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Para além dessas atribuições que denominaríamos de nor mais, outras lhe couberam que designaremos de extraordinárias.

Assim, ©m 1612, são eles os convocados para com o síndico da

cidade e o Procurador da mesma elaborarem a tabela de preços

dos produtos ou serviços que fabricavam e vendiam. (236 ) As

questões das taxas dos ofícios, não raro, eram fonte de agravos

entre os vereadores e os juizesSâlficuldade de acordo quanto

aos preços. Em 1593, o diálogo entre as partes tornou-se

mesmo impossível e os juízes dos sapateiros obtiveram do Cor-

regedor que os vereadores fossem obrigados a escolher outras

pessoas, para, como seus delegados e em seu nome, com eles

negociarem as tabelas. ( 237)

E, com o patrocínio da câmara, alguns são mandatados

para resolver certas dificuldades no interior do seu ofício:

por exemplo, eml627, dada a falta de sola e a consequente

carestia, os juizes dos sapateiros são levados a conferenciar

com os curtidores e, dessa discussão, sai uma sugestão que a

Câmara fez sua e promulga imediatamente: proibe-se a venda de

couros para o exterior da cidade e do Termo.(238) E quando

surgem dúvidas ou querelas entre ofícios afins, normalmente

os vereadores tentam promover a conciliação através da nego-

ciação entre eles cujos interlocutores natos são os juízes.

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Assim,em 163^, os espingardeiros pretenderam apartar-se dos fer<- reiros e serralheiros quanto ao fazimento da alegoria para representa- ção na procissão do Corpo de Deus.Tal atitude poderia significar que as despesas do quadro a apresentar no cortejo passavam a recair ape- nas sobre os dois últimos ofícios.Pois os Juízes chegaram a acordo e a separação consumou-se sem que a Câmara tivesse que intervir mais do que para a confirmar,(239)

E em l622,tendo surgido uma disputa entre cutileiros,correeiros, esteireiros,seleiros, bainheiros e espadeiros sobre qual ofício e res- pectiva bandeira haveria de encabeçar o conjunto na procissão menciona- da,a Governança decidiu confiar aos Juízes dos ofícios a resolução da pendência.Pacificamente acordaram que o ofício de cutileiro merecia a primazia nao s5 por ser o mais antigo mas também por contar maior núme- ro de oficiais.(2^0)

Ao escrivão competia acompanhar os juizes e lavrar as actas de todas as decisões tomadas dentro do seu ofício bem como registar as elei- ções, passar certidões dos seus resultados, redigir o termo dos exa- mes de aptidão profissional, relatar as receitas e despesas.

Normalmente,o escrivão de um ofício era recrutado no seu inte- rior, entre os oficiais. Mas se acontecesse não haver ai nenhum in- divíduo habilitado para escrever, então o escrivão ia buscar-se fora. Assim, em l6l0, os agulheiros apresentaram para esse cargo o tanoeiro António Gonçalves.(241)

Outras vezes, um dos juxzes servia de escrivão como sucedeu em 1622 com os tosadores.(2^2)

Aos mordomos cabia zelar pela bandeira e insígnias da profissão e tratar da representação condigna do ofício na procissão do Corpo de Deus. Com efeito, é aos mordomos das diversas "invenções" que, em I63I, o tesoureiro da Cidade, Santos de Sousa, entrega os subsídios atribuídos pela Câmara aos diferentes quadros alegóricos.( 2^3) Eram eles que arrecadavam as verbas necessárias para as despesas da pro- cissão. ( 2^)

Em Lisboa e, segundo cremos também no Porto, corripetia-lhes ainda arrecadar as o aceitas e satisfazer as despesas do respectivo ofício.(2^5)

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Infelizmente,exceptuando o caso dos barbeiros,não nos aparece

nunca nos Livros da Gemara registo da tomada de posse destes corpos

gerentes,porque tal nao era obrigatório.Mas o facto de os Juízes dos passamaneiros sereia,em 16^9,simultaneamente os ^ordomos de Santo Ama-

ro (2zf6)nao quererá dizer que as duas funções se concentraram,às ve-

zes,nos mesmos indivíduos?

A questão parece pertinente. No entanto,no caso dos barbeiros e nos pressupostos do Regimento dos correeiros fica claro que os dois cargos eram exercidos" por individualidades distintas.(2k?)

0 número de Juízes variava conforme o ofício,talvez em função do total de oficiais.No caso dos sapateiros,os Juízes são três invariavel- mente durante o perfodo considerado.Na maior parte das restantes profissões sao dois; e nao raro,apenas umrassim os pasteleiros,os pi- cheleiros,os tintureiros,os violeiros e os cordoeiros,os quais,no en- tanto^ partir de 1593 passam a ter dois.

A eleição dos diversos cargos fazia-se usualmente no interior da profissão por sufrágio directo e público,cabendo o direito de voto a todos os oficiais.O regimento dos espadeiros de 15*f8 previa mesmo sangão pecuniária para os oficiais que,não tendo justo impedimento, faltassem ao acto. (248)

Excepcionalmente,a escolha era realizada "as mais vozes" nos Pa- ços do Concelho,perante os Vereadores. ( 2^9)

0 recurso à votação secreta foi utilizado pelo menos uma vez pe- los anzoleiros,em 1610,( 250) talvez porque se encontravam desavindos en- tre si os poucos oficiais existentes.

Por regra,a eleição tinha lugar no mes de Janeiro,como mandava o Regimento dos correeiros de 1622. ( 25Í>Mas não são excepcionais os casos em que,na prática,foi o escrutínio realizado em outros meses.

