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CAPÍTULO 3. OPÇÕES, FUNDAMENTOS E PERCURSOS METODOLÓGICOS

1. O PÇÕES E FUNDAMENTOS METODOLÓGICOS

1.1. Opções Metodológicas

No conjunto de estratégias que historicamente configuraram o campo da animação sócio- cultural, a animação teatral, em particular, tem vindo a fazer-se representar no discurso e na agenda das políticas sociais. Por via desta centralidade e também porque o teatro é indissociável da emergência e consolidação do campo da animação sócio-cultural, a animação teatral vem chamando a si, o direito de se autonomizar como área de intervenção dentro do campo da própria animação sócio- cultural. Esta pretensão decorre, por um lado, da sua tradicional ancoragem na oferta social, nomeadamente nos programas sócio-educativos de instituições vocacionadas para o atendimento à pessoa idosa, e por outro, da sua difusão em contextos de intervenção comunitária. A estes fatores juntou-se ainda a ação da comunicação social que tem posto a descoberto, um grande número de grupos e de formas teatrais atuantes em contextos comunitários e na esfera da institucionalização da pessoa idosa.

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Por todas estas razões “os teatros da animação teatral” (Úcar, 2006: 131-137) parecem ocupar hoje, um lugar na vida e rotina da pessoa humana que, porque envelhece, passa a dispor de mais tempo desocupado e de outras formas de o viver e gerir. As razões desta relação privilegiada do teatro com o envelhecimento ativo prendem-se com o facto de que, na sua essência, as práticas que habitam a animação teatral apelam direta e invariavelmente ao outro, à sua presença participativa. Seja na posição de ator, seja na de público fruidor, o outro é também o que permite e, em parte, justifica a existência do ato teatral. Em última análise, a animação teatral performa contra a exclusão e solidão humanas.

Estigma maior de uma sociedade que envelhece a passos largos, a solidão não combina com teatro. A razão de este existir radica naquele que é, por definição, o ser mais eminentemente social - o homem.

Como pode a animação teatral atuar contra a exclusão? Que tipo de relações despoleta e facilita? Pode ou não empossar aqueles que em torno de si se reúnem, e como os empossa? Que modalidades, que práticas melhor perseguem estes objetivos?

No conjunto de questões acima referidas enraízam as motivações iniciais que conduziram ao presente estudo. Um estudo cujo principal desafio é o de tentar compreender o contributo da animação teatral para aquele(a) que, envelhecendo, pode ainda “aprender a conhecer”, “aprender a viver com os outros”, “aprender a ser”, “aprender a fazer”, (Delors, 1999), até mesmo teatro…

De uma perspetiva metodológica, para um estudo que se interessa pelo fazer teatral e, simultaneamente, pelo retorno que esse fazer pode trazer a quem o faz, a abordagem qualitativa apresenta-se como sendo a mais adequada. Centrando-nos nos processos de construção de um atelier de animação teatral, centramo-nos incontornavelmente no vivido, nos processos experienciais dos seus atores - as pessoas idosas - e o olhar que, segundo a literatura, melhor parece servir a apreensão desta realidade complexa, é o qualitativo.

1.2. Abordagem metodológica

De acordo com o exposto, adotaram-se assim, os pressupostos da investigação qualitativa, mais concretamente, um estudo de caso envolvendo um projeto de intervenção teatral.

A abordagem metodológica qualitativa enfatiza os processos, privilegia o que ocorre e não somente os produtos ou os resultados finais. Como referem Bogdan & Biklen (1991: 49) “as estratégias qualitativas patentearam o modo como as expectativas se traduzem em atividades, procedimentos e interações diárias”.

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Este tipo de investigação está “vocacionada para a análise de casos concretos, nas suas particularidades de tempo e de espaço, partindo das manifestações e atividades das pessoas nos seus contextos próprios” (Flick, 2005: 13).

Neste tipo de investigação, a “fonte direta de dados” é o ambiente natural e o investigador é o “instrumento principal” (Bodgan & Biklen, 1994: 47). Assim, os investigadores qualitativos, que acreditam que o comportamento humano é fortemente influenciado pelo contexto em que ocorre, observam as ações e os sujeitos no seu ambiente natural para melhor os compreenderem (Bodgan & Biklen, 1994). No decurso da investigação, os investigadores qualitativos questionam constantemente os sujeitos no sentido de compreenderem “aquilo que eles experimentam, o modo como eles interpretam as suas experiências e o modo como eles próprios estruturam o mundo social em que vivem (Psathas, 1973 in Bodgan & Biklen, 1994: 50). No caso deste estudo, o ambiente em que a investigação aconteceu foi o espaço do próprio projeto de intervenção teatral.

