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LIVRO DIDÁTICO Preceitos/Diretrizes

10 Capacidade de reflexão, tomada de decisão e análise

6.2.2 O verso da capa

O verso da capa dos livros didáticos analisados é utilizado para apresentar mapas geográficos que enfatizam a Alemanha, a Áustria e a Suíça. A ênfase mencionada é feita de forma variada nos livros didáticos e se utilizando diferentes recursos. O livro Studio D A1, por exemplo, faz o destaque a esses três países através do uso de cores diferenciadas e do título do mapa. No caso deste livro, o mapa tem como título “Alemanha, Áustria e Suíça” e estes países estão sinalizados no mapa com cores que os evidenciam, diferentemente do que ocorre com os demais países, que são deixados todos em uma tonalidade clara e com pouca ostentação:

Figura 26 – Mapa Geográfico do livro Studio D A1

Método semelhante foi utilizado pelo livro Berliner Platz 1 que pontua, no alto do mapa geográfico, a preferência pela Alemanha, Aústria e Suíça, ao incluir a sigla dos denominados países dominantes falantes de língua alemã (D A CH), além de apresentar estes três países em tons de verde, enquanto, os demais países figuram em um tom neutro, sem qualquer tipo de destaque:

O livro Passwort Deutsch 1, apesar de não fazer menção através de título ou sigla que identifiquem a Alemanha, a Áustria e a Suíça, explicita a sua ênfase nestes países com o uso de cores ao identificar cada um deles com uma cor distinta, no caso a Alemanha com o verde, a Suíça com um tom de rosa e a Áustria com o cinza, enquanto, os demais países estão pintados de branco, identificados apenas pelos nomes:

Figura 28 – Mapa Geográfico do livro Passwort Deutsch 1

O destaque, através das cores, também foi um recurso utilizado pelos livros Schritte Plus 1e 2, estes livros ressaltam a Alemanha, a Áustria e a Suíça ao inserirem cores fortes e nítidas nos mapas destes três países, a exaltação fica ainda mais aparente ao se perceber que as mesmas tonalidades de cores são utilizadas nos demais países. No entanto, em tons mais claros e sem muita nitidez. Ademais, esses países também se sobressaem aos demais em relação ao tamanho das letras com as quais os seus nomes foram escritos, no caso dos referidos países, as letras estão maiores e mais evidentes:

Figura 29 – Mapa Geográfico do livro Schritte Plus 1

A ênfase dada a esses três países se contrapõe, na visão desta análise, a um dos preceitos do Quadro Comum Europeu, que está intimamente relacionado com a autonomia do aluno: a interculturalidade. Apesar de a Alemanha, a Suíça e a Áustria serem os três países mais conhecidos que falam a língua alemã, não são os únicos; ao todo são sete países que possuem a língua alemã como oficial ou co-oficial, sem contabilizar os demais países que a utilizam de forma minoritária, ou sem a “relevância” de uma referência política como a adquirida com o termo oficial ou co-oficial.

A língua alemã como língua oficial é falada na Alemanha, na Áustria e em Liechtenstein, como língua co-oficial é utilizada na Bélgica, em Luxemburgo, na Suíça e na Itália. A partir de um olhar mais criterioso, verifica-se que os outros quatro países (Liechtenstein, Luxemburgo, Itália e Bélgica) são apresentados nos mapas. Porém sem nenhum realce, tendo em vista que são ilustrados da mesma forma que outros países que não falam a língua alemã. O destaque para os três países descaracteriza, de certo modo, a preocupação com a interculturalidade e a possível inserção efetiva desta em sala de aula.

A interculturalidade é norteada pela concepção de que os países, as sociedades, os seres humanos não são iguais, cada um terá a sua especificidade e esta deverá ser respeitada. O Quadro Europeu Comum assume essa visão e estabelece que o ensino precisa ser pautado na integração, compreensão e interação entre os diversos países e sociedades, perspectiva essa assumida por Mendes (2008), que explicita que o ensino de línguas necessita adotar a perspectiva da cultura como meio de promover a integração e o respeito à diversidade dos povos, visualizando a interculturalidade como a inter-comunicação entre mundos linguísticos- culturais distintos. Vale destacar a seguinte fala da autora:

[...] o sentido que atribuo à qualificação intercultural é o de um esforço, uma ação integradora, capaz de suscitar comportamentos e atitudes comprometidas com principios orientados para o respeito ao outro, às diferenças, à diversidade cultural que caracteriza todo o processo de ensino/aprendizagem, seja ele de línguas ou de qualquer outro conteúdo escolar. É o esforço para a promoção da interação, da integração e cooperação entre os indivíduos de diferentes mundos culturais. (MENDES, 2008, p. 61)

O Quadro Europeu pretende, assim, desenvolver uma competência intercultural tendo como “objectivo central da educação em língua promover o desenvolvimento desejável da personalidade do aprendente no seu todo, bem como o seu sentido de identidade, em resposta à experiência enriquecedora da diferença na língua e na cultura” (CONSELHO DA EUROPA, 2001, p. 19).

Nesse pensar, o ensino-aprendizagem tem como responsabilidade nortear-se na construção de um modo de viver autônomo e intercultural a ser assumido por seus professores e alunos. A autonomia e a interculturalidade são capacidades que devem ser desenvolvidas pelos agentes inseridos em contextos educacionais (alunos e professores), visto que será através dessas capacidades que estes serão capazes de atuar criticamente, além de visualizarem-se como cidadãos democráticos.

