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A OCUPAÇÃO DAS TERRAS DO ALTO SERTÃO DA BAHIA: DO LATIFÚNDIO DOS GUEDES DE BRITO AOS MINIFÚNDIOS POLICULTORES

2 FORMAÇÃO TERRITORIAL DO SUDOESTE BAIANO E DO VALE DO RIO GAVIÃO

2.2 A OCUPAÇÃO DAS TERRAS DO ALTO SERTÃO DA BAHIA: DO LATIFÚNDIO DOS GUEDES DE BRITO AOS MINIFÚNDIOS POLICULTORES

A ocupação das terras, que se iniciou no litoral, passou a se interiorizar com as expedições dos bandeirantes à procura de metais preciosos. Nos sertões, essa ocupação também sucedeu com a criação e transporte dos rebanhos bovinos, com a instalação das sesmarias, que promoveram um povoamento mais intenso, e com formas produtivas de uso da terra seja por meio das fazendas de gado bovino, seja pela agricultura. Todo esse processo foi fundamental para ocupação e formação territorial dos sertões da Bahia e para o aumento populacional e o surgimento de vilas e povoados.

Sobre essa questão, afirma Maria Aparecida de Souza:

A busca de metais e pedras preciosas e a caça ao índio para escravização não foram os únicos fatores que permitiram a ocupação e povoamento do interior brasileiro. Desde muito cedo os rebanhos bovinos trilharam caminhos pelos sertões provocando transformações na paisagem baiana. Se, por um lado, a expulsão ou eliminação física do nativo significava o despovoamento, por outro num movimento inverso, a fixação de colonizadores reconstruía e redimensionava o povoamento com as fazendas criadoras de gado e instalação de rancharias para atender às necessidades imediatas de tropeiros que estabeleciam os vínculos comerciais com a isolada região (SOUZA, M. 2001, p.73).

Esse processo também ocorreu com o Sudoeste baiano, área que outrora correspondia às terras do “Alto Sertão da Bahia” e que tinha como modelo de povoamento a criação de gado em grandes propriedades e, posteriormente, a descoberta de minas de ouro e pedras preciosas. O mais conhecido proprietário de terras dessa porção do espaço, que atualmente corresponde às terras do estado da Bahia e de Minas Gerais, foi o Mestre de Campo Antônio Guedes de Brito, que detinha concessão de inúmeras sesmarias e que ampliou suas terras com áreas conquistadas aos índios.

Compreender o processo de ocupação das terras com o povoamento e o desbravamento da caatinga é essencial para entendermos a formação do território baiano, sobremodo as diversas formas de uso da terra que se desenvolveram historicamente nessa região e a atual estrutura fundiária.

Para tanto é imprescindível recorrermos à história da “conquista” dessa porção do território. Segundo dados historiográficos, o Sudoeste baiano e, também, as margens do Rio Gavião, na porção que foi represada para formar a Barragem de Anagé, têm uma

ocupação que data do século XVII, quando os bandeirantes e sesmeiros passaram a ocupar os vales dos rios dessa região, que, naquele contexto, era denominada Alto Sertão da Bahia.

Como afirma Neves:

As cartas de doação das capitanias hereditárias e os respectivos forais no século XVI, já empregavam esse termo com a mesma acepção. Também a denominação de Alto Sertão da Bahia tem antecedentes remotos, talvez século XVI, quando Antônio Guedes de Brito conquistou esse território de povos indígenas (NEVES, 2005 p. 20).

A formação territorial do Alto Sertão da Bahia ocorreu com a expansão da pecuária extensiva, desenvolvida em grandes latifúndios, que foram sendo formados a partir das sesmarias e das terras que foram sendo repartidas aos herdeiros de famílias. Naquele contexto histórico, os casamentos se davam entre famílias brancas, consideradas nobres ou com posses, para que a riqueza e, sobremodo, a terra não fossem divididas, mas, sim, somadas, promovendo a concentração para que permanecessem sob domínio das mesmas famílias.

