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SITUAÇÕES E CONTEXTOS

3.3. Alguns contextos da pesquisa

3.3.3. Os horários coletivos

Os professores se alternam em seus vários turnos e turmas para o exercício de sua docência e outras atividades que compõem a sua atividade (para muitos, essa alternância significa estar presente durante o dia em mais de uma escola). Entrementes, eles também estão em formação. Além destas circunstâncias, há os horários e espaços de discussão coletiva, horários oficialmente constituídos e previstos no calendário institucional, que têm por objetivo a caracterização da formação do professor, ainda que utilizado de forma pragmática e, muitas vezes, conduzido única e exclusivamente por discussões e preparo de atividades práticas. Na rede municipal, estes horários coletivos estão organizados conforme as seguintes jornadas25:

Jornada Básica (JB): 18 horas-aula e 2 horas-atividade semanais (uma na escola, a outra em local escolhido pelo professor). Total de 120 horas-aula mensais.

Jornada Especial Ampliada (JEA): 25 horas-aula e 5 horas-atividade semanais (3 na escola e 2 em local de opção do professor). Total de 180 horas-aula mensais. Jornada Especial Integral (JEI): 25 horas-aula e 15 horas adicionais semanais (11 na escola e 4 em local de livre escolha do professor). Total de 240 horas-aula mensais. Destas 11 horas a serem cumpridas na escola, 8 são em atividades coletivas com outros professores e com a coordenação e as demais como horas- atividade.

É importante notar que esta jornada de trabalho, a JEI, é preferida pelos professores, uma vez que garante maiores vencimentos remuneratórios e uma maior carga horária para dedicação à atividade docente fora do âmbito da sala de aula. Na maior parte das vezes, os professores que não escolhem esta carga horária são por circunstâncias, tais como: não poder acumular com outra carga horária conforme disposto em Lei; outra escola em que complementa carga horária ou salário não compatibiliza horário; ou a sua categoria não permite essa composição (professores contratados pela CLT, por exemplo, não podem participar desta jornada).

Há ainda outras possibilidades para composição de jornada de trabalho:

JEX – Jornada Especial de Hora-Aula Excedente (corresponde às horas-aula

25 Estes dados foram obtidos no site do Sindicato dos Professores e Funcionários Municipais de São Paulo –

prestadas além das aulas de JB ou JEA).

TEX – Jornada Especial de Hora-trabalho Excedente (corresponde às horas prestadas além das aulas de JB ou JEA, para a realização de Projetos Pedagógicos).

Na escola em estudo, durante o ano de 2004, os professores que cumpriam horário de JEI organizavam-se em 3 grupos. Os grupos se reuniam de segunda a quinta-feira, ao longo de todo o ano letivo, durante duas horas-aula por dia. (As atividades desenvolvidas pelo Grupo 1 naquele ano, relacionadas a Tecnologias de Comunicação e Informação estão apresentadas no Capítulo 4). Os grupos de JEI, naquele ano letivo, eram compostos pelos professores segundo o quadro abaixo (acrescidos da coordenação pedagógica):

Quadro 1. Organização dos Grupos de JEI

Grupo Horário Professores participantes

Grupo 1 das 8h20min às10h 50min Um Professor de Inglês

Um Professor de Educação Física

Um Professor de Matemática (uma vez por semana, cumpria seu horário de JEI junto ao grupo 2)

Quatro Professoras de Ensino Fundamental I Uma Auxiliar de Direção

Uma Professora Readaptada Uma Professora de Português

Grupo 2 das 10h55min às 12h25min Uma Professora Orientadora de Informática Educativa – POIE

Uma Professora de História e de Geografia (uma vez por semana, cumpria seu horário de JEI junto ao grupo 1)

Uma Professora de Ciências Um Auxiliar de Direção Uma Professora de Artes Uma Professora de Português

Uma Orientadora de Sala de Leitura – OSL Uma Professora de História

Grupo 3 das 13h10min às 14h55min 4 Professoras de Ensino Fundamental I

(Livro de JEI da Unidade Escolar, 2004) Este horário de JEI é proposto para elaboração e desenvolvimento de um Projeto pelos diversos grupos. A coordenação pedagógica da escola, composta por duas Coordenadoras Pedagógicas, estabeleceu que os três grupos de JEI deveriam, naquele ano elaborar um projeto comum para toda a escola. O projeto, chamado de Projeto Especial de Ação (PEA), assim elaborado deveria estar em conformidade com o estabelecido no Projeto Político-Pedagógico

da Unidade Escolar e respeitar os preceitos estabelecidos pela Portaria 1.654, de 5 de março de 2004:

Os Projetos Especiais de Ação - PEAs são instrumentos de trabalho elaborados pelas Unidades Educacionais, que devem ser articulados com o Projeto Político Pedagógico, promovendo efetivamente a reflexão sobre o cotidiano vivido - que compreende a apropriação dos espaços públicos internos e externos, com o objetivo de transformação das práticas educativas, compreendendo ações de natureza pedagógica e/ou institucional.

Segundo esta Portaria, quem deve participar do PEA são os seguintes profissionais: Equipe Técnica - no horário de trabalho (coordenando ou delegando responsabilidades).

Docentes - Em JEI (inclusive readaptados, portadores de laudo com restrição/alteração de função) – nas horas-adicionais.

- Em JB/JEA (inclusive Auxiliar de Direção, readaptado ou com restrição/alteração de função, o eventual) – nas horas-atividade da jornada ou como TEX.

Obs.: Professores Readaptados ou Restrição/Alteração de Função, poderão participar, se não houver determinação em contrário. O Auxiliar de Direção e o eventual participarão apenas fora do seu horário de trabalho.

Com base nessas diretrizes, a equipe da Unidade Escolar em investigação, inicialmente elaborou um PEA que tinha como fulcro o desenvolvimento profissional dos professores, motivados que estavam desde a discussão sobre os planos e metas a serem estabelecidos (ou modificados) no PPP da escola, no início do ano, nas reuniões de Organização da Unidade Educacional (dias 27 a 30/1/2004). Os profissionais presentes naquele momento, equipe técnica e corpo docente, sentiram a necessidade de um plano que melhor conduzisse o seu processo de formação contínua na escola, enquanto espaço apropriado para aquisição, incorporação e desenvolvimento de alternativas para o enfrentamento das práticas ali desenvolvidas. A motivação ficou registrada na apresentação do PEA, cuja denominação do Projeto foi “Desenvolvimento profissional do professor”:

Esta temática foi eleita após discussão e avaliação das ações realizadas no [sobre o] ano letivo anterior (2003) e adequação aos pressupostos do Projeto Político Pedagógico da Escola. Desta maneira, o foco está centrado no desenvolvimento profissional dos professores, ou seja, na discussão sobre a sua formação e as condições de exercício de sua prática, o que promoverá reflexões acerca das atividades cotidianas com os alunos (PEA – 2004, versão inicial).

Os objetivos foram assim definidos:

a) Fazer do ambiente educativo um lugar para discussão e enriquecimento dos docentes e ao seu exercício de reflexão e crítica, a partir de um levantamento bibliográfico coletivo e das interações e depoimentos entre os profissionais envolvidos no projeto, enfatizando o espaço escolar como lugar próprio e privilegiado para a formação contínua dos educadores.

b) Usar Tecnologias de Informação e Comunicação, discutindo as possibilidades e limitações em seu uso, para promover o desenvolvimento profissional dos professores.

c) Integrar os projetos que serão desenvolvidos na U.E. (Tecnologias da UE e seu uso, Educação Sexual26, Educom, Letramento27, Mão na Massa28, Profa29,

Orçamento Participativo, Vamos Combinar e Proerd30) à discussão sobre uso de

Tecnologias de Informação e Comunicação no desenvolvimento profissional de professores. (PEA – 2004, versão inicial)

Como proposta de procedimentos metodológicos para o desenvolvimento das atividades, os professores determinaram que, em todos os grupos de JEI, às segundas-feiras haveria “Capacitação dos professores para o uso da informática em sua prática docente, no Laboratório de Informática Educativa”. O grupo 1, ainda definiu que às terças-feiras, os professores deveriam “a partir de leituras ou vídeos, [fazer] discussões sobre os recursos e aparelhos de Tecnologias de Informação e Comunicação presentes na Unidade Escolar, suas possibilidades de uso pedagógico e suas limitações”.

