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G OZO INSATISFEITO

No documento Eu e Outras Poesias Augusto dos Anjos (páginas 156-162)

Entre o gozo que aspiro, e o sofrim ento De m inha m ocidade, experim ento O m ais profundo e abalador atrito...

Queim am -m e o peito cáusticos de fogo Esta ânsia de absoluto desafogo Abrange todo o círculo infinito.

Na insaciedade desse gozo falho Busco no desespero do trabalho, Sem um dom ingo ao m enos de repouso,

Fazer parar a m áquina do instinto, Mas, quanto m ais m e desespero, sinto

A insaciabilidade desse gozo!

DOLÊNCIAS

Oh! Lua m orta de m inha vida,

Os sonhos m eus Em vão te buscam , andas perdida E eu ando em busca dos rastos teus...

Vago sem crenças, vagas sem norte, Cheia de brum as e enegrecida, Ah! Se m orreste pra m inha vida!

Vive, consolo de m inha m orte!

Baixa, portanto, coração erm o De lua fria À plaga triste, plaga som bria Dessa dor lenta que não tem term o.

Tu que tom baste no caos extrem o Da Noite im ensa do m eu Passado, Sabes da angústia do torturado...

Ah! Tu bem sabes por que é que eu gem o!

Instilo m ágoas saudoso, e enquanto Planto saudades num cam po m orto, Ninguém ao m enos dá-m e um conforto,

Um só ao m enos! E no entretanto Ninguém m e chora! Ah! Se eu tom bar

Cedo na lida...

Oh! Lua fria vem m e chorar Oh! Lua m orta da m inha vida!

IDEALIZAÇÕES

A Santos Neto

I

Em vão flam ej a, rubro, ígneo, sangrento O sol, e, fulvos, aos astrais desígnios,

Raios flam ej am e fuzilam ígneos, Nas chispas fulvas de um vulcão violento!

É tudo em vão! Atrás da luz dourada, Negras, pom peiam (triste m aldição!) -- Asas de corvo pelo coração...

-- Crepúsculo fatal vindo do Nada!

Que im porta o Sol! A Treva, a Som bra -- eis tudo!

E no m eu peito condenada treva --A som bra desce, e o m eu pesar se eleva

E chora e sangra, m udo, m udo, m udo...

E há no m ei peito -- ocaso nunca visto, Martirizado porque nunca dorm e As Sete Chagas dum m artírio enorm e, E os Sete Passos que m agoaram Cristo!

II

Agora dorm e o astro de sangue e de ouro Com o um sultão cansado! As nuvens com o

Odaliscas, da Noite ao negro assom o Beij am -lhe o corpo ensangüentado d’ouro.

Legiões de névoas m ortas e finadas

Com o fragm entações d’ouro e basalto Lem bram guirlandas pom peando no Alto

Eterizadas, volaterizadas.

E a Noite em erge, santa e vitoriosa Dente um velarium de veludos. Atros, Descem os nim bos... No ar há m alabatros

Turiferando a negridão tediosa.

Além , dourando as névoas dos espaços, Na m aj estade dum condor bendito,

Subindo à m aj estade do Infinito, A Via-Láctea vai abrindo os braços!

Áureas estrelas, alvas, lum inosas, Trazem no peito o branco das m anhãs

E dorm em brancas com o leviatãos Sobre o oceano astral das nebulosas.

Eu am o a noite que este Sol arranca!

Nam oro estrelas... Sírius m e deslum bra, Vésper m e encanta, e eu beij o na penum bra

A im agem lirial da Noite Branca.

III

De novo, a Aurora, entre esplendores, há-de Alva, se erguer, com o tom bou outrora, E com o a Aurora -- o Sol -- hóstia da Aurora,

Abençoada pela Eternidade!

E ei-lo de novo, ontem m oribundo, Hoj e de novo, curvo ao seu destino, Fantástico, ciclópico, assassino Ébrio de fogo, dom inando o m undo!

Mas de que serve o Sol, se triste em cada

Raio que tom ba no m arnel da terra, Mais em m eu peito um a ilusão se enterra, Mais em m inh’alm a um desespero brada?!

De que serve, se, à luz áurea que dele Em ana e estua e se refrange e ferve, A Mágoa ferve e estua, de que serve Se é desespero e m aldição todo ele?!

Pois, de que serve, se aclarandoos cerros E engalanando os arvoredos gaios, A alm a se abate, com o se esses raios N’alm a caindo, se tornassem ferros?!

IV

Poeta, em vão na luz do sol te inflam as, E nessa luz queim as-te em vão! És todo pó, e hás de ser após as cham as, lodo, Com o Herculanum foi após as cham as.

Ah! Com o tu, em lodo tudo acaba, O leão, o tigre, o m astodonte, a lesm a, Tudo por fim há de acabar na m esm a Tênebra que hoj e sobre ti desaba.

Ninguém se exim e dessa lei im ensa Que, em plena e fulva reverberação,

Arrasta as alm as pela Escuridão, E arrasta os corações pela Descrença.

Ergue, pois poeta, um pedestal de tanta Treva e dor tanta, e num suprem o e insano E extraordinário e grande e sobre-hum ano Esforço, sobre ao pedestal, e... canta!

Canta a Descrença que passou cortanto

As tuas ilusões pelas raízes, E em vez de chagas e de cicatrizes Deixar, foi valas funerais deixando.

E foi deixando essas funéreas, frias, Medonhas valas, onde, com o abutres Medonhos, de ossos, de ilusões te nutres,

Vives de cinzas e de ruinarias!

V

Agora é noite! E na estelar coorte, Com o recordação da festa diurna, Gem e a pungente orquestração noturna

E chora a fanfarra triunfal da Morte.

Então, a Lua que no céu se espalha, Ilum inando as serranias, banha As serranias dum a luz estranha, Alva com o um pedaço de m ortalha!

Nessa m úsica que a alm a m e ilum ina Tento esquecer as m inhas próprias dores,

Canto, e m inh’alm a cobre-se de flores -- Fera rendida à m úsica divina.

Harpas concertam ! Brandas m elodias Plangem ... Silêncio! Mas de novo as harpas

Reboam pelo m ar, pelas escarpas, Pelos rochedos, pelas penedias...

Eu am o a Noite que este Sol arranca!

Nam oro estrelas... Sírius m e deslum bra, Vésper m e encanta, e eu beij o na penum bra

A im agem lirial da Noite Branca!

No documento Eu e Outras Poesias Augusto dos Anjos (páginas 156-162)

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