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Promoção da saúde e o protagonismo social

1. INTRODUÇÃO

2.2 O DIÁLOGO RADICAL COMO ALICERCE DA PROMOÇÃO DA SAÚDE

2.2.3 Promoção da saúde e o protagonismo social

Os teóricos que discutem promoção da saúde trazem a participação social como categoria fundamental na construção de suas propostas, portanto, esse é um dos pontos cruciais, relatados por pesquisadores que comparam as diferentes correntes. Carlos Freitas (2003), ao comparar as duas principais tendências da promoção da saúde, considera que uma direcionou importância quase exclusiva para mudanças de atitudes individuais de prevenção, buscando transformar comportamentos e estilos de vida; a segunda, ampliaria a primeira, considerando a importância de intervenções ambientais realizadas por meio de políticas públicas. O autor cita a Carta de Ottawa como documento de referência para o desenvolvimento das ideias de promoção da saúde no mundo e considera que a Declaração de Bogotá teve importância similar para a América Latina, pois colocou em pauta as principais discussões a respeito da necessidade de promover transformações sociais para superar as desigualdades. Sérgio Carvalho (2007), ao estudar o movimento da promoção da saúde no Canadá, realiza uma sistematização das principais correntes: (1) a primeira tendência teria se desenvolvido a partir do Relatório Lalonde, é denominada de “corrente behaviorista” e busca transformar comportamentos individuais não saudáveis; (2) a segunda, influenciada pela Carta de Ottawa, ficou conhecida como a “nova promoção da saúde” e enfatizaria a atuação sobre os determinantes socioambientais e a participação social nos processos decisórios; (3) a terceira corrente, influenciada pelo artigo Producing Health, Consuming Health Care, ficaria conhecida como a “corrente da promoção da saúde da população” e dá grande ênfase à atuação do Estado perante os macrodeterminantes econômicos, mas deixa de lado a importância da participação dos coletivos organizados ao desconsiderar categorias como poder, luta de classes e iniquidades sociais. Outros dois artigos de Paulo Buss (2000) e de Antonio Carvalho e Buss (2008) acrescentam elementos fundamentais para discussão da promoção da saúde, especialmente ao demonstrar como a evolução desse conceito interagiu com as formulações teóricas sobre os determinantes sociais de saúde e municípios saudáveis, evidenciando a necessidade de ações intersetoriais e da participação social para construção da saúde coletiva.

Propor uma promoção da saúde crítica, vincula-se diretamente à necessidade dos grupos sociais apropriarem-se de conhecimentos que subsidiem a análise de

seus métodos em busca de coerência entre propostas e atuação para a construção de sua práxis. De acordo com Jairnilson Paim (2008c),

a constituição de novos sujeitos sociais e o desenvolvimento de uma consciência sanitária que promovam a desmedicalização da sociedade, o reforço à cidadania plena e a participação social parecem fundamentais para a sustentação do processo da RSB [Reforma Sanitária Brasileira] e o desenvolvimento do SUS [Sistema Único de Saúde] nos próximos anos (p.117).

Em uma conjuntura reestruturada por esses novos autores, ampliam-se possibilidades de reflexões e de atuação social para superar as desigualdades sociais e, consequentemente, ampliar o movimento e as oportunidades de promoção da saúde. Ao considerar o conceito ampliado de saúde, evidencia-se a necessidade de construir propostas que reconheçam os membros da sociedade como protagonistas em seu espaço e tempo. O intuito não é transferir para as pessoas a culpa pelo não desenvolvimento de ações que são de responsabilidade do Estado, mas oportunizar o amplo diálogo crítico e horizontal a respeito de pautas de interesse de toda a sociedade, para garantir direitos e poder exigir os deveres estatais. Espaços deliberativos