ABANDONADA
Bem depressa sum iu-se a vaporosa Nuvem de am ores, de ilusões tão bela;
O brilho se pagou daquela estrela Que a vida lhe tornava venturosa!
Som bras que passam , som bras cor-de-rosa -- Todas se foram num festivo bando,
Fugazes sonhos, gárrulos voando -- Resta som ente um ’alm a tristurosa.
Coitada! o gozo lhe fugiu correndo, Hoj e ela habita a erm a soledade, Em que vive e em que aos poucos vai m orrendo!
Seu rosto triste, seu olhar m agoado, Fazem lem brar em noute de saudade
A luz m ortiça d’um olhar nublado.
CETICISMO
Desci um dia ao tenebroso abism o, Onde a Dúvida ergueu altar profano;
Cansado de lutar no m undo insano Fraco que sou volvi ao ceicism o.
Da Igrej a -- a Grande Mãe -- o exorcism o Terrível m e feriu, e então sereno
De j oelhos aos pés do Nazareno Baixo rezei em fundo m isticism o:
-- Oh! Deus, eu creio em ti, m as m e perdoa!
Se esta dúvida cruel qual m e m agoa Me torna ínfim o, desgraçado réu.
Ah, entre o m edo que o m eu ser aterra, Não sei se viva pra m orrer na terra, Não sei se m orra p’ra viver no céu!
A MÁSCARA
Eu sei que há m uito pranto na existência, Dores que ferem corações de pedra, E onde a vida borbulha e o sangue m edra,
Aí existe a m água em sua essência.
No delírio, porém , da febre ardente Da ventura fugaz e transitória O peito rom pe a capa torm entória
Para sorrindo palpitar contente.
Assim a turba inconsciente passa, Muitos que esgotam do prazer a taça
Sentem no peito a dor indefinida.
E entre a m ágoa que a m ásc’ra eterna apouca A Hum anidade ri-se e ri-se louca
No carnaval intérm ino da vida.
O COVEIRO
Um a tarde de abril suave e pura Visitava eu som ente ao derradeiro
Lar; tinha ido ver a sepultura
De um ente caro, am igo verdadeiro.
Lá encontrei um pálido coveiro Com a cabeça para o chão pendida;
Eu senti a m inh’alm a entristecida E interroguei-o: “Eterno com panheiro Da m orte, quem m atou-te o coração?”
Ele apontou para um a cruz no chão, Ali j azia o seu am or prim eiro!
Depois, tom ando a enxada, gravem ente, Balbuciou, sorrindo tristem ente:
-- “Ai, foi por isso que m e fiz coveiro!”
PECADORA
Tinha no olhar cetíneo, aveludado, A cham a cruel que arrasta os corações,
Os seios rij os eram dois brasões Onde fulgia o sim b’lo do pecado.
Bela, divina, o porte em oldurado No m árm ore sublim e dos contornos, Os seios brancos, palpitantes, m ornos, Dançavam -lhe no colo perfum ado.
No entanto, esta m ulher de grã beleza, Moldada pela m ão da Natureza, Tornou-se a pecadora vil. Do fado
Do destino fatal, presa, m orria, Um a noite entre as vascas da agonia, Tendo no corpo o verm e do pecado!
NO CLAUSTRO
Pelas do claustro salas silenciosas, De lutulentas, úm idas arcadas, Na vastidão silente das caladas Abóbadas som brias tenebrosas, Vagueiam tristem ente desfiladas De freiras e de m onj as tristurosas Que guardam cinzas de ilusões passadas,
Que guardam pet’las de funéreas rosas.
E à noute quando rezam na clausura, No sigilo das rezas m isteriosas, Nem a som bra m ais leve de ventura!
Só as arcadas ogivais desnudas, E as m esm as m onj as sem pre tristurosas, E as m esm as portas im passíveis, m udas!
IL TROVATORE
Canta da torre o trovador saudoso -- Addio, Eleonora! oh! sonhos m eus!
E o canto se desprende harm onioso, Na vibração final do extrem o adeus.
Repercute dolente, m avioso, Subindo pelo Azul da Inspiração;
Assim canta tam bém m eu coração, Trovador tortorado e angustioso, Ai! não, não acordeis, lem branças m inhas!
Saudade d’um as noutes em que vinhas
Cantar com igo um doce desafio!
Mas, pouco a pouco, os sons esm orecendo, Perdem -se as notas pelo Azul m orrendo,
-- Addio Eleonora, addio, addio!
A LOUCA
Quando ela passa: -- a veste desgrenhada, O cabelo revolto em desalinho, No seu olhar feroz eu adivinho O m istério da dor que a traz penada.
Moça, tão m oça e j á desventurada;
Da desdita ferida pelo espinho, Vai m orta em vida assim pelo cam inho,
No sudário da m ágoa sepultada.
Eu sei a sua história. -- Em seu passado Houve um dram a d’am or m isterioso O segredo d’um peito torturado --E hoj e, para guardar a m ágoa oculta,
Canta, soluça -- o coração saudoso, Chora, gargalha, a desgraçada estulta.
PRIMAVERA
Prim avera gentil dos m eus am ores, -- Arca cerúlea de ilusões etéreas, Chova-te o Céu cintilações sidéreas E a terra chova no teu seio flores!
Esplende, Prim avera, os teus fulgores, Na auréola azul, dos dias teus risonhos, Tu que sorveste o fel das m inhas dores E m e trouxeste o néctar dos teus sonhos!
Cedo virá, porém , o tiste outono, Os dias voltarão a ser tristonhos E tu hás de dorm ir o eterno sono, Num sepulcro de rosas e de flores,
Arca sagrada de cerúleos sonhos, Prim avera gentil dos m eus am ores!
A ESPERANÇA
A Esperança não m urcha, ela não cansa, Tam bém com o ela não sucum be a Crença,
Vão-se sonhos nas asas da Descrença, Voltam sonhos nas asas da Esperança.
Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o m undo é um a ilusão com pleta, E não é a Esperança por sentença Este laço que ao m undo nos m anieta?
Mocidade, portanto, ergue o teu grito, Sirva-te a Crença do fanal bendito, Salve-te a glória no futuro -- avança!
E eu, que vivo atrelado ao desalento, Tam bém espero o fim do m eu torm ento, Na voz da Morte a m e bradar; descansa!
SONETO
Senhora, eu traj o o luto do Passado, Este luto sem fim que é o m eu Calvário
E ansio e choro, delirante e vário, Sonâm bulo da dor angustiado.
Quantas venturas que m e acalentaram ! Meu peito túm ’lo do prazer finado
Foi outrora do riso abençoado, O berço onde as venturas se em balaram .
Mas não queiras saber nunca risonha O m istério d’um peito que estertora E o segredo d’um ’alm a que não sonha!
Não, não busques saber porque, Senhora, É m inha sina perenal, tristonha -- Cantar o Ocaso quando surge a Aurora.
SOFREDORA
Cobre-lhe a fria palidez do rosto O sendal da tristeza que a desola;
Chora -- o orvalho do pranto lhe perola As faces m aceradas de desgosto.
Quando o rosário de seu pranto rola, Das brancas rosas do seu triste rosto Que rolam m urchas com o um sol j á posto
Um perfum e de lágrim as se evola.
Tenta às vezes, porém , nervosa e louca Esquecer por m om ento a m ágoa intensa Arrancando um sorriso à flor da boca.
Mas volta logo um negro desconforto, Bela na Dor, sublim e na Descrença,
Com o Jesus a soluçar no Horto.