Infere-se, contudo, que o realce de apenas três dos setes países falantes oficiais ou co-oficiais da língua alemã pode gerar uma visão estereotipada ou até mesmo de hierarquia entre determinados países em relação a outros, tendo como referência o domínio linguístico. Os livros não esclarecem os motivos que os levaram a destacar apenas alguns desses países, o que prejudica ainda mais a visão da interculturalidade, pois, sem estabelecer um padrão, o aluno, assim como o professor, pode se questionar sobre as razões que fizeram a editora focar nesses três países, possibilitando, dentre outros, os seguintes questionamentos: São os países que possuem o maior número de falantes da língua? São os países que possuem o maior

domínio linguístico da língua? São os países que possuem as maiores variedades linguísticas na língua alemã?

Ademais, é importante frisar que, apesar da ênfase dada, no mapa geográfico, à

Alemanha, à Áustria e à Suíça, o foco do livro é o Hochdeutsch48 falado na Alemanha, sendo

as informações sobre as variantes ou as especificidades linguísticas, encontradas na Áustria ou na Suíça, excluídas dos livros didáticos ou incluídas nestes de forma restrita e tímida. No livro Studio D A1, a Áustria e a Suíça são mencionadas poucas vezes ao longo do livro didático, sendo referenciadas, em sua grande parte, de modo superficial, não apresentando nenhum elemento essencial e caracterizador desses países, além de seus usos nas atividades poderem ser facilmente substituídos por outro país europeu. Alguns dos exemplos do uso desses países no livro podem ser visualizados nas seguintes atividades:

Figura 30 – Livro Studio D A1, Start auf Deutsch, página 13

Figura 31 –Livro Studio D A1, Unidade 1, página 23

Figura 32 – Livro Studio D A1, Unidade 03, página 49

48

O Hochdeutsch é a denominada variante oficial do alemão ensinada nas escolas, utilizadas pelos órgãos públicos, etc.

O livro Passwort Deutsch 1, por sua vez, tenta incluir os aspectos das variantes e especificidades dos referidos países ao dividir as suas dez unidades de acordo com cidades destes, destinando a unidade 7 à Salzburg, cidade da Áustria, e a unidade 9 à cidade de Basileia, na Suíça. Além disso, explicita, na sua página de introdução ao livro, que os CDs possuem, em suas composições, variantes regionais da Alemanha, da Áustria e da Suíça. Contudo, mesmo com essas demonstrações, o livro didático não pontua para o aluno as variantes linguísticas, as indicando apenas no livro do professor, de modo que ficam dependentes do professor mencionar essa informação, caso ache relevante.

A série Schritte Plus faz uma discreta menção à Áustria e à Suíça ao longo de seus livros didáticos, realizando apenas uma pequena introdução aos conhecimentos sobre estes países, como se observa a seguir: 1) a indicação das siglas destes países, como ocorre na Unidade 1 (Figura 33); 2) a conexão de algumas cidades com os seus respectivos países, como na atividade desenvolvida na Unidade 2 (Figura 34) e 3) na menção de algumas variáveis linguísticas, como é feito na atividade do livro de exercício da Unidade 2 (Figura 34).

Vale ressaltar que, na maioria das vezes, a alusão aos referidos países é feita apenas como meio exemplificativo, de modo que poderiam ser substituídos por outros países, assim como ocorre no Studio D A1. No caso da série Schritte Plus, a ausência de especificidades e de variantes sobre a Suíça se explica pelo fato de que a editora possui uma linha denominada Schritte Plus Ausgabe Schweiz, que tem como base o alemão falado especificamente na Suíça. Contudo, esse fato não justifica a omissão da editora em sua série padrão para o ensino de alemão como língua estrangeira, tendo em vista que as variantes linguísticas e integração com os demais países é preceito obrigatório do Quadro Europeu Comum.

A referida alusão aos países Áustria e Suíça, ao longo dos livros didáticos citados, pode ser observada a seguir:

Figura 34 – Livro Schritte Plus 1, Unidade 02, página 26

Figura 35 – Livro Schritte Plus 1, Unidade 02, página 104

O livro Berliner Platz 1 segue o mesmo padrão dos demais livros, de modo que quase nenhuma referência aos países citados é feita de forma significativa. Na maioria dos casos, esses países são apenas utilizados para exemplificar situações e atuarem como cenários para diálogos. Uma das poucas menções às variantes linguísticas entre os países é feita na Unidade 1, ao exemplificarem algumas formas diferentes de cumprimento nestes países:

Figura 36 – Livro Berliner Platz 1, Unidade 01, página 14

O realce indevido, ao menos na concepção desta pesquisa, e o fato de os autores não explorarem, ou ao menos exemplificarem, quando possível, as variantes linguísticas, é um contraponto à interculturalidade e à consequente autonomização do aluno. A demonstração ao aluno de que a língua alemã é falada em outros países, além da Alemanha, pode gerar a motivação ao estudo, pois é concebido que o uso da língua não será restrito a apenas um local específico. Além disso, apresenta ao aluno que a língua alemã pode estar mais próxima de si do que ele, anteriormente, imaginava. Constata-se que a apresentação de variantes pode servir como estímulo ao aluno na busca por novos vocabulários e novas fontes de estudos. Ainda nesse sentido, é necessário conceber que a perspectiva adotada pelos livros para a apresentação desses países aparenta se restringir apenas aos mesmos as ações de interação, integração e compreensão da língua alemã.

Atenta-se, contudo, que, nesta fase da pesquisa, se analisa apenas a organização do livro, exemplificando um realce indevido em determinados países e o não uso de variantes linguísticas. Posteriormente, será demonstrado que, apesar desses pontos, os livros se utilizam da interculturalidade em outros sentidos, como, por exemplo, ao apresentarem textos que tentam estimular o aluno a um estudo não apenas focado na Alemanha.