O maior exemplo desse processo é o controle dos Guedes de Brito, como relata Neves, ao se referir aos domínios fundiários de origem sesmeira dessa família:

Um dos maiores vinculava parcelas do Morgado Guedes de Brito, instituído no século XVII, por verba testamentária do tabelião Antônio de Brito Correia e sua mulher Maria Guedes. Esse patrimônio fundiário de origem sesmeira, em poder do filho Antônio Guedes de Brito, expandiu- se e somente não superou, em extensão, as terras da Casa da Torre, domínio dos descendentes de Garcia d’Ávila que se estendia por zonas que mais tarde ficaram sob jurisdição de vários estados nordestinos. Quase todo o sertão da Bahia pertenceu a essas duas famílias. Os d’Ávila disporia de 270 léguas à margem esquerda do São Francisco, “indo para o sul” e 80 desse rio “para o norte”, e os “herdeiros do mestre-de-campo Antônio Guedes de Brito possuiriam 160 léguas desde morro dos Chapéus até a nascença do rio das Velhas”, em cujas terras estabeleceram sítios de uma légua, arrendados “por dez mil réis de foro” anuais (NEVES, 2008 p. 65-66).

O destaque do autor de que todas as terras do sertão pertenceram a essas duas famílias e, levando-se em consideração que tais domínios fundiários correspondiam também a outras áreas do agreste, do litoral e a terras que hoje constituem áreas de outros

estados, como Minas Gerais e Sergipe, tudo isso nos leva a inferir que as grandes propriedades fundiárias não tiveram origem necessariamente nas capitanias hereditárias. Elas são provenientes, sobretudo, da expansão das sesmarias e da apropriação ilegal e ilegítima de grandes extensões de terras, tendo em vista que existia um limite para cada sesmaria, mas que não foi respeitado pelos patriarcas dessas famílias e por seus descendentes.

As terras que pertenciam aos Guedes de Brito foram ampliadas com extensões de áreas que correspondem a partes dos estados da Bahia e Minas Gerais. Esse patrimônio fundiário foi sendo construído com as heranças das famílias e com as terras conquistadas com a expropriação dos índios, que foram violentamente massacrados e dizimados pelas expedições organizadas pelo Mestre de Campo Antônio Guedes de Brito. Sabe-se também que ocorriam processos de ocupação das terras para, posteriormente, ser solicitada a legalização junto à Coroa. Esse grande latifúndio ocupava partes da área central da Bahia indo até o norte de Minas Gerais, como descreve Neves:

O mesmo Guedes de Brito, associado a Bernardo Vieira Ravasco, recebeu do Conde de Óbidos, capitão-geral da Bahia em 1663, terras desde a nascença do Itapicurú e do rio de São Francisco e por elle acima tanta léguas, quantas há da própria nascença do Itapicurú á do Paraguassú [...]. Posteriormente Guedes de Brito comprou parte do sócio. Sobre o que caberia a tribos indígenas nada se sabe. Desconhece-se qualquer reserva indígena na região. E assim comprando de parceiros em sesmarias e outros proprietários, descobrindo e conquistando territórios dos índios, o mestre de campo se apoderou, nos sertões baianos e mineiros, de áreas mais extensas que diversos países da Europa juntos ou correspondentes a vários Portugais (NEVES, 2001, p.131).

As marcas da violência e da expropriação estão presentes na gênese da formação territorial do Sudoeste baiano. No processo de conquista do território dos índios, várias tribos foram completamente exterminadas pelas tropas do Mestre de Campo Antônio Guedes de Brito. Terras foram tomadas de posseiros e pequenos proprietários, além de diversas formas de extração da renda da terra, que já se desenvolviam, nessa época histórica, por meio de arrendamentos, foreiros, posseiros que, por não disporem de terras, pagavam as rendas aos proprietários.

A Figura 01 refere-se ao Mapa 01, que mostra a extensão das terras que pertenciam aos Guedes de Brito. Como podemos perceber, as propriedades ultrapassavam os limites de alguns estados, que, na época, ainda não eram demarcados com os limites atuais.

Rio Vaz a B arris Rio Itap ituru Rio Jac uípe Rio S alit re Rio Jac aré R io P a ra g u a çu R io P reto R io G ra n d e R io C o rr e n te Rio Para mirim Rio Sto Onofre Salva dor Rio de Con tas Rio Bru mado Rio Pa rdo R io J e q u iti n h o n h a Rio Itan hém Rio Mu curi R io São M a teus R io D o ce Rio da s Velh as R io P a ra íb a R io G ran de R io P ar na íb a Rio Par acat u Rio Uru caia R io C ar in ha nh a Oc ea no A tlâ nti co Rio V erd e G ran de Rio Ve rde Pe quen o R io G a vi ã o R io d o A n tô n io R io d a s R ã s Rio Sta Ri ta São Fr an ci sc o Te rras de do mín io do s G u ed es d e Br ito Oce ano Rios Elab oradore s: J úni or R . P. J úno ir e Ge dev al Pa iva . Ago ./200 9. Fonte: CE PLAB/SEP LAN T EC. Nev e s (200 5).

