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CAPITULO 2 – Desenvolvimento da Fase 1 – Representação da Figura

2.6. Aula Teórica 1 Etapa 2

2.6.1. Os Cânones da figura humana

Em primeiro lugar, e por ser a base do desenho da figura humana, foi-lhes transmitido o conceito proporção, ou seja, “a relação de grandeza entre duas partes ou entre cada uma das partes e a grandeza total” (Porto Editora, 2003:1355), e de cânone o qual entendemos ser “a regra ou sistema que determina e relaciona as proporções da figura humana, partindo de uma medida básica, chamada por sua vez Módulo” (Parramón, 1973:7)

Na representação da figura humana, podemos recuar até ao antigo Egito para falarmos do uso de normas no desenho da figura humana, nomeadamente, na Lei da Frontalidade, na qual a figura humana era representada não com o propósito de reproduzir o que se via, mas de fazer sobressair o que achavam mais importante, de que se realça “a escala de alturas hierarquizada segundo o estatuto social” (Areal & Moreira, 2012: 42).

Quando, na antiga Grécia, a preocupação principal na representação da figura humana passou a assentar na “expressão de beleza” (Parramón, 1994:108), surge a preocupação em identificar as proporções ideais na figura humana. Na procura das proporções, Cânone ideal, podemos destacar três escultores famosos da antiga Grécia: Policleto, Lisipo e Leócares, que embora com um objetivo comum diferiram no cânone por eles defendido como o ideal.

Policleto, no século V antes de Cristo, foi o primeiro a definir as proporções ideais para a figura humana, quando escreveu um tratado que intitulou de “O Cânone”, que defendia que, “para obter a perfeita proporção de uma das partes do corpo com respeito a outras, a figura deverá medir sete cabeças de altura” (Parramón, 1973:7). A estátua de nome Dorífero é a obra representativa deste tratado, daí ser também denominada por O Cânone.

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Lisipo, por sua vez, no século IV antes de Cristo definia como a proporção ideal, a altura total do corpo igual a sete cabeças e meia a altura da cabeça, o “que lhe confere uma maior esbelteza” (Parramón, 1994:108).

Leócares, a quem é atribuída a execução da famosa estátua, “Apolo de Belvedere”, considerada, segundo José Maria Parramon (1973) uma das mais belas estátuas do mundo, atribui como proporção para a sua obra uma altura correspondente a oito cabeças e meia.

Figura 12 – "Dorifero" de Policleto, "Apoxiomeno" de Lísipo e "Apolo" de Léocares (in, http://www.comocubriruncuerpo.org/category/proporciones-del-cuerpo-humano-1-da-vinci-y-

vitruvio-los-canones/)

Como se pode observar na figura 4, existem três cânones para determinar as proporções da figura humana: Um cânone de sete cabeças para a figura normal, um cânone de sete cabeças e meia para a figura ideal e um cânone de oito cabeças e meia para a figura heróica. (Parramón, 1973)

Como refere Jack Faragasso (1998), os artistas em busca de um ideal de perfeição, diferiam nas suas interpretações sobre qual o cânone de proporção ideal. Procuravam expressar esse ideal nas suas obras de arte, interpretando-o à sua maneira em vez de simplesmente copiarem as coisas tal como elas apareciam aos seus sentidos. Para Burne Hogart (2003), os artistas Gregos definiram o conceito de cânone perfeito de proporção, com base na racionalidade

87 geométrica, como um ideal supremo e universal, de verdade absoluta. Este ideal de proporção, segundo Hogart (2003:69), é igualmente concebidos para a figura humana e para a arquitetura, “a pureza e a perfeição de um é consistente com a ordem e a harmonia do outro”.

