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Os passos das embaixadas de D Sebastião através dos seus oficiais

Da Corte portuguesa às Cortes europeias – as dinâmicas das embaixadas de D Sebastião

5.2. Os passos das embaixadas de D Sebastião através dos seus oficiais

Durante o reinado de D. Sebastião, as embaixadas permanentes foram reduzidas. As Cortes de 1562 assim o pediram – o capítulo 15 dos Povos requeria que os embaixadores «que manda aos Reynos Estrangeiros não estem perpétuos, e se venhão tanto, que acabarem suas Embaixadas, por encurtar despezas»730. Apenas na cúria romana se encontrava um embaixador português em total permanência oficial. Em Castela, as embaixadas portuguesas conheceram esse carácter até à saída do meirinho-mor, em 1576. Em França, também se mantinha uma embaixada, se bem que com algumas intermitências. Até 1569, era liderada por João Pereira Dantas. Só no ano seguinte iria para o seu lugar João Gomes da Silva, que em 1574 foi enviado para Roma e “substituído” por D. Nuno Manuel, encaminhado para França em embaixada de pêsames pela morte de Carlos IX731.

Em Inglaterra, a situação era semelhante. António Fogaça e, depois, Francisco Giraldes, partilharam a posição de embaixador no reino de Isabel I Tudor, com vista a assinar um acordo jurídico-comercial. Esta presença angustiava o papa, que criticou a política externa de D. Sebastião por manter contactos diplomáticos com o reino isabelino732.

729 Vide carta de D. Sebastião para Filipe II (Alcobaça, 19 de Agosto de 1569). Simancas, AGS, Estado,

Portugal, leg. 386, fl. 31. Esta matéria foi desenvolvida ao longo do primeiro capítulo da presente dissertação, relativo aos negócios dinásticos.

730 José Pereira Baião, Portugal Cuidadoso, e lastimado […], p. 35.

731 A decisão desta nomeação vem anunciada na carta de D. Juan de Borja a Filipe II (Lisboa, 11 de Julho

de 1574). Simancas, AGS, Estado, Portugal, leg. 392, fls. 14-18. Citada em Joaquim Veríssimo Serrão, Itinerários de El-Rei D. Sebastião[…], p. 327.

732 Vide carta de D. Henrique a Francisco Giraldes (Lisboa, 11 de Dezembro de 1578). Lisboa, BNP, Fundo

Geral de Manuscritos, cód. 887, fl. 11, parcialmente publicada em Idem, “Contribuição para o Epistolário do Cardeal-Rei[…]”, p. 137.

137 Quadro 7 – Relação entre embaixadores residentes e enviados de D. Sebastião

Residente Enviado Total

Número de Missões

5 20 25

Percentagem 20% 80% 100%

NOTA: Excluíram-se o Dr. António Pinto e Aquiles Estaço da contagem por não terem sido, efectivamente, enviados ou embaixadores.

Quadro 8 – Embaixadas Permanentes de D. Sebastião

Local Embaixador Anos

Castela D. Francisco Pereira [1558] – 1570

D. Duarte de Castelo Branco

1570 – 1576

Roma D. João Teles de

Meneses

1569 – 1573

João Gomes da Silva 1574 –

[1580] Inglaterra Francisco Giraldes* 1571-[1579]

NOTA: Assinaladas entre parêntesis rectos, as datas que ultrapassam o período em estudo.

As enviaturas encaixavam no género de embaixada de representação – mormente associada a cerimónias dinásticas. Uma ocasião especial, como um nascimento, um casamento ou um falecimento, motivavam uma embaixada desse carácter733.

As embaixadas de pêsames revelam uma importância singular. O impacto da morte é superior, excepto quando o nascimento é o primogénito sucessor doutro reino, o que se verifica pelo envio maioritário de embaixadas de pêsames em relação às de nascimentos. Quando falece um infante menor, ou nasce um segundo-filho dos monarcas, não é comum encontrarem-se enviaturas para essa congratulação especificamente. Recrutava-se, nessa circunstância o embaixador residente para comunicar o sentimento junto da Corte.

733 Alguns Estados mais pequenos serviam-se dos embaixadores residentes para estas missões

138

Gráfico 1 - Relação das embaixadas com ocasiões dinásticas (1568-1578)

Quadro 9 – Embaixadas de Negociação de D. Sebastião734

Local Enviado Ano(s) Negócio

Castela D. Álvaro de Castro 1570 Casamento de D. Sebastião com Margarida de Valois.

