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Panorama da atividade cinematográfica no Brasil e na Argentina (2009-2015)

CAPÍTULO 4 AS COPRODUÇÕES BRASILEIRO-ARGENTINAS NO CONTEXTO DA ATIVIDADE CINEMATOGRÁFICA DO BRASIL E DA ARGENTINA

4.1 Panorama da atividade cinematográfica no Brasil e na Argentina (2009-2015)

Ao propor fazer um estudo comparativo entre Brasil e Argentina no âmbito das políticas públicas de incentivo às coproduções internacionais, uma das perguntas que nos colocaram foi: é possível comparar a atividade cinematográfica desses dois países tão diferentes na sua extensão populacional e econômica? Nessa linha, é crucial contextualizarmos as dimensões de tais diferenças e, assim, situarmos o ambiente dessas políticas cinematográficas.

A primeira diferença que devemos pontuar é quanto ao número de seus habitantes, um dado que reflete diretamente no volume de potenciais expectadores das obras cinematográficas. Segundo informações do Banco Mundial (2017), a extensão populacional do Brasil em 2015 foi de mais de 207 milhões de habitantes; enquanto a Argentina possui 43 milhões, ou seja, a população brasileira é, aproximadamente, 4,8 vezes superior. Em outras palavras: poderíamos dizer que no âmbito populacional o Brasil tem quase cinco Argentinas.

Colocada essa questão preliminar, vamos para uma segunda e uma terceira diferença. Mesmo com um volume de potenciais expectadores quase cinco vezes inferior, a Argentina lançou 1029 filmes nacionais de longa-metragem no período de 2009 a 2015; enquanto o Brasil lançou 713 longas nacionais. Nesse mesmo recorte de tempo, a Argentina produziu 241 coproduções cinematográficas internacionais, enquanto o Brasil realizou 81 coproduções oficiais. Por outro ângulo: a Argentina produziu 44% mais longas-metragens que o Brasil e coproduziu três vezes a mais que o seu vizinho.

A seguir, as tabelas 1, 2, 3 e 4 exibem o número de filmes nacionais por ano de lançamento, bem como a quantidade de coproduções brasileiras e coproduções argentinas exibidas, respectivamente, no Brasil e na Argentina, no período de 2009 a 2015.

Tabela 1 - Quantidade de filmes nacionais no Brasil por ano de lançamento (2009-2015)135

Fonte: Elaborada pela autora com dados da OCA/ANCINE (2016)

Tabela 2 - Quantidade de filmes nacionais lançados na Argentina por ano de lançamento (2009-2015)

Fonte: Elaborada pela autora com dados do INCAA (2016)

135 Ver em: <http://www.ANCINE.gov.br/media/SAM/Estudos/Mapeamento_Salas_Exibicao_2010.pdf>

Ano de lançamento Total de filmes 2009 84 2010 74 2011 100 2012 83 2013 129 2014 114 2015 129 Total: 713 filmes Ano de lançamento Total de filmes 2009 97 2010 138 2011 129 2012 145 2013 166 2014 172 2015 182 Total: 1029 filmes

Tabela 3: Quantidade de coproduções brasileiras lançadas no Brasil por ano (2009-2015)136

Fonte: Elaborada pela autora com dados do Observatório do Cinema e do Audiovisual Brasileiro (OCA/ANCINE)

Tabela 4: Quantidade de coproduções argentinas lançadas na Argentina por ano (2009-2015)

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados do Cine Nacional137

136 Disponível em: <http://oca.ancine.gov.br/cinema>. Acesso em: 25 mar. 2017. 137 Disponível em: < http://www.cinenacional.com/peliculas>. Acesso em: 25 mar. 2017.

Ano Quantidade 2009 6 2010 9 2011 15 2012 9 2013 21 2014 14 2015 7 Total: 81 filmes Ano Quantidade 2009 24 2010 26 2011 31 2012 36 2013 34 2014 51 2015 39 Total: 241

No entanto, os dados apresentados nas tabelas 3 e 4, quanto ao número de coproduções, podem ser metodologicamente questionáveis. Isso porque os modos que a Ancine e o INCAA contabilizam as suas coproduções também são diferentes entre si.