A discussão sobre qual era afinal o Cânone a adotar, foi sofrendo variadas interpretações pelos mais variados artistas, dos quais podemos dar como exemplo e citando José Maria Parramon (1973:8), “Sete e meia! - dizia Miguel Ângelo”, com o seu famoso “David” “oito ! – afirmava Leonardo da Vinci”, “oito e meia ! – interpunha de novo Miguel Ângelo (...) nos desenhos da Albertina”(...) “nove !! – afirmava Boticelli”, com o seu “São Sebastião” e “Onze ! – parecia gritar, anos mais tarde, El Greco”, nas suas representações de figuras alongadas.

No século XV, segundo Faragasso (1998), uma das muitas razões para o início do renascimento em Itália foi o revelar das estátuas gregas, e um reacender das suas antigas filosofias, ideais e teorias. Assim, como afirma Simblet (2004), com o Renascimento da arte de tradição Helénica, e inspirados nos seus conhecimentos, os artistas do Renascimento italiano, iniciaram uma procura de definição de ideais de proporção para o corpo humano, Leonardo da Vinci desenhou o homem dentro de um círculo e um quadrado, enquanto que Dürer levou mais longe a sua investigação, procurando a perfeição numa medição infinitesimal do corpo, o que o levou a escrever quatro volumes, nos quais os explica através de ilustrações. Para Hogarth (2003:69), “Da Vinci e Dürer procuraram redefinir os cânones Gregos à luz dos novos conhecimentos”.

O arquiteto romano Marcus Vitrúvio, que viveu no século I a.c., deixou como legado um compêndio, que se revelou uma fonte de inspiração para artistas como Leonardo da Vinci e Albrecht Dürer. De entre outros estudos nele existentes, Vitrúvio apresenta textos que descrevem a relação das proporções do corpo humano com as formas geométricas simples do quadrado e da circunferência. (Modesto, Alves e Ferrand, 2006)

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O famoso desenho do “Homem de Vitrúvio” (Fig.13), de Leonardo da Vinci, é uma interpretação por ele feita, dos textos de Vitrúvio. Aqui pode ver-se a dupla inscrição do corpo humano no quadrado e no círculo. Ao observarmos o quadrado podemos perceber que a envergadura é igual à altura e que observando o círculo, este é formado pela elevação dos braços à altura da cabeça. Também Albrecht Dürer faz uma interpretação idêntica à de Leonardo da Vinci, dos textos de Vitrúvio, definindo a harmonia do corpo pela sua inscrição no quadrado e no círculo (Fig. 5). (Modesto, Alves e Ferrand, 2006)

Figura 13 – Comparação entre os esquemas canónicos de Leonrdo da Vinci (a preto) e Albrecht Dürer (a encarnado) a partir do modelo de Marcus Vitrúvio

(in, Ramos e Porfírio, 2006:90)

Albrecht Dürer foi provavelmente o pioneiro da antropometria, através dos seus estudos, nos quais “tentou categorizar a diversidade de tipos físicos humanos de acordo com uma observação sistemática e medição de um largo número de pessoas” (Santos e Fujão, 2003:2 e 3).

Os estudos das proporções humanas de Albrecht Dürer foram de uma tal complexidade e exatidão que acabaram por ser um fim em si mesmas, ultrapassando mesmo os limites da utilidade artística. Após tantos estudos foi o próprio Dürer a abandonar a ideia de uma proporção ideal ou de uma beleza absoluta, dado que “muitas formas de beleza estão condicionadas pela diversidade da criação, vocação e disposição natural”. (Isabel Ritto, 2012:103 e 107)

89 “O objetivo da teoria das proporções era providenciar-lhe não um único cânone, mas sim estudos de especímenes e métodos que lhe permitissem criar, dentro dos limites mais amplos da natureza humana e tendo como base a pura medição, todos os tipos possíveis de figuras”. (Ritto, 2012:103)

A proporção dá-nos um meio simples para fazer uma estimativa do que está certo ou errado, pelo menos para a maioria das pessoas de uma determinada cultura num determinado tempo. (Faragasso,1998)