D. Fernão Martins de Mascarenhas

1571 Saída de D. Catarina de Áustria de Portugal.

D. Francisco de Portugal 1574 Casamento de D. Sebastião com Maximiliana da Baviera. Apoio militar de Filipe II.

Pêro de Alcáçova Carneiro

1576 Arranjar os detalhas para as Vistas de Guadalupe.

Luís da Silva 1576 Apoio militar de Filipe II.

França D. Pedro Henriques 1568? Represálias do corso francês.

João Gomes da Silva* 1571 – 1574 Casamento de D. Sebastião com Margarida de Valois

D. Nuno Manuel* 1574 – 1576 Represálias do corso francès.

Francisco Giraldes [1579] Nomeado em 1576, para continuar o trabalho de D. Nuno Manuel.

Inglaterra António Fogaça 1568 – 1571 Reembolso pelas presas do corso e pirataria. Arranjar o Tratado de paz e comércio.

Francisco Giraldes* 1571 – [1579]

Tratado de paz e comércio.

Países Baixos

Nuno Álvares Pereira 1577 Recrutamento de soldados.

Sebastião da Costa 1578 Embarque dos soldados.

734 Neste gráfico e na tabela foram integradas as Cortes às quais Portugal se encontrava mais próximo, tanto

geográfica como dinasticamente. São, de resto, os reinos em que se focou toda a incidência da dissertação. Incluem-se Castela e França. Excluem-se Inglaterra por Isabel I Tudor não ter casado nem tido filhos, bem como o Sacro-Império Romano Germânico, que muito embora fosse abundante nestes aspectos, as relações com Portugal estavam desligadas desde 1569, como se aponta no capítulo seguinte.

0 2 4 6 8 10 12

Nascimentos (33,3%) Casamentos (100%) Subidas ao trono (50%) Óbitos (70%)

Total Enviaturas

139 Quadro 10 - Embaixadas de representação de D. Sebastião

Enviado Ano Ocasião

D. Álvaro de Castro [1567] 1568

Manutenção da embaixada em Roma.

Francisco de Sá Prisão de Carlos Lourenço de Áustria

D. Luís de Lencastre Morte de Carlos Lourenço de Áustria. Morte de Isabel de Valois, rainha de Castela.

D. Duarte de Castelo Branco** 1570 Casamento de Filipe II de Castela e Ana de Áustria.

João Gomes da Silva** 1571 Casamento de Carlos IX e Isabel de Áustria.

Fernão da Silva 1571 Nascimento de Fernando de Áustria, a Castela.

João Teles de Meneses* 1572 Morte de Pio V, a Roma ao Cardinalato. Eleição de Gregório XIII para o pontificado.

D. Dinis de Lencastre 1572 Casamento de Henrique III de Navarra e Margarida de Valois e Nascimento

de Maria Isabel de França. (João Gomes da Silva, o

moço)

1573 Eleição de Henrique de Valois para o trono da Polónia.

D. Nuno Manuel* 1574 1575

Morte de Carlos IX de França.

Coroação de Henrique III no trono de França.

Casamento de Henrique III de França e Luísa de Lorena-Vandémout.

Cristóvão de Távora 1576 Morte de Maximiliano II, a Castela, à rainha Ana de Áustria.

João Gomes da Silva, o moço 1577 Morte de D. Isabel de Bragança e do Senhor D. Duarte, aos príncipes de

Parma, Alexandre Farnésio e D. Maria de Portugal.

Nota: os nomes assinalados com * evoluíram para embaixadas permanentes. Entre parêntesis destacam-se embaixadas não concluídas. ** Embaixada definida que aproveitou a deslocação do agente.

Cerca de 33,3% dos nascimentos nas casas reais cristãs receberam «os emboras» da Corte portuguesa por via de uma enviatura. Durante o reinado efectivo de D. Sebastião, nasceram quatro príncipes em Castela735 e a ultimogénita do imperador Maximiliano II736. Em França nasceu a única filha de Carlos IX e Isabel de Áustria – Maria Isabel de França (1572-1578), única geração nascida da casa real francesa entre as gémeas Joana e Vitória (1556), filhas de Henrique II de França e Catarina de Médicis, e o delfim Luís (depois Luís XIII de França), filho de Henrique IV de França e Maria de Médicis, em 1601.