Território de domínio dos Guedes

de Brito no Alto Sertão da Bahia

e estado de

Minas Gerais - sécu

los XVII e XVIII

70 ° W 0° 10 ° S 20 ° S 30 ° S 40 ° W 50 ° W 60 ° W 0 1 15 0 km Bra sil div isã o pol ít ic a 0 11 0 2 20km MAPA 01: TERRAS Q U E PE RT E

NCIAM AOS GUEDES DE BRI

T

As propriedades sob o controle dos Guedes de Brito foram sendo ampliadas, usando das mais diversas práticas, como as ações de espoliação de pequenos proprietários, usando, como forma de controle, a violência e a truculência, maculando com sangue, ilegalidade e ilegitimidade um dos maiores latifúndios dos sertões da Bahia. Segundo Neves:

Se a imensidão das terras ermas facilitava as ocupações, propiciavam também a espoliação de posseiros pobres por proprietários mais experientes e influentes nas órbitas do poderes políticos e que dispunham, na retaguarda, das milícias coloniais. A legislação portuguesa ignorava a existência de posseiros. Em casos de conflitos se reconheciam os direitos dos donatários de sesmarias, que materializavam a onipresença do poder monárquico português, emanante da propriedade da terra. Explorando essa faculdade desde o século XVII se legalizaram extensas áreas já ocupadas, das quais passaram a cobrar foros e arrendamentos de moradores (NEVES, 2001, p. 131).

O direito a esse meio de produção se apresentava inacessível para a grande massa de excluídos e pobres, mesmo que estivessem na condição de posseiros, tendo em vista que, quando ocorriam conflitos por terra e litígios entre os sesmeiros e posseiros, a lei sempre favorecia os proprietários das terras. Esse processo de disputa entre posseiros e supostos proprietários ainda ocorre atualmente no Brasil, evidenciando que as contradições e a concentração fundiária não sofreram grandes alterações, mesmo com o aprimoramento das leis e instituições.

Ao analisar o parcelamento das terras por meio da sesmaria, Neves relata:

As restrições e controles das concessões e conservação de sesmarias, não eliminaram seu caráter de latifúndio inacessível ao lavrador sem recursos. Enquanto perdurou no Brasil esse sistema de repartição de terras funcionou como mecanismo de construção e consolidação da estrutura fundiária de grandes propriedades concentradora de renda, facilitando sua transferência para outros sistemas econômicos, conduta típica de economias primário- exportadoras de origem colonial (NEVES, 2001, p. 130).

Com a morte do Mestre de Campo Antônio Guedes de Brito, o patrimônio fundiário foi transferido para sua única filha, Maria Isabel Guedes de Brito, que, juntamente com seu marido Antônio da Silva Pimentel, administrou as propriedades, que, em grande parte, eram arrendadas para aqueles que não tinham a terra e pagavam o arrendamento ou o foro anual à proprietária ou aos seus procuradores. Como descreve Neves (2005, p.135), “o

procurador de Isabel Maria cobrava rendimentos dos ocupantes, mas estes passaram a se declarar espoliados e suspenderam os pagamentos”.

Fica desse modo evidente que a herdeira assumiu com afinco a gestão de suas terras e usava as mesmas práticas de seu pai, para ampliar as propriedades. A disputa pelas terras no Rio das Velhas, onde foram descobertas pedras preciosas, incitou os conflitos e os interesses não apenas sobre as terras, mas, principalmente, sobre as riquezas minerais ali encontradas e em processo de exploração, como relata Neves:

Logo que se descobriu ouro no rio das Velhas, na primeira metade da década de 1690, intensificou-se o povoamento de suas adjacências, iniciando com as fazendas pecuaristas de Antônio Guedes de Brito. Desenvolveu-se, a partir de então, a demanda por terras e surgiram, em conseqüência, arrendatários e posseiros que, em pouco tempo, passaram a disputar, com Isabel Maria Guedes de Brito, a posse das glebas que ocupavam (NEVES, 2005, p. 134).

