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3. ABORDAGEM METODOLÓGICA

3.1 O CASO E AS ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS

3.1.1 Perspectiva metodológica da análise

Para auxiliar na interpretação das entrevistas, adotamos, como principal referência, Laurence Bardin (2010) que apresenta, de maneira sistematizada, a perspectiva da análise de conteúdo, especialmente, no que se refere à estruturação das etapas e do plano de análise. Porém, foram agregadas referências complementares em virtude da necessidade de trazer mais elementos para alicerçar a opção qualitativa de análise em detrimento da análise da frequência de aparição de determinados índices. Com isso, não queremos dizer que a autora não trata da abordagem qualitativa de análise, afinal, ela argumenta em favor de seu uso a depender da situação. De acordo com Bardin, para que a análise seja realizada, “não é obrigatório ter-se como guia um corpus de hipóteses”, pois algumas análises são efetuadas “sem ideias pré-concebidas”, a partir de “procedimentos de exploração7

que possibilitam um “processo dedutivo e facilitam a construção de novas hipóteses” (p.124-125). Além disso, ao tratar da codificação, considera a presença de determinados elementos como um indicador que, independentemente de sua contagem, pode tornar-se “um índice tanto (ou mais) frutífero que a frequência de aparição” (p.140). Neste caso, a ausência de determinados elementos no texto também é considerada como veiculadora de sentidos. Martin Bauer (2012), em sua revisão sobre análise de conteúdo, considera que, ao “focalizar frequências”, a análise de conteúdo “descuida do que é raro e do que está ausente”. Porém, este “é um problema de enfoque” possível de ser superado, pois, apesar do “viés para o presente”, é possível dedicar atenção às ausências (p.213).

Para Bardin (2010) a organização da análise de conteúdo está subdividida em “três polos cronológicos”: (1) pré-análise – objetiva sistematizar materiais e pontos importantes a serem observados ao longo do processo (2) exploração do material – 7 Bardin cita como referência para a discussão de procedimentos abertos e procedimentos fechados P. Henry e

permite codificar e decompor o material e (3) tratamento dos resultados obtidos e interpretação – torna os resultados decorrentes do processo “significativos e válidos”.

O caminho percorrido ao longo desta pesquisa propiciou a realização de entrevistas com o devido cuidado e articulação teórica para evitar um roteiro de questionamentos que fosse desenvolvido no intuito de satisfazer expectativas. Por isso, foi criado apenas um roteiro prévio que esteve aberto a novas inserções de acordo com o diálogo com cada interlocutor. Cada pergunta tinha o objetivo de conhecer, com uma maior riqueza de detalhes, a equipe e o processo de produção das mídias. Portanto, as falas dos autores entrevistados não serão utilizadas como mera fundamentação para consolidar argumentos preestabelecidos. A análise dos materiais contribuiu para novas interpretações na pesquisa e a maior parte das categorias emergiu no processo. Por esse motivo, também serão evidenciadas mais falas dos membros da equipe, pois, de acordo com a abordagem adotada para este estudo, é fundamental compartilhar compreensões etnometodológicas. No processo desta pesquisa, as intervenções dos autores entrevistados contribuíram de maneira significativa para o desenvolvimento do projeto.

Fiz a opção ética de assumir a responsabilidade por realizar as transcrições, pois, diante do compromisso de manter o sigilo das entrevistas, eliminei qualquer chance de pedir ajuda ou contratar alguém para auxiliar nessa etapa. Porém, apesar do volume de trabalho, essa escolha foi essencial por conta do aprendizado e pela satisfação de ver um relato de experiência ser construído com auxílio dos autores envolvidos no processo. Essa etapa também foi importante, pois a necessidade de ouvir minuciosa e repetidas vezes cada trecho do material possibilitou novas interpretações e ampliou o campo de visão. Durante a etapa de transcrição foram inseridos alguns comentários importantes e começaram a ser evidenciadas algumas unidades de registro e categorias que não estavam previstas, mas consideramos que isso não seria suficiente para alcançar uma maior riqueza de detalhes. Para tal, foram realizadas “leituras flutuantes” (BARDIN, 2010, p.122) do material transcrito no intuito de buscar novos elementos em uma revisão mais detalhada para a continuidade da análise.

O material foi codificado ao longo de uma análise mais densa a partir de unidades de registro temáticas com referências ao contexto em que estavam inseridas. Não foi utilizada uma regra de contagem, mas foi considerada na análise a presença e ausência de temas considerados importantes ou que emergiram ao longo

do processo. Para a categorização também foram estabelecidos alguns critérios com base nos objetivos e hipóteses, previamente descritos, e considerados os elementos emergentes do processo como fundamentais para ampliação do olhar.

À medida que a leitura densa se realizava, identificavam-se as unidades de registro temáticas, considerando o referencial teórico e as anotações prévias feitas durante a transcrição e leitura flutuante. A primeira subdivisão temática propôs os seguintes eixos: (1) Relação entre as pessoas da comunidade e com o lugar; (2) Hierarquias e o processo de tomada de decisão; (3) Participação social; (4) Satisfação com as atividades desenvolvidas na unidade de saúde; (5) Relação entre as pessoas da equipe; (6) Processo de produção; (7) Importância do uso da linguagem local para viabilizar a comunicação; (8) Surgimento da rádio e sua importância; (9) Etnométodos; (10) Institucionalidade e (11) Detalhamento de outras atividades de educação desenvolvidas, além da rádio.

A partir dessas subdivisões, optamos por reorganizar as unidades e realizar a análise, considerando como categorias centrais: (1) a caracterização do campo para tratar do lugar e das pessoas envolvidas no intuito de contribuir com uma melhor apresentação do contexto em que foi realizado o trabalho; (2) o processo de

produção dos programas de rádio com detalhamento das atividades em cada

etapa e (3) a participação social para apresentar as impressões etnoanalíticas sobre a influência das atividades desenvolvidas e da organização da equipe na interação com os membros da sociedade.

O resultado preliminar dessa pesquisa foi compartilhado com o grupo social envolvido para análise e críticas, visando a revisão coletiva acerca de possíveis equívocos ou distorções do pesquisador que se distancia para um olhar individual a respeito de uma produção, essencialmente, interativa.

Durante a realização da pesquisa, o senso de responsabilidade com este trabalho ampliava-se, pois, ao mesmo tempo que era fundamental ter o cuidado para evitar deslumbramentos, precisava também manter a preocupação com a maneira como seriam sistematizados os resultados para manter uma coerência com o que foi compartilhado e não cometer deslizes éticos. Apesar do interesse em interferir de imediato, o desenho escolhido para a pesquisa não era condizente com tal proposta. Por isso, minha atuação buscou apenas conhecer os processos e, a partir da sistematização, trazer pontos relevantes para a análise proposta.