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Eu e Outras Poesias Augusto dos Anjos

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Academic year: 2022

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Eu e Outras Poesias

Augusto dos Anjos

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Fonte:

ANJOS, Augusto dos. Eu e outras poesias. 42. ed. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 1998.

Texto proveniente de:

A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro <http://www.bibvirt.futuro.usp.br>

A Escola do Futuro da Universidade de São Paulo Perm itido o uso apenas para fins educacionais.

Texto-base digitalizado por:

Francisco de Mesquita Moreira – Rio de Janeiro/RJ

Este m aterial pode ser redistribuído livrem ente, desde que não sej a alterado, e que as inform ações acim a sej am

m antidas. Para m aiores inform ações, escreva para <bibvirt@futuro.usp.br>.

Estam os em busca de patrocinadores e voluntários para nos aj udar a m anter este proj eto. Se você quiser aj udar

de algum a form a, m ande um e-m ail para <parceiros@futuro.usp.br> ou

<voluntario@futuro.usp.br>.

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MONÓLOG O DE UMA SOMBRA

“Sou um a Som bra! Venho de outras eras, Do cosm opolitism o das m oneras...

Pólipo de recônditas reentrâncias, Larva de caos telúrico, procedo Da escuridão do cósm ico segredo, Da substância de todas as substâncias!

A sim biose das coisas m e equilibra.

Em m inha ignota m ônada, am pla, vibra A alm a dos m ovim entos rotatórios...

E é de m im que decorrem , sim ultâneas, A saúde das forças subterrâneas E a m orbidez dos seres ilusórios!

Pairando acim a dos m undanos tetos, Não conheço o acidente da Senectus -- Esta universitária sanguessuga Que produz, sem dispêndio algum de vírus,

O am arelecim ento do papirus E a m iséria anatôm ica da ruga!

Na existência social, possuo um a arm a -- O m etafisicism o de Abidarm a --

E trago, sem bram ânicas tesouras, Com o um dorso de azêm ola passiva,

A solidariedade subj etiva De todas as espécies sofredoras.

Com o um pouco de saliva quotidiana Mostro m eu noj o à Natureza Hum ana.

A podridão m e serve de Evangelho...

Am o o esterco, os resíduos ruins dos quiosques

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E o anim al inferior que urra nos bosques É com certeza m eu irm ão m ais velho!

Tal qual quem para o próprio túm ulo olha, Am arguradam ente se m e antolha,

À luz do am ericano plenilúnio, Na alm a crepuscular de m inha raça Com o um a vocação para a Desgraça E um tropism o ancestral para o Infortúnio.

Aí vem suj o, a coçar chagas plebéias, Trazendo no deserto das idéias O desespero endêm ico do inferno, Com a cara hirta, tatuada de fuligens

Esse m ineiro doido das origens, Que se cham a o Filósofo Moderno!

Quis com preender, quebrando estéreis norm as, A vida fenom ênica das Form as, Que, iguais a fogos passageiros, luzem .

E apenas encontrou na idéia gasta, O horror dessa m ecânica nefasta, A que todas as coisas se reduzem ! E hão de achá-lo, am anhã, bestas agrestes,

Sobre a esteira sarcófaga das pestes A m osrtrar, j á nos últim os m om entos, Com o quem se subm ete a um a charqueada,

Ao clarão tropical da luz danada, O espólio dos seus dedos peçonhentos.

Tal a finalidade dos estam es!

Mas ele viverá, rotos os liam es Dessa estranguladora lei que aperta

Todos os agregados perecíveis, Nas eterizações indefiníveis Da energia intra-atôm ica liberta!

Será calor, causa ubíqua de gozo, Raio X, m agnetism o m isterioso, Quim iotaxia, ondulação aérea,

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Fonte de repulsões e de prazeres, Sonoridade potencial dos seres, Estrangulada dentro da m atéria!

E o que ele foi: clavículas, abdôm en, O coração, a boca, em síntese, o Hom em ,

-- Engrenagem de vísceras vulgares -- Os dedos carregados de peçonha,

Tudo coube na lógica m edonha Dos apodrecim entos m usculares.

A desarrum ação dos intestinos Assom bra! Vede-a! Os verm es assassinos Dentro daquela m assa que o húm us com e, Num a glutoneria hedionda, brincam , Com o as cadelas que as dentuças trincam

No espasm o fisiológico da fom e.

É um a trágica festa em ocionante!

A bacteriologia inventariante Tom a conta do corpo que apodrece...

E até os m em bros da fam ília engulham , Vendo as larvas m alignas que se em brulham

No cadáver m alsão, fazendo um s.

E foi então para isto que esse doudo Estragou o vibrátil plasm a todo, À guisa de um faquir, pelos cenóbios?!...

Num suicídio graduado, consum ir-se, E após tantas vigílias, reduzir-se À herança m iserável dos m icróbios!

Estoutro agora é o sátiro peralta Que o sensualism o sodom ita exalta, Nutrindo sua infâm ia a leite e a trigo...

Com o que, em suas clélulas vilíssim as, Há estratificações requintadíssim as

De um a anim alidade sem castigo.

Brancas bacantes bêbadas o beij am . Suas artérias hírcicas latej am ,

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Sentindo o odor das carnações abstêm ias, E à noite, vai gozar, ébrio de vício,

No som brio bazer dom eretrício, O cuspo afrodisíaco das fêm eas.

No horror de sua anôm ala nevrose, Toda a sensualidade da sim biose, Uivando, à noite, em lúbricos arroubos,

Com o no babilônico sansara, Lem bra a fom e incoercível que escancara

A m ucosa carnívora dos lobos.

Sôfrego, o m onstro as vítim as aguarda.

Negra paixão congênita, bastarda, Do seu zooplasm a ofídico resulta...

E explode, igual à luz que o ar acom ete, Com a veem ência m avórtica do aríete

E os arrem essos de um a catapulta.

Mas m uitas vezes, quando a noite avança, Hirto, observa através a tênue trança Dos filam entos fluídicos de um halo A destra descarnada de um duende, Que tateando nas tênebras, se estende

Dentro da noite m á, para agarrá-lo!

Cresce-lhe a intracefálica tortura, E de su’alm a na caverna escura, Fazendo ultra-epiléticos esforços, Acorda, com os candeeiros apagados,

Num a coreografia de danados, A fam ília alarm ada dos rem orsos.

É o despertar de um povo subterrâneo!

É a fauna cavernícola do crânio -- Macbeths da patológica vigília, Mostrando, em rem brandtescas telas várias,

As incestuosidades sangüinárias Que ele tem praticado na fam ília.

As alucinações tácteis pululam .

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Sente que m egatérios o estrangulam ...

A asa negra das m oscas o horroriza;

E autopsiando a am aríssim a existência Encontra um cancro assíduo na consciência

E três m anchas de sangue na cam isa!

Míngua-se o com bustível da lanterna E a consciência do sátiro se inferna, Reconhecendo, bêbedo de sono, Na própria ânsia dionísica do gozo,

Essa necessidade de horroroso, Que é talvez propriedade do carbono!

Ah! Dentro de toda a alm a existe a prova De que a dor com o um dartro se renova, Quando o prazer barbaram ente a ataca...

Assim tam bém , observa a ciência crua, Dentro da elipse ignívom a da lua A realidade de um a esfera opaca.

Som ente a Arte, esculpindo a hum ana m ágoa, Abranda as rochas rígidas, torna água

Todo o fogo telúrico profundo E reduz, sem que, entanto, a desintegre,

À condição de um a planície alegre, A aspereza orográfica do m undo!

Provo desta m aneira ao m undo odiento Pelas grandes razões do sentim ento, Sem os m étodos da abstrusa ciência fria

E os trovões gritadores da dialética, Que a m ais alta expressãoda dor estética

Consiste essencialm ente na alegria.

Continua o m artírio das criaturas:

-- O hom icídio nas vielas m ais escuras, -- O ferido que a hostil gleba atra escarva,

-- O últim o solilóquio dos suicidas -- E eu sinto a dor de todas essas vidas Em m inha vida anônim a de larva!”

Disse isto a Som bra. E, ouvindo estes vocábulos,

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Da luz da lua aos pálidos venábulos, Na ânsa de um nervosíssim o entusiasm o,

Julgava ouvir m onótonas coruj as, Executando, entre daveiras suj as, A orquestra arrepiadora do sarcasm o!

Era a elegia panteísta do Universo, Na produção do sangue hum ano im enso,

Prostituído talvez, em suas bases...

Era a canção da Natureza exausta, Chorando e rindo na ironia infausta Da incoerência infernal daquelas frases.

E o turbilhão de tais fonem as acres Trovej ando grandíloquos m assacres,

Há-de ferir-m e as auditivas portas, até que m inha efêm era cabeça, Reverta à quietação datrava espessa

E à palidez das fotosferas m ortas!

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AG ONIA DE UM FILÓSOFO

Consulto o Phtah-Hotep. Leio o obsoleto Rig-Veda. E, ante obras tais, m e não consolo...

O Inconsciente m e assom bra e eu nele rolo Com a eólica fúria do harm atã inquieto!

Assisto agora à m orte de um inseto!...

