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6. INFORMAÇÕES DESCARTADAS 114

6.2. Panorama Político 117

O colunista Ilimar Franco demonstrou que um dos motivos mais recorrentes para o descarte de uma informação é quando considera que ela é mero reflexo de “opinião da fonte”. Ilimar reforça a tese de que a subjetividade é repelida pelos profissionais da imprensa. Para ele, a informação precisa estar apoiada em “fatos”. No entanto, o colunista reflete uma contradição: a opinião da fonte é descartada quando ela não reflete o que ele próprio pensa a respeito do assunto, ou o que ele acredita que sejam “os fatos”. Em sua teoria do gatekeeping, David White explica que a seleção de notícias “é extremamente subjetiva e dependente de juízos de valor baseados na experiência, atitude e expectativas do gatekeeper” (White, 1999, p. 45). Seguem os exemplos:

No 1o dia da pesquisa em O Globo, 23 de agosto de 2010, Ilimar Franco telefonou a uma autoridade governista e conseguiu a seguinte declaração: “As especulações sobre nomeações e medidas de um possível governo do PT são papo furado”. Da mesma fonte, Ilimar ouviu que a “dianteira de Dilma (Rousseff) nas pesquisas vai influenciar as eleições regionais se ela continuar crescendo” e que o “discurso do PSDB sobre autoritarismo petista não tem efeito”. O colunista afirmou que as informações eram apenas opinião da fonte e, por isso, não foram publicadas. Pelo mesmo motivo, Ilimar deixou de fora a declaração de uma autoridade de oposição de que “nos Estados, pesquisa Datafolha que dá larga vantagem a Dilma não refletiu”.

No 4o dia de análise, 23 de setembro de 2010, Ilimar deixou de publicar três informações por serem consideradas apenas opinião da fonte: uma de autoridade governista que se disse “surpresa” com o resultado das pesquisas para as eleições no Sul do país, outra de uma autoridade dando suas impressões sobre as eleições no Pará e uma terceira com o comentário de um diretor de Instituto de Pesquisa sobre o resultado de uma enquete sobre a

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corrida presidencial. No 5o dia de pesquisa, 1o de outubro de 2010, Ilimar descartou duas informações pelo mesmo motivo: uma fonte da campanha de Serra criticando o formato dos debates televisivos e uma autoridade governista afirmando que acreditava na vitória da candidata Dilma no primeiro turno.

No entanto, a justificativa do colunista enfrenta contradições, já que ele publicou outras declarações consideradas “opinião da fonte”, conforme classificação desta pesquisa. Existe uma diferença entre as declarações da fonte que interessam e as que não interessam para a construção de um ponto de vista sobre os acontecimentos. A seleção é feita, portanto, para se construir uma narrativa coerente com a visão de mundo do colunista.

As notas-frases da coluna, por exemplo, são todas opiniões da fonte, a exemplo da publicada no dia 3 de outubro, creditada ao governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, sobre o desempenho da então candidata à presidência pelo PV em um debate televisivo: “A Marina Silva é o Rolando Lero dessas eleições”. Também há o exemplo da nota-abre publicada no dia 16 de setembro, em que a coordenação de campanha de Dilma Rousseff (PT) queixou-se de haver faltado “sensibilidade” e “prudência” ao ex-ministro José Dirceu ao se expor publicamente depois do escândalo do Mensalão, esquema do qual era acusado de ser chefe.

Em algumas ocasiões, Ilimar esqueceu-se de informações recebidas no início do expediente e, ao final, já havia conseguido notas suficientes e importantes para a coluna, a exemplo de uma informação de uma autoridade governista de que a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal só seria preenchida por um novo ministro no próximo governo.

O colunista também deixou de publicar notas que contradiziam as versões veiculadas pelas matérias do jornal O Globo. No 2o dia de análise, 30 de agosto de 2010, Ilimar recebeu de uma assessora do governo a informação: “Dilma não vai realizar a reforma da Previdência em um eventual governo”, ao contrário do que dizia matéria publicada naquela semana no jornal O Globo. O colunista não publicou a nota, apesar de ter confessado acreditar que a reforma Previdenciária não seria feita em um suposto governo da candidata petista. Ilimar disse que não iria desmentir matéria do próprio jornal em que trabalha. “Acho antipático dizer o que os jornalistas devem fazer”, argumentou o colunista.

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A reação de Ilimar Franco demonstra a validade da abordagem do newsmaking, que argumenta que o trabalho do jornalista também sofre influência do contexto da organização em que ele está inserido e, por conseguinte, da linha editorial do veículo. Apesar de Fraser Bond (1962) ter apontado para a conquista da liberdade editorial do colunista já nos anos 30, o pesquisador alerta que a organização também se reserva o direito de “cortar, censurar ou eliminar” a coluna quando lhe convém e o colunista, profissional experimentado na empresa, não quer sofrer reprimendas.

