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CAPÍTULO II – PARTE PRÁTICA

ENQUADRAMENTO TEÓRICO

3. Pontes e cruzamentos do VIH/SIDA e dependência de substâncias

3.5. Modelos de compreensão dos comportamentos de saúde relacionados com o VIH/SIDA

3.5.2. Os modelos de compreensão específicos para o VIH/SIDA

Os comportamentos de risco devem ser compreendidos dentro do contexto de outras preocupações com a saúde (como a ansiedade ou o consumo de substâncias, por exemplo), dos fatores específicos das populações, e de outros fatores cognitivos (como a intenção de praticar sexo seguro). Nesse sentido, as teorias do comportamento de risco para o VIH/SIDA devem ser responsivas aos contextos ambientais, desenvolvimentais, sociais e interpessoais em que as pessoas vivem (Traube, Holloway, & Smith, 2011).

3.5.2.1. Modelo de Redução de Risco da Sida (ARRM)

Proposto por Catania, Kegeles e Coates (1990) é um modelo de mudança de comportamentos especifico para o VIH/SIDA (Gillis, Meyer-Bahlburg, Exner, & Ehrhardt, 1998). Integra componentes do Modelo de Crenças na Saúde, da Teoria da Ação Fundamentada, da Teoria da Aprendizagem Social e do Modelo de Motivação para a Mudança, e tenta descrever o processo através do qual os indivíduos mudam os seus comportamentos, enfatizando o compromisso pessoal na mudança de comportamentos sexuais de risco para o VIH/SIDA. Baseia-se na premissa de que para evitar a doença, as pessoas devem perceber que seu comportamento sexual os coloca em risco de infeção por VIH (rotulagem); fazer um compromisso de mudança de comportamento (compromisso), e tomar medidas para mudar (“enactment”) o seu comportamento sexual, evitando, assim, a infeção pelo VIH/SIDA (Gillis et al., 1998; Bakker, Buunk, Siero, & Van Den Eijnden, 1997).

O ARRM é um modelo de estágios, o que implica a progressão das pessoas através de diferentes níveis em relação à mudança de comportamento. Nesse sentido, à semelhança dos modelos de multi-estádios o ARRM constrói o processo de mudança de comportamento em três fases que denomina de estágios:

1. Reconhecer e rotular como problemático o comportamento de alto risco em relação à transmissão do VIH/SIDA;

Este estágio sustenta-se na noção de suscetibilidade que assume a perceção do risco como uma condição essencial para a mudança de comportamento; na noção de gravidade percebida da doença, já bem estabelecida entre a população geral, que percebe o VIH/SIDA como uma doença grave que leva à morte; e na noção

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da vulnerabilidade pessoal que reconhece ser o conceito chave deste modelo. 2. Assumir o compromisso de mudar o comportamento de alto risco;

Este estádio introduz as noções de tomada de decisão e compromisso de mudança de comportamento, que estão relacionados com a ponderação de custo- benefício do uso de estratégias saudáveis (como o uso de preservativo) e com a confiança na eficácia pessoal.

3. Desenvolver e pôr em prática as estratégias direcionadas à redução de atividades de alto risco.

O último estádio refere-se ao planeamento da ação que visa um novo comportamento. Para isso, é necessária a procura de soluções para a ação que visam não só a tomada de decisão individual, mas também a negociação com outros pois quando falamos de relações sexuais inseguras estamos, sempre, perante mais do que uma pessoa.

3.5.2.2. Modelo de Informação-Motivação e Aptidões Comportamentais

Ao longo da epidemia da SIDA, uma série de intervenções preventivas do VIH têm sido implementadas numa variedade de contextos. Contudo, o “fosso” entre a produção científica e a prática continua profundo, ou seja, nem os teóricos se deslocam ao terreno para testar as suas teorias, nem os técnicos do terreno incorporam as teorias de mudança nos planos de intervenção (Green, Ottoson, García, & Hiatt, 2009; Fisher, Fisher, & Shuper, 2009). Fisher, Fisher e Shuper (2009) exploram bem esta questão do desfasamento dos programas de intervenção das teorias de comportamentos de saúde, referindo a falta de avaliação dos programas, bem como os benefícios perdidos pelos programas de intervenção que não usam a teoria para guiarem a sua estratégia.

De forma a facilitar a integração de modelos teóricos nos programas de intervenção, Fisher e Fisher (1992), apresentam um modelo de compreensão e promoção dos comportamentos preventivos para o VIH/SIDA, o Modelo de Informação-Motivação e Aptidões Comportamentais. Esta abordagem tem servido de base para a compreensão dos comportamentos de risco para o VIH/SIDA e postula que a informação, a motivação e as aptidões comportamentais são determinantes fundamentais do comportamento preventivo da infeção. Desta forma, a informação e a motivação para a prevenção trabalham primariamente com as competências que irão influenciar o comportamento preventivo para o VIH/SIDA (figura 10) (Fisher et al.,

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2009). Ou seja, uma pessoa bem informada sobre estratégias de prevenção do VIH/SIDA, motivada para agir e com competências e confiança para iniciar a ação, tem maior probabilidade de iniciar ou manter comportamentos saudáveis que os previnam de contrair a infeção do VIH/SIDA.

3.5.2.3. Modelo das Sexual webs

Os modelos específicos para o VIH/SIDA vão beber às teorias da cognição social e pretendem fazer uma abordagem mais integradora dos comportamentos de risco tentando incluir componentes individuais e componentes de interação. Contudo, quando falamos de comportamentos sexuais de risco, falamos obrigatoriamente de relações sexuais e, mesmo estes modelos específicos falham na abordagem de questões tão pertinentes e emergentes na compreensão dos comportamentos relacionados com o sexo, como as novas tecnologias (pornografia pela internet) e os atributos sexuais (motivação sexual, tipos de relacionamento sexual, etc.). É com estes argumentos que Timiun (2011) propõe um modelo explicativo do comportamento sexual de risco. O modelo é conceptualizado com base em fatores socioculturais e contextuais que denomina de atributos sexuais e de redes sexuais. Os atributos sexuais contemplam a capacidade sexual, que se refere a todos os fatores demográficos, familiares, socioeconómicos, comunitários e globais que influenciam a capacidade de uma pessoa negociar ou executar uma relação sexual, a motivação sexual, que se refere aos benefícios esperados que encorajam as pessoas a ter relações sexuais (as formas de como as pessoas pretendem ter sexo e obter os benefícios esperados com ele), e a

Figura 10: Modelo de Informação-Motivação e Aptidões Comportamentais (Fisher et al., 2009).

Informação sobre prevenção do VIH Motivação para a prevenção do VIH Competências comportamentais de prevenção do VIH Comportamento preventivo do VIH

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performance sexual, que diz respeito às coisas que as pessoas fazem para praticarem uma relação sexual ou o que fazem durante os encontros sexuais. As redes sexuais, englobam diferentes tipos de relacionamento sexual ou as redes sexuais em si (a aceitação e as crenças sobre o sexo, características e atividades sexuais entre parceiros sexuais).

Terminada esta síntese de alguns dos modelos mais comuns na compreensão geral e específica da relação entre os comportamentos e o VIH/SIDA, dedicaremos a nossa atenção ao único modelo que associa risco de infeção pelo VIH/SIDA e o consumo de substâncias.

3.5.3. Um modelo específico de exposição dos consumidores de substâncias ao risco