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Toda a investigação realizada prevê a definição de pressupostos metodológicos que descrevam o percurso e as opções tomadas, nomeadamente as questões instrumentais que estão ao serviço da pesquisa, em que toda a questão técnica implica uma discussão teórica. Assim sendo, a metodologia deverá ser vista neste contexto como o conhecimento crítico dos caminhos do processo científico, averiguando e questionando acerca dos seus limites e possibilidades (Demo, 1989; Gómez, Flores, e Jiménez, 1999; Denzin e Lincoln, 2005).

Sucintamente pode-se afirmar que a investigação gira em torno de dois eixos: a metodologia quantitativa e a metodologia qualitativa. A metodologia quantitativa teve a sua origem com o pai da sociologia Auguste Comte, tendo como marco inaugural a sua filosofia positivista. O recurso a este paradigma metodológico justifica-se por permitir medir, analisar, replicar e aplicar o conhecimento obtido (Streubert e Carpenter, 2011).

No entanto, a impossibilidade e dificuldade das metodologias quantitativas em medir determinados fenómenos, conduziu a um interesse crescente pelas metodologias qualitativas, fruto de uma profunda reflexão da experiência vivenciada na prática. Sublinhe-se, porém, que este interesse só começou a surgir a partir de 1970, altura em que este método passa a se afirmar como uma alternativa à investigação quantitativa, abordando um mesmo problema de forma distinta.

Através da metodologia qualitativa os participantes podem fornecer informações únicas acerca da sua vivência, experiência de vida, relacionadas com fenómenos humanos, nomeadamente com os valores,

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cultura e relações humanas, que não podem ser obtidos através do recurso ao paradigma quantitativo (Streubert e Carpenter, 2011) o que, nas palavras de Morse (2007), constitui o desafio mais premente para os investigadores que pretendem recorrer a este género de investigação. Saliente-se, todavia, que existem formas diversas de alcançar o conhecimento, que se diferenciam, entre si, pela especificidade e unicidade dos seus pressupostos teóricos, técnicas e linguagens, denominadas por paradigmas, que Guba e Lincoln (2002) afirmam ser sistemas básicos de crenças e visões do mundo que orientam o pesquisador para a escolha dos métodos e nas formas ontológica e epistemologicamente fundamentais.

A procura de resposta para questões como Qual a natureza da realidade?

Qual a relação entre o investigador e o conhecimento? Que falta conhecer ou é passível de ser conhecido? Como faz o investigador falar o que falta conhecer? (Lincoln,1997), faz com que se entenda que tipo de paradigma

se adequa ao estudo do fenómeno que se pretende explorar, etapa que obrigatoriamente deve anteceder a escolha do método a utilizar, de forma a antecipar as eventuais dúvidas que dessa opção possam emergir, bem como para definir o desenho de investigação.

No entanto, convém salvaguardar que, de acordo com o paradigma que se opte, a resposta a cada uma das questões anteriormente apresentadas, será distinta. Quer isto dizer que o número de respostas será idêntico ao número de paradigmas existentes e que, no caso específico das ciências sociais, são quatro, nomeadamente: positivismo, pós-positivismo, teoria crítica e construtivismo (Queiroz, Meireles e Cunha, 2007).

O positivismo considera os métodos como meras técnicas de maior ou menor eficiência no levantamento de dados. De acordo com Queiroz, Meireles e Cunha (2007), tem como objetivo descobrir leis e generalizações conducentes à explicação da realidade, tentando prenunciar e controlar. Numa perspetiva ontológica, percebe a realidade como única, comandada por leis e mecanismos inalteráveis (Newman, 1992; Silverman, 1995), entende-a de forma simples, considerando os dados fragmentáveis, tangíveis, mensuráveis e convergentes (Queiroz,

69 Meireles e Cunha, 2007). Epistemologicamente, o conhecimento emerge a partir de hipóteses formuladas, que são testadas e verificadas, conduzindo à aceitação das suas conclusões como factos, o que traduz bem a racionalidade técnica deste paradigma (Schön, 2000). De acordo com esta conceção, parte-se do princípio de que o conhecimento considerado válido “só pode estabelecer-se por referência ao que se manifesta através da experiência” (p. 27). Para que tal se cumpra, objeto de investigação e investigador não deverão ser confundidos; pelo contrário, deverá ficar bem definida essa dualidade, devendo ser encarados como duas entidades independentes, sem que haja influência mútua, numa aproximação facilitada e limitada pelas hipóteses enunciadas, com o objetivo de as testar e obter conhecimento que servirá para explicar determinado fenómeno, permitindo o seu controle (Charmaz, 2006; Bryant e Charmaz, 2010).

