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Já se sabe, através da obra crítica do próprio Calvino, e também por outros trabalhos que se propõem a estudar Palomar, que a obra é dividida por categorias temáticas. Essa divisão se dá de forma sistêmica, matemática, em que capítulos contemplam subcapítulos que, por sua vez, guardam “sub-sub-capítulos”. Além disso, as três grandes partes concentram divisões de experiências – na primeira, a observação; na segunda, a descrição; na terceira, a reflexão. Tal divisão pode ocorrer porque, segundo Castro (2007), alguns dos romances de Calvino “nascem com a característica de ser modulares, isto é, podem ser lidos tanto linearmente, pois constam de uma evolução longitudinal [...], como podem ser lidos não linearmente, saltando os capítulos, transpondo sessões e índices” (CASTRO, 2007, p. 19).

Embora em italiano a classificação de Palomar seja romanzo e não racconti (uma reunião de contos, de histórias), não existe um enredo que perpasse todos os “episódios” da obra. Porém, há uma interligação entre eles que pode ser verificada na estrutura e na composição da personagem. Na estrutura, porque temos uma narrativa dividida em partes e, nessas partes, são evidenciados a) lugares onde ocorrem as experiências e b) a composição em episódios, deixando evidente o deslocamento da personagem, uma “ação indireta”, na qual se constata o movimento do ir que no entanto revela atitudes que se concentram no campo do pensamento. Na construção da personagem, porque apesar de não haver um enredo que interligue estruturalmente os episódios ou contos, há uma articulação dos momentos da vida da personagem, o que nos leva a pensar numa composição de trajetória (vida, experiências, etc).

39 “de um lado o caráter taciturno e de outro a aplicação de uma “leitura de mundo” nos seus aspectos não linguísticos”.

A primeira coisa que notamos ao olhar o sumário como um todo é que os subcapítulos estão, em sua maioria, indicando uma localização espacial, ou seja, Calvino está trabalhando uma personagem “em movimento” no sentido da diversificação espacial. Logo, o senhor Palomar está na praia, no jardim, no terraço, na cidade, no zoológico, em lojas, etc.

Essas categorias funcionam como recortes espaciais que mimeticamente representam o mundo dentro de um espaço maior já definido, que é a cidade, com exceção de “As viagens de Palomar”, que mesmo estando fora de cidades diferentes de Roma, Paris e Barcelona, as cidades citadas no livro, contribui para que neste capítulo Palomar visite grandes civilizações. Para falar dessa cidade que Palomar habita, Calvino se utiliza de duas referências cosmopolitas e também pessoais, que estão diluídas na cidade-cidade ou cidade-mundo de Palomar.

O foco narrativo escolhido para contar a história do senhor Palomar ocorre através do narrador em 3ª pessoa. Tal escolha se aproxima do que fala Benjamin (1994) acerca da experiência vivida para narrar, da transposição da narrativa oral para o romance. Apesar de não termos aqui um narrador em 1ª pessoa, o que existe é basicamente uma representação de Palomar através do narrador, ao mesmo tempo em que toma distância a partir do foco escolhido. Esse afastamento que possui para descrever é o mesmo afastamento de que a personagem se utiliza ao se posicionar num lugar de estranhar o que observa. Sendo assim, o narrador é propositalmente pensado quase que para assumir o lugar de Palomar no sentido da neutralidade com que vê as coisas. O foco narrativo é construído de forma a ajudar o leitor a enveredar por entendimentos que sejam os mais múltiplos, para que a interpretação escape de uma mão única ou de determinado espectro de possibilidades. Todavia o narrador, a par dos pensamentos e sensações de Palomar, às vezes crítico e às vezes complacente quanto a isso, nos ajuda a traçar uma personalidade para a personagem. Passemos, agora, para as análises.

