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As percepções sobre as pessoas que não têm acesso à água em casa

3.1 I MPORTÂNCIA DA ÁGUA

3.1.5 As percepções sobre as pessoas que não têm acesso à água em casa

A maioria do sujeitos declara que as pessoas que não têm acesso à água sofrem (21/40). Eles apresentam um discurso a partir de seu próprio sentimento, ou seja, como se estivessem no lugar das vítimas, apontando, entre outras coisas, para o custo que isso representa: a falta de conforto e o risco à saúde. É interessante notar que os sujeitos de Jardim Camburi, quando questionados sobre a importância do seu próprio acesso à água, não destacaram seu uso para lavar as mãos. Porém, quando a questão é para o uso do outro, a necessidade aparece:

117 “É, a água não tem como ficar sem não! ... Eu vejo quando eles, assim passa no jornal, né?

Porque passa na televisão aí esses lugares, aí que as pessoas morrem de sede, né? Eles carregando água no balde, aquelas latinha de água, pra lavar, pra tomar banho, usando canequinha... As pessoas sofrem. Sofrem demais. Sofrem porque fica aquela vontade de ter, mas não tem condição nenhuma de poder comprar os encanamentos pra puxar, às vezes não tem dinheiro, né? E você sabe que a CESAN... Não faz isso de graça, sempre tem que ter aquela taxa e se a pessoa não tem, vai continuar abrindo um poço, vai beber aquela água, né? Ah, eu acho que é muito difícil, né? Ah, elas estão perdendo muita coisa, a oportunidade de não sofrer tanto, ter uma vida mais leve, mais saudável, né?” (ICa); “Eu acho que elas têm mais dificuldade ainda pra poder viver. Olha, acho que deve passar uma vida bem difícil” (ST); “Deve viver numa situação bem precária, né? Sujeita à doença, porque não toma banho, né? A água toda hora é necessária, né? Lavar as mãos, tomar banho, beber água, então, sem a água afeta assim, deve ser difícil, né? Ficar carregando a água ou indo atrás da água. Eu acho que, isso aí é até um crime, eu acho, né? Porque ficar sem água? Já pensou você carregar água?... Você abrir a torneira e não ter água, eu não me imaginaria sem água não, sinceramente... Vivem cheios de problemas, doenças, crianças com problemas, é, tem que ter essa água tratada, eu acho que teria que ter. Sofre muito não, né.” (JC).

Vale destacar a afirmação do RDH 2006: “Todos os cidadãos devem ter acesso a recursos suficientes para satisfazer as suas necessidades básicas e levar uma vida digna. A água potável faz parte do mínimo social, com um requisito mínimo de 20 litros por pessoa e por dia” (PNUD, 2006, p. 3).

Oito sujeitos encontram, no descaso do governo, outra razão para a falta de acesso à água. Há quem cite a corrupção como causa do descaso. Na ocasião em que estas entrevistas foram realizadas, estavam sendo divulgados na mídia escândalos de corrupção na política nacional:

“Ah, eu acho que... Falta de cuidado do governo com a população, né? Então, uns têm demais, outros têm de menos, outros não têm nada. Eu acho que é por falta de... De recurso, não chegou até lá...” (ICa); “Eu acho que é um pouco do descuido do governo também, entendeu? Porque se eles realmente se esforçassem, tinha como colocar água pra eles, porque eles gastam com tanta coisa, por que não vê esse lado, entendeu? Eu acho que o governo deveria se desempenhar mais, né? Eu acho que é falta de interesse das pessoas, não? Das pessoas que mandam, que governam as coisas” (ST); “Eu acho que é o lado social, né?

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É a exclusão social que vive o povo, essa questão da má distribuição de renda, né? Eu acho, o governo ou as pessoas que estão dentro da área, vamos supor, principalmente quem trabalha na área da CESAN, deveria fazer o possível, porque eu acho que é má vontade também, muito, deles, de fazer as coisas, falta de boa vontade. Eu vejo só pela política que está acontecendo no nosso Congresso, você vê porque um dos motivos, essa corrupção” (JC).

Ao mesmo tempo, oito sujeitos declaram não saber o motivo de umas pessoas terem acesso à água e outras não:

“Algumas pessoas têm água em casa e outras não têm... Essa aí eu não vou saber responder não!” (ICa); “Ah, isso aí eu não sei! Sinceramente eu não sei” (ST); “Eu não sei, aí eu já não sei nem te responder” (JC).

Nestes discursos, os entrevistados afirmam que não sabem responder, é sugestivo pensar que eles não sabem responder por que não existe mesmo uma resposta a isso. Porque não ter acesso à água em casa é uma situação indigna e malvada, uns terem acesso e desperdiçarem e outros não terem nada. A água é uma dádiva da natureza para a vida, dádiva que foi “seqüestrada” de alguns, de muitos, algo incompreensível e a ser percebido somente com o sentimento e às vezes com a revolta e não com palavras. “Sem água nós morremos! A água é uma dádiva da natureza!”49.

Um sujeito em Santa Teresa aponta como razão o desperdício de água por pessoas que têm acesso a ela:

“Eu acho que muita gente assim, desperdiça a água e isso faz com que outras pessoas às

vezes, fiquem em falta. Desperdício de uns, desperdício de outros, aí faz com que o local também não tenha água” (ST).

Enquanto isso, nove sujeitos, seis deles de Jardim Camburi, declaram que as pessoas não têm água em casa porque não se esforçam para isso:

“Podia fazer uma forcinha e ter, né? Oh, eu acho que aí é... Parte das pessoas, interesse

deles, de muitos, deveria fazer uma força pra botar, né? Ah, falta de... Controle dentro de

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casa” (ICa); “Às vezes é falta de desenvolvimento, é falta de cultura também, né? Porque aí depende do lugar onde essas pessoas vivem, né? Que por exemplo, cidade é difícil, né? A

pessoa não ter! Agora uma pessoa que mora em local de difícil acesso, tem esses cantos de rua, né? É difícil pra pessoa ter água em casa, energia, é muito difícil na periferia que não tem água e tal, fica difícil, né? Tem gente que não tem condições dele mesmo fazer a instalação de água, depende do governo e outros já tem mais facilidade, né? É, eu acho que assim, quanto mais carente, né? Mais difícil, eu acho assim, quanto mais carente o bairro, entendeu? Às vezes quanto mais carente a prefeitura ou coisa, as coisas ficam mais difíceis, o acesso à água, o acesso à luz, o acesso a tudo, né? Eu acho falta de esforços deles também, que se você quiser você faz, não faz? Corre atrás! Um pouco relaxamento, do dono da casa por não correr atrás” (JC).