Ah! todos os fenôm enos do solo Parecem realizar de pólo a pólo O ideal do Anaxim andro de Mileto!

No hierático areópago heterogêneo Das idéias, percorro com o um gênio Desde a alm a de Haeckel à alm a cenobial!...

Rasgo dos m undos o velário espesso;

E em tudo igual a Goethe, reconheço O im pério da substância universal!

O MORCEG O

Meia-noite. Ao m eu quarto m e recolho.

Meu Deus! E este m orcego! E, agora, vede:

Na bruta ardência orgânica dasede, Morde-m e a goela ígneo e escaldante m olho.

“Vou m andar levantar outra parede...”

-- Digo. Ergo-m e a trem er. Fecho o ferrolho E olho o teto. E vej o-o ainda, igual a um olho,

Circularm ente sobre a m inha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego A tocá-lo. Minh’alm a se concentra.

Que ventre produziu tão feio parto?!

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A Consciência Hum ana é este m orcego!

Por m ais que a gente faça, à noite ele entra Im perceptivelm ente em nosso quarto!

PSICOLOG IA DE UM VENCIDO

Eu, filho do carbono e do am oníaco, Monstro de escuridão e rutilância, Sofro, desde a epigênese da infância, A influência m á dos signos do zodíaco.

Produndissim am ente hipocondríaco, Este am biente m e causa repugnância...

Sobe-m e à boca um a ânsia análoga à ânsia Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verm e -- este operário das ruínas -- Que o sangue podre das carnificinas Com e, e à vida em geral declara guerra, Anda a espreitar m eus olhos para roê-los, E há de deixar-m e apenas os cabelos,

Na frialdade inorgânica da terra!

A IDÉIA

De onde ela vem ?! De que m atéria bruta Vem essa luz que sobre as nebulosas Cai de incógnitas criptas m isteriosas Com o as estalactites dum a gruta?!

Vem da psicogenética e alta luta Do feixe de m oléculas nervosas,

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Que, em desintegrações m aravilhosas, Delibera, e depois, quer e executa!

Vem do encéfalo absconso que a constringe, Chega em seguida às cordas da laringe,

Tísica, tênue, m ínim a, raquítica...

Quebra a força centrípeta que a am arra, Mas, de repente, e quase m orta, esbarra

No m olam bo da língua paralítica!

O LÁZARO DA PÁTRIA

Filho podre de antigos Goitacases, Em qualquer parte onde a cabeça ponha,

Deixa circunferências de peçonha, Marcas oriundas de úlceras e antrazes.

Todos os cinocéfalos vorazes Cheiram seu corpo. À noite, quando sonha,

Sente no tórax a pressão m edonha Do bruto em bate férreo das tenazes.

Mostra aos m ontes e aos rígidos rochedos A hedionda elefantíase dos dedos Há um cansaço no Cosm os... Anoitece.

Riem as m eretrizes no Cassino, E o Lázaro cam inha em seu destino Para um fim que ele m esm o desconhece!

IDEALIZAÇÃO DA HUMANIDADE FUTURA

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Rugia nos m eus centros cerebrais A m ultidão dos séculos futuros -- Hom ens que a herança de ím petos im puros

Tornara etnicam ente irracionais!

Não sei que livro, em letras garrafais, Meus olhos liam ! No húm us dos m onturos,

Realizavam -se os partos m ais obscuros, Dentre as genealogias anim ais!

Com o quem esm igalha protozoários Meti todos os dedos m ercenários Na consciência daquela m ultidão...

E, em vez de achar a luz que os Céus inflam a, Som ente achei m oléculas de lam a

E a m osca alegre da putrefação!

SONETO

Ao m eu prim eiro filho nascido m orto com 7 m eses incom pletos.

2 fevereiro 1911.

Agregado infeliz de sangue e cal, Fruto rubro de carne agonizante, Filho da grande força fecundante De m inha brônzea tram a neuronial,

Que poder em briológico fatal Destruiu, com a sinergia de um gigante,

Em tua morfogênese de infante A m inha morfogênese ancestral?!

Porção de m inha plásm ica substância, Em que lugar irás passar a infância,

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Tragicam ente anônim o, a feder?!

Ah! Possas tu dorm ir, feto esquecido, Panteisticam ente dissolvido Na noumenalidade do NÃO SER!

VERSOS A UM CÃO

Que força pôde adstrita e em briões inform es, Tua garganta estúpida arrancar

Do segredo da célula ovular Para latir nas solidões enorm es?

Esta obnóxia inconsciência, em que tu dorm es, Suficientíssim a é, para provar A incógnita alm a, avoenga e elem entar

Dos teus antepassados vem iform es.

Cão! -- Alm a do inferior rapsodo errante!

Resigna-a, am para-a, arrim a-a, afaga-a, acode-a A escala dos latidos ancestrais...

E irás assim , pelos séculos adiante, Latindo a esquisitíssim a prosódia Da angústia hereditária dos teus pais!

O DEUS-VERME

Fator universal do transform ism o.

Filho da teleológica m atéria, Na superabundância ou na m iséria, Verme -- é o seu nom e obscuro de batism o.

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Jam ais em prega o acérrim o exorcism o Em sua diária ocupação funérea, E vive em contubérnio com a bactéria, Livre das roupas do antropom orfism o.

Alm oça a podridão das drupas agras, Janta hidrópicos, rói vísceras m agras E dos defuntos novos incha a m ão...

Ah! Para ele é que a carne podre fica, E no inventário da m atéria rica Cabe aos seus filhos a m aior porção!

DEBAIXO DO TAMARINDO

No tem po de m eu Pai, sob estes galhos, Com o um a vela fúnebre de cera, Chorei bilhões de vezes com a canseira

De inexorabilíssim os trabalhos!

Hoj e, esta árvore, de am plos agasalhos, Guarda, com o um a caixa derradeira,

O passado da Flora Brasileira E a paleontologia dos Carvalhos!

Quando pararem todos os relógios De m inha vida e a voz dos necrológios

Gritar nos noticiários que eu m orri, Voltando à pátria da hom ogeneidade,

Abraçada com a própria Eternidade A m inha som bra há de ficar aqui!

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AS CISMAS DO DESTINO I

Recife, Ponte Buarque de Macedo.

Eu, indo em direção à casa do Agra, Assom brado com a m inha som bra m agra,

Pensava no Destino, e tinha m edo!

Na austera abóbada alta o fósforo alvo Das estrelas luzia... O calçam ento Sáxeo, de asfalto rij o, atro e vidrento,

Copiava a polidez de um crânio alvo.

Lem bro-m e bem . A ponte era com prida, E a m inha som bra enorm e enchia a ponte,

Com o um a pele de rinoceronte Estendida por toda a m inha vida!

A noite fecundava o ovo dos vícios Anim ais. Do carvão da treva im ensa

Caía um ar danado de doença Sobre a cara geral dos edifícios!

Tal um a horda feroz de cães fam intos, Atravessando um a estação deserta, Uivava dentro do eu, com a boca aberta,

A m atilha espantada dos instintos!

Era com o se, na alm a da cidade, Profundam ente lúbrica e revolta, Mostrando as carnes, um a besta solta

Soltasse o berro da anim alidade.

E aprofundando o raciocínio obscuro, Eu vi, então, à luz de áureos reflexos,

O trabalho genésico dos sexos, Fazendo à noite os hom ens do Futuro.

Livres de m icroscópios e escalpelos,

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Dançavam , parodiando saraus cínicos, Bilhões de centrossom as apolínicos

Na câm ara prom íscua do vitellus.

Mas, a irritar-m e os globos oculares, Apregoando e alardeando a cor noj enta,

Fetos m agros, ainda na placenta, Estendiam -m e as m ãos rudim entares!

Mostravam -m e o apriorism o incognoscível Dessa fatalidade igualitária, Que fez m inha fam ília originária Do antro daquela fábrica terrível!

A corrente atm osférica m ais forte Zunia. E, na ígnea crosta do Cruzeiro,

Julgava eu ver o fúnebre candeeiro Que há de m e alum iar na hora da m orte.

Ninguém com preendia o m eu soluço, Nem m esm o Deus! Da roupa pelas brechas,

O ventobravo m e atirava flechas E aplicações hiem ais de gelo russo.

A vingança dos m undos astronôm icos Enviava à terra extraordinária faca, Posta em rij a adesão de gom a laca Sobre os m eus elem entos anatôm icos.

Ah! Com certeza, Deus m e castigava!

Por toda a parte, com o um réu confesso, Havia um j uiz que lia o m eu processo E um a forca especial que m e esperava!

Mas o vento cessara por instantes Ou, pelo m enos, o ignis sapiens do Orco

Abafava-m e o peito arqueado e porco Num núcleo de substâncias abrasantes.

É bem possível que eu um dia cegue.

No ardor desta letal tórrida zona,

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A cor do sangue é a cor que m e im pressiona E a que m ais neste m undo m e persegue!

Essa obsessão crom ática m e abate.

Não sei por que m e vêm sem pre à lem brança O estôm ago esfaqueado de um a criança

E um pedaço de víscera escarlate.

Quisera qualquer coisa provisória Que a m inha cerebral caverna entrasse,

E até ao fim , cortasse e recortasse A faculdade aziaga da m em ória.

