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“What is in a name? That which we call a rose

1.1.2 O VOCABULÁRIO

Words are a universal currency within a community. (PINKER, 1994, p. 151)

O vocabulário de uma língua se renova com grande velocidade no mundo contemporâneo. Segundo Rey-Debove (1984), em 25 anos a renovação das unidades lexicais é da ordem de 10%, o que corresponde a 5 mil palavras num conjunto de 50 mil vocábulos. O vocabulário então é um subconjunto do léxico de uma língua. É composto de todas as unidades semânticas, graficamente simples e compostas, e locuções que se atualizam no discurso, que são chamadas de palavras ou vocábulos. Isso nos leva à seguinte indagação: Quantas palavras um falante nativo comum conhece?

“Não conhecemos jamais todas as palavras da nossa própria língua” (REY- DEBOVE, 1984, p. 57). Assim, cada indivíduo falante de uma língua possui seu próprio vocabulário. O vocabulário ativo de um indivíduo é aquele que ele tem o costume de empregar na fala ou na escrita; o vocabulário passivo é aquele que o indivíduo compreende quando empregado por outras pessoas, mas não emprega. Rey-Debove (1984) afirma que o vocabulário de um indivíduo varia para uma comunidade lingüística entre 3.000 e 40.000 itens. Os maiores dicionários da língua, entretanto, ultrapassam facilmente as 100.000 entradas, chegando até mesmo a 500.000 entradas.

Segundo Rey-Debove, cada usuário da língua domina mais ou menos todas as palavras gramaticais e todas as palavras lexicais de primeira necessidade, ou seja, cuja freqüência é alta na língua falada, garantindo, assim, comunicação entre usuários.

Segundo Radford (1999), o léxico de um falante nativo de inglês contém cerca de 30.000 palavras, o que significa que em uma conversa informal, tal falante tem que fazer até 05 escolhas por segundo dentre as 30.000 palavras disponíveis no seu léxico, que compreende seu vocabulário ativo e passivo.

Biderman (1984b) considera que o léxico mais usual de um usuário padrão não ultrapassaria 15.000 palavras; em um outro momento de sua pesquisa lexicográfica, entretanto, Biderman (1998a) discute a idéia de que um homem culto domine 25.000 palavras no seu vocabulário ativo e passivo.

Pinker (1994) propõe uma discussão sobre vocabulário começando com um “palpite” baseado em um teste que delimita quantas palavras uma pessoa escuta ou lê. De acordo com os resultados, um analfabeto dominaria menos de 1.000 palavras e uma

pessoa escolarizada conheceria uma média de 5.000 palavras, enquanto pessoas como Shakespeare conheceriam mais ou menos 15.000 palavras (esse número equivale ao número de palavras distintas encontradas em suas peças e sonetos).

O autor, entretanto, argumenta que os resultados desse teste não são verdadeiros, pois as pessoas reconhecem mais palavras do que realmente usam (PINKER, 1994, p. 149). Para avaliar a dimensão do vocabulário de uma pessoa, a Psicologia sugere um método: tomar o maior dicionário de língua disponível e testar todas as palavras com um usuário. O autor argumenta que tal teste seria impraticável, pois se fosse testada uma palavra a cada 30 segundos em 8 horas diárias de trabalho, o pesquisador levaria um ano para testar um único indivíduo. Ao invés disso, uma amostra seria suficiente para o teste: por exemplo, extrair a cada oito páginas a terceira entrada da primeira coluna da página esquerda. Os usuários não leriam todo o verbete, apenas diriam se conhecem ou não a palavra em questão, escolhendo um sinônimo entre algumas alternativas. A proporção seria multiplicada pelo tamanho do dicionário, o que daria uma estimativa do tamanho do vocabulário de uma pessoa.

Pinker (1994) expõe as conclusões do estudo realizado por William Nagy e Richard Anderson. Os pesquisadores selecionaram com base em uma lista de 227.553 palavras, 45.453 lexias simples, e 42.080 derivados e compostos que não poderiam ser interpretados a partir de seus componentes. Testando essa amostra de 87.533 unidades lexicais, Nagy e Anderson estimaram que um falante nativo comum do inglês, formado no Ensino Médio (High School), conheça 45.000 palavras, sendo esse número abaixo do real, uma vez que o estudo não incluiu nomes próprios, estrangeirismos, números, etc. Com a inclusão destas palavras, o estudante comum conheceria mais de 60.000 palavras e estudantes de graduação (Ensino Superior) que lêem mais, conheceriam mais palavras ainda. Pinker (1994), entretanto, indaga: 60.000 palavras seriam muitas ou poucas palavras para o vocabulário de um falante? Para o autor, esse número não é um exagero, se considerarmos que um estudante de Ensino Médio, que já passou cerca de 17 anos em contato com sua língua nativa, aprendeu uma média de 10 novas palavras por dia ou uma nova palavra a cada 90 minutos.