Quanto às coproduções oficiais brasileiras, utilizamos os dados organizados pela Coordenação do Observatório do Cinema e do Audiovisual (OCA) da ANCINE (2007), que usou uma metodologia específica. A OCA considera como coproduções internacionais as obras que atenderam aos seguintes critérios de forma simultânea: 1) Longas-metragens brasileiros lançados comercialmente em salas de exibição no Brasil; 2) Registro de Certificado de Produto Brasileiro (CPB) expedido pela ANCINE; e 3) Informação de coprodutor estrangeiro constante no CPB. Desse modo, segundo a ANCINE (2007), não foram consideradas coproduções internacionais as obras que tenham apontado como coprodutor estrangeiro empresas de origem estrangeira que aportaram recursos por meio dos mecanismos de incentivos fiscais previstos nos arts. 3° e 3°-A da Lei n° 8.685/93 e no art. 39, X, da Medida Provisória n° 2.228-1/2001, conforme o §3°, art. 2º da Instrução Normativa 106/2012.

Como já havíamos citado anteriormente, essa nova metodologia passou a vigorar a partir de 2013, acarretando mudanças significativas nos números divulgados em anos anteriores no site da agência, bem como excluindo filmes pesquisados e citados na nossa dissertação de mestrado defendida na Universidade de Brasília (UnB), em 2012.

Destacamos que, para efeito da nossa atual análise, utilizamos a metodologia acima quando nos referimos às coproduções brasileiras, que englobam somente as obras com o reconhecimento oficial da Agência Nacional do Cinema (ANCINE). Já para a elaboração da Tabela 4, sobre a quantidade de coproduções internacionais argentinas realizadas por país parceiro, no período de 2009-2015, como não há uma metodologia específica adotada pelo Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais (INCAA), o nosso olhar comparativo deve ser feito com uma especial atenção.

O INCAA não produz dados sistematizados e específicos sobre coproduções internacionais. Tanto no site do Instituto quanto nos anuários divulgados por ele sobre a indústria cinematográfica argentina, há apenas duas categorias de dados: 1) produções estrangeiras, por um lado; e 2) produções e coproduções nacionais, do outro. Quando estivemos na sede do INCAA em Buenos Aires, também buscamos dados específicos sobre as coproduções, mas fomos informados que não há dados diferenciados entre as produções domésticas e as coproduções da Argentina com outros países, já que ambas são consideradas

obras nacionais, portanto, recebem o mesmo tratamento para efeito das ações políticas de incentivo e da construção dos dados. Dessa forma, para a elaboração da Tabela 4 e dos Quadros 15, 17 e 19, usamos como principal fonte o site Cine Nacional, que conta com o apoio do INCAA e traz a compilação de todos os filmes produzidos na Argentina, desde o surgimento do cinema.

Vale ressaltar que o cinenacional.com138 é autodescrito como:

O site de cinema argentino mais completo do mundo. Seu principal atributo é um banco de dados contendo dados de 7.377 fichas técnicas, 37.093 filmografias e 8.077 fotos relacionadas em maior ou menor medida com o fazer cinematográfico no nosso país. O projeto nasceu em agosto de 2000 e foi levado adiante por uma equipe de programadores, designers e jornalistas. [...] O nosso desejo é, em primeiro lugar, contribuir para a preservação de todas as informações relativas ao nosso cinema e, por outro, facilitar o acesso a essas informações de forma fácil e conveniente para aqueles que desejam explorar ou apenas gostam de filmes argentinos. [...] Desde fevereiro de 2004, é apoiado pelo Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais (INCAA), o Museu do Cinema Pablo C. Duckrós Hicken e foi declarado de interesse cultural pela legislatura da Cidade Autônoma de Buenos Aires (resolução 190/2002). (CINENACIONAL, s.d, n.p., tradução nossa).

Cabe lembrar que a falta de uma padronização nas metodologias de criação de dados sobre o mercado cinematográfico ibero-americano é exatamente uma das principais dificuldades dos pesquisadores da Economia Política do Cinema ao realizarem estudos comparativos. Os bancos de dados nacionais apresentam metodologias próprias ou oferecem escassas informações sobre as atividades cinematográficas locais. Podemos verificar tal barreira mesmo no Observatório Ibero-americano Audiovisual (OIA) da Conferência de Autoridades Cinematográficas Ibero-americanas (CACI). Quando pesquisamos o seu banco de dados percebemos muitas divergências ou incompletudes de informações sobre as cinematografias de cada um dos países da região.

Feitas essas considerações, sigamos para as próximas características. Ao verificarmos as taxas de ingressos por habitantes, podemos inferir que no Brasil a média, para o período de 2009 a 2015, foi de 0,72 ingressos por habitante, enquanto a média da Argentina foi de 1,04 bilhetes por habitante. Esmiuçando esses números, poderíamos interpretar que 72% da população brasileira foi ao cinema pelo menos uma vez ao ano. Do outro lado, poderia ser dito que 100% da população argentina foi ao cinema ao menos uma vez ao ano e 4% foi duas vezes, ao cinema em cada um dos anos do período focado. Claro, que na realidade não é bem assim que funciona o comportamento do público. Grande parte dos

espectadores vai várias vezes ao cinema enquanto muita gente não vai nenhuma vez. Esses cálculos funcionam para termos uma dimensão da população consumidora de cinema em cada um dos dois países.

