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2 A EXECUÇÃO PROVISÓRIA COMO INSTITUTO

2.2 O conceito de execução provisória

2.2.1 O título executivo provisório

Faz-se necessário tecer algumas considerações sobre o título executivo, pois é este que embasa a execução108. Nesse contexto, nas palavras de Sérgio Seiji Shimura, o título executivo é “o documento ou o ato documentado, tipificados em lei, que contém uma obrigação líquida e certa e que viabilizam o uso da ação executiva”109. Wilson Gianulo lembra o conceito trazido por Chiovenda: “título executório é o pressuposto ou condição geral de qualquer execução e, assim, da execução forçada: nulla executio sine titulo”. E, ainda, conclui: “título corresponde a representação formal, fundamentalmente documental da obrigação, guardadas as características de liquidez, certeza e exigibilidade”.110

Ademais, o título executivo é “a base indispensável para a execução, com tríplice função processual: autorizar, definir o fim e fixar os limites da execução. É ele quem autoriza ao credor a utilização das vias do processo de

108 "[...] El simple interés en la ejecución no justifica la pretensión ejecutiva, aunque sea indudablemente necesario para que se verifique actuaciones de esta clase. Hace falta un motivo en que pueda apoyarse la reclamación correspondiente, y este motivo ha de consistir en un fundamento legal, o sea en un título de ejecución.

El título es, pues, requisito objetivo indispensable de toda ejecución procesal: "nulla executio sine titulo". No es que el resto de pretensiones procesales, a diferencia de la pretensión de ejecución, carezcan de título. Pero en la pretensión de ejecución el título figura en primer plano, porque es requisito que se examina inicialmente y que decide, con su existencia o inexistencia, la apertura del procedimiento correspondiente."

No português: "[...] O simples interesse na execução não justifica a pretensão executiva, ainda que seja indubitavelmente necessário para que se verifique as atuações desta classe. Faz falta um motivo em que possa apoiar-se a reclamação correspondente, e este motivo há que se consistir em um fundamento legal, ou seja, em um título executivo.

É o título, pois, requisito objetivo indispensável de toda execução processual: "nulla executio sine titulo". Não se quer dizer que o restante das pretensões processuais, diferentemente da pretensão de execução, careça de título. Mas na pretensão de execução, o título figura em primeiro plano, porque é requisito que é examinado inicialmente e que decide, com sua existência ou inexistência, a abertura do procedimento correspondente." (livre tradução). GUASP, Jaime; ARAGONESES, Pedro. Derecho Processal Civil: Tomo II, Parte Especial, Procesos Declarativos y de Ejecución (séptima edicíon revisada y puesta al día). Madrid: Thomson Civitas, 2006, pp. 605-606.

109 SHIMURA, Sérgio Seiji. Título executivo. São Paulo: Método, 2005, p. 139.

110 GIANULO, Wilson. Execução e embargos: nos termos da reforma do Código de Processo

execução contra a pessoa que nele figure como devedor.” Tendo o título como elementos essenciais a liquidez (valor a ser pago, ato a ser praticado ou a que deva se abster o executado, ou, ainda, a coisa a ser entregue), a certeza (o que indica estar designada a prestação a ser dada), e a exigibilidade (imposição ao devedor da prestação quando havida a condição e ou o termo).111

Como afirma Salvatore Satta, “título executivo significa simplesmente que existe uma norma, constituída por um procedimento público ou privado, o qual a lei atribui um valor absoluto para a ação do credor”.112 E como bem lembra Leo Rosenberg: “são títulos executivos ou títulos de dívida, os documentos públicos que declaram executável a pretensão para cumprir ou uma responsabilidade”, ou seja, “obrigam o órgão executivo a executar”. Assim, “quase sempre são resoluções judiciais, mas podem ser também atos que tenham assento em documentos públicos”.113 Ainda nesse âmbito, Leonardo Prieto Castro afirma que o título executivo é um título obrigacional que conduz à execução forçada, aduzindo que “é a base da execução, pois no título o juiz encontrará a medida e o alcance dos atos executivos e a indicação do que é

111 FERNANDES, Andréa Lopes de Oliveira Ferreira; FRANCO, Wanner Ferreira. Execução na

pendência do julgamento dos recursos extraordinário e especial. In: NERY, Jr., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis, v. 4. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 82.

112 No original: “Título ejecutivo significa simplemente que existe uma normativa, constituída a

través de um cierto procedimento, privado o público, a la cual la ley atribuye un valor absoluto respecto de la acción del acreedor.”

SATTA, Salvatore. Manual de Derecho Procesal Civil, Volumen II, el proceso de ejecución, los procedimientos especiales. Traducción de Santiago Sentís Melendo. Buenos Aires: Ediciones Juridicas Europa-America, 1971, p. 17.