Percebe-se que os teóricos analisados não chegam a um consenso sobre a questão da aquisição do vocabulário, sobre o número de palavras que um falante nativo da língua sabe e domina em seu vocabulário ativo e passivo, apresentando diferentes testes e chegando a resultados distintos.

Biderman (1998a) ainda discorre sobre outros fatores de limitação que influenciariam a aquisição do vocabulário, como a memória de um falante (registro das palavras) e o universo lingüístico ao seu redor, ou seja, a realidade física, cultural, concreta que cerca tal falante.

Nossa preocupação, entretanto, direciona-se ao falante não-nativo da língua inglesa, ao usuário do dicionário para aprendizes que apresenta certamente um número menor de palavras em seu vocabulário em LE do que um falante nativo. Um consenso sobre o número de palavras incorporadas ao vocabulário ativo e passivo de um falante nativo faria com que estudos direcionados à aquisição do vocabulário por falantes não-nativos fossem mais precisos, como por exemplo, em relação à questão do uso do vocabulário básico de definição para a elaboração de definições referenciais em dicionários monolíngües para estrangeiros.

Podemos afirmar, entretanto, que um falante não-nativo adquire o léxico de uma língua estrangeira principalmente através da educação formal (ou seja, através da escola e da sala de aula, ou mesmo através da leitura de obras literárias ou até mesmo da consulta a dicionários).

É importante pontuar algumas considerações a respeito da aprendizagem de uma língua relacionada à aquisição do vocabulário pelo falante nativo antes de analisar aspectos da aprendizagem de LE.

1.1.2.1 A APRENDIZAGEM DA LÍNGUA E A AQUISIÇÃO DE VOCABULÁRIO

Learning a word from another person is not just a case of imitating that person’s behavior (PINKER, 1994, p. 151)

Segundo Pinker (1994), o aprendizado de palavras começa em torno dos 12 meses de vida. Uma criança com 6 anos de idade domina em torno de 13.000 palavras. Vale considerar, em linhas gerais, de que modo essa aquisição da língua ocorre.

Sabemos que a relação entre som (imagem acústica) e significado de uma palavra é arbitrária. Para entendermos essa relação, retomamos Saussure em sua discussão sobre a arbitrariedade do signo lingüístico.

[...] O laço que une o significante ao significado é arbitrário (...) A idéia de ‘mar’ não está ligada por relação alguma interior à seqüência de sons

m-a-r que lhe serve de significante; poderia ser representada igualmente

bem por outra seqüência, não importa qual; como prova, temos as diferenças entre as línguas e a própria existência de línguas diferentes. (SAUSSURE, 1995, p. 81-2)

Tal princípio não é contestado por ninguém. Mesmo quando pensamos nas onomatopéias, cujas escolhas de significantes podem ser ‘motivadas’ e nem sempre são arbitrárias, a contra-argumentação reside no fato de que são pouco numerosas, e que sua escolha é, em certa medida, arbitrária, pois não passam de imitações aproximadas de certos ruídos. Além disso, cada língua constrói suas onomatopéias de acordo com os sons que os falantes escutam, influenciados por seu recorte lingüístico e de acordo com os meios que a língua oferece. Segundo Pinker (1994), essa arbitrariedade já está incorporada na mente da criança. Bebês não esperam que cattle seja similar a battle ou

coats a goats.

O autor ilustra essa questão com um caso de um lingüista em uma comunidade indígena em uma situação específica: um coelho passa pela aldeia e neste momento um nativo aponta para o animal e grita ‘gavagai’. Se transportássemos essa situação a um contexto em que o lingüista fosse a criança em fase de aprendizagem e o nativo os pais dessa criança, o bebê deveria intuir o significado da palavra e evitar outras alternativas (possibilidades contextuais menos prováveis como, por exemplo, ao invés de ‘coelho’,

gavagai seria ‘animal ligeiro’ ou ‘animal com orelhas compridas’ ou qualquer outra

possibilidade contextual). Assim, ‘gavagai’ seria coelho para o bebê, e não ‘animal’ ou ‘mamífero’ ou ‘um tipo específico de coelho’, etc.