Ao olharmos para a quantidade de salas de cinema disponíveis para a população do Brasil e da Argentina, constatamos que a média do Brasil foi de 2.528 salas no período. Em 2009, havia 2110 salas e, em 2015, o público passou a contar com 3005 salas brasileiras, significando um aumento de 895 novas salas, ou seja, um acréscimo de 42%. No quadro 14, a nomenclatura usada para o mesmo item é “telas”, do mesmo modo como tratado pelo INCAA, para referir-se às salas de cinema – que é diferente de complexo de cinema, onde há várias salas, várias telas. Sendo assim, na Argentina, a média foi de 872 salas. Havia 843 telas em 2009, elevando para 912 no ano de 2015, ou seja, houve um aumento de 69 salas, o que representa 8% de acréscimo num intervalo de sete anos.

Ao observar o crescimento do lançamento de novas salas, vimos que no Brasil a investida foi bem maior que na Argentina. Mesmo assim, deve-se considerar outro ponto: o número de habitantes por sala. Enquanto no Brasil houve uma média de 78 mil habitantes por sala, na Argentina a média foi de 47 mil habitantes por sala. No entanto, enquanto o Brasil saltou de 90 mil habitantes por sala, em 2009, para 68 mil habitantes por sala, em 2015; o cenário da Argentina sofreu pouca alteração: pulou de 48 mil, no ano de 2009, para 47 mil habitantes por sala em 2015.

Quanto a essa dimensão, é crucial citarmos as principais políticas voltadas para a ampliação do mercado exibidor no Brasil e na Argentina. No primeiro, verificamos a implementação de uma nova política com a criação, em 2012, do Programa Cinema Perto de Você, que objetivava a abertura e a modernização de salas de cinema em todo o País, inaugurando também o Projeto Cinema na Cidade, voltado para abertura de salas em espaços públicos municipais em cidades com população entre 20 e 100 mil habitantes e que não disponham de cinema em funcionamento. Além dessas iniciativas, o período foi marcado ainda pela criação do Programa Brasil de Todas as Telas, em 2013, voltado para todas as plataformas de exibição. Enquanto isso, na Argentina, há uma rede de salas estatais de cinema com ênfase na exibição de filmes nacionais. O projeto foi lançado em 2003, com a inauguração do Espaço INCAA 0 Km e, ao longo dos anos, o Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais inaugurou novas Salas INCAA em várias cidades do país. Em 2015, o governo da Argentina se abriu para uma nova demanda do público e lançou uma plataforma

digital de exibição video on demand (VOD) gratuita na internet, a ODEON, e posteriormente o CineAr Play e o CineAr TV, ambas direcionadas exclusivamente aos argentinos.

Quadro 13: Panorama da atividade cinematográfica no Brasil (2009-2015)

2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 População 196,701,298 198,614,208 200,517,584 202,401,584 204,259,377 206,077,898 207,847,528 Público 112.670.935 134.836.791 143.206.574 146.598.376 149.518.269 155.610.429 172.943.242 Renda (R$) 969.796.083,34 1.260.373.852,47 1.449.997.621,20 1.614.022.222,83 1.753.200.571,83 1.955.909.695,99 2.350.161.302,17 Títulos 317 303 337 327 397 393 446 Preço Médio do Ingresso (R$) 8,61 9,35 10,13 11,01 11,73 12,57 13,59 Ingresso por habitante 0,57 0,67 0,71 0,76 0,73 0,77 0,83 Salas de Exibição 2.110 2.206 2.352 2.517 2.678 2.833 3.005 Habitantes

por sala 90 mil 86 mil 81 mil 77 mil 75 mil 71 mil 68 mil Renda dos Títulos Brasileiro (R$) 131.923.170,45 225.958.090,35 161.487.064,41 158.105.660,79 297.072.056,07 221.853.128,60 277.679.147,86 Títulos Brasileiros Lançados 84 74 100 83 129 114 129 Participação de Público 14,3% 19,1% 12,4% 10,71% 10,50% 12,23% 13,0%

Quadro 14: Panorama da atividade cinematográfica na Argentina (2009-2015)

Fontes: Elaborado pela autora com dados do Observatório Iberamericano do Audiovisual (2017), INCAA (2017) e Banco Mundial (2017)