113 No idioma do autor: “Son títulos ejecutivos o títulos de deuda los documentos públicos que

declaran ejecutable la pretensión por cumplir o uma responsabilidad. Obligan al órgano ejecutivo a ejecutar. Casi siempre son resoluciones judiciales, pero pueden ser tambiém actos de parte que se han asentado en documentos públicos. [...[“

ROSENBERG, Leo. Tratado de Derecho Procesal Civil. Traducción de Angela Romera Vera. Tomo III. Libro terceiro: La ejecución forzosa. Libro cuarto: embargo preventivo y medidas provisionales de seguridaded. Buenos Aires: Ediciones Juridicas Europa-America, 1955, p. 16.

preciso fazer para satisfazer o credor, ou, em geral, para realizar o direito objetivo”.114

Ademais, com o título executivo, é determinável o fim da ação executiva, pois, por meio dele, verifica-se qual foi a obrigação contraída pelo executado, sendo esta obrigação que define qual é o objetivo da execução, além de fixar os limites da ação executiva.115

Nesse contexto, dentre as classes de título executivo, há os definitivos, que se constituem na regra, e os provisórios, “que são em particular as sentenças declaradas provisoriamente executáveis”.116 Desse modo, no caso da execução provisória, lembra-se que a provisoriedade é do título executivo, pois este ainda está sujeito à apreciação do Tribunal, por meio do recurso interposto pelo réu. Isto é, não se trata da provisoriedade da execução em si, mas do título que a fundamenta.

Isto é, a provisoriedade da execução é apenas o reflexo do próprio título executivo, conforme Cândido Rangel Dinamarco:

114 No original: “Es la base de la ejecución, porque en el título há de encontrar el Juez ejecutor

la medida y el alcance de los actos ejecutivos y la indicación de lo que es preciso hacer para satisfacer al acreedor e, en general, para realizar el derecho objetivo [...]“.

CASTRO, Leonardo Prieto. Derecho Procesal, Tomo II, Segunda Tirada. Libreria General Zaragoza, 1949.

115 Nas palavras de José Alberto dos Reis:

“Com efeito, se o título contém a obrigação de pagar certa soma de dinheiro, a execução a promover há-de ser a destinada ao pagamento de quantia certa; se a obrigação constante do título é a de entregar coisa determinada, a execução há-de ter por fim a entrega de coisa certa; se em face do título o devedor está obrigado a prestar um facto, o credor tem de requerer a execução para prestação de facto (art. 45). Finalmente o título fixa os limites da acção executiva. É pelo título que se conhece, com precisão, o conteúdo da obrigação do devedor: qual o montante que deve pagar, qual a coisa que tem de entregar, ou determinada individualmente, ou contida dentro de certo género, quantidade e qualidade, qual a natureza, características e espécie do facto que está obrigado a prestar. Estes limites da obrigação comandam os limites da execução.”

REIS, José Alberto dos. Processo de Execução. Volume 2. Coimbra: Coimbra Editora, 1985, p. 69.

116“Los definitivos, que forman a regla, y los provisionales, que son em particular las sentencias

declarada provisionalmente ejecutables [...]“.

ROSENBERG, Leo. Tratado de Derecho Procesal Civil. Traducción de Angela Romera Vera. Tomo III. Libro terceiro: La ejecución forzosa. Libro cuarto: embargo preventivo y medidas provisionales de seguridaded. Buenos Aires: Ediciones Juridicas Europa-America, 1955.

[...] Na segunda hipótese tem-se a execução provisória, que é o resultado de um abrandamento imposto à eficácia abstrata do título executivo, cuja presença autoriza plenamente a realização de alguns atos executivos mas nem sempre de todos: os que puderem atingir de modo perigoso o patrimônio do suposto devedor são em princípio condicionados a uma caução a ser prestada pelo exequente, como modo de resguardar aquele patrimônio contra possíveis ilegalidades e injustiças. A essência da provisoriedade da execução consiste na preservação de meios destinados a desfazer os efeitos dos atos constritivos que chegarem a ser realizados, dispondo expressamente a lei que ela ‘fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se ao estado anterior’ etc. (CPC, art. 475- O, inc. II). A provisoriedade da execução é sempre reflexo da provisoriedade do próprio título executivo em que se apoia – e a lei confirma essa relação, ao usar a locução sentença provisória para referir-se àquela que está sujeita a recurso (art. 475-O, § 1º).117

Por isso, não raro, diversos autores criticam a denominação execução “provisória”, uma vez que a provisoriedade não está na execução, mas no título, como se verá no próximo tópico sobre a nomenclatura (item 2.2.2).118

117 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, IV. São Paulo:

Malheiros, 2009, pp. 896-897.

118 Luiz Guilherme Marinoni também critica tal denominação, assim como sustenta visão mais

prática a respeito do título executivo. Afirma o autor que a tutela fundada em verossimilhança também não era admitida uma vez que a execução sempre deveria ser precedida pela cognição, também devido à aplicação do princípio da nulla executio sine titulo. A execução provisória foi chamada por Chiovenda de “figura anormal”, uma vez que permitia atos executivos antes da cognição exauriente, ou seja, antes de se atingir a “verdade”. Assim, para o autor, a execução é provisória, ou melhor, incompleta, não porque o direito ainda não foi definitivamente declarado, mas por questão de técnica legislativa. Se quisesse, o legislador poderia estabelecer execução completa para sentenças recorridas e, portanto, ainda não transitadas em julgado. Portanto, em sua visão, o título deve ser visto “como algo que não deve ser relacionado com a existência do direito, mas sim com a necessidade prática de sua realização”.

MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 49.

Ainda mais ferrenha é a crítica de Ovídio Baptista: “De modo que o direito moderno que produziu a genial criação do título executivo, valendo-se da verossimilhança e da inversão do contraditório, através do qual o Estado está disposto a conceder a tutela a quem pode não ter direito, recusa-se a empregar a mesma técnica para outras situações que não sejam diretamente os interesses dos comerciantes e empresários em geral”.

SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil: Processo Cautelar (Tutela de Urgência). 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. v. 3, p. 44.