• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II – PARTE PRÁTICA

ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1. Sida – Uma síndrome na idade adulta

1.3. Epidemiologia do VIH/SIDA

1.4.3. Terapêutica farmacológica – Antirretrovirais

A sinergia entre sectores de atuação como a investigação, governos, indústria, organizações não-governamentais, clínicos e pacientes impulsionadas pela grande epidemia da SIDA, permitiu que a terapêutica antirretroviral evoluísse rápida e eficazmente. Contudo, só seis anos após a descoberta da SIDA é que surgiu o primeiro medicamento para o tratamento da doença. Durante este período que durou até 1991 a prescrição era monoterapêutica com AZT (Humanitarian news and analysis service of the UN Office for the Coordination of Humanitarian Affairs [IRIN] , 2005). Os estudos continuaram e apesar do AZT ser na altura o único medicamento que demonstrava alguma eficácia no “ataque “ direto ao vírus do VIH, os efeitos secundários do seu consumo eram menos animadores (IRIN, 2005).

A história da terapêutica antirretroviral inicia-se com alguns percalços. Segundo Harrington (2012) no inicio dos anos 90 a pesquisa para o tratamento era “como um ciclo vicioso causado por uma combinação de drogas más, ensaios clínicos mal concebidos e medidas ou marcadores da atividade das drogas anti-VIH

8 Até 2013 estas unidades de tratamento dependiam do IDT,IP. (Instituto da Droga e da

30 anos de pontes e cruzamentos entre álcool, drogas ilícitas e comportamentos de risco na era do VIH/SIDA

_____________________________________________________________________________________

41

inadequados”(p.2). A seguir ao AZT, ainda hoje usado, a urgência em dar respostas para o tratamento do VIH/SIDA lançou no mercado drogas em que os seus benefícios eram nulos ou muito limitados (como é o caso do ddC - zalcitabina) (Harrington, 2012). Em 1992, surgem, então, essas as novas drogas para o tratamento da infeção (a Didanosina (ddI) e a Zalcitabina (ddc). Estas, faziam parte do grupo dos nucleótidos inibidores da transcriptase reversa (NITR), na altura o único grupo de fármacos disponível e que se acreditava constituir uma mais valia à monoterapia. No entanto, ao fim de algum tempo deixava de ser eficaz devido ao surgimento de resistência do vírus ao medicamento (IRIN, 2005).

Em 1996 surgiu o primeiro fármaco de um novo grupo de medicamentos, o viramune (NVP), que enfatizava esta nova classe de antirretrovirais – Não- Nucleósidos Inibidores da Transcriptase (NNITR). Estes fármacos paravam a duplicação de ADN viral por desativação da enzima transcriptase reversa (IRIN, 2005).

O desenvolvimento deste novo grupo de medicamentos mostrou-se eficaz no combate ao vírus que se tinha tornado resistente aos NITR’s, e rapidamente se percebeu que a terapêutica combinada entre dois grupos diferentes era muito mais eficaz no combate a um vírus em constante mutação (IRIN, 2005).

Logo a seguir à disponibilização dos NNITR’s (cerca de 1996/7), surge o terceiro grupo de fármacos, os Inibidores da Protéase, que atuavam diretamente na protéase, a enzima fundamental para a replicação do VIH dentro da célula (IRIN, 2005).

Foi a partir destes três grandes grupos de fármacos que surgiu a terapêutica antiretrovírica de alta eficácia (HAART). Atualmente existe mais de uma dezena de fármacos disponíveis para o tratamento do VIH, que podem ser divididos em vários grupos descritos a seguir.

O primeiro grupo refere-se aos fármacos inibidores da entrada, destacando-se três tipos de fármacos: os inibidores da ligação às células CD4, os inibidores da ligação aos coreceptores (maraviroc, vicriviroc, por exemplo) e os inibidores da fusão (como o enfirvitide - T20).