Na ascensão barom étrica da calm a, Eu bem sabia, ansiado e contrafeito, Que um a população doente do peito Tossia sem rem édio na m inh’alm a!

E o cuspo que essa hereditária tosse Golfava, à guisa de ácido resíduo, Não era o cuspo só de um indivíduo

Minado pela tísica precoce.

Não! Não era o m eu cuspo, com certeza Era a expectoração pútrida e crassa Dos brônquios pulm orares de um a raça

Que violou as leis da Natureza!

Era antes um a tosse ubíqua, estranha, Igual ao ruído de um calhau redondo Arrem essado no apogeu do estrondo, Pelos fundibulários da m ontanha!

E a saliva daqueles infelizes Inchava, em m inha boca, de tal arte, Que eu, para não cuspir por toda a parte,

Ia engolindo, aos poucos, a hem optísis!

Na alta alucinação de m inhas cism as O m icrocosm os líquido da gota Tinha a abundância de um a artéria rota,

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Arrebatada pelos aneurism as.

Chegou-m e o estado m áxim o da m ágoa!

Duas, três, quatro, cinco, seis e sete Vezes que eu m e furei com um canivete,

A hem oglobina vinha cheia de água!

Cuspo, cuj as caudais m eus beiços regam , Sob a form a de m ínim as cam ândulas, Benditas sej am todas essas glândulas, Que, quotidianam ente, te segregam ! Escarrar de um abism o noutro abism o, Mandando ao Céu o fum o de um cigarro,

Há m ais filosofia neste escarro Do que em toda a m oral do Cristianism o!

Porque, se no orbe oval que os m eus pés tocam Eu não deixasse o m eu cuspo carrasco,

Jam ais exprim iria o acérrim o asco Que os canalhas do m undo m e provocam !

II

Foi no horror dessa noite tão funérea Que eu descobri, m aior talvez que Vinci,

Com a força visualística do lince, A falta de unidade na m atéria!

Os esqueletos desarticulados, Livres do acre fedor das carnes m ortas, Rodopiavam , com as brancas tíbias tortas,

Num a dança de núm eros quebrados!

Todas as divindades m alfazej as, Siva e Arim ã, os duendes, o In e os trasgos,

Im itando o barulho dos engasgos,

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Davam pancadas no adro das igrej as.

Nessa hora de m onólogos sublim es, A com panhia dos ladrões da noite, Buscando um a taverna que os açoite, Vai pela escuridão pensando crim es.

Perpetravam -se os atos m ais funestos, E o luar, da cor de um doente de icterícia,

Ilum inava, a rir, sem pudicícia, A cam isa verm elha dos incestos.

Ninguém , de certo, estava ali, a espiar-m e, Mas um lam pião, lem brava ante o m eu rosto,

Um sugestionador olho, ali posto De propósito, para hipnotizar-m e!

Em tudo, então, m eus olhos distinguiram Da m iniatura singular de um a aspa,

À anatom ia m ínim a da caspa, Em briões de m undos que não progrediram !

Ser cachorro! Ganir incom preendidos Verbos! Querer dizer-nos que não finge,

E a palavra em brulhar-se na laringe, Escapando-se apenas em latidos!

Despir a putrescível form a tosca, Na atra dissoluçào que tudo inverte,

Deixar cair sobre a barriga inerte O apetite necrófago da m osca!

A alm a dos anim ais! Pego-a, distingo-a, Acho-a nesse interior duelo secreto Entre a ânsia de um vocábulo com pleto E um a expressão que não chegou à língua!

Surpreendo-a em quatrilhões de corpos vivos, Nos antiperistálticos abalos Que produzem nos bois e nos cavalos

A contração dos gritos instintivos!

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Tem po viria, em que, daquele horrendo Caos de corpos orgânicos disform es

Rebentariam cérebros enorm es, Com o bolhas febris de água, fervendo!

Nessa época que os sábios não ensinam , A pedra dura, os m ontes argilosos Criariam feixes de cordões nervosos E o neuroplasm a dos que raciocinam ! Alm as pigm éias! Deus subj uga-as, cinge-as À im perfeição! Mas vem o Tem po, e vence-O,

E o m eu sonho crescia nosilâncio, Maior que as epopéias carolíngias!

Era a revolta trágica dos tipos Ontogênicos m ais elem entares, Desde os foram iníferos dos m ares

À grei liliputiana dos pólipos.

Todos os personagens da tragédia, Cansados de viver na paz de Buda, Pareciam pedir com a boca m uda A ganglionária célula interm édia.

A planta que a canícula ígnea torra, E as coisas inorgânicas m ais nulas Apregoavam encéfalos, m edulas Na alegria guerreira da desforra!

Os protistas e o obscuro acervo rij o Dos espongiários e dos infusórios Recebiam com os seus órgãos sensóricos

O triunfo em ocional do regozij o.

E apesar de j á não ser assim tão tarde, Aquela hum anidade parasita, Com o um bicho inferior, berrava, aflita,

No m eu tem peram ento de covarde!

(22)

Mas, refletindo, a sós, sobre o m eu caso Vi que, igual a um am niota subterrâneo,

j azia atravassada no m eu crânio A intercessão fatídica do atraso!

A hipótese genial do m icrozim a Me estrangulava o pensam ento guapo, E eu m e encolhia todo com o um sapo Que tem um peso incôm odo por cim a!

Nas agonias do delirium -trem ens, Os bêbedos alvares que m e olhavam ,

Com os copos cheios esterilizavam A substância prolífica dos sêm ens!

Enterravam as m ãos dentro das goelas, E sacudidos de um trem or indôm ito

Expeliam , na dor forte do vôm ito, Um conj unto de gosm as am arelas.

Iam depois dorm ir nos lupanares Onde, na glória da concupiscência, Depositavam quase sem consciência

As derradeiras forças m usculares.

Fabricavam destarte os bastoderm as, Em cuj o repugnante receptáculo Minha perscrutação via o espetáculo De um a progênie idiota de palerm as.

Prostituição ou outro qualquer nom e, por tua causa, em bora o hom em te aceite,

É que as m ulheres ruins ficam sem leite E os m eninos sem pai m orrem de fom e!

Por que há de haver aqui tantos enterros?

Lá no “Engenho” tam bém , a m orte é ingrata...

Há o m alvado carbúnculo que m ata A sociedade infante dos bezerros!

Quantas m oças que o túm ulo reclam a!

(23)

E após a podridão de tantas m oças, Os porcos espoj ando-se nas poças Da virgindade reduzida à lam a!

Morte, ponto final da últim a cena, Form a difusa da m atéria em bele,

Minha filosofia te repele, Meu raciocínio enorm e te condena!

Diante de ti, nas catedrais m ais ricas, Rolam sem eficácia os am uletos, Oh! Senhora dos nossos esqueletos E das caveiras diárias que fabricas!

E eu desej ava ter, num a ânsia rara, Ao pensar nas pessoas que perdera, A inconsciência das m áscaras de cera Que a gente prega, com o um cordão, na cara!

Era um sonho ladrão de subm ergir-m e Na vida universal,e, em tudo im erso, Fazer da parte abstrada do Universo, Minha m orada equilibrada e firm e!

Nisto, pior que o rem orso do assassino, Reboou, tal qual, num fundo de caverna,

Num a im pressionadora voz interna, o eco particular do m eu Destino;

III

“Hom em ! por m ais que a Idéia deintegres, Nessas perquisições que não têm pausa, Jam ais, m agro hom em , saberás a causa

De todos os fenôm enos alegres!

Em vão, com a bronca enxada árdega, sondas

(24)

A estéril terra, e a hialina lâm pada oca, Trazes, por perscrutar (oh! ciência louca!)

O conteúdo das lágrim as hediondas.

Negro e sem fim é esse em que te m ergulhas lugar do Cosm os, onde a dor infrene

É feita com o é feito o querosene Nos recôncavos úm idos das hulhas!

Porque, para que a Dor perscrutes, fora Mister que, não com o és, em síntese, antes

Fosses, a refletir teus sem elhantes, A própria hum anidade sofredora!

A universal com plexidade é que Ela Com preende. E se, por vezes, se divide, Mesm o ainda assim , seu todo não RESIDENCIA

No quociente isolado da parcela!

Ah! Com o o ar im ortal a Dor não finda!

Das papilas nervosas que há nos tatos Veio e vai desde os tem pos m ais transatos

Para outros tem pos que hão de vir ainda!

Com o o m achucam ento das insônias Te estraga, quando toda a estuada Idéia

Dás ao sôfrego estudo da ninféia E de outras plantas dicotiledôneas!