Outros conflitos entre arrendatários e posseiros e a proprietária Isabel Maria também ocorreram em outras áreas, como em Jacobina, sobretudo em decorrência das minas de ouro que passaram a ser exploradas, tendo os ocupantes de pagar o valor do arrendamento. Tais conflitos, segundo relato de Neves, sempre eram levados ao conhecimento do rei, ou do seu representante na colônia, que, via de regra, sempre reconhecia o direito da proprietária: “O conde de Assumar, por considerar a matéria de competência régia e, enquanto o rei não deliberasse, ordenou aos moradores que voltassem a pagar as rendas da terra a Isabel Maria Guedes de Brito” (NEVES, 2005, p. 137).

A herdeira de Guedes de Brito, juntamente com seu marido, o coronel Antônio da Silva Pimentel, além de administrar as propriedades herdadas, atuou no sentido de ampliar as terras, como descreve Neves, ao se referir a esse processo: “Pode-se, com base nestes dados, deduzir que Antônio Guedes de Brito se apossara do território do centro-norte da Bahia até a foz do rio das Velhas. Seu genro e sua filha estenderam as ocupações até as cabeceiras desse afluente do São Francisco” (NEVES, 2005, p. 143).

Com a morte de Isabel Maria Guedes de Brito e do seu esposo, o domínio fundiário foi transferido para Joana da Silva Guedes de Brito, neta de Antônio Guedes de Brito, que recebeu uma imensidão de terras, correspondendo às áreas do estado da Bahia e Minas Gerais, entre elas as porções de terras do Sudoeste baiano e as margens do Rio Gavião.

Terras que correspondem atualmente aos municípios de Anagé, Caraíbas e Belo Campo, onde está localizada a Barragem de Anagé.

Erivaldo Fagundes Neves descreve a transferência das propriedades de Isabel Maria para sua filha Joana no seguinte trecho: “Isabel Maria manteve e transferiu para a filha Joana parte do vale dos rios: Pardo e Verde Grande, todo o Médio São Francisco e a Serra Geral, inclusive os sub-vales do Antônio, São João, Brumado e Gavião, da bacia do rio de Contas” (NEVES, 2005, p. 143 Grifo nosso).

Com base na descrição das terras que foram transferidas para Joana da Silva Guedes de Brito, podemos concluir que as terras que margeiam o Rio Gavião foram propriedade dos Guedes de Brito, até a venda realizada pelo Sétimo Conde da Ponte.

Todas essas terras foram administradas por Joana da Silva Guedes de Brito, que, após ficar viúva do primeiro matrimônio, casou-se, em segundas núpcias, com o fidalgo português Manoel de Saldanha da Gama, e, juntos, gerenciaram as propriedades fundiárias até o falecimento da herdeira dos Guedes de Brito.

Após a morte de Joana, todo o patrimônio fundiário foi transferido para o seu segundo marido, tendo em vista que a herdeira dos Guedes de Brito não teve filhos em nenhum dos matrimônios. O viúvo de Joana da Silva Guedes de Brito, o fidalgo Manoel de Saldanha da Gama, retornou a Portugal, onde se casou com Francisca Joana Josefa da Câmara Coutinho.

Essa descrição histórica, apesar de ser detalhada, é essencial, pois serão os descendentes de Manoel de Saldanha da Gama e Francisca Joana Josefa da Câmara Coutinho que irão redefinir a divisão das terras e a estrutura fundiária e vão contribuir para reorganização territorial de grandes extensões de terras da Bahia e também de Minas Gerais, pelo processo de venda e parcelamento desse grande latifúndio que começou a ser formado no início do século XVI e ficou sob o domínio dos descendentes do Mestre de Campo Antônio Guedes de Brito até o século XVIII.

Neves descreve toda a sucessão histórica do domínio fundiário dos Guedes de Brito no trecho que se segue:

O Alto Sertão da Bahia, conquistado de povos indígenas e ocupado por Antônio Guedes de Brito, na segunda metade do século XVI, manteve-se na mesma cadeia sucessória, transferiu-se para a filha Maria Isabel Guedes de Brito e desta para a neta Joana que, depois de enviuvar-se de João de Mascarenhas, contraiu novas núpcias com Manoel de Saldanha Gama. Dona Joana não teve filho em nenhum dos enlaces e legou tudo (...) mais tarde, em seu testamento, ao segundo marido e o nomeou sucessor do Morgado (...). Depois de viúvo, Saldanha da Gama casou-se

novamente, em Portugal e tornou-se pai de João Saldanha da Gama Melo Torres Guedes de Brito, que além das heranças paternas e maternas coube-lhe, de um tio sem descendência a titularidade de conde da Ponte (NEVES, 2005, p. 116).