Em Leitura de uma onda, Palomar possui um objetivo, que é observar uma onda apenas. Evita o “vago” da contemplação e delimita seu objetivo. Há relações com o tempo: enquanto contemplar é associado a um ato rápido, observar requer certa demora. A personagem sente dificuldade em isolar a parte do todo, ou seja, há um encadeamento, uma sequência no movimento das ondas; é também uma relação matemática, pois a onda existe sozinha, mas também enquanto conjunto de ondas. A sucessão das ondas que batem na praia forma a imagem que ele quer ver, a imagem de uma onda só. São necessárias várias para que ele perceba como é o movimento de uma, apenas: “Infine non sono "le onde" che lui intende

guardare, ma un'onda singola e basta: volendo evitare le sensazioni vaghe, egli si prefigge per ogni suo atto un oggetto limitato e preciso” (CALVINO, 2017, p. 5)41.

Aqui já surgem as indicações do “homem nervoso” que o senhor Palomar é; inclusive, é o primeiro sintoma de modernidade apontado. Palomar busca reduzir sua relação com o mundo e por isso mantém suas sensações sob controle: explorar é querer esse controle também sobre o mundo, que demonstra uma preocupação científica. Na descrição da percepção da onda, é como se Palomar estivesse embarcado nas grandes navegações, porém ancorado na praia:

La gobba dell'onda venendo avanti è di lì che comincia a rimboccarsi di bianco. Se ciò avviene a una certa distanza da riva, la schiuma ha il tempo d'avvolgersi su se stessa e scomparire di nuovo come inghiottita e nello stesso momento tornare a invadere tutto, ma stavolta spuntando da sotto, come un tappeto bianco che risale la sponda per accogliere l'onda che arriva. Però, quando ci s'aspetta che l'onda rotoli sul tappeto, ci si accorge che non c'è più l'onda ma solo il tappeto, e anche questo rapidamente scompare, diventa un luccichio d'arena bagnata che si ritira veloce, come se a respingerlo fosse l'espandersi della sabbia asciutta e opaca che avanza il suo confine ondulato (CALVINO, 2017, p. )42.

Neste capítulo temos a questão do posto de observação, que vai se repetir em outros; separa um espaço, recorta, privilegia um lugar para a investigação. Às vezes o ponto é em relação ao objeto, como nesse caso, e em outros episódios está em relação à personagem. Seu ponto de observação é apenas uma interpretação das inúmeras interpretações possíveis, uma experiência, que pode ser diferente e variar de momento e para pessoa. Palomar procura uma padronização no funcionamento das ondas e, por conseguinte, indica que transfere uma tendência de padrão para as outras coisas que observa. Atentemos para a onda como imagem efêmera, que não se sustenta nem na praia nem na imagem que Palomar forma na cabeça, o que faz com que ele devolva essa parte que extraiu do universo, apresente a efemeridade da onda e, por conseguinte, da imagem que forma na cabeça. A não fixação e o fato de não poder

41 “Em suma, não são “as ondas” que ele pretende observar, mas uma simples onda e pronto: no intuito de evitar as sensações vagas, ele predetermina para cada um de seus atos um objetivo limitado e preciso”

(CALVINO, 1994, p. 7).

42 A crista da onda vindo para a frente ergue-se num determinado ponto mais do que nos outros e é ali que começa a se preguear de branco. Se isto acontece a certa distância da praia, a espuma tem tempo de revolver- se sobre si mesma e desaparecer de novo como que tragada e no mesmo momento tornar a invadir tudo, mas desta vez surgindo de baixo, como um tapete branco que soergue a fímbria para acolher a onda que chega. Porém, quando se espera que a onda role sobre o tapete, damo-nos conta de que já não existe mais a onda, mas apenas o tapete, e mesmo esse rapidamente desaparece, torna-se uma cintilação da areia alagada que se retira veloz, como se para contê-lo houvesse um expandir-se da areia seca e opaca avançando seu rebordo

apreender o que vê causam insegurança na personagem: “Guai se l'immagine che il signor Palomar è riuscito minuziosamente a mettere insieme si sconvolge e frantuma e disperde. […] Il signor Palomar s'allontana lungo la spiaggia, coi nervi tesi com'era arrivato e ancor più insicuro di tutto” (CALVINO, 2017, p. 9)43.

