2. Gêneros textuais/discursivos
2.6. Os gêneros consoante Bordet e outros estudiosos
Apresentamos, neste momento, as considerações de alguns estudiosos sobre a
temática dos gêneros. Começamos pelos pressupostos de Bordet (2011).
Consoante Bordet (2011, p. 18),
“o gênero é uma forma de comunicação
adaptada a um contexto e uma intenção não é suficiente para definir o que torna eficaz a
comunicação na forma adotada, ou seja, no gênero adotado”. A autora ainda afirma que
redigir um texto que se inscreve em um gênero dado e se torna identificável como tal
supõe que as normas que definem os pontos comuns dos textos pertencentes ao mesmo
gênero foram identificadas.
Bordet (2011, p. 19) declara que essas normas “não são prescritas por uma
autoridade superior, mas identificadas por regularidades linguísticas e discursivas,
respondendo aos objetivos de comunicação do gênero”. Além disso, o texto constrói o
gênero ao mesmo tempo em que nele se inscreve, propondo uma nova atualização.
Assim, cada nova ocorrência de realização do gênero é suscetível de fazer nele
desenvolver traços descritivos. Se as normas são fundadas sobre regularidades
(estruturas) identificáveis tem-se, portanto, relação com normas em constante evolução,
o que as torna difíceis de apreender.
Sobre essa instabilidade, Beacco (2004, p. 6) escreve:
Essa constatação da instabilidade, potencial e relativa dos textos, consideradas como entrando em um mesmo gênero discursivo, em relação ao modelo o qual eles procedem, confirma o estatuto de apresentação social partilhada da noção de gênero: esta atua como uma norma de comportamento verbal e não como uma norma linguística.14
Os objetivos de comunicação do gênero ligados a um contexto institucional
evoluem ao mesmo tempo em que esse contexto é atravessado por correntes científicas,
sociológicas, históricas e políticas, de acordo com Bordet (2011, p. 19). Ela também
considera que a constante modificação dos circuitos de comunicação e das modalidades
de reconhecimento de valor do pesquisador só pode influenciar sobre as “normas
implícitas de gênero que se aplicam às diferentes realizações do discurso científico”.
Bordet acrescenta que “se conformar com o gênero consiste, portanto, adaptar-se
a uma norma em constante evolução produzindo uma forma suscetível de evoluir com
14
Cette constatation de l’instabilité, potentielle et relative des textes, considérés comme entrant dans un
même genre discursif, par rapport au modèle dont ils procèdent, confirme le statut de présentation sociale partagée de la notion de genre : celle-ci agit comme une norme de comportement verbal et non comme une norme linguistique.
33
cada uma de suas realizações”. Desse modo, o que importa é definir a margem de
evolução determinada pela compatibilidade com os objetivos do gênero, objetivos que
serão avaliados em função de uma análise do contexto institucional em um dado
instante.
Bordet (2011, p. 53) afirma que foi desde a publicação, no início dos anos 90,
dos trabalhos de John Swales, um grande especialista das questões do ensino do inglês
especializado para locutores não nativos, que ficou difícil dissociar a questão do gênero
e a da comunidade de discurso. Swales (1990) afirma que “só se pode definir o gênero
do discurso passando pela definição e compreensão da comunidade que o gera, com
objetivos específicos, correspondendo à razão de ser dessa comunidade”.
Assim, Bordet declara que é preciso que haja intenção de comunicação e que ela
seja reconhecida e partilhada pela comunidade que se encontra no momento de
produção de um discurso. Sobre a questão da norma, substitui-se, portanto, a do
reconhecimento ligado ao respeito de um código implícito partilhado por uma dada
comunidade. Essa concepção é partilhada e desenvolvida pela escola francesa de análise
do discurso, como atesta Sophie Moirand, para quem o gênero é:
Uma representação sócio cognitiva interiorizada que se tem da composição do desdobramento de uma classe de unidades discursivas, as quais se expuseram na vida quotidiana, na vida profissional e nos diferentes mundos que se atravessou, uma espécie de chefe permitindo a cada um construir, planificar e interpretar as atividades verbais ou não verbais no interior de uma situação de comunicação, de um lugar, de uma comunidade linguageira, de um mundo social, de uma sociedade. (2003 apud BORDET 2011, p. 54).15
François Rastier (2005, p. 7) aponta o papel fundamental do gênero, que permite
passar da generalidade da língua à particularidade de sua instanciação no texto:
Os níveis de gêneros, campos genéricos e discursos são níveis estratégicos que permitem passar da generalidade da língua às particularidades dos textos, pois as relações semânticas entre textos se estabelecem preferencialmente entre textos do mesmo gênero, do mesmo campo genérico e do mesmo discurso.16
15
Une représentation socio-cognitive intériorisée que l’on a de la composition du déroulement d’une classe d’unités discursives, auxquelles on a été exposé dans la vie quotidienne, la vie professionelle et les différents mondes que l’on a traversés, une sorte de patron permettant à chacun de construire, de planifier et d’interpréter les activités verbales ou non verbales à l’intérieur d’une situation de communication, d’un lieu, d’une communauté langagière, d’un monde social, d’une société.
16
Les niveaux des genres, champs génériques et discours sont bien les niveaux stratégiques qui permettent de passer de la généralité de la langue aux particularités des textes, car les relations sémantiques entre textes s’établissent préférentiellement entre textes du même genre, du même champ générique et du même discours.