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1 PROBLEMATIZAÇÃO DOS REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO:

1.4 Além das Transformações de Conversão e Tratamento

1.4.4 Operação Discursiva de Designação em Álgebra

Em uma perspectiva cognitiva, a aprendizagem de álgebra requer, fundamentalmente, a operação de designação (DUVAL, 2015). A operação de designação da função referencial consiste em identificar um objeto por meio de um só signo ou de uma combinação de signos (letra ou número) ou de gestos (DUVAL, 1995). A designação é útil para encaminhar o pensamento algébrico, na medida em que as expressões incompletas produzidas por esta operação sejam integradas a outras unidades discursivas que abrem uma nova dimensão de sentido (DUVAL, 2015).

A introdução da álgebra requer substituições de termos concernentes à operação de designação ou redesignação, de modo que se baseia não simplesmente nas letras, mas na diferença entre um sinal e as suas ocorrências (DUVAL, 2015), ou seja, de um ponto de vista cognitivo, a compreensão em álgebra está ligada às operações de designação. Assim, a introdução da álgebra demanda quatro tipos de substituição semiótica, a saber: escrever uma relação entre duas listas de dados; colocar os dados em forma de equação; fórmulas para utilizar na realidade; e equações para resolver (DUVAL, 2015), conforme mostra o Quadro 20, abaixo.

Quadro 20: Quatro tipos de operações de substituição semiótica mobilizadas em álgebra Substituições de termos relativos à simples operação de designação ou de

redesignação Substituições expressões pertencentes de

a uma relação de

igualdade entre

membros 1. ESCREVER UMA

RELAÇÃO entre duas listas de dados 2. COLOCAR EM FORMA DE EQUAÇÃO os dados de problemas da realidade 3. FÓRMULAS PARA UTILIZAR NA REALIDADE 4. EQUAÇÕES

Produção de duas listas de dados correlacionados a uma

observação

Descrição verbal de uma situação e de seus dados:

dois níveis

Uma letra codifica o termo genérico de um

fator

Transformações internas da escrita de uma equação dada: dois níveis ESCOLHA DE UMA

LETRA para a primeira lista e DESIGNAÇÃO FUNCIONAL da segunda lista a. ESCOLHA DE UMA LETRA ANTECIPANDO a designação funcional b. CONVERSÃO DE UM TERMO DE PROPRIEDADE dos números em expressão literal a. SUBSTITUIR UM DADO NUMÉRICO por

cada uma das letras (menos uma) Nível 1: a. DESLOCAR todas as letras de um membro para outro c. REAGRUPAMENTO DE OPERAÇÕES SUCESSIVAS respeitando as prioridades operatórias para formar uma única

expressão

b. Às vezes, DESLOCAR uma letra de um membro

para o outro Caso particular para a

relação de duas letras

b. 1º grau: REAGRUPÁ- LAS segundo as prioridades operatórias c. 2º grau: RECONHECER AS FORMAS DE EXPRESSÃO (fatorar ou desenvolver) Nível 2 d. DUAS DESIGNAÇÕES DE UM MESMO OBJETO para escrever uma EQUIVALÊNCIA REFERENCIAL (EQUAÇÃO) Nível 2: d. Considerar o número de soluções Fonte: Duval (2015, p. 57)

O primeiro tipo de substituição semiótica, operação de designação funcional, consiste em “substituir, respectivamente, uma letra e um sintagma operatório [operação aritmética], compreendendo essa letra por duas listas abertas de números, quando essas duas listas são ligadas por uma relação funcional” (DUVAL, 2015, p. 54). Por exemplo, a designação do padrão de regularidade que relaciona duas listas de números por meio de letras, números e operações:

sejam as listas , para a designação do padrão de regularidade que une essas duas listas, podemos escrever na língua natural que “cada número da lista de baixo é igual ao número da lista de cima mais uma unidade”. Se perguntarmos ao aluno o que acontecerá para qualquer número da lista, será necessária uma designação das relações existentes por meio de letras, números e operações:

. (BRANDT; MORETTI, 2018, p. 13-14)

O segundo tipo de substituição semiótica, operação de redesignação, consiste em “substituir uma letra e/ou um sintagma operatório compreendendo essa letra na designação lexical ou numérica-lexical dos dados de um problema” (DUVAL, 2015, p.54). Ou seja, incide inicialmente “[...] em uma operação de redesignação literal do que já foi designado por um sintagma nominal articulando os nomes de duas grandezas heterogêneas para designar um valor numérico” (DUVAL, 2015, p. 55) e, na sequência, na associação “[...] de um número com a letra escolhida e não com uma lista indefinidamente aberta de números ou de valores numéricos” (DUVAL, 2015, p. 55).