O olhar e a observação estão condicionados às ações do corpo em A espada do sol. A descrição acontece a partir de dois elementos: as cores do reflexo do sol na paisagem e as texturas imaginadas por Palomar. A imagem imaterial (reflexo do sol, a espada do sol) encontra um correspondente material (espada, objeto concreto) e a manifestação da natureza em cores e formas se integra ao homem, o que é perceptível enquanto a personagem está na água. Além do mais, o adjetivo tardio atribuído a Palomar pode se referir tanto à sua maturidade quanto ao seu horário de natação:

E' l'ora in cui il signor Palomar, uomo tardivo, fa la sua nuotata serale. Entra nell'acqua, si stacca dalla riva, e il riflesso del sole diventa una spada scintillante nell'acqua che dall'orizzonte s'allunga fino a lui. Il signor Palomar nuota nella spada o per meglio dire la spada resta sempre davanti a lui, a ogni sua bracciata si ritrae, e non si lascia mai raggiungere

(CALVINO, 2017, p. 13)44.

Existe uma troca de importâncias acerca da integração entre homem e natureza: quem reverencia quem? É então que o senhor Palomar toma consciência de que o existir está associado ao pensar; toda a percepção e reflexão acerca da natureza acontecem quando o homem se dispõe a pensá-la, a questioná-la. O que ele vê não é privilégio dele, pois o evento da natureza está para todos, mas o modo como vamos tratar aquilo é o que nos diferencia. Percebemos cores, formas e textura nesta praia; em lugar de ser passagem, meio, caminho para descobertas, ela é o próprio objeto da descoberta. O ato de pensar chega várias vezes a Palomar, e ver a onda nos parece uma junção entre acontecimento real e elaboração mental:

"Tutto questo avviene non sul mare, non nel sole, - pensa il nuotatore Palomar, - ma dentro la mia testa, nei circuiti tra gli occhi e il cervello. Sto nuotando nella mia mente; è solo là che esiste questa spada di luce; e ciò che

43 “É pena que a imagem que o senhor Palomar havia conseguido organizar com tanta minúcia agora se desfigure, se fragmente e se perca. […] O senhor Palomar afasta-se ao longo da praia, com os nervos tensos

como havia chegado e ainda mais inseguro de tudo” (CALVINO, 1994, p. 11).

44 É a hora em que o senhor Palomar, homem tardio, pratica sua natação vespertina. Entra na água, afasta-se da praia, e o reflexo do sol se torna uma espada cintilante na água que do horizonte se prolonga até ele. O senhor Palomar nada na espada ou, melhor dizendo, a espada permanece sempre diante dele, retraindo-se a cada uma

mi attira è próprio questo. E' questo il mio elemento, l'unico che io possa in qualche modo conoscere" (CALVINO, 2017, p. 14)45.

Há uma transformação da coisa vista em reflexão. O não alcance da coisa vista – materialmente falando – dá a sensação de incompletude, pois ele sai do lugar da conquista de um bem ou um território de maneira física para dar lugar a uma tentativa de domínio mental, que contribui para a sua experiência, mas que como imagem é efêmera. Tal pensamento destrói as certezas do homem, pois, embora Palomar queira a experiência, também possui a angústia de não apreendê-la. Logo, a posse não é da coisa material, e sim da coisa vista, que depende dos olhos; nesse sentido, ele gostaria de apreender apenas o ato de ver que começa e se encerra em cada um.

Palomar se coloca na missão de ficar na água, pois do contrário estaria revertendo um efeito da natureza, já que entende a espada do sol como um presente oferecido a ele. Enquanto isso, sempre questiona a experiência enquanto está vivendo-a, e seu pensamento está condicionado à ação da natureza, que aqui é sua experiência.

la spada esiste solo perché lui è lì; se lui se ne andasse, se tutti i bagnanti e i natanti tornassero a riva, o solo voltassero le spalle al sole, dove finirebbe la spada? Nel mondo che si disfa, la cosa che lui vorrebbe salvare è la più fragile: quel ponte marino tra i suoi occhi e il sole calante (CALVINO, 2017, p. 15)46.

As coisas feitas pelo homem, como o barco a vela, também interagem na ação, pois para funcionar precisa seguir as regras impostas pelo vento e pelo mar. Quando Palomar diz “è solo il vento a sapere” (CALVINO, 2017, p. 15)47, percebemos a ideia de natureza como oráculo, sorte. A intervenção humana não é mostrada apenas como benefício, pois Palomar percebe a poluição que o cerca, um malefício da modernidade, e o homem refém de sua própria intervenção, dos rastros que deixa.