Foi apenas com os primogénitos – Fernando de Castela (1571) e Maria Isabel de França (1572) – que os ditos reinos receberam embaixadores extraordinários portugueses

735 Filhos de Filipe II e de Ana de Áustria: Fernando (1571-1578), Carlos Lourenço (1573-1575), Diego

(1575-1583) e Filipe Hermenegildo, futuro Filipe III de Castela (1578-1621).

736 Vide carta de Maximiliano II a Filipe II (Viena, 6 de Novembro de 1568). Simancas, AGS, Estado,

140 para celebrarem a ocasião. Para o primeiro, Fernão da Silva foi destacado exclusivamente para o efeito737.

Note-se que, para o segundo caso, D. Dinis de Lencastre foi enviado em circunstâncias sui generis, não só para celebrar o massacre «em dia tão sinalado como foy o de S. Bartholomeu», como para que «no fim desta practica lhe dareis [à família real francesa] da minha parte os emboras pela filha»738.

Para os restantes infantes do ramo castelhano da casa de Áustria, D. Sebastião e D. Catarina serviram-se de D. Duarte de Castelo Branco para transmitir a Filipe II os parabéns e os pêsames consecutivos, em audiência, sem a exclusividade de uma enviatura739.

Pode se ter dado o caso de uma coincidência quando D. Sebastião enviou Fernão da Silva para Castela, em Maio de 1578740. O cortesão fora instruído para felicitar Filipe II pelo nascimento de mais um príncipe, Filipe Hermenegildo (futuro Filipe III de Castela, II de Portugal), nascido a 14 de Abril, tendo a notícia chegado ao embaixador castelhano uma semana depois741.

Metade dos óbitos registados receberam uma embaixada de pêsames portuguesa. Alguns casos foram notórios como a morte de Carlos Lourenço na prisão, em Julho de 1568. D. Luís de Lencastre, o embaixador proposto por D. Sebastião742, viajou para Madrid em Setembro743. Falecendo a rainha, Isabel de Valois, em Outubro, «lhe foy encarregado a visitar a ElRey [Filipe II] por aquelle motivo»744.

737 Vide carta de D. Sebastião a Filipe II, ou Carta Credencial de Fernão da Silva (Lisboa, 20 de Dezembro

de 1571). Simancas, AGS, Secretaria de Estado, legajo 389, fl. 9.

738 Vide instrução de D. Sebastião a D. Dinis de Lencastre, já citada.

739 Vide carta de D. Catarina de Áustria a D. Duarte de Castelo Branco (Xabregas, 24 de Julho de 1575).

Lisboa, BA, Embaixada e Governo de D. Duarte de Castelo Branco, cód. 49-X-1, fl. 221, encarregando o embaixador de fazer visitação ao rei católico em seu nome, dando os pêsames pela morte do infante Carlos Lourenço e pelo nascimento do infante Diego.

740 Vide carta de D. Juan de Silva a Gabriel de Zayas (Lisboa, 14 de Maio de 1578). Simancas, AGS, Estado,

Portugal, leg. 396, fl. 53, dando a notícia da nomeação do embaixador. Apesar disso, não se descarta que o monarca português se tenha aproveitado da situação para enviar o embaixador.

741 Vide carta de D. Juan de Silva a Gabriel de Zayas (Lisboa, 22 de Abril de 1578). Simancas, AGS, Estado,

Portugal, leg. 396, fl. 43, publicado em CODOIN, tomo XXXIX, p. 565.

742 Vide carta de D. Sebastião a Filipe II (carta credencial de D. Luís de Lencastre, Sintra, 10 de Agosto de

1568), publicada em Diogo Barbosa Machado, Memorias […], parte III, liv. I, cap. IV, pp. 45-46.

743 Idem, ibidem, p. 47. Foi uma enviatura bastante rápida. Carlos Lourenço morreu a 23 de Julho. D.

Sebastião recebe a notícia a 26, responde ao tio a 4 de Agosto com os pêsames, assumindo que enviava um embaixador para apresentar condolências. E, entretanto, a 10 de Agosto, fazia o mesmo, escrevendo a carta de crença, dizendo que D. Luís de Lencastre partiria em breve. O embaixador só partiria em 1 de Setembro. O maior tempo de espera deu-se nos 9 dias, possivelmente um tempo com vista à nomeação, em conselho, de um representante de D. Sebastião em Madrid. Cf. Joaquim Veríssimo Serrão, Itinerários de El-Rei D. Sebastião[…], pp. 63-64 e 68.