Por norma,o Senado da Câmara aceitava e respeitava a escolha dos mesteirais.Casos houve,todavia,em que se verificou a sua intervenção directa no sentido de promover as eleições ou até de nomear o Juiz para determinado ofício:

-assim,em 1627,sao os Vereadores quem nomeia João Ferreira,"o me-

lhor caldeireiro da cidade",como Juiz do ofício;(252>

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pasteleiros, visto que servia havia muitos anos}(253)

-em I628 forçam os picheleiros a eleger o seu Juiz.(25*t) Desconhecemos se algum Regimento proibia que o mesmo oficial servisse de Juiz em anos consecutivos.Esse ê",no entanto,Q espírito e o pressuposto do Regimento dos correeiros de 1622.( 255)Na prática porém,sucederam-se os casos de repetição de mandato,mesmo em ofícios previsivelmente suficientes em número,como no caso dos barbeiros. £56 )

Conflitos e demandas

Como ê de esperar, os conflitos entre oficiais ou até dentro do mesmo ofí- cio nem sempre foramde fácil solução. Quando os juízes não logravam chegar a acordo, o Juiz de Fora e Vereadores ditavam e impunham o seu parecer. Mas, frequentemente as questões se complicavam e as demandas saltavam para o Cor-

regedor da Comarca ou cara a Relação e, às vezes daí nqra ,1 Cana Aa c---rO-

cação.

Assim, em I588, surgiu uma disputa entre sirgueiros, por um lado, e correeiros e cinteiros por outro. Os sirgueiros estavam produzindo e ven- dendo cintas e talabartes de couro, guarnecidos de seda. Ora, no entender dos rivais, os sirgueiros não podiam fazer mais que cintas e retrós de seda, pois para tal ê que estavam examinados e não para laborar em couros. Se o fizessem, como faziam, transgrediam os acórdãos da cidade que proibiam a um oficial exercer simultaneamente dois ofícios.

A Câmara à face dos acórdãos, não tinha mais que dar razão aos corre- eiros e cinteiros. Foi o que fez. Mas facultou aos sirgueiros que pelo es- paço de k meses, pudessem vender o que já haviam produzido. Aproveitam, to-

davia, para ê*igir dos outros que não faltassem nunca com cintos e talabar-

tes em abundância.(257) Ë evidente que este conflito foi provocado pela lei do espartilho em que era obrigado a viver cada ofício. E a Verea- ção, pressionada pelas próprias corporações, era muito severa na exigência do respeito pela justa competência de cada ofício e até de cada oficial. Em 1613, o anzoleiro António Gonçalves foi notificado que, sob pena de 50 cruzados e 2 anos de degredo para Africa, não fizesse qualquer obra para a qual nao tivesse sido examinado.( 258) A queixa contra o anzoleiro procedia dos companheiros de oficio que andavam todos desavindos entre si, com de-

ndas no Tribunal, cuja conciliaçso a Câmara parece ter conseguido.(£59) ma

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Maa, às vezes, as fronteiras entre a s competências de cada ofí- cio eram difíceis de precisar. A própria evolução das profissões com a sua diversificação progressiva não podia evitar confusões e rivalida- des bem mesquinhas. Caso típico será o dos sirgueiros e passamaneiros,

cujas divergências procediam do material que cada grupo havia de utilizar e, talvez mais profundamente da definição do que se devia entender por pas- samanes. E, neste caso, os conflitos do Porto não eram senão a repetição do que acontecera em Lisboa. (260 ) A tentativa de predomínio da sirgaria sobre os passamaneiros estes não hesitavam em contratar advogado e re- correr à via judicial,mesmo contra deliberações camarárias. (261 )

A reserva de exclusividade de certos materiais para um oficio era, às vezes, levada de-iasiado longe. Em 1584, os correeiros: e bainheiros requerem na Câmara que os couros da Índia não pudessem ser trabalhados pelos sapateiros. Os Vereadores passaram sentença favorável aos reque- rentes. Os sapateiros, porém, é que nao concordando, recorreram para a Relação, onde conseguiram que o primeiro veredicto fosse revogado. (262)

Dissemos, atrás, que os ofícios estavam subordinados ao Concelho e às autoridades municipais. Mas o poder municipal sobre a organização mesteiral estava longe de ser ilimitado. E, no caso do Porto, a Casa da Relação foi instância muitas vezes procurada quando a decisão da Câmara nao convinha às partes, nomeadamente quando se lhes impunham cargas que julgassem inaceitáveis. Essa circunstância verificava-se frequentemente por alturas de cada procissão do Corpo de Deus.

Os mesteirais suportavam mal oe encargos indevidos quando a Câmara pretendia impor ou usar o argumento da autoridade. Mas eram mais dóceis quando se preferia a via da conciliação. Por exemplo em 1614, Juiz e

Vereadores quiseram constranger os ofícios que normalmente eram obriga- dos a comparecer na procissão do Corpo de Deus,a que se apresentassem na procissão de São Pantaleao,com seus castelos.

Logo os Mordomos da Confraria dos Fieis de Deus declararam que não iriam e,se insistissem em obrigá-los.recorreriam para a Relação.

Ora a procissão era no dia seguinte.0 agravo dos mesteirais provo- cava a suspensão da ordem da Câmara econsequentemente,dispensá-los-ia da comparência,

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eram obrigados. Mas não indo por obrigação, ao menos participassem