No segundo grupos de fármacos temos os antirretrovirais que atuam dentro da célula. Nestes grupos ainda distinguimos os Nucleosidios Inibidores da Transcriptase Reversa (NTRI’s), dos quais se destacam fármacos como a zidovudina (AZT), didanosina (ddl), abacavir (ABC), entre outros; os Não-Nucleosidios Inibidores da

30 anos de pontes e cruzamentos entre álcool, drogas ilícitas e comportamentos de risco na era do VIH/SIDA

_____________________________________________________________________________________

42

Transcriptase (NNTRI), como a Nevirapina (NVP) e Efavirenz (EFV); e por último os Inibidores da Protéase (IP’s), com fármacos como o Atazanavir (ATV) e Ritonavir (RTV), entre outros (De Clercq, 2010; De Clercq, 2001).

O terceiro grupo é composto pelos fármacos Inibidores da Integrase, como o Raltegravir e o Elvitegravir. O quarto, e último grupo refere-se aos fármacos inibidores da maturação, como o Bevirimat.

Atualmente existe uma vasta combinação farmacológica para o tratamento da infeção pelo VIH. O esquema terapêutico inicial tem sempre em conta fatores como a contagem de CD4, a carga viral e a presença de sintomas. No quadro 5 podemos ver as recomendações para o início da terapêutica antirretroviral de acordo com estes fatores.

Quadro 5

Recomendações Portuguesas para início da terapêutica antirretroviral.

Categoria clínica Contagem T-CD4+ Carga Viral* Recomendação Sintomático

(sinais clínicos maiores ou menores

relacionados com a infeção VIH) Qualquer valor Indiferente Tratar Assintomático < 200 / mm3 Indiferente Tratar Assintomático > 200 < 350/mm3 Qualquer valor Considerar

tratamento**

Assintomático > 350/mm3 >30000 (bDNA)] > 55.000 (PCR) Tratar Assintomático > 350/mm3 < 30000 (bDNA)

< 55.000 (PCR) tratamentoAdiar o *** Nota: *quando disponível **tendo em vista o fraco risco de desenvolvimento de IO, aconselha-se não iniciar o tratamento e aumentar a periodicidade de avaliação clínica e laboratorial. Ao optar pelo início do tratamento, deve-se levar em conta a motivação do paciente. *** Acompanhar a evolução clínica e laboratorial a intervalos mais curtos, monitorando a taxa de declínio das células T-CD4+. (DGS, 2004).

A disponibilização generalizada da terapêutica antirretroviral (ART) resultou no aumento da esperança e da qualidade de vida dos doentes infetados pelo VIH. No entanto, as exigências e as alterações a que a toma destes fármacos obriga, originam muitas vezes falhas terapêuticas. Dentro das dificuldades mais sentidas, encontram-se os efeitos secundários da medicação, os problemas decorrentes da sua alta toxicidade que culmina muitas vezes na falência de órgãos tão importantes como o fígado ou os rins (Genberg, Lee, Rogers, & Wilson, 2014; Trotta, et al., 2002).

Os efeitos secundários mais comuns da terapêutica antirretroviral são os gastrointestinais, como desconforto abdominal, perda apetite, diarreia, náuseas e

30 anos de pontes e cruzamentos entre álcool, drogas ilícitas e comportamentos de risco na era do VIH/SIDA

_____________________________________________________________________________________

43

vómitos e surgem geralmente no inicio da terapêutica. A toxicidade hepática, pancreática e renal é também um dos efeitos associados à toma destes medicamentos. Alguns fármacos (Efavirenze e o Abacavir) provocam alterações do Sistema Nervoso Central como tonturas, insónia, alterações do humor, confusão mental e ideação suicida nos primeiros dias e/ou semanas a seguir ao início do tratamento. Para além destes, efeitos como osteoporose, necrose avascular (principalmente da cabeça do fémur), acidose láctica e alterações hematológicas são também comuns e decorrentes da terapêutica ART (Schieferstein & Buhk, s/d).

Para além de todas estas complicações derivadas do tratamento farmacológico, fatores como o horário da toma da medicação e a quantidade de medicamentos que têm de tomar, surgem como obstáculos à adesão terapêutica dos doentes infetados pelo VIH. Neste sentido, trabalhar a adesão à terapêutica é um ponto de intervenção bastante pertinente na abordagem com pacientes infetados pelo VIH (Genberg, Lee, Rogers, & Wilson, 2014).