Alguns dos projetos citados no item (c) dos objetivos eram em tese envolvidos mais diretamente pelo uso de Tecnologias de Comunicação e Informação, quais sejam: “Tecnologias da U.E e seu uso” e “Educom”. O primeiro, Tecnologias da Unidade Escolar e seu uso, teve origem em conversas entre alguns professores que tiveram a idéia de propor neste projeto um estudo que se iniciaria pelo levantamento de todos os recursos tecnológicos disponíveis na Unidade Escolar, desde fita-cassete de áudio e vídeo até os equipamentos de informática, uma vez que muitos professores declaravam não ter conhecimento desses recursos todos disponíveis. Assim, segundo o projeto, em um primeiro momento seria feito este levantamento, depois, segundo o interesse e necessidades definidas pelos grupos coletivos, um levantamento teórico para incrementação dos estudos, seguido de discussões sobre alternativas de uso de tais recursos com os alunos.

O Educom.radio é um projeto originado fora da Unidade Escolar, nascido de uma parceria entre a Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura de São Paulo e o NCE -

26 Educação sexual: Projeto a ser desenvolvido principalmente pelas professoras de Ciências.

27 Letramento e alfabetização: proposta em vigor na Rede Municipal para tratar dessa temática em todas as áreas

do conhecimento.

28 O Projeto ABC da Educação Científica – Mão na Massa é “voltado aos anos iniciais do Ensino Fundamental,

apresenta uma proposta metodológica sócio-construtivista, que por meio do ensino das ciências naturais, fundamentada na ação, na problematização, na investigação, na experimentação, na construção coletiva e não na memorização de enunciados cristalizados, busca articular todas as áreas do conhecimento numa perspectiva interdisciplinar” (http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/educacao/projetos/mao_na_massa/0001, acessado em 27 de dezembro de 2005).

29 O PROFA – Programa de Formação de Professores Alfabetizadores – é fruto de uma parceria com o

Ministério da Educação com vistas à formação do professor no que tange à sua aproximação ao conhecimento didático de alfabetização (http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/educacao/formacao/2004/0001).

30 “O Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD) é uma iniciativa da Polícia

Militar de prevenção para crianças da pré-escola até o colegial; os pais também recebem orientações em reuniões e palestras, representando um esforço cooperativo entre as Escolas, Pais e Polícia Militar”. (Disponível em Polícia Militar do Estado de São Paulo, http://www.polmil.sp.gov.br/unidades/damco/ /frameset2.asp, acessado em 8/11/2005).

Núcleo de Comunicação e Educação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), que tem como meta a construção de um ambiente favorável às manifestações culturais das comunidades do entorno das escolas, com intenção de lidar com a linguagem radiofônica, envolvendo professores, alunos e membros da comunidade escolar. O projeto incluía a orientação de alunos e professores do Ensino Fundamental para o uso de práticas de “educomunicação” através do uso do rádio31.

Os demais projetos a serem integrados à discussão sobre o uso de tecnologias, conforme previsto nos objetivos, não serão aqui detalhados pois fogem à delimitação desta pesquisa, por isto são feitas referências somente em notas de rodapé.

Este Projeto Especial de Ação foi encaminhado à Coordenação da Escola. Na semana seguinte, as Coordenadoras devolveram o PEA com algumas anotações feitas a lápis pela Supervisão Escolar (da Coordenadoria de Educação), através das quais denotavam que o PEA não estava de acordo com a Portaria 1.654, de 5/3/2004, uma vez que “os alunos não aparecem no projeto”, segundo anotaram, justificando que o texto enviado não condiz com nenhuma das alíneas do segundo Artigo desta Portaria:

Artigo 2º - Configuram-se modalidades de PEA as seguintes ações curriculares sistematizadas :

I - Formação Permanente da Comunidade Educativa, pautada nos seguintes eixos: a) aprofundamento da visão de currículo como construção sócio-cultural e histórica; b) diversidade cultural, etno-racial, de gênero e de sexualidade;

c) cultura da infância, do adolescente, do jovem e do adulto; d) leitura de mundo/ alfabetização/ letramento;

e) organização da escola em ciclos e a reestruturação dos tempos e espaços das Unidades educacionais;

f) paz e justiça social: direitos humanos, ética e cidadania; g) educação para o meio-ambiente;

h) avaliação processual.