Da mesma assessora de governo, Ilimar ouviu que “Dilma deve manter tamanho do PMDB em possível governo, mas a discussão é precoce”. O colunista não publicou a informação por acreditar que o espaço do PMDB cresceria se a candidata petista fosse eleita. Segundo ele, a declaração é apenas “vacina para a campanha”. Ou seja, Ilimar deixou de publicar uma informação porque ela não correspondia à opinião dele sobre o assunto. A fonte também tentou emplacar na coluna o resultado de uma pesquisa não-registrada para as eleições presidenciais. O colunista deixou a informação de fora por considerar “arriscado” divulgar pesquisas não-registradas. De fato, as fontes ligadas a instituições legítimas (como as pesquisas registradas na Justiça Eleitoral) “blindam” o trabalho do jornalista contra críticas.

De uma autoridade de oposição, Ilimar recebeu a informação de que “o PSDB subestimou a força de Lula na propaganda televisiva de Dilma”. O colunista justificou que esse era “só um elemento na caça às bruxas para justificar o baixo desempenho do candidato Serra”, ou seja, uma “desculpa” da oposição para o baixo desempenho nas pesquisas. Mais uma vez, Ilimar não acreditava que essa era, de fato, a causa dos problemas na campanha da oposição e deixou a informação de fora da coluna.

De uma candidata a deputada estadual, Ilimar ouviu que “os partidos não dão condições às mulheres de disputar as eleições”. O colunista afirmou que a fonte era uma típica “plantadora de notícias”, só queria se auto-promover. Essa constatação foi baseada na própria experiência do colunista que, ao longo do tempo, aprendeu a detectar as fontes que não forneciam material que interessava a ele.

Ilimar Franco recebeu informações de autoridades governistas que ele considerou serem apenas “falatório”, como a declaração de que o “candidato Pimentel (MG) não vai

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ganhar as eleições”, ou a informação de que o “PMDB sempre vai apoiar o governo e é preciso se vacinar contra as intrigas”.

Em uma palestra veiculada na Internet, Ilimar ouviu que “Ronaldo Coelho, candidato a suplente de César Maia no Senado, afirmou que Maia fez a Cidade da Música, mas não gastou dinheiro com publicidade”. A informação não foi divulgada porque o colunista decidiu “não comprar briga com a fonte”. A reação de Ilimar pode ser explicada por uma declaração dada por ele de que publicar ou não a informação que prejudica a fonte “é um cálculo de custo e benefício”40. Nesse caso, o colunista considerou que o custo era muito alto.

No 3o dia de pesquisa, 15 de setembro de 2010, Ilimar deixou de fora duas informações justificando que o jornal já as publicaria em matérias do dia seguinte. Uma foi o “barraco ocorrido na entrevista de Serra à CNT”, informada por um colega jornalista, e outra sobre uma reunião entre autoridades do Rio de Janeiro. Outras duas notas que versavam sobre a opinião de autoridades governistas em relação à criação de “janela” para troca de partido ficaram de fora da edição por poderem ser guardadas para outro dia.

Uma informação colhida junto a um colega jornalista em 23 de setembro de 2010 ficou de fora da edição por ter sido “apenas uma contextualização do cenário eleitoral no Sul”. Uma autoridade governista também especulou sobre o resultado da corrida para o Senado e não emplacou a informação. Um desabafo de assessor de oposição quanto aos erros da campanha eleitoral para a presidência também ficou de fora da edição por não ser considerada “opinião oficial”. Uma informação sobre a estratégia de Dilma nos debates televisivos dada por um assessor governista também ficou de fora porque Ilimar considerou-a “apenas uma troca de impressões entre colegas”. A agenda da candidata também ficou de fora da coluna porque já seria publicada em uma matéria do jornal.

A informação de um assessor governista sobre as eleições no Mato Grosso do Sul também foi descartada porque foi considerada pelo colunista “muito local”. O critério também não se mostrou muito objetivo já que Ilimar publicou uma nota sobre a sucessão do governo de Santa Catarina no dia 3 de outubro de 2010. Nesse caso, pode ter havido um certo bairrismo, já que o colunista trabalhou em um jornal de Santa Catarina.

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Outra declaração de um colega jornalista do Ceará de que havia pessoas ligadas ao PT fazendo campanha para um candidato ao Senado do PV não foi utilizada porque não foi confirmada por uma autoridade governista. Tem-se o exemplo da importância do cruzamento das informações. Uma informação de uma assessora de governo de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgaria uma lista dos candidatos “fichas-sujas” foi descartada por opção editorial do colunista: ele preferiu focar na crítica à confusão do sistema eleitoral por conta da ausência de julgamento da Lei da Ficha Limpa.

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