45 Tudo isso acontece não no mar, nem no sol”, pensa o nadador Palomar, “mas dentro da minha cabeça, nos circuitos entre os olhos e o cérebro. Estou nadando em minha mente; é apenas ali que existe esta espada de luz; e o que me atrai é precisamente isto. Este é o meu elemento, o único que poderei de certa forma conhecer

(CALVINO, 1994, p. 16).

46 a espada só existe porque ele está ali; se ele fosse embora, se todos os banhistas voltassem para a praia, ou simplesmente virassem as costas ao sol, onde acabaria a espada? Do mundo que se desfaz, o que gostaria de

salvar é a coisa mais frágil: aquela ponte marinha entre seus olhos e o sol poente (CALVINO, 1994, p.

17).

Um questionamento que envolve todas as pequenas narrativas do livro já aparece aqui no início: a reflexão sobre o fim, sobre a morte, e a percepção da vida como ciclo. Palomar faz uma associação entre o fechar dos olhos e a existência do que vê. A exibição da coisa para o olho mostra que cada um vê o mundo segundo sua própria condição nele. Do ponto de vista do homem, é a partir dele que o mundo começa e termina; essa é uma percepção particularizada, que dá sentido aos lugares para si. Assim, na narrativa existe o mundo comum a todos, e o mundo de Palomar:

Il signor Palomar pensa al mondo senza di lui: quello sterminato di prima della sua nascita, e quello ben più oscuro di dopo la sua morte; cerca d'immaginare il mondo prima degli occhi, di qualsiasi occhio; e un mondo che domani per catastrofe o lenta corrosione resti cieco (CALVINO, 2017, p. 17)48.

Saindo da praia, ambiente marítimo, encontramos Palomar escondido num jardim para observar outra ação da natureza: o acasalamento/reprodução das tartarugas. Em Os amores

das tartarugas percebe-se uma abordagem muito mais descritiva por parte do narrador, como

se quisesse, a partir da palavra, construir o comportamento mecânico das tartarugas; enquanto isso, as conclusões feitas por ele são tão objetivas e é algo tão marcado que esquece de Palomar e foca na cena vigente. Temos a impressão de que o narrador não apenas subtrai Palomar, mas se coloca no lugar dele, isto é, o significado da personagem observar escondido as tartarugas evidencia esse sentido de preenchimento da pessoa ausente:

Il maschio spinge la femmina di fianco, torno torno al rialzo del marciapiede. La femmina sembra resista all'attacco, o almeno oppone un'immobilità un po' inerte. Il maschio è più piccolo e attivo; si direbbe più giovane. Prova ripetutamente a montarla, da dietro, ma il dorso del guscio di lei è in salita e lui scivola.

Ora dovrebbe essere riuscito a mettersi nella posizione giusta: spinge a colpi ritmici, pausati; a ogni colpo emette un ansito, quasi un grido. La femmina sta con le zampe anteriori appiattite sul terreno, il che la porta a sollevare la parte di dietro. Il maschio annaspa con le zampe anteriori sul guscio di lei, tendendo il collo in avanti, sporgendosi a bocca aperta. Il problema con questi gusci è che non c'è modo d'afferrarsi, e del resto le zampe non fanno nessuna presa (CALVINO, 2017, p. 19)49.

48 O senhor Palomar pensa no mundo sem ele: aquele inexistente de antes de seu nascimento, e aquele bem mais escuro de depois de sua morte; procura imaginar o mundo antes dos seus olhos, de qualquer olho; e o

mundo que amanhã por uma catástrofe ou lenta corrosão se torne cego (CALVINO, 1994, p. 18).

49 O macho aborda a fêmea pelo lado, contornando o realce do degrau. A fêmea parece resistir ao ataque, ou pelo menos opõe uma imobilidade um tanto inerte. O macho é menorzinho e mais ativo; dir-se-ia mais jovem. Tenta insistentemente montá-la, mas o dorso da carapaça dela está descido e ele escorrega.

