor os seus ocupantes, principalmente essas corporações.

No caso de São Paulo, essa mentalidade ocorreu primeiramente nas corporações multinacionais, para depois se espalhar pelas outras empresas.

A instabilidade econômica contribuiu também para o desenvolvimento do mercado através da mudança de enfoque das empresas em relação à propriedade dos edifícios. Como estratégia de combate à recessão, elas adotaram a desmobilização de seu patrimônio, incluindo a venda dos prédios-sede que ocupavam, deixando de ser proprietárias para se tornarem locatárias (De Magalhães, op. cit.).

Em vez de manter uma grande quantidade de capital imobilizado no edifício, as corporações começaram a investir o capital proveniente de sua venda em aplicações financeiras e com a renda obtida pagar o aluguel dos novos imóveis ocupados.

Esse fator foi intensificado no período de estabilização promovida pelo Plano Real, pois as altas taxas de juros usadas para manter a inflação baixa continuavam a justificar a aplicação financeira das corporações-locatárias quando comparada aos aluguéis que se mantiveram estáveis no período (Rejman, 2000, anexo IV).

De acordo com a empresa de consultoria imobiliária Richard Ellis, o valor do aluguel deve ser em torno de 1% do valor de venda do prédio; sendo assim, no final de um ano gasta-se em aluguel 12% do valor do prédio. Comparando-se esse valor com a taxa média de juros anuais entre 1994 e 1998, que foi de 23,2%84, obtém-se um crédito de 11,2% do capital investido numa aplicação que rendesse no mínimo a variação da taxa de juros.

Mesmo que o imóvel antigo ocupado estivesse desvalorizado em função da idade, esses juros ainda permitiriam que essa relação chegasse até 2% (o prédio antigo valendo a metade do novo), sem que houvesse diminuição significativa do capital.

Outro fator para o qual Rejman (ibid.) chamou a atenção é o fato de que num período de desenvolvimento tecnológico muito rápido, os edifícios ficam obsoletos com facilidade. Para as empresas, então, é mais interessante serem locatárias, pois após o vencimento do contrato de aluguel de cinco anos, elas partem à procura de edifícios mais modernos e com maiores inovações tecnológicas, visto a seguir:

"Hoje eu vou alugar um escritório na marginal Pinheiros. Ele tem shaft, piso elevado, tem isso, tem aquilo. Daqui a cinco anos pode ser que esse prédio fique obsoleto e eu precise de mais tecnologia. Então, vencendo o contrato de cinco anos, "tchau... fui", vou procurar outro prédio mais moderno. Fico lá mais cinco anos, mudou a tecnologia e o prédio também já ficou obsoleto, eu vou para um terceiro. Se eu sou dono é muito mais difícil fazer isso. É por isso que hoje as empresas alugam, pois tem a possibilidade de sair e mudar. Isto tem um custo, é lógico, mas é a tecnologia que manda." (Rejman, 2000, anexo IV, pág. 309)

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Dado obtido da média das taxas médias anuais de juro reais, elaborado pelo Dieese, na análise de 5

Do ponto de vista da viabilização do empreendimento desses edifícios, o boom dos escritórios classe "A" foi ocasionado pela consolidação desse mercado através da ação dos promotores e empreendedores imobiliários junto aos investidores corporativos (De Magalhães, op. cit.; Sartori, 1999, anexo IV; Rejman, op. cit.). Nesse caso, os investidores preferidos para cooptação dos promotores foram os fundos de pensão, ou as entidades fechadas de previdência privada.

Anteriormente, outras entidades de previdência já haviam atuado no processo de produção da cidade. A partir da década de 30, os IAPs (Instituto de Aposentadorias e Pensões) construíram um grande número de conjuntos residenciais para seus associados, objetivando tanto a solução da questão habitacional, presente na idéia de seguridade social plena, quanto a busca por uma estratégia de capitalização através do aluguel das unidades residenciais construídas (Bonduki, 1994).

A Lei do Inquilinato, que congelou os aluguéis a partir da década de 40, foi diminuindo a presença dessas corporações, até a sua ação no mercado habitacional ter sido extinta quando da formulação do Sistema Financeiro Habitacional em 1964. Contudo, cabe ressaltar que as intervenções urbanas dos IAPs foram feitas sempre no mercado imobiliário residencial.

Quanto às entidades de previdência fechada em questão, elas começaram a surgir no final da década de 70, tendo sido regulamentadas pela Lei 6.435 de 1977. Tendo surgido originalmente para complementar a previdência oficial somente das empresas estatais, os fundos de pensão acabaram, posteriormente, sendo criados para as empresas privadas também.

Entre as décadas de 80 e 90, os fundos de pensão consolidaram-se como grande formadores de poupança em função de seu regime de capitalização, constituindo a principal base econômica do mercado de ações e imobiliário (ABRAPP, 1999a).

Em dezembro de 1998 o patrimônio total dos fundos contabilizava US$ 77 bilhões, equivalente a 10% do PIB à época (Lopes, 1999). Entre 1990 e 1998, os investimentos dos fundos de pensão no mercado imobiliário passaram de 2 para aproximadamente US$ 8 bilhões, só tendo diminuído em relação ao anos de 95 e 96 em função da resolução 2.324 do Banco Central que fixou o teto máximo de 10% dos recursos dos fundos para investimento no mercado imobiliário (gráfico 5.4).

A associação dos promotores imobiliários com esses investidores corporativos possibilitou a construção de uma grande quantidade de edifícios modernos, com grandes lajes e facilidades tecnológicas, cujo locatário preferido foi as grandes corporações multinacionais. A carência de edifícios com essas especificações e a atuação dos promotores na cooptação de prováveis locatários, por vezes utilizando de contratos de pré-locação, garantiu retornos financeiros consideráveis a longo prazo com baixo risco para os investidores85.

Gráfico 5.4: Variação do total de investimentos dos fundos de pensão no mercado imobiliário. Fonte: ABRAPP, 1992, 1997,

1999b.

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A ABRAPP (1995) estimava as taxas de retorno entre 15 e 20%, descontada a inflação, para os cotistas dependendo do tipo de empreendimento, variando entre edifícios residenciais, comerciais, hotéis e shopping centers. 90 91 92 93 94 95 96 97 98 0 2.000 4.000 6.000 8.000 10.000 US$ milhões

De Magalhães (op. cit.) detectou três estratégias de associação entre promotores imobiliários e investidores para a viabilização desses empreendimentos. No primeiro caso, os promotores atuaram como financiadores e no meio ou após o término da construção venderam os edifícios aos investidores. Numa segunda forma, os promotores começavam os trabalhos iniciais, mas o desenvolvimento dependia da cooptação dos investidores. Na terceira forma, o investidor atuou como promotor e continuou como proprietário, sem o envolvimento dos empreendedores imobiliários.

Exemplos da aplicação dessas três estratégias serão analisados no estudo do desenvolvimento da região da marginal do rio Pinheiros, no próximo capítulo.

5.4 A LOCALIZAÇÃO DOS GRANDES EMPREENDIMENTOS TERCIÁRIOS NA