Stake (2007: 52) destaca três diferenças entre a metodologia qualitativa e quantitativa: “1) a distinção entre explicação e compreensão como objetivo da investigação; 2) a distinção entre um papel pessoal e impessoal para o investigador e 3) a distinção entre o conhecimento descoberto e o conhecimento construído”. Para este autor, os investigadores quantitativos enfatizam a explicação e o controlo, ao passo que os investigadores qualitativos privilegiam a compreensão das complexas inter- relações entre tudo o que existe (Stake, 2007).

A metodologia qualitativa distingue-se também da quantitativa, pelo facto de privilegiar o contexto da descoberta. Assim, o investigador qualitativo “procura a formulação de conceitos, teorias ou modelos com base num conjunto de hipóteses que podem surgir quer no decurso, quer no final da investigação” (Guerra, 2006: 23). Portanto, “as questões, as hipóteses, as variáveis ou as categorias de observação normalmente não estão totalmente formuladas ou predeterminadas no início de uma pesquisa” (Hébert, Goyette & Boutin, 2008: 102). Apesar de se ter partido para o campo com um quadro teórico mais ou menos mapeado e os objetivos da investigação mais ou menos definidos, foi no decurso da investigação e no desenrolar do projeto de intervenção que se formularam as questões da investigação com maior nitidez.

Para Stake (2007: 18) o caso “é uma coisa específica, uma coisa complexa e em funcionamento”. Neste sentido, consideramos que o projeto de animação teatral por nós implementado é um caso e será este o objeto da nossa investigação.

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De acordo com Merriam (in Bodgan & Biklen, 1994: 89) o estudo de caso “consiste na observação detalhada de um contexto, ou indivíduo, de uma única fonte de documentos ou de um acontecimento específico”.

Na ótica de Yin (2004: 19), o estudo de caso é “a estratégia preferida quando se colocam questões do tipo “como” e “por que”, quando o pesquisador tem pouco controlo sobre os eventos e quando o foco se encontra em fenómenos contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real”.

1.3. Objetivos e Questões da Investigação

O principal objetivo do nosso estudo de caso é o de compreender de que forma um projeto de animação teatral pode contribuir para o envelhecimento ativo e qualidade de vida de um grupo de idosos. Este objetivo foi operacionalizado através das seguintes questões de investigação:

- De que forma o atelier de teatro pode contribuir para fomentar a participação ativa dos seniores?

- Quais os contributos específicos do atelier de teatro para a melhoria do bem-estar físico e psicológico dos seniores?

- O que tem de particular o atelier de teatro para fomentar o desenvolvimento de relações entre os seniores?

- De que forma o trabalho com a memória contribui para a valorização da identidade e subjetividade dos seniores?

- Que indutores poderão facilitar de forma mais ativa a participação dos seniores?

Tal como afirma Stake (2007: 20), “a investigação por estudo de caso não é uma investigação por amostragem”. Aquilo que se pretende não é estudar um caso com o objetivo de entender outros casos, mas sim compreender esse caso específico. O primeiro critério para a seleção do caso deve ser o de este “maximizar o que podemos aprender. Dados os nossos objetivos, que casos terão probabilidade de nos levar a entendimentos, a asserções, talvez até à modificação das generalizações?” (Stake, 2007: 20).

Neste sentido, consideramos que a realização de um projeto de intervenção ao nível da animação teatral com um grupo de seniores nos poderia levar a entendimentos, a asserções, a respostas às nossas questões de investigação.

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O plano geral de um estudo de caso pode ser representado como um funil. O início do estudo corresponde à parte mais larga do funil. À medida que o estudo avança, tal como afirmam Bodgan e Biklen (1994: 89-90):

os planos são modificados e as estratégias selecionadas. Com o tempo acabarão por tomar decisões no que diz respeito aos aspetos específicos do contexto, indivíduos ou fonte de dados que irão estudar. A área de trabalho é delimitada. A recolha de dados e as atividades de pesquisa são canalizadas para terrenos, sujeitos, materiais, assuntos e temas. De uma fase de exploração alargada passam para uma fase mais restrita de análise dos dados coligidos.

O estudo de caso com projeto de intervenção inseriu-se num projeto institucional mais abrangente: o Projeto +SaúdArte (Anexo I). Como veremos, apesar de um mapeamento inicial mais ou menos definido, o plano do estudo foi se redefinindo ao longo do desenvolvimento do projeto, procurando adequar-se aos interesses e necessidades dos sujeitos participantes.