Coube desse modo ao Sexto Conde da Ponte, João Saldanha da Gama Melo Torres Guedes de Brito, a administração do patrimônio fundiário dos Guedes de Brito, no Alto Sertão da Bahia. Analisar e estudar a atuação do Conde da Ponte é essencial para compreender a estrutura fundiária do Sudoeste da Bahia (Território de Identidade de Vitória da Conquista) e, também, das margens do Rio Gavião, pois foi, a partir da gestão desses empreendimentos, que se deu o parcelamento e a divisão das terras em sítios, fazendas e glebas e pequenas propriedades, vendidas aos arrendatários. Esse processo foi o marco inicial da fragmentação desse grande latifúndio e da configuração da estrutura fundiária, que, após essa divisão, passou a ter como característica a existência de uma grande quantidade de pequenas propriedades, coexistindo com alguns latifúndios.

A descrição de Neves demonstra bem esse processo:

Após inventário e partilha dos bens de Manoel de Saldanha da Gama, o filho João, já investido no titulo de conde da Ponte, comprou dos demais herdeiros, em 1806, tudo que restava do domínio fundiário recebido em sesmarias, herdado, comprado e conquistado de índios, por Antônio Guedes de Brito, no século XVI. O conde reunificou o remanescente dos seculares domínios territoriais, iniciou processos de “libelo de reivindicação” contra cada um dos usurpadores das terras, e negociou com eles, arrendamentos ou venda das glebas que ocupavam. Mobilizou, para isto, uma rede de procuradores, através do procurador geral, Pedro Francisco de Castro, em todos os sertões, por onde se expandiam os latifúndios (NEVES, 2005, p.151).

A venda das terras foi organizada depois da divisão do grande latifúndio em áreas administrativas, certamente para haver um controle melhor sobre a propriedade, tendo em vista a sua dimensão, como destaca Neves:

O conde da Ponte, quando assumiu a titularidade, em fins do século XVIII, dividiu esses territórios em cinco áreas administrativas (Rio de Contas, Rio Pardo, Caetité, Urubu, Xique-Xique, Jacobina), e as denominou de distritos. Em 1819, determinou-se o tombamento do patrimônio fundiário de cada uma dessas unidades, dos quais só se conhecem apenas os dos tombos do Rio Pardo, com 105 fazendas e sítios arrendados e o de Urubu, com 111 além das grandes unidades pecuaristas dos baixos do São Francisco, administradas pelo próprio senhorio, incluídas no inventário de 1831 (NEVES, 2005, p.149).

Os conflitos com os posseiros continuaram, inclusive aqueles que se iniciaram quando Joana da Silva Guedes de Brito ainda era a administradora do patrimônio fundiário, destacando-se as contestações em Jacobina, onde se explorava o ouro. Segundo Neves, “o príncipe regente emitiu nova carta ao governador da Bahia, com determinação de que o Juiz privativo de administração dos bens da Casa da Ponte na Bahia deslocasse para onde situavam as terras em litígio”. Ou seja, percebemos, com essa descrição, que as disputas e os conflitos dos posseiros e arrendatários duravam muitos anos, mas sempre o poder central, nesse caso representado pelo Rei, atendia aos interesses dos proprietários das terras.

Mesmo com as disputas, a atenção e o apoio dos representantes do poder, sempre existiram e se reproduziram parcelas de camponeses em pequenas propriedades, praticando a agricultura de autoconsumo, por meio de relações não capitalistas quanto à reprodução e tão antigas quanto a tentativa de apropriação privada das terras.

Na descrição que segue fica ainda mais evidente essa relação:

Preservaram-se, pois, os interesses do conde da Ponte, ao reconhecer aos mineiros e lavradores de Jacobina apenas o direito a recursos ou apelações, cujas perspectivas já se anteviam. Quando ao conde, obteve mais do que pretendeu: foi nomeado Governador da Bahia pelo príncipe D. João e ocupou o cargo entre 1805 a 1809, quando morreu. Desse modo, passou a exercer influências sobre o judiciário colonial, inclusive com poderes de