O autor explica ainda que essa inferência de significado ocorre porque o bebê não é um lógico-matemático, mas um ser humano guiado por certas previsões. Descobrir que palavra combina com qual conceito é o problema central da situação exposta em ‘gavagai’, tanto na aquisição da língua materna quanto na aquisição da língua estrangeira.

O autor ainda analisa o fato de que as palavras têm muitos significados, mas poucos significados têm mais de uma palavra, o que significa que há muitos homônimos e poucos sinônimos, uma vez que se supõe que sinônimos têm diferença de significado, mesmo que seja pequena. Por exemplo, os sinônimos policeman e cop diferem quanto ao grau de formalidade.

Quando uma criança ouve uma nova palavra em um mesmo contexto em que já aprendeu outras palavras, ela parte para novos processos mais específicos de conceptualização, lançando mão das categorias e subcategorias.

Ainda segundo Pinker, não há dois indivíduos exatamente iguais no mundo, entretanto também não há grupos de propriedades ou categorizações diferentes. Animais que têm orelhas longas e peludas, rabos como um pom-pom e tendem a comer cenouras, escondem-se em buracos e tocas geralmente são coelhos. Colocar objetos em categorias é inferir o significado pelo conjunto de propriedades de cada categoria. Quanto mais específica a categoria, mais inferências sobre o objeto.

Pinker também apresenta o trabalho de duas psicólogas - Ellen Markman e Jeanne Hutchinson - que aplicaram dois testes em crianças de 2 e 3 anos de idade. O primeiro teste compreendia um conjunto de figuras mostradas às crianças. A pesquisadora mostrava uma figura e pedia à criança que encontrasse outra similar a essa, ou seja, a psicóloga não nomeava as figuras com unidades lexicais. Os conjuntos formados, por exemplo, eram os de um cachorro e um osso. No segundo teste, entretanto, a instrução era diferente: ‘Encontrar um dax que seja similar a esse dax’ (dax era uma palavra inventada). Nesse caso, as crianças traziam duas figuras de pássaros ou de cachorros.

Comprovou-se que mesmo sem nunca ter ouvido uma palavra (no caso, dax), as crianças (falantes nativas da língua) apresentam uma capacidade inata de articular conceitos, o que intuitivamente fez com que elas não formassem um conjunto com duas figuras diferentes ou somente complementares (como no caso do cachorro e do osso), mas conjuntos com figuras que representassem objetos sinônimos (no caso dos dois pássaros), considerando dax uma categoria genérica (como por exemplo, pássaro).

Remetemos a discussão a Chomsky (1997), cuja análise dos mecanismos de aquisição de uma língua o levou a discutir a capacidade inata do ser humano, ou seja, as pessoas estão predispostas à linguagem, pois haveria uma potencialidade genética do ser humano para a aquisição da linguagem.

Toda essa discussão sobre vocabulário e aquisição da língua nos leva a indagar, então, que processos envolvem o reconhecimento e a produção de uma palavra. Num primeiro momento, a informação sobre a categoria a que tal palavra pertence parece ser importante. Em seguida, as propriedades morfológicas e sintáticas da palavra também devem ser reconhecidas e compreendidas. Além disso, reconhecer uma palavra envolve entendê-la semanticamente, buscando seu significado contextualizado.

A discussão sobre aquisição do vocabulário por um falante nativo faz com que reflitamos sobre quais processos envolvem a aquisição do vocabulário de uma língua por um falante não-nativo.

Fica claro que o número de palavras do léxico de um falante não-nativo de uma língua é relativamente menor que o léxico de um falante nativo dessa língua com o mesmo grau de escolaridade, e esse vocabulário restrito do falante não-nativo tem de ser levado em conta na construção de verbetes em dicionários para aprendizes.Dicionários monolíngües como o Longman Dictionary of Contemporary English (LDOCE) e o Oxford Advanced Learner’s Dictionary (OALD), por exemplo, produzem os textos de seus verbetes, ou seja, as definições referenciais, usando um vocabulário de definição (vocabulário restrito entre 2.000 a 3.500 palavras de uso corrente na língua inglesa sem inserção de termos técnicos), cuja freqüência garante o entendimento do verbete por parte do usuário falante não-nativo da língua. Discutiremos esta questão mais adiante quando levantarmos as diferenças entre os tipos de dicionários.

Além disso, a informação sobre a categoria da palavra, suas propriedades morfossintáticas e semânticas, bem como a contextualização de seus significados, também devem fazer parte do verbete do dicionário para aprendizes, por serem informações fundamentais na aquisição de uma palavra.

Antes de discutirmos tais questões relativas ao dicionário, consideramos brevemente as peculiaridades das ciências que têm o léxico como objeto de estudo.