O pátio vazio e descampado dá a sensação de que o espectador assiste a uma luta numa arena de combate. É uma cena selvagem, que poderia ser representada por uma espécie animal selvagem, mas que acontece docemente entre duas tartarugas. Apesar de Palomar observar um fenômeno da vida selvagem que compete também aos homens, o ato sexual, a ação não alcança seu repertório imaginativo.

O narrador faz questionamentos acerca da evolução dos mecanismos tecnológicos e as sensações humanas que perduram e não são exatas; o maquinário evolui e é preciso, mas pode deixar de funcionar, enquanto os comportamentos fisiológicos são em sua essência os mesmos, mas não podem ser apreendidos. Logo, temos a utilização da tartaruga como metáfora para essa dualidade: seus movimentos robotizados e os cascos com aparência de “capacete” ou armadura medieval, ambos impenetráveis, tentam esconder o que há por baixo: vida, pois o ser humano não pode possuir o comportamento mecânico que a sociedade exige.

Le osserva con un'attenzione fredda, come se si trattasse di due macchine: due tartarughe elettroniche programmate per accoppiarsi. Cos'è l'eros se al posto della pelle ci sono piastre d'osso e scaglie di corno? Ma anche quello che noi chiamiamo eros non è forse un programma delle nostre macchine corporee, più complicato perché la memoria raccoglie i messaggi d'ogni cellula cutanea, d'ogni molecola dei nostri tessuti e li moltiplica combinandoli con gli impulsi trasmessi dalla vista e con quelli suscitati dall'immaginazione? La differenza sta solo nel numero dei circuiti coinvolti: dai nostri recettori partono miliardi di fili, collegati col computer dei sentimenti, dei condizionamenti, dei legami tra persona e persona… L'eros è un programma che si svolge nei grovigli elettronici della mente, ma la mente è anche pelle: pelle toccata, vista, ricordata (CALVINO, 2017, p. 20)50.

O senhor Palomar transfere seu espaço de trabalho para o terraço em O assovio do

melro. Nesta narrativa, Calvino discute a parte e o todo: os pássaros funcionam em conjunto,

tanto sonoramente quanto de forma imagética, de construção da imagem desse todo, porque

Agora parece que conseguiu colocar-se na posição correta: arremete em golpes rítmicos, pausados; a cada investida emite um arquejo, quase um grito. A fêmea está com as patas anteriores aplacadas contra o solo, o que a leva a erguer a parte traseira. O macho braceja com as patas dianteiras sobre a carapaça dela, esticando o pescoço para a frente, estendendo-se com a boca aberta. O problema dessas carapaças é que não há onde

agarrar-se, e além do mais as patas não têm poder de apreensão (CALVINO, 1994, p. 21).

50 Ele as observa com fria atenção, como se se tratasse de duas máquinas: duas tartarugas eletrônicas programadas para se acasalarem. Como será o eros se em lugar da pele temos lâminas de osso e escamas de chifre? Mas não será talvez aquilo a que chamamos eros um programa de nossas máquinas corpóreas, mais complexo porque a memória recolhe as mensagens de todas as células cutâneas, de todas as moléculas dos nossos tecidos e as multiplica combinando-as com os impulsos transmitidos pela vista e aqueles suscitados pela imaginação? A diferença está apenas no número de circuitos envolvidos: de nossos receptores partem milhares de fios, ligados ao computador dos sentimentos, dos condicionamentos, dos vínculos entre as pessoas... O eros é um programa que se desenvolve nos emaranhados eletrônicos da mente, mas a mente

caso fosse um pássaro apenas, Palomar não conseguiria colher as conclusões do que investiga. Há a oposição entre silêncio barulho sendo a escuta – e por isso mesmo a condição de estar em silêncio – uma aliada da observação.

gli uccelli invisibili tra i rami dispiegano attorno a lui un repertorio di manifestazioni sonore le più svariate, lo avvolgono in uno spazio acustico irregolare e discontinuo e spigoloso, ma in cui un equilibrio si stabilisce tra i vari suoni, nessuno dei quali s'eleva sugli altri per intensità o frequenza, e tutti s'intessono in un ordito omogeneo, tenuto insieme non dall'armonia ma

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