No dia 10 de maio de 2004, os professores fizeram o seguinte registro no Livro de JEI, livro oficial de registro dos acontecimentos das reuniões coletivas:

Discussão do PEA e alteração / reformulação do documento (pois faltou clareza, segundo a supervisora, quanto ao papel do aluno e do professor...).(Livro de JEI, 2004. p. 61v)

Mesmo achando-se contrariados pela não aceitação do PEA que foi elaborado, os professores, puseram-se a fazer as adequações, donde surgiu o definitivo, com a denominação

“Desenvolvimento profissional dos professores, visando à melhoria do processo pedagógico”, cujas principais alterações foram feitas na sua justificativa, nos objetivos (foram acrescentados também os “resultados esperados”), nos procedimentos metodológicos e nas atividades a serem desenvolvidas:

Justificativa:

Levando em conta que os alunos da U.E. necessitam de melhoria na qualidade da leitura de mundo, nas suas diversas linguagens e formas de comunicação, bem como na apropriação de códigos diversos e em seus processos de transformação, para a utilização em sua vida social, política e profissional, estaremos formalizando discussões próprias para a formação dos professores de forma sistematizada, planejada através dos projetos veiculados e articulados na U.E.

Estas discussões serão fundamentadas no conhecimento trazido pelo aluno e de diagnósticos contínuos, levando os professores à reflexão sobre sua prática, gerando novas ações à luz do referencial teórico adotado (sócio-construtivista), conforme a bibliografia em anexo e preparando os alunos para o exercício da cidadania. E, em conseqüência, que o aluno possa se apropriar do letramento como função social. Tudo isso colaborará para uma melhoria na qualidade da prática pedagógica, pois, com esse exercício de reflexão e busca constante de leituras e contatos com outras práticas, os professores estarão melhorando suas condições de trabalho (pensando-se no coletivo) e conseqüentemente a qualidade de aprendizagem dos educandos. (PPP da U.E. p. 153)

“Resultados esperados”:

Transformação do ambiente escolar em lugar próprio para a efetiva formação contínua dos professores e melhoria da aprendizagem dos alunos.

Melhorar a qualidade do ensino e conseqüentemente do letramento, visando a utilização do mesmo como função social.

Os projetos visam enriquecer a formação do professor a fim de que sua prática se aprimore e os objetivos do PPP da Escola sejam atingidos. (Ibid. p. 157)

Objetivos:

Utilizar diferentes fontes de informação, visando o letramento.

Fazer do ambiente educativo um lugar para discussão e enriquecimento dos docentes e ao seu exercício de reflexão e crítica.

Valorizar as ações coletivas que repercutem na melhoria das condições de ensino.

Compreender as diferentes tecnologias visando a sua aplicação, através (sic) de novos recursos, em sala de aula a fim de garantir a inclusão do aluno no campo tecnológico e seu aprendizado com outros instrumentos.

Possibilitar a capacitação dos professores para que possam elaborar atividades que atendam as necessidades dos alunos em todos os componentes curriculares. Integrar os projetos que serão desenvolvidos na U.E. (Educação sexual, Educom, Ler e escrever em todas as áreas do conhecimento, Mão na massa, PROFA). (Ibid. p. 156-157)

Essa versão do PEA teve parecer favorável da Supervisão de Ensino no dia 15 de março de 2004, a partir de quando passou a fazer parte das atividades dos professores. Desta

maneira, o PEA teria uma duração total de 294 horas-aula, com encerramento no dia 22 de dezembro de 2004.

Nesse novo Projeto, foram suprimidos os projetos “Tecnologias da U.E. e seu uso”, “Orçamento Participativo”, “Vamos Combinar” e “Proerd”.

Segundo as anotações de campo feitas durante a coleta de dados, o Projeto Educom.radio funcionou ao longo do ano da seguinte maneira: alguns professores da Unidade Escolar participavam aos sábados de reuniões envolvendo alunos, pais de alunos e os orientadores do Projeto, da ECA-USP e da própria Prefeitura. Tais encontros ocorriam em uma Unidade Escolar e envolviam várias escolas. A escola ora em estudo não recebeu o equipamento prometido e, usando o que possuía, ou seja, um reprodutor de CD, um microfone e uma caixa amplificadora de volume, durante os horários dos recreios, os alunos envolvidos davam alguns anúncios gerais sobre acontecimentos da escola e tocavam músicas escolhidas por eles mesmos. As discussões nos horários coletivos sobre este Projeto eram limitadas ao barulho que isto causava e sobre algumas alternativas para orientar os alunos à escolha das músicas a serem reproduzidas.