141 Em 1576, o rei português deu os sentimentos à então rainha de Castela, Ana de Áustria, filha do imperador Maximiliano II, pelo falecimento deste através de Cristóvão de Távora745. No ano seguinte, enviou João Gomes da Silva, o moço, aos príncipes de Parma pela morte de D. Isabel de Bragança e do senhor D. Duarte746.

Noutra embaixada, D. João Teles de Meneses entregou as condolências ao cardinalato pela morte de Pio V, vindo mais tarde a felicitar Gregório XIII pela sua eleição747. Também a enviatura de D. Nuno Manuel a França levava ordens para mostrar pêsames pela morte de Carlos IX e para cumprimentar o novo monarca francês e felicitá- lo pelo casamento748. Neste sentido, assistiu-se a uma maior proporcionalidade com as enviaturas.

Para quatro inícios de reinado, já foram referidas as abordagens de D. João Teles de Meneses (Gregório XIII, 1572) e D. Nuno Manuel (Henrique III, 1574). Entretanto, Henrique de Valois, duque de Anjou, fora eleito rei de Polónia em 1573. Conhecem-se alguns pormenores do percurso da embaixada que D. Sebastião lhe planeara enviar. Antes disso, convém salientar que o rei português requeria aos embaixadores que demonstrassem ao duque de Anjou, ainda na corte francesa, «o quaõ affeiçoado lhe sou, e fuy sempre por suas obras serem de quem elle he, nas quaes se tem bem visto com quão grande valor da sua muita christandade, prudencia, e esforço tem procedido nellas»749. É de notar que o rei português nutria uma admiração sincera pelo príncipe francês, e que sempre o demonstrou ao longo do seu reinado.

Planeou enviar Martim Correia da Silva que, por se sentir indisposto, não prosseguiu com o ofício em direcção à Polónia750. João Gomes da Silva, o moço, sobrinho do embaixador homónimo, foi o escolhido751. A delonga do seu envio culminou com a morte de Carlos IX e na ascensão de Henrique III à coroa francesa, daí que o embaixador o tenha encontrado «Ja em italia de volta pera frãça»752.

745 Vide a instrução a Cristóvão de Távora, já citada, presente no Apêndice documental, doc. nº 13. 746 Vide carta de D. Sebastião a João Gomes da Silva (Madrigalejo, 3 de Janeiro de 1577). Lisboa, BNP,

Fundo Geral de Manuscritos, cód. 887, fl. 156v.

747 Vide carta de D. Sebastião ao Cardeal Alexandrino (Lisboa, 29 de Maio de 1572), publicada em Corpo

Diplomático Portuguez […], tomo X, pp. 447-448

748 Vide a Instrução ao embaixador, já citada, presente no Apêndice documental, doc. nº 11. 749 Vide instrução de D. Sebastião a D. Dinis de Lencastre. Apêndice documental, doc. nº 9. 750 Vide instrução de D. Sebastião a D. Nuno Manuel. Apêndice documental, doc. nº 11.

751 Vide carta de D. Sebastião a João Gomes da Silva (Lisboa, 21 de Maio de 1574). Lisboa, BNP, Fundo

Geral de Manuscritos, cód. 887, fl. 150. Joaquim Veríssimo Serrão indicou-a como planeamento de uma embaixada ao «rei da Bolonha», confusão gerada por erro de leitura paleográfica. Cf. Os Itinerários de El- Rei D. Sebastião […], p. 332. A carta encontra-se transcrita no Apêndice documental, doc. nº 25.

142 Estranha-se que, em plena delineação de um plano para conquistar Larache, D. Sebastião não tenha interposto uma enviatura especial para felicitar Rodolfo de Áustria pela subida ao trono imperial, em 1576. Deste modo, captaria a atenção do novo imperador para o apoiar.

Quanto aos matrimónios, D. Duarte de Castelo Branco foi congratular Filipe II e Ana de Áustria, em 1570; João Gomes da Silva deu os parabéns a Carlos IX e Isabel de Áustria no ano seguinte. D. Dinis de Lencastre felicitou Henrique III de Navarra e Margarida de Valois em 1572 e em 1575 D. Nuno Manuel apresentou os cumprimentos de D. Sebastião a Henrique III de França pelo seu casamento com Luísa de Lorena- Vandémout (1553-1601). Das quatro enviaturas, três acabariam por se tornar embaixadas permanentes (as de 1570, 1571 e 1575), pedidos especiais feitos por D. Sebastião, enquanto aguardavam a chegada do novo agente.