De acordo com Guba e Lincoln (2002), o pós-positivismo teve a sua origem nas críticas levantadas ao positivismo, mantendo, todavia, os pressupostos básicos e fundamentais do positivismo. Em termos ontológicos defende que o que é desconhecido deve-se à incapacidade para ser conhecido. Por outro lado, em termos epistemológicos, consideram que a objetividade não é possível, só se podendo fazer aproximações (Newman, 1992), pelo que, como forma de contornar a subjetividade existente, conciliam a experimentação modificada com a triangulação de dados.

No que se refere ao paradigma da teoria crítica, também denominada por ciência crítica, salienta-se que poderá ser subdividida em três, especificamente pós-estruturalismo, pós-modernismo e uma fusão entre ambas. Independentemente dessa distinção, importa referir que partilham um objetivo comum, nomeadamente o facto de procurar a emancipação dos indivíduos pela crítica às ideologias, combatendo a desigualdade através de alterações nas perceções dos indivíduos na ação que conduz à transformação da autoconsciência e das condições sociais (Queiroz, Meireles e Cunha, 2007). Ontologicamente caracteriza-se por ter uma natureza da realidade múltipla, construída, divergente, envolvida em aspetos de equidade e hegemonia. Epistemologicamente distingue-se por

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ser inovadora e por defender que a investigação deverá ser orientada por valores (Guba e Lincoln, 2002; Queiroz, Meireles e Cunha, 2007). Salienta- se que nesta teoria a realidade é compreendida como sendo mentalmente construída, baseada na sociedade e na experiência, tornando o conhecimento subjetivo, razão pela qual se procura eliminar elementos deturpadores da consciência (Queiroz, Meireles e Cunha, 2007).

Relativamente ao último paradigma apresentado pelas ciências sociais, o construtivismo, também por alguns denominado por interpretativismo, registe-se que ontologicamente é gerado pelo relativismo. Toma em linha de conta o facto de a realidade ser uma construção mental e, como tal, passível de ser interpretada de formas diversas e distintas, conferido subjetividade a qualquer investigação que se encete. Ao reconhecer esta realidade, a admissão da subjetividade é assumida, de tal modo que os achados da investigação resultam de um processo de concertação entre o investigador e os sujeitos respondentes (Newman, 1992). Queiroz, Meireles e Cunha (2007) salientam que os acontecimentos neste paradigma deverão ser compreendidos recorrendo a processos mentais interpretativos, influenciados pela e na interação com a sociedade.

Antes de se avançar mais nestas questões metodológicas, torna-se obrigatório reconhecer que nas ciências sociais a influência da posição, da história biográfica, da educação, interesses e preconceitos do pesquisador podem, quer direta quer indiretamente, assumir um papel preponderante na investigação. Assim, como refere Thiollent (1980) pode-se afirmar que neste paradigma, a neutralidade nas pesquisas sociais é algo que efetivamente não existe e a sua objetividade é relativa, posição não partilhada pelo positivismo, que declinam a subjetividade no seu paradigma e a quem é atribuída a autoria de inúmeras censuras e críticas feitas à metodologia qualitativa.

Assim sendo, o construtivismo acaba por se estabelecer numa posição mais próxima à visão de Max Weber, que assenta no entendimento de que o conhecimento sociológico é influenciado por valores, sendo que a objetividade, só é possível quando são definidos critérios claros e concretos que deverão ser definidos pelo pesquisador em relação aos

71 problemas que está a investigar, cientificando todo o processo metodológico.

Ainda assim, saliente-se que nos últimos séculos (provavelmente nos últimos quatro), foram os paradigmas positivismo e pós-positivismo que dominaram (e ainda dominam) a investigação, assumindo influência nos poderes decisórios e políticos. Todavia, nos anos mais recentes, tem-se assistido a um aumento da utilização quer da teoria crítica quer do construtivismo, desafiando-se a medição e notando-se uma crescente aceitação, que se traduz pelo financiamento, por agências e programas, de projetos exclusivamente qualitativos (Guba e Lincoln, 2002; Streubert e Carpenter, 2011).

Deste modo, uma vez que o principal objetivo deste trabalho é a descrição de um foco relativo à profissão de enfermagem e dada à importância que este paradigma assume para a compreensão do método que se irá utilizar, dedica-se o próximo subcapítulo a explorar um pouco mais sobre o construtivismo.