No exemplo: “Rita e Carlos têm juntos 54 anos. Rita tem oito anos a mais que Carlos. Quantos anos tem Carlos? Quantos anos tem Rita?” (BRANDT; MORETTI, 2018, p. 15), a idade de Rita é redesignada em função da idade de Carlos: . Este exemplo explicita diferentes tipos de designação, dentre eles, a redesignação por meio da linguagem algébrica: , em que x representa a idade de Rita e y representa a idade de Carlos (designação

indireta), (designação indireta/descrita/funcional); e

(dupla designação) (BRANDT; MORETTI, 2018).

O terceiro tipo de substituição semiótica, substituição de um número por uma letra, consiste em “substituir um valor numérico ou um número por uma letra no contexto de uma fórmula ou de uma equação” (DUVAL, 2015, p. 55). Essa operação “[...] permite aplicar uma fórmula aos dados resultando de operações concretas de medida” (DUVAL, 2015, p. 55), isto é, em uma fórmula, “[...] as letras codificam o termo genérico, dando lugar às medidas” (BRANDT; MORETTI, 2018, p. 21). Por exemplo: “[...] a área de um retângulo é igual ao produto da medida da base pela medida da altura: ” (BRANDT; MORETTI, 2018, p. 21). Duval (2011 apud BRANDT; MORETTI, 2018, p. 21), em uma palestra, destaca: “[...] para resolver problemas reais, não são as equações que são úteis, mas sim as fórmulas”.

O quarto tipo de substituição semiótica, substituição de uma expressão algébrica por outra expressão algébrica, consiste em “substituir uma expressão literal por outra expressão literal, que é mais desenvolvida ou mais reduzida” (DUVAL, 2015, p. 55). Essa distinção entre um sinal e as suas ocorrências é considerada semioticamente fundamental em álgebra

(DUVAL, 2015). Por exemplo: a equação de primeiro grau “[...] exigirá

reorganizações operatórias do tipo (princípio aditivo)

(princípio multiplicativo) ” (BRANDT; MORETTI, 2018, p. 23). Acerca de equações do segundo e terceiro graus, “a resolução das equações [...] faz levar em conta outros tipos de substituição, que vão exigir um reconhecimento puramente formal da forma de expressão” (DUVAL, 2015, p. 56). Nesse sentido, podem-se citar a forma canônica, a forma reduzida e a forma desenvolvida da equação do segundo grau.

Essas operações discursivas necessitam ser introduzidas no ensino-aprendizagem de matemática. Contudo, como aponta o autor da teoria de RSS: “[...] como introduzir os alunos nas operações discursivas que ocorrem na linguagem matemática?” (DUVAL, 2014, p. 26), ou seja: como introduzir os alunos nas operações de designação em álgebra?

Como se nota, as operações de designação “[...] não são tão evidentes e espontâneas, pois precisam ser objeto do ensino para a atribuição de sentido e significação no interior das próprias relações” (BRANDT; MORETTI, 2018, p. 18). O professor, de sua parte, precisa tomar consciência da necessidade dessas formas de designação (BRANDT; MORETTI, 2018).

Porém, em um processo educativo, não basta o professor dominar as formas de designação de um conteúdo cognitivo; é necessário que o estudante também as utilize adequadamente e aprenda a empregar a língua natural e a linguagem algébrica nessa mesma perspectiva. Para tanto, cabem intervenções docentes apropriadas. Isso pode ser considerado um paradoxo didático: como pode o professor intervir em situações de ensino-aprendizagem sem tornar esse processo, por um lado, custoso ou com explicações abundantes para/por parte o/do docente e, por outro lado, sem conceber o estudante como um sujeito autônomo (autossuficiente)?