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3.3 Diferentes abordagens do fenômeno lingüístico oração relativa (adjetiva)

3.3.2 Perspectiva da Gramática Descritiva

Sob o enfoque descritivo, Perini (2001) entende a oração relativa como aquela que tem a função de modificador externo dentro de outra oração, a principal, sendo sempre subordinada a esta. Conforme o autor, a construção relativa tem o seguinte perfil: a) apresenta um pronome relativo (que, o qual, quem, onde, cujo, quanto) que às vezes pode vir precedido de preposição; b) apresenta uma estrutura oracional que aparenta ser incompleta, após o relativo; c) articula um elemento nominal + o pronome relativo + a estrutura oracional em questão, formando uma seqüência que o autor denomina sintagma nominal, ainda que nem sempre o elemento nominal inicial se faça presente.

Para Perini (2001), o fato de ser uma oração incompleta é apenas aparente, pois o conectivo exerce determinada função sintática na oração relativa, completando-a. A título de exemplo, retomando o enunciado já empregado anteriormente: “Logo que iniciou a festa, identificamos a mulher que não tinha sido convidada”, podemos dizer que a oração relativa “que não tinha sido convidada” é completa, pois apresenta sujeito (papel exercido pelo pronome relativo que) e predicado. A prova de que o pronome relativo é o sujeito da oração está no fato dela não aceitar a introdução de outro sujeito: “Logo que iniciou a festa, identificamos a mulher que ela não tinha sido convidada” (construção inadequada). O mesmo ocorre com as demais funções que o relativo pode exercer na oração em que atua. Enfim, a oração relativa exerce sempre a função de modificador externo, constituindo parte de um sintagma nominal. E o pronome relativo (assim como a preposição e a conjunção) consiste em uma classe de conectores subordinativos existentes na língua.

Nesse contexto, Perini (2001) entende que o pronome relativo (precedido ou não de preposição) exerce funções de nível oracional como sujeito, objeto direto e adjunto circunstancial, posicionando-se sempre no início da oração, independentemente da função

ocupada. Semanticamente, o pronome relativo é interpretado como co-referente do elemento nominal que o antecede. Também existem casos na construção relativa em que não há antecedente antes do relativo, mesmo assim, eles preenchem os requisitos da estrutura oracional. No exemplo, “Só respeito quem me respeita”, encontramos todos os traços necessários a tal estrutura, quer dizer, há um pronome relativo (quem); esse relativo desempenha uma função sintática na subordinada (aqui, de objeto direto do verbo respeitar), e introduz a oração relativa. Portanto, a construção de relativa forma um sintagma nominal extensivo à oração principal.

No caso particular do pronome relativo cujo, tanto a oração relativa tem a função de modificador externo quanto o próprio pronome exerce essa função, como podemos observar no exemplo que segue: “O rapaz cujo pai morreu é nosso vizinho”. Nesse caso, a oração relativa “cujo pai morreu” é modificador externo de rapaz; e o pronome cujo é modificador externo de pai. Aqui também podemos comprovar a classificação do pronome com base no fato de não ser possível introduzir outro modificador ao elemento “pai”, uma vez que essa função já está sintaticamente preenchida. Perini (2001) explica o comportamento do pronome cujo pelo fato de ocupar o lugar do determinante, jamais ocorrendo concomitantemente com ele, embora aceite outros termos do sintagma nominal tais como: “O rapaz cujo o pai morreu é meu vizinho” (construção inadequada gramaticalmente); “O rapaz cujo aquele pai morreu é meu vizinho” (também inadequada); “O rapaz cujo velho pai morreu é meu vizinho” (adequada – aceita o uso de um adjetivo).

Assim como para a GT, também para a Gramática Descritiva as orações relativas podem se manifestar de duas maneiras, ora restringindo ora explicando o sentido expresso por seu antecedente. A diferença formal, enfatiza Perini (2001), é que as explicativas estão sempre separadas por vírgula, enquanto as restritivas raramente o são. Diferentemente da nomenclatura tradicional, para não confundir o aspecto sintático com o semântico, o autor prefere chamá-las de apositiva (a explicativa) e de não-apositiva (a restritiva). As duas construções relativas apresentam estruturas sintáticas parecidas, mas com o a seguinte diferença: só a apositiva pode ser separada por vírgulas e empregar o pronome relativo o qual sem preposição.

Ainda no que se refere ao uso do pronome relativo, Perini (2001, p. 156) defende que ele pode assumir diferentes funções: a) no caso de quem, ele só pode ocorrer sem antecedente

(“Só admiro quem cumpre seus compromissos”), podendo ou não ser precedido de preposição (“A mulher a quem me dirigi é minha tia”); b) o qual, em oração não-apositiva, só pode ocorrer precedido de preposição, já que seu uso sem preposição é exclusivo da apositiva; c) o que só pode ocorrer sem antecedente; d) o pronome relativo que só pode ocorrer com antecedente, tanto em oração apositiva quanto não-apositiva.

Após a abordagem descritiva da oração relativa, passamos a entendê-la também sob a perspectiva da Gramática de Usos (Funcional), cujo objetivo é entender e explicitar o uso efetivo atual da nossa língua materna. O emprego das expressões lingüísticas na interação verbal implica uma sistematização dos aspectos sintático e semântico do modelo lingüístico, para que assim possamos entender a gramática a partir da capacidade de escolha do falante em sua produção lingüística, integrando a organização gramatical a uma teoria global de interação. Para Neves (1997, p. 15), o interesse dessa gramática pela competência comunicativa do falante consiste em trabalhar com a “capacidade que os indivíduos têm não apenas de codificar e decodificar expressões, mas também de usar e interpretar essas expressões de uma maneira interacionalmente satisfatória”.

Em sua obra “Gramática de usos do português”, Neves (2000, p. 14) busca encontrar a descrição do sentido, “partindo do princípio de que é no uso que os diferentes itens assumem seu significado e definem sua função, e de que as entidades da língua têm de ser avaliadas em conformidade com o nível em que ocorrem, definindo-se, afinal, na relação com o texto”. Isso significa que “a interpretação das categorias lingüísticas não pode prescindir da investigação de seu comportamento na unidade maior – o texto, que é a real unidade de função” (idem, p. 15).