• Nenhum resultado encontrado

CAMINHOS DA INTERVENÇÃO PRECOCE

1.6. O Papel do Herdado e do Adquirido no Processo do Desenvolvimento

1.6.2. Período do Dominante "Nurture"

A emergência do comportamentalismo vem pôr em causa a perspectiva maturacionista que dominou os anos 50. John Watson, defensor deste paradigma, afirma que a criança não nasce completa, faz-se. Coloca, dessa forma, nos pais, a grande responsabilidade do desenvolvimento da criança. Para os behavioristas, na ausência de lesões cerebrais significativas, os produtos desenvolvimentais das crianças são fortemente determinados por factores ambientais. Esta perspectiva torna a educação das crianças a mais importante das obrigações sociais (Shonkoff & Meisels, 2000). Ao eleger a aprendizagem como o principal factor que influencia o desenvolvimento e, considerando a capacidade de aprendizagem

CAPITULO I Caminhos da Intervenção Precoce

como o resultado das experiências, em determinado contexto ambiental, este modelo apoia a necessidade da I.P..

1.6.3. À Procura do Equilíbrio "Nature/Nurture"

No período de 1930 a 1960, Piaget, com as suas observações cuidadosas e sistemáticas, começa a desenvolver uma perspectiva que viria revolucionar a nossa compreensão do desenvolvimento intelectual. Piaget traz o reconhecimento de que, no desenvolvimento da criança, os factores biológicos e sociais se influenciam, mutuamente (Shonkoff & Meisels, 2000).

Os efeitos de "nature" e "nurture" são difíceis de separar. Por um lado, os seres humanos continuam a desenvolver-se ao longo do ciclo vital e o desenvolvimento, geralmente, reflecte uma combinação das duas forças. Além de tudo, os mecanismos, através dos quais o ambiente actua, não podem ser descritos de uma forma tão precisa como os da hereditariedade. Certas influências genéticas e ambientais tendem a actuar na mesma direcção (Sameroff & Chandler, 1975). Frequentemente, o ambiente reflecte ou reforça diferenças genéticas.

Piaget está na origem da "revolução cognitiva", com a sua ênfase, nos processos mentais internos. Perspectivava as crianças de um modo orgânico, activas, seres em crescimento, com os seus próprios impulsos internos e padrões de desenvolvimento, acreditando que o fulcro do comportamento inteligente é uma capacidade inata para a adaptação ao ambiente.

1.6.4. A Transacionalidade dos Factores "Nature/Nurture"

Actualmente, admite-se a relação recíproca entre natureza e educação (Sameroff & Chandler, 1975), explicando-se o desenvolvimento da criança como o produto de uma dinâmica de interacções da criança com o meio e a experiência proporcionada pela família e contexto social (Sameroff & Fiese, 1990). Admite-se,

CAPÍTULO I Caminhos da Intervenção Precoce

também, hoje, que o comportamento não é resultado de uma causa única, mas sim de causas múltiplas, sendo o resultado da hereditariedade em interacção com o meio e com o tempo.

O potencial hereditário pode ser enriquecido ou empobrecido, dependendo do tipo, quantidade e qualidade dos nossos encontros com o meio e dependendo do momento em que estes encontros ocorrem. Este último aspecto torna-se central para uma intervenção eficaz. Perfilhar esta ideia é reforçar o valor da I.P.. Benjamim Bloom (1964) no seu, clássico, estudo traça uma "curva de crescimento com aceleração negativa" para o desenvolvimento: com o avançar, na idade, existe um decréscimo do efeito, positivo, que um ambiente, apropriado, tem na criança. Bloom defende que não só a falta de um meio ambiente, enriquecedor, impede o desenvolvimento cognitivo, óptimo, da criança, como a ultrapassagem desse tempo, precioso, é, particularmente, prejudicial, porque não há forma de, posteriormente, a compensar.

Podemos, então, afirmar que o desenvolvimento psicológico é possibilitado pelos genes, que nos definem, como membros da espécie, sendo, contudo, limitado por um determinado calendário que determina o momento em que certas aquisições são possíveis e determinadas pelas interacções da pessoa com o seu meio. "O resultado do desenvolvimento, em qualquer ponto do tempo, não é função do estado inicial da criança, nem do estado inicial do ambiente, mas sim de uma complexa função da interacção da criança com o ambiente, ao longo do tempo" (Sameroff & Fiese, 1990, pp. 122-123). Esta relação recíproca Narture/Nurture é explicada por Sameroff & Chandler (1975) como a perspectiva de "Continuum of Caretaking Casuality", traduzida por Bairrão (1994), "continuo

de acidentes de socialização". Nesta perspectiva os factores ambientais, sociais e

familiares têm efeitos transaccionais no desenvolvimento. Não é o "contínuo de

morbilidade de reprodução", nem o "contínuo de acidentes de socialização" que

isoladamente têm um valor de prognóstico definitivo acerca das características do processo de desenvolvimento, mas é provavelmente a combinação destas dimensões que torna possível a compreensão do desenvolvimento (Sameroff & Chandler, 1975).

Isto implica, no contexto da I.P., que as agressões biológicas podem alterar-se pela acção dos factores ambientais e, ainda, que as vulnerabilidades

CAPÍTULO I Caminhos da Intervenção Precoce

desenvolvimentais podem ter também uma etiologia social e ambiental, admitindo-se uma bidireccionalidade entre factores sociais e biológicos determinantes na génese do desenvolvimento que, por sua vez, vai influenciar, tanto a intervenção, quanto a organização dos serviços.

Esta questão tem provocado um renovado interesse em I.P.. O impacto da intervenção, nos primeiros anos, no futuro desenvolvimento tem sido enfatizado; a maior parte dos responsáveis pelo desenvolvimento da criança concorda, hoje, que a IP. em Crianças em risco biológico, ou ambiental, pode ser particularmente eficaz na prevenção de dificuldades mais severas, no futuro. Por isso, a I.P. é,

não só, considerada vantajosa no imediato, mas, também, na prevenção.

Contudo, estas novas abordagens não têm sido consistentemente aplicadas no trabalho com crianças com problemas de desenvolvimento. Em muitos programas, as crianças são tratadas dentro de um modelo tradicional que foca os distúrbios físicos e médicos, em vez de outro que compreenda os distúrbios como um aspecto crítico, de um processo mais vasto do desenvolvimento, no qual a criança e a família estão envolvidos, numa complexa interacção, de questões biológicas, psicológicas e sociais.

Os programas de Intervenção deveriam ser concebidos de forma a minimizar experiências que têm efeitos negativos no desenvolvimento e promovendo experiências que têm efeitos positivos (Wolery, 2000).