A diáfana água alvíssim a e a hórrida áscua Que da ígnea flam a bruta, estriada, espirra;

A form ação m olecular da m irra, o cordeiro sim bólico da Páscoa;

As rebeladas cóleras que rugem No hom em civilizado, e a ele se prendem Com o às pulseiras que os m ascates vendem

A aderência teim osa da ferrugem ; O orbe feraz que bastos j oj os acres Produz’a rebelião que na batalha,

(25)

Deixa os hom ens deitados, sem m ortalha, Na sangueira concreta dos m assacres;

Os sanguinolentíssim os chicotes Da hem orragia; as nódoas m ais espessas,

O achatam ento ignóbil das cabeças, Que ainda degrada os povos hotentotes;

O Am or e a Fom e, a fera ultriz que o foj o Entra, à espera que a m ansa vítim a o entre,

-- Tudo que gera no m aterno ventre A causa fisiológica do noj o;

As pálpebras inchadas na vigília, As aves m oças que perderam a asa,

O fogão apagado de um a casa, Onde m orreu o chefe da fam ília;

O trem particular que um corpo arrasta Sinistram ente pela via férrea, A cristalização da m assa térrea, O tecido da roupa que se gasta;

A água arbitrária que hiulcos caules grossos Carrega e com e; as negras form as feias

Dos aracnídeos e das centopéias, O fogo-fátuo que ilum ina os ossos;

As proj eções flam ívom as que ofuscam , Com o um a pincelada rem brandtesca, A sensação que um a coalhada fresca Transm ite às m ãos nervosas dos que a buscam ;

O antagonism o de Tífon e Osíris, O hom em grande oprim indo o hom em pequeno

A lua falsa de um parasseleno, A m entira m eteórica do arco-íris;

Os terrem otos que, abalando os solos, Lem bram paióis de pólvora explodindo,

A rotação dos fluidos produzindo

(26)

A depressão geológica dos pólos;

O instinto de procriar, a ânsia legítim a Da alm a, afrontando ovante aziagos riscos,

O j uram ento dos guerreiros priscos Metendo as m ãos nas glândulas da vítim a;

As diferenciações que o psicoplasm a Hum ano sofre da m ania m ística, A pesada opressão característica Dos dez m inutos de um acesso de asm a;

E, (conquanto contra isto ódios regougues) A utilidade fúnebre da corda Que arrasta a rês, depois que a rês engorda,

À m orte desgraçada dos açougues...

Tudo isto que o terráqueo abism o encerra Form a a com plicação desse barulho Travado entre o dragão do hum ano orgulho

E as forças inorgânicas da terra!

Por descobrir tudo isso, em balde cansas!

Ignoto é o gérm em dessa força ativa Que engendra, em cada célula passiva,

A heterogeneidade das m udanças!

Poeta, feito m alsão, criado com os sucos De um leite m au, carnívoro asqueroso,

Gerado no atavism o m onstruoso Da alm a desordenada dos m alucos;

Últim a das criaturasinferiores Governada por átom os m esquinhos, Teu pé m ata a uberdade dos cam inhos

E esteriliza os ventres geradores!

O áspero m al que a tudo, em torno, trazes, Am álogo é ao que, negro e a seu turno,

Traz o ávido filóstom o noturno Ao sangue dos m am íferos vorazes!

(27)

Ah! Por m ais que, com o espírito, trabalhes A perfeição dos seres existentes, Hás de m ostrar a cárie dos teus dentes

Na anatom ia horrenda dos detalhes!

O Espaço -- esta abstração spencereana Que abrange as relações de coexistência E só! Não tem nenhum a dependência Com as vértebras m ortais da espécie hum ana!

As radiantes elipses que as estrelas Traçam , e ao espectador falsas se antolham

São verdades de luz que os hom ens olham Sem poder, no entretanto, com preendê-las.

Em vão, com a m ão corrupta, outro éter pedes Que essa m ão, de esqueléticas falanges, Dentro dessa água que com a vista abranges,

Tam bém prova o princípio de Arquim edes!

A fadiga feroz que te esbordoa Há de deixar-te essa m edonha m arca, Que, nos corpos inchados de anasarca, Deixam os dedos de qualquer pessoa!

Nem terás no trabalho que tiveste A m isericordiosa toalha am iga, Que afaga os hom ens doentes de bexiga

E enxuga, à noite, as pústulas da peste!

Quando chegar depois a hora tranqüila, Tu serás arrastado, na carreira, Com o um cepo inconsciente de m adeira

Na evolução orgânica da argila!

Um dia com parado com um m ilênio Sej a, pois, o teu últim o Evangelho...

É a evolução do novo para o velho E do hom ogêneo para o heterogêneo!

(28)

Adeus! Fica-te aí, com o abdôm en largo A apodrecer!... És poeira e em balde vibras!

O corvo que com er as tuas fibras Há de achar nelas um sabor am argo!”

IV

Calou-se a voz. A noite era funesta.

E os queixos, a exibir trism os danados, Eu puxava os cabelos desgrenhados Com o o Rei Lear, no m eio da floresta!

Maldizia, com apóstrofes veem entes, No estentor de m il línguas insurretas, O convencionalism o das Pandetas E os textos m aus dos códigos recentes!

Minha im aginação atorm entada Paria absurdos... Com o diabos j untos, perseguiam -m e os olhos dos defuntos Com a carne da esclerótica esverdeada.

Secara a clorofila das lavouras.

Igual aos sustenidos de um a endecha Vinha-m e às cordas glóticas a queixa

Das coletividades sofredoras.

O m undo resignava-se invertido Nas forças principais do seu trabalho...

A gravidade era um princípio falho, A análise espectral tinha m entido!

O Estado, a Associação, os Municípios Eram m ortos. De todo aquele m undo

Restava um m ecanism o m oribundo E um a teleologia sem princípios.

(29)

Eu queria correr, ir para o inferno, Para que, da psique no oculto j ogo, Morressem sufocadas pelo fogo Todas as im pressões do m undo externo!

Mas a Terra negava-m e o equilíbrio...

Na Natureza, um a m ulher de luto Cantava, espiando as árvores sem fruto.

A canção prostituta do ludíbrio.

(30)

BUDISMO MODERNO

Tom e, Dr., esta tesoura, e...corte Minha singularíssim a pessoa.

Que im porta a m im que a bicharia roa Todo o m eu coração, depois da m orte?!

Ah! Um urubu pousou na m inha sorte!

Tam bém , das diatom áceas da lagoa A criptógam a cápsula se esbroa Ao contato de bronca destra forte!

Dissolva-se, portanto, m inha vida Igualm ente a um a célula caída Na aberração de um óvulo infecundo;

Mas o agregado abstrato das saudades Fique batendo nas perpétuas grades Do últim o verso que eu fizer no m undo!

SONHO DE UM MONISTA

Eu e o esqueleto esquálido de Esquilo Viaj ávam os, com um a ânsia sibarita, por toda a pro-dinâm ica infinita, Na inconsciência de um zoófito tranqüilo.

A verdade espantosa do Protilo Me aterrava, m as dentro da alm a aflita

Via Deus -- essa m ônada esquisita -- Coordenando e anim ando tudo aquilo!

E eu bendizia, com o esqueleto ao lado, Na guturalidade do m eu brado, Alheio ao velho cálculo dos dias,

(31)

Com o um pagão no altar de Proserpina, A energia intracósm ica divina Que é o pai e é a m ãe das outras energias!

SOLITÁRIO

Com o um fantasm a que se refugia Na solidão da natureza m orta, Por trás dos erm os túm ulos, um dia,

Eu fui refugiar-m e à tua porta!

Fazia frio e o frio que fazia Não era esse que a carne nos contorta...

Cortava assim com o em carniçaria O aço das facas incisivas corta!

Mas tu não vieste ver m inha Desgraça!

E eu saí, com o quem tudo repele, -- Velho caixão a carregar destroços --

Levando apenas na tum ba carcaça O pergam inho singular da pele E o chocalho fatídico dos ossos!

MATER ORIG INALIS

Form a verm icular desconhecida Que estacionaste, m ísera e m ofina,

Com o quase im palpável gelatina, Nos estados prodrôm icos da vida;

O hierofante que leu a m inha sina Ignorante é de que és, talvez, nascida

(32)

Dessa hom ogeneidade indefinida Que o insigne Herbert Spencer nos ensina.

Nenhum a ignota união ou nenhum sexo À contingência orgânica do sexo A tua estacionária alm a prendeu...

Ah! De ti foi que, autônom a e sem norm as, Oh! Mãe original das outras form as,

A m inha form a lúgubre nasceu!

O LUPANAR

Ah! Por que m onstruosíssim o m otivo Prenderam para sem pre, nesta rede, Dentro do ângulo diedro da parede, A alm a do hom em poilígam o e lascivo?!

Este lugar, m oços do m undo, vede:

É o grande bebedeouro coletivo, Onde os bandalhos, com o um gado vivo,

Todas as noites, Vêm m atar a sede!

É o afrodístico leito do hetairism o A antecâm ara lúbrica do abism o, Em que é m ister que o gênero hum ano entre.

Quando a prom iscuidade aterradora Matar a últim a força geradora E com er o últim o óvulo do ventre!

IDEALISMO

(33)

Falas de am or, e eu ouço tudo e calo!

O am or da Hum anidade é um a m entira.

É. E é por isso que na m inha lira De am ores fúteis poucas vezes falo.

O am or! Quando virei por fim a am á-lo?!

Quando, se o am or quea Hum anidade inspira É o am or do sibarita e da hetaíra, De Messalina e de Sardanapalo?!

Pois é m ister que, para o am or sagrado, O m undo fique im aterializado -- Alavanca desviada do seu futuro --

E haj a só am izade verdadeira Dum a caveira para outra caveira, Do m eu sepulcro para o teu sepulcro?!

ÚLTIMO CREDO

Com o am a o hom em adúltero o adultério E o ébrio a garrafa tóxica de rum , Am o o coveiro -- este ladrão com um Que arrasta a gente para o cem itério!

É o transcendentalíssim o m istério!

É o nous, é o pneum a, é o ego sum qui sum , É a m orte, é esse danado núm ero Um Que m atou Cristo e que m atou Tibério!

Creio, com o o filósofo m ais crente, na generalidade descrente Com que a substância cósm ica evolui...

Creio, perante a evolução im ensa, Que o hom em universal de am anhã vença

O hom em particular eu que ontem fui!

(34)

O CAIXÃO FANTÁSTICO

Célere ia o caixão, e, nele, inclusas, Cinzas, caixas cranianas, cartilagens Oriundas, com o os sonhos dos selvagens,

De aberratórias abstrações abstrusas!

Nesse caixão iam , talvez as Musas, Talvez m eu Pai! Hoffm ânicas viagens

Enchiam m eu encéfalo de im agens As m ais contraditórias e confusas!

A energia m onística do Mundo, À m eia-noite, penetrava fundo No m eu fenom enal cérebro cheio...

Era tarde! Fazia m uito frio.

Na rua apenas o caixão som brio Ia continuando o seu passeio!

SOLILÓQ UIO DE UM VISIONÁRIO

Para desvirginar o labirinto Do velho e m etafísico Mistério, Com i m eus olhos crus no cem itério,

Num a antropofagia de fam into!

A digestão desse m anj ar funéreo Tornado sangue transform ou-m e o instinto De hum anas im pressões visuais que eu sinto

Nas divinas visões do íncola etéreo!

(35)

Vestido de hidrogênio incandescente, Vaguei um século, im proficuam ente,

Pelas m onotonias siderais...

subi talvez às m áxim as alturas, Mas, se hoj e volto assim , com a alm a às escuras,

É necessário que ainda eu suba m ais!

A UM CARNEIRO MORTO

Misericordiosíssim o carneiro Esquartej ado, a m aldição de Pio Décim o caia em teu algoz som brio E em todo aquele que for seu herdeiro!

Maldito sej a o m ercador vadio Que te vender as carnes por dinheiro,

pois, tua lã aquece o m undo inteiro E guarda as carnes dos que estão com frio!

Quando a faca rangeu no teu pescoço, Ao m onstro que esprem eu teu sangue grosso Teus olhos -- fontes de perdão -- perdoaram !

Oh! tu que no Perdão eu sim bolizo, Se fosses Deus, no Dia de Juízo, Talvez perdoasses os que te m ataram !

VOZES DA MORTE

Agora sim ! Vam os m orrer, reunidos, Tam arindo de m inha desventura, Tu, com o envelhecim ento da nervura,

(36)

Eu, com o envelhecim ento dos tecidos!

Ah! Esta noite é a noite dos Vencidos!

E a podridão, m eu velho! E essa futura Ultrafatalidade de ossatura, A que nos acharem os reduzidos!

Não m orrerão, porém , tuas sem entes!

E assim , para o Futuro, em diferentes Florestas, vales, selvas, glebas, trilhos, Na m ultiplicidade dos teus ram os, Pelo m uito que em vida nos am am os, Depois da m orte, inda terem os filhos!

INSÂNIA DE UM SIMPLES

Em cism as patológicas insanas, É-m e grato adstringir-m e, na hierarquia

Das form as vivas, à categoria Das organizações liliputianas;

Ser sem elhante aos zoófitos e às lianas, Ter o destino de um a larva fria, Deixar enfim na cloaca m ais som bria

Este feixe de células hum anas!

E enquanto arrem edando Éolo iracundo, Na orgia heliogabálica do m undo, Ganem todos os vícios de um a vez, Apraz-m e, adstrito ao triângulo m esquinho

De um delta hum ilde, apodrecer sozinho No silêncio de m inha pequenez!

(37)

OS DOENTES I

Com o um a cascavel que se enroscava, A cidade dos lázaros dorm ia...

Som ente, na m etróplole vazia, Minha cabeça autônom a pensava!

Mordia-m e a obsessão m á de que havia, Sob os m eus pés, na terra onde eu pisava,

Um fígado doente que sangrava E um a garganta órfã que gem ia!

Tentava com preender com as conceptivas Funções do encéfalo as substâncias vivas Que nem Spencer, nem Haeckel com preenderam ...

E via em m im , coberto de desgraças, O resultado de bilhões de raças Que há m uito desapareceram !

II

Minha angústia feroz não tinha nom e.

Ali, na urbe natal do Desconsolo, Eu tinha de com er o últim o bolo Que Deus fazia para a m inha fom e!

Convulso, o vento entoava um pseudosalm o.

Contrastando, entretanto, com o ar convulso A noite funcionava com o um pulso

Fisiologicam ente m uito calm o.

Caíam sobre os m eus centros nervosos, Com o os pingos ardentes de cem velas,

(38)

O uivo desenganado das cadelas E o gem ido dos hom ens bexigosos.

Pensava! E em que eu pensava, não perguntes!

Mas, em cim a de um túm ulo, um cachorro Pedia para m im água e socorro À com iseração dos transeuntes!

Bruto, de errante rio, alto e hórrido, o urro Reboava. Além j azia os pés da serra, Criando as superstições de m inha terra,

A queixada específica de um burro!

Gordo adubo de agreste urtiga brava, Benigna água, m agnânim a e m agnífica, Em cuj a álgida unção, branda e beatífica,

A Paraíba indígena se lava!

A m anga, a am eixa, a am êndoa, a abóbora, o álam o E a câm ara odorífera dos sum os Absorvem diariam ente o ubérrim o húm us

Que Deus espalha à beira do seu tálam o!

Nos de teu curso desobstruídos trilhos, Apenas eu com preendo, em quaisquer horas,

O hidrogênio e o oxigênio que tu choras Pelo falecim ento dos teus filhos!

Ah! Som ente eu com preendo, satisfeito, A incógnita psique das m assas m ortas Que dorm em , com o as ervas, sobre as hortas,

Na esteira igualitária do teu leito!

O vento continuava sem cansaço E enchia com a fluidez do eólico hissope

Em seu fantasm agórido galope A abundância geom étrica do espaço.

Meu ser estacionava, olhando os cam pos Circunj acentes. No Alto, os astros m iúdos

Reduziam os Céus sérios e rudos

(39)

A um a epiderm e cheia de saram pos!

III

Dorm ia em baixo, com a prom íscua véstia No enbotam ento crasso dos sentidos,

A com unhão dos hom ens reunidos Pela cam aradagem da m oléstia.

Feriam -m e o nervo óptico e a retina Aponevroses e tendões de Aquiles, Restos repugnantíssim os de bílis, Vôm itos im pregnados de ptialina.

Da degenerescência étnica do Ária Se escapava, entre estrépitos e estouros,

Reboando pelos séculos vindouros, O ruído de um a tosse hereditária.

OH! desespero das pessoas tísicas, Adivinhando o frio que há nas lousas,

Maior felicidade é a destas cousas Subm etidas apenas às leis físicas!

Estas, por m ais que os cardos grandes rocem Seus corpos brutos, dores não recebem ;

Estas dis bacalhaus o óleo não bebem , Estas não cospem sangue, estas não tossem !

Descender dos m acacos catarríneos, Cair doente e passar a vida inteira Com a boca j unto de um a escarradeira, Pintando o chão de coágulos sangüíneos!

Sentir, adstritos ao quim iotropism o Erótico, os m icróbios assanhados Passearem , com o inúm eros soldados,

(40)

Nas cancerosidades do organism o!

Falar som ente um a linguagem rouca.

Um português cansado e incom preensível, Vom itar o pulm ão na noite horrível

Em que se deita sangue pela boca!

Expulsar, aos bocados, a existência Num a bacia autôm ata de barro, Alucinado, vendo em cada escarro

O retrato da própria consciência!

Querer dizer a angústia de que é pábulo E com a respiração j á m uito fraca Sentir com o que a ponta de um a faca, Cortanto as raízes do últim o vocábulo.

Não haver terapêutica que arranque Tanta opressão com o se, com efeito, Lhe houvessem sacudido sobre o peito

A m áquina pneum ática de Bianchi!

E o ar fugindo e a Morte a arca da tum ba A erguer, com o um cronôm etro gigante Marcando a transição em ocionante Do lar m aterno para a catacum ba!

Mas vos não lam enteis, m agras m ulheres, Nos ardores danados da febre hética,

Consagrando vossa últim a fonética A um a recitação de m esereres.

Antes levardes ainda um a quim era Para a garganta om nívora das laj es Do que m orrerdes, hoj e, urrando ultraj es

Contra a dissolução que vos espera!

Porque a m orte, resfriando-vos o rosto, Consoante a m inha concepção vesânica, É a alfândega, onde toda a vida orgânica Há de pagar um dia o últim o im posto!

(41)

IV

Com eçara a chover. Pelas algentes Ruas, a água, em cachoeiras desobstruídas

Encharcava os buracos das feridas, Alagava a m edula dos Doentes!

Do fundo do m eu trágico destino, Onde a Resignação os braços cruza,

Saía, com o vexam e de um a fusa, A m ágoa gaguej ada de um cretino.

Aquele ruído obscuro de gagueira Que à noite, em sonhos m órbidos, m e acorda,

Vinha da vibração bruta da corda Mais recôndita da alm a brasileira!

Aturdia-m e a tétrica m iragem De que, naquele instante, no Am azonas,

Fedia, entregue a vísceras glutonas, A carcaça esquecida de um selvagem .

A civilização entrou na taba Em que ele estava. O gênio de Colom bo Manchou de opróbrios a alm a do m azom bo,

Cuspiu na cova do m orubixaba!

E o índio, por fim , adstrito à étnica escória, Recebeu, tendo o horror no rosto im presso, Esse achincalham ento do progresso Que o anulava na crítica da História!

Com o quem analisa um a apostem a, De repente, acordando na desgraça, Viu toda a podridão de sua raça...

Na tum ba de Iracem a!...

(42)

Ah! Tudo, com o um lúgubre ciclone, Exercia sobre ela ação funesta Desde o desbravam ento da floresta

à ultraj ante invenção do telefone.

E sentia-se pior que um vagabundo Microcéfalo vil que a espécie encerra,

Desterrado na sua própria terra, Dim inuído na crônica do m undo!

A hereditariedade dessa pecha Seguiria seus filhos. Dora em diante

Seu povo tom baria agonizante Na luta da espingarda contra a flecha!

Veio-lhe então com o à fêm ea vêm antoj os.

Um a desesperada ânsia im profícua De estrangular aquela gente iníqua Que progredia sobre os seus despoj os!

Mas, diante a xantocróide raça loura, Jazem , caladas, todas as inúbias, E agora, sem difíceis nuanças dúbias,

Com um a clarividência aterradora, Em vez da prisca tribo e indiana tropa

A gente deste século, espantada, Vê som ente a caveira abandonada De um a raça esm agada pela Europa!

V

Era a hora em que arrastados pelos ventos, Os fantasm as ham léticos dispersos Atiram na consciência dos perversos A som bra dos rem orsos fam ulentos.

(43)

As m ães sem coração rogavam pragas Aos filhos bons. E eu, roído pelos m edos,

Batia com o pentágono dos dedos Sobre um fundo hipotético de chagas!

Diabólica dinâm ica daninha Oprim ia m eu cérebro indefeso Com a força onerosíssim a de um peso Que eu não sabia m esm o de onde vinha.

Perfurava-m e o peito a áspera pua do desânim o negro que m e prostra, E quase a todos os m om entos m ostra

Minha caveira aos bêbedos da rua.

Hereditariedades politípicas Punham na m inha boca putrescível Interj eições de abracadabra horrível E os verbos indignados das Filípicas.

Todos os vocativos dos blasfem os, No horror daquela noite m onstruosa,

Maldiziam , com voz estentorosa, A peçonha inicial de onde nascem os.

Com o que havia na ânsia de conforto De cada ser, ex.: o hom em e o ofídio,

Um a necessidade de suicídio E um desej o incoercível de ser m orto!

Naquela angústia absurda e tragicôm ica Eu chorava, rolando sobre o lixo, Com a contorção neurótica de um bicho

Que ingeriu 30 gram as de noz-vôm ica.

E, com o um hom em doido que se enforca, Tentava, na terráquea superfície, Consubstanciar-m e todo com a im undície,

Confundir-m e com aquela coisa porca!

(44)

Vinha, às vezes, porém , o anelo instável De, com o auxílio especial do osso m asséter

Mastigando hom eom érias neutras de éter Nutrir-m e da m atéria im ponderável.

Anelava ficar um dia, em sum a, Menor que o anfióxus e inferior à tênia,

Reduzido à plastídula hom ogênea, Sem diferenciação de espécie algum a.

Era (nem sei em síntese o que diga) Um velhíssim o instinto atávico, era A saudade inconsciente da m onera Que havia sido m inha m ãe antiga.

Com o horror tradicional da raiva corsa Minha vontade era, perante a cova, Arrancar do m eu próprio corpo a prova

Da persistência trágica da força.

A pragm ática m á de hum anos usos Não com preende que a Morte que não dorm e

É a absorção do m ovim ento enorm e Na dispersão dos átom os difusos.

Não m e incom oda esse últim o abandono Se a carne individual hoj e apodrece

Am anhã, com o Cristo, reaparece Na universalidadej do c arbono!

A vida vem do éter que se condensa Mas o que m ais no Cosm os m e entusiasm a

É a esfera m icroscópica do plasm a Fazer a luz do cérebro que pensa.

Eu voltarei, cansado, da árdua liça À substância inorgânica prim eva De onde, por epigênese, veio Eva E a stirpe radiolar cham ada Actissa.

Quando eu for m isturar-m e com as violetas

(45)

Minha lira, m aior que a Bíblia e a Fedra Reviverá, dando em oção à pedra Na acústica de todos os planetas!

VI

À álgida agulha, agora, alva, a saraiva Caindo, análoga era... Um cão agora Punha a atra língua hidrófoba de fora Em contrações m iológicas de raiva.

Mas, para além , entre oscilantes cham as, Acordavam os bairros da luxúria...

As prostitutas, doentes de hem atúria, Se extenuavam nas cam as.

Um a, ignóbil, derreada de cansaço, Quase que escangalhada pelo vício, Cheirava com prazer no sacrifício

A lepra m á que lhe roía o braço!

E ensangüentava os dedos da m ão nívea Com o sentim ento gasto e a em oção pobre,

Nessa alegria bárbara que cobre Os saracoteam entos da lascívia...

De certo, a perversão de que era presa o sensorium daquela prostituta Vinha da adaptação quase absoluta À am biência m icrobiana da baixeza!

Entanto, virgem fostes, e, quando o éreis, Não tínheis ainda essa erupção cutânea,

Nem tínheis, vítim a últim a da insânia, Duas m am árias glândulas estéreis!

Ah! Certam ente não havia ainda

(46)

Rom pido, com violência, no horizonte, O sol m alvado que secou a fonte

De vossa castidade agora finda!

Talvez tivésseis fom e, e as m ãos, em balde, Estendestes ao m undo, até que, à-toa,

Fostes vender a virginal coroa Ao prim eiro bandido do arrabalde.

E estais velha! -- De vós o m undo é farto, E hoj e, que a sociedade vos enxota, Som ente as bruxas negras da derrota Freqüentam diariam ente vosso quarto!

prom etem -vos (quem sabe?!) entre os ciprestes Longe da m ancebia dos alcouces, Nas quietudes nirvânicas m ais doces O noivado que em vida não tivestes!

VII

Quase todos os lutos conj ugados, Com o um a associação de m onopólio,

Lançavam pinceladas pretas de óleo Na arquitetura arcaica dos sobrados.

Dentro da noite funda um braço hum ano Parecia cavar ao longe um poço Para enterrar m inha ilusão de m oço, Com o a boca de um poço artesiano!

Atabalhoadam ente pelos becos, Eu pensava nas coisas que perecem , Desde as m usculaturas que apodrecem

À ruína vegetal dos lírios secos.

Cism ava no propósito funéreo

(47)

Da m osca debochada que farej a O defunto, no chão frio da igrej a, E vai depois levá-lo ao cem itério!

E esfregando as m ãos m agras, eu, inquieto, Sentia, na craniana caixa tosca,

A racionalidade dessa m osca, A consciência terrível desse inseto!

Regougando, porém , argots e alj âm ias, Com o quem nada encontra que o perturbe,

A energúm ena gei dos ébrios da urbe Festej ava seu sábado de infâm ias.

A estática fatal das paixões cegas, Rugindo fundam ente nos neurônios,

Puxava aquele povo de dem ônios Para a prom iscuidade das adegas.

E a ébria turba que escaras suj as m asca, À falta idiossincrásica de escrúpulo, Absorvia com gáudio absinto, lúpulo E outras substâncias tóxicas da tasca.

O ar am biente cheirava a ácido acético, Mas, de repente, com o ar de quem em pesta,

Apareceu, escorraçando a festa, A m andíbula inchada de um m orfético!

Saliências polim órficas verm elhas, Em cuj o aspecto o olhar perspícuo prendo, Punham -lhe num destaque horrendo o horrendo

Tam anho aberratório das orelhas.

O fácies do m orfético assom brava!

-- Aquilo era um a negra eucaristia, Onde m inh’alm a inteira surpreendia A Hum anidade que se lam entava!

Era todo o m eu sonho, assim inchado, Já podre, que a m orféia m iserável

(48)

Tornava às im pressões táteis, palpável, Com o se fosse um corpo organizado!

VIII

Em torno a m im , nesta hora, estriges voam , E o cem itério, em que eu entrei adrede, Dá-m e a im pressão de um boulevard que fede,

Pela degradação dos que o povoam . Quanta gente, roubada à hum ana coorte

Morre de fom e, sobre a palha espessa, Sem ter, com o Ugolino, um a cabeça Que possa m astigar na hora da m orte E nua, após baixar ao caos budista, Vem para aqui, nos braços de um canalha

porque o m adapolão para a m ortalha Custa 1$200 ao loj ista!

Que resta das cabeças que pensaram ?!

E afundado nos sonhos m ais nefastos, Ao pegar num m ilhão de m iolos gastos,

Todos os m eus cabelos se arrepiaram . Os evolucionistas benfeitores Que por entre os cadáveres cam inham ,

iguais a irm ãs de caridade, vinham Com a podridão dar de com er às flores!

Os defuntos então m e ofereciam Com as articulações das m ãos inerm es, Num prato de hospital, cheio de verm es, Todos os anim ais que apodreciam ! É possível que o estôm ago se afoite (Muito em bora contra isto a alm a se irrite)

(49)

A cevar o antropófago apetite, Com endo carne hum ana, à m eia-noite!

Com um a ilim itadíssim a tristeza, Na im paciência do estôm ago vazio,

Eu devorava aquele bolo frio Feito das podridões da Natureza!

E hirto, a cam isa suada, a alm a aos arrancos, Vendo passar com as túnicas obscuras,

As escaveiradíssim as figuras Das negras desonradas pelos brancos;

Pisando, com o quem salta, entre fardos, Nos corpos nus das m oças hotentotes Entregues, ao clarão de alguns archotes,

À sodom ia indigna dos m oscardos;

Eu m aldizia o deus de m ãos nefandas Que, transgredindo a igualitária regra Da Natureza, atira a raça negra Ao contubérnio diário das quitandas!

Na evolução de m inha dor grotesca, Eu m endigava aos verm es insubm issos

Com o indenização dos m eus serviços, O benefício de um a cova fresca.

Manhã. E eis-m e a absorver a luz de fora, Com o o íncola do pólo ártico, às vezes,

Absorve, após a noite de seis m eses, Os raios caloríficos da aurora.

Nunca m ais as goteiras cairiam Com o propositais setas m alvadas, No frio m atador das m adrugadas, Por sobre o coração dos que sofriam ! Do m eu cérebro à absconsa tábua rasa Vinha a luz restituir o antigo crédito, Proporcionando-m e o prazer inédito,

(50)

De quem possui um sol dentro de casa.

Era a volúpia fúnebre que os ossos Me inspiravam , trazendo-m e ao sol claro,

À apreensão fisiológica do faro O odor cadaveroso dos destroços!

IX

O inventário do que eu j á tinha sido Espantava. Restavam só de Augusto A form a de um m am ífero vetusto E a cerebralidade de um vencido!

O gênio procriador da espécie eterna Que m e fizera, em vez de hiena ou lagarta,

Um a sobrevivência de Sidarta, Dentro da filogênese m oderna;

E arrancara m ilhares de existências Do ovário ignóbil de um a fauna im unda,

Ia arrastando agora a alm a infecunda Na m ais triste de todas as falências.

No céu calam itoso de vingança Desagregava, déspota e sem norm as,

O adesionism o biôntico das form as Multiplicadas pela lei da herança!

A ruína vinha horrenda e deletéria Do subsolo infeliz, vinha de dentro Da m atéria em fusão que ainda há no centro,

Para alcançar depois a periferia!

Contra a Arte, oh! Morte, em vão teu ódio exerces!

Mas, a m eu ver, os sáxeos prédios tortos Tinham aspectos de edifícios m ortos,

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Decom pondo-se desde os alicerces!

A doença era geral, tudo a extenuar-se Estava. O Espaço abstrato que não m orre Cansara... O ar que, em colônias fluídas, corre,

Parecia tam bém desagregar-se!

O prodrom os de um tétano m edonho Repuxavam -m e o rosto... Hirto de espanto,

Eu sentia nascer-m e n’alm a, entanto, O com eço m agnífico de um sonho!

Entre as form as decrépitas do povo, Já batiam por cim a dos estragos A sensação e os m ovim entos vagos Da célula inicial de um Cosm os novo!

O letargo larvário da cidade Crescia. Igual a um parto, num a furna,

Vinha da original treva noturna, o vagido de um a outra Hum anidade!

E eu, com os pés atolados no Nirvana, Acom panhava, com um prazer secreto,

A gestação daquele grande feto, Que vinha substituir a Espécie Hum ana!

(52)

ASA DE CORVO

Asa de corvos carniceiros, asa De m au agouro que, nos doze m eses, Cobre às vezes o espaço e cobre às vezes

O telhado de nossa própria casa...

Perseguido por todos os reveses, É m eu destino viver j unto a esa asa, Com o a cinza que vive j unto à brasa, Com o os Goncourts, com o os irm ãos siam eses!

É com essa asa que eu faço este soneto E a indústria hum ana faz o pano preto

Que as fam ílias de luto m artiriza...

É ainda com essa asa extraordinária Que a Morte -- a costureira funerária --

Cose para o hom em a últim a cam isa!

UMA NOITE NO CAIRO

Noite no Egito. O céu claro e produndo Fulgura. A rua é triste. A Lua cheia Está sinistra, e sobre a paz do m undo

A alm a dos Faraós anda e vagueia.

Os m astins negros vão ladrando à lua...

O Cairo é de um a form osura arcaica.

No ângulo m ais recôndito da rua Passa cantando um a m ulher hebraica.

O Egito é sem pre assim quando anoitece!

Às vezes, das pirâm ides o quedo E atro perfil, exposto ao luar, parece

Um a som bria interj eição de m edo!

(53)

Com o um contraste àqueles m esereres, Num quiosque em festa alegre turba grita,

E dentro dançam hom ens e m ulheres Num a aglom eração cosm opolita.

Tonto do vinho, um saltim banco da Ásia, Convulso e roto, no apogeu da fúria,

Executando evoluções de razzia Solta um brado epilético de inj úria!

Em derredor dum a am pla m esa preta -- Últim a nota do conúbio infando --

Vêem -se dez j ogadores de roleta Fum ando, discutindo, conversando.

Resplandece a celeste superfície.

Dorm e soturna a natureza sábia...

Em baixo, na m ais próxim a planície, Pasta um cavalo esplêndido da Arábia.

Vaga no espaço um silfo solitário.

Troam kinnors! Depois tudo é tranqüilo...

Apenas com o um velho stradivário, Soluça toda a noite a água do Nilo!

O MARTÍRIO DO ARTISTA

Arte ingrata! E conquanto, em desalento, A órbita elipsoidal dos olhos lhe arda,

Busca exteriorizar o pensam ento Que em suas fronetais células guarda!

Tarda-lhe a Idéia! A inspiração lhe tarda!

E ei-lo a trem er, rasga o papel, violento, Com o o soldado que rasgou a farda

No desespero do últim o m om ento!

(54)

Tenta chorar e os olhos sente enxutos!...

É com o o paralítico que, à m íngua Da própria voz e na que ardente o lavra Febre de em vão falar, com os dedos brutos

Para falar, puxa e repuxa a língua, E não lhe vem à boca um a palavra!

DUAS ESTROFES

(À memória de João de Deus) Ahi! ciechi! il tanto affaticar che giova?

Tutti torniam o alla gran m adre antica E il nostro nom e appena si ritrova.

Petrarca A queda do teu lírico arrabil De um sentim ento português ignoto Lem bra Lisboa, bela com o um brinco,

Que um dia no ano trágico de m il E setecentos e cinqüenta e cinco, Foi abalada por um terrem oto!

A água quieta do Tej o te abençoa.

Tu representas toda essa Lisboa De glórias quase sobrenaturais, Apenas com um a diferença triste, Com a diferença que Lisboa existe E tu, am igo, não existes m ais!

O MAR, A ESCADA E O HOMEM

“Olha agora, m am ífero inferior,

“À luz da espicurista ataraxia,

(55)

“O fracasso de tua geografia

“E do teu escafandro esm iuçador!

“Ah! Jam ais saberás ser superior,

“Hom em , a m im , conquanto ainda hoj e em dia,

“Com a am pla hélice auxiliar com que outrora ia

“Voando ao vento o vastíssim o vapor.

“Rasgue a água hórrida a nau árdega e singre-m e!”

E a verticalidade da Escada íngrem e:

“Hom em , j á transpuseste os m eus degraus?!”

E Augusto, o Hércules, o Hom em , aos soluços, Ouvindo a Escada e o Mar, caiu de bruços

No pandem ônio aterrador do Caos!

DECADÊNCIA

Iguais às linhas perpendiculares Caíram , com o cruéis e hórridas hastas,

Nas suas 33 vértebras gastas Quase todas as pedras tum ulares!

A frialdade dos círculos polares, Em sucessivas atuações nefastas, Penetrara-lhe os próprios neuroplastas,

Estragara-lhe os centros m edulares!

Com o quem quebra o obj eto m ais querido E com eça a apanhar piedosam ente

Todas as m icroscópicas partículas, Ele hoj e vê que, após tudo perdido, Só lhe restam agora o últim o doente E a arm ação funerária das clavículas!

(56)

RICORDANZA DELLA MIA G IOVENTÚ

A m inha am a-de-leite Guilherm ina Furtava as m oedas que o Doutor m e dava.

Sinhá-Mocinha, m inha Mãe, ralhava...

Via naquilo a m inha própria ruína!

Minha am a, então, hipócrita, afetava Susceptibilidade de m enina:

“-- Não, não fora ela! --“ E m aldizia a sina, Que ela absolutam ente não furtava.

Vej o, entretanto, agora, em m inha cam a, Que a m im som ente cabe o furto feito...

Tu só furtaste a m oeda, o ouro que brilha.

Furtaste a m oeda só, m as eu, m inha am a, Eu furtei m ais, porque furtei o peito

Que dava leite para a tua filha!

A UM MASCARADO

Rasga essa m áscara ótim a de seda E atira-a à arca ancestral dos palim psestos...

É noite, e, à noite, a escândalos e incestos É natural que o instinto hum ano aceda!

Sem que te arranquem da garganta queda A interj eição danada dos protestos, Hás de engolir, igual a um porco, os restos

Dum a com ida horrivelm ente azeda!

A sucessão de hebdôm adas m edonhas Reduzirá os m undos que tu sonhas

(57)

Ao m icrocosm os do ovo prim itivo...

E tu m esm o, após a árdua e atra refrega, Terás som ente um a vontade cega E um a tendência obscura de ser vivo!

VOZES DE UM TÚMULO

Morri! E a Terra -- a m ãe com um -- o brilho Destes m eus olhos apagou!... Assim Tântalo, aos reais convivas, num festim ,

Serviu as carnes do seu próprio filho!

Por que para este cem itério vim ?!

Por que?! Antes da vida o angusto trilho Palm ilhasse, do que este que palm ilho E que m e assom bra, porque não tem fim !

No ardor do sonho que o fronem a exalta Construí de orgulho ênea pirâm ide alta...

Hoj e, porém , que se desm oronou A pirâm ide real do m eu orgulho, Hoj e que apenas sou m atéria e entulho

Tenho consciência de que nada sou!

CONTRASTES

A antítese do novo e do obsoleto, O Am or e a Paz, o Ódio e a Carnificina, O que o hom em am a e o que o hom em abom ina,

Tudo convém para o hom em ser com pleto!

(58)

O ângulo obtuso, pois, e o ângulo reto, Um a feição hum ana e outra divina São com o a exim enina e a endim enina Que servem am bas para o m esm o feto!

Eu sei tudo isto m ais do que o Eclesiastes!

Por j ustaposição destes contrastes, Junta-se um hem isfério a outro hem isfério,

Às alegrias j untam -se as tristezas, E o carpinteiroque fabrica as m esas Faz tam bém os caixões do cem itério!...

(59)

G EMIDOS DE ARTE I

Esta desilusão que m e acabrunha É m ais traidora do que o foi Pilatos!...

Por causa disto, eu vivo pelos m atos, Magro, roendo a substância córnea de unha.

Tenho estrem ecim entos indecisos E sinto, haurindo o tépido ar sereno, O m esm o assom bro que sentiu Parfeno Quando arrancou os olhos de Dionisos!

Em giro e em redem oinho em m im cam inham Ríspidas m ágoas estranguladoras, Tais quais, nos fortes fulcros, as tesouras Brônzeas, tam bém gira e redem oinham . Os pães -- filhos legítim os dos trigos -- Nutrem a geração do Ódio e da Guerra.

Os cachorros anônim os da terra São talvez os m eus únicos am igos!

Ah! Por que desgraçada contingência À híspida aresta sáxea áspera e abrupta

Da rocha brava, num a ininterrupta Adesão, não prendi m inha existência?!

Por que Jeová, m aior do que Laplace, Não fez cair o túm ulo de Plínio Por sobre todo o m eu raciocínio Para que eu nunca m ais raciocinase?!

Pois m inha Mãe tão cheia assim daqueles Carinhos, com que guarda m eus sapatos, Por que m e deu consciência dos m eus atos

Para eu m e arrepender de todos eles?!

Quisera antes, m ordendo glabros talos,

(60)

Nabucodonosor ser do Pau d’Arco, Beber a acre e estagnada água do charco,

Dorm ir na m anj edoura com os cavalos!

Mas a carne é que é hum ana! A alm a é divina.

Dorm e num leito de feridas, goza O lodo, apalpa a úlcera cancerosa, Beij a a peçonha, e não se contam ina!

Ser hom em ! escapar de ser aborto!

Sair de um vente inchado que se anoj a, Com prar vestidos pretos num a loj a E andar de luto pelo pai que é m orto!

E por trezentos e sessenta dias Trabalhar e com er! Martírios j untos!

Alim entar-se dos irm ãos defuntos, Chupar os ossos das alim arias!

Barulho de m andíbulas e abdôm ens!

E vem -m e com um desprezao por tudo isto Um a vontade absurda de ser Cristo Para sacrificar-m e pelos hom ens!

Soberano desej o! Soberana Am bição de construir para o hom em um a

Região, onde não cuspa língua algum a O óleo rançoso da saliva hum ana!

Um a região sem nódoas e sem lixos, Subtraída à hediondez de ínfim o casco,

Onde a forca feroz com a o carrasco E o olho do estuprador se encha de bichos!

Outras constelações e outros espaços Em que, no agudo grau da últim a crise,

O braço do ladrão se paralise E a m ão da m eretriz caia aos pedaços!

(61)

II

O sol agora é de um fulgor com pacto, E eu vou andando, cheio de cham usco, Com a flexibilidade de um m olusco, Úm ido, pegaj oso e untuoso ao tacto!

Reúnam -se em rebelião ardente e acesa Todas as m inhas forças em otivas E arm em ciladas com o cobras vivas

Para despedaçar m inha tristeza!

O sol de cim a espiando a flora m oça Arda, fustigue, queim e, corte, m orda!...

Deleito a vista na verdura gorda Que nas hastes delgadas se balouça!

Avisto o vulto das som brias granj as Perdidas no alto... Nos terrenos baixos,

Das laranj eiras eu adm iro os cachos E a am pla circunferência das laranj as.

Ladra furiosa a tribo dos podengos.

Olhando para as pútridas charnecas Grita o exército avulso das m arrecas Na úm ida copa dos bam bus verdoengos.

Um pássaro alvo artífice da teia De um ninho, salta, no árdego trabalho, De árvore em árvore e de galho em galho,

Com a rapidez dum a sem icolcheia.

Em grandes sem icírculos aduncos, Entrançados, pelo ar, largando pêlos,

Voam à sem elhan ça de cabelos Os chicotes finíssim os dos j uncos.

Os ventos vagabundos batem , bolem Nas árvores. O ar cheira. A terra cheira...

E a alm a dos vegetais rebenta inteira

(62)

De todos os corpúsculos do pólen.

A câm ara nupcial de cada ovário Se abre. No chão coleia a lagartixa.

Por toda a parte a seiva bruta esguicha Num extravasam ento involuntário.

Eu, depois de m orrer, depois de tanta Tristeza, quero, em vez do nom e -- Augusto,

Possuir aí o nom e dum arbusto Qualquer ou de qualquer obscura planta!

III

Pelo acidentalíssim o cam inho Faísca o sol. Nédios, batendo a cauda, Urram os bois. O céu lem bra um a lauda

Do m ais incorruptível pergam inho.

Um a atm osfera m á de incôm oda hulha Abafa o am biente. O aziago ar m orto a m orte

Fede. O ardente calor da areia forte Racha-m e os pés com o se fosse agulha.

Não sei que subterrânea e atra voz rouca, Por saibros e por cem côncavos vales,

Com o pela avenida das Mappales, Me arrasta à casa do finado Toca!

Todas as tardes a esta casa venho.

Aqui, outrora, sem conchego nobre, Viveu, sentiu e am ou este hom em pobre

Que carregava canas para o engenho!

Nos outros tem pos e nas outras eras, Quantas flores! Agora, em vez de flores,

Os m usgos, com o exóticos pintores,

(63)

Pintam caretas verdes nas taperas.

Na bruta dispersão de vítreos cacos, À dura luz do sol resplandecente, Trôpega e antiga, um a parede doente

Mostra a cara m edonha dos buracos.

O cupim negro broca o âm ago fino Do teto. E traça trom bas de elefantes Com as circunvoluções extravagantes Do seu com plicadíssim o intestino.

O lodo obscuro trepa-se nas portas.

Am ontoadas em grossos feixes rij os, As lagartixas, dos esconderij os, Estão olhando aquelas coisas m ortas!

Fico a pensar no Espírito disperso Que, unindo a pedra ao gneiss e a árvore à criança,

Com o um anel enorm e de aliança, Une todas as coisas do Universo!

E assim pensando, com a cabeça em brasas Ante a fatalidade que m e oprim e,

Julgo ver este Espírito sublim e, Cham ando-m e do sol com as suas asas!

Gosto do sol ignívom o e iracundo Com o o réptil gosta quando se m olha

E na atra escuridão dos ares, olha Melancolicam ente para o m undo!

Essa alegria im aterializada, Que por vezes m e absorve, é o óbolo obscuro,

É o pedaço j á podre de pão duro Que o m iserável recebeu na estrada!

Não são os cinco m il m ilhões de francos Que a Alem anha pediu a Jules Favre...

É o dinheiro coberto de azinhavre Que o escravo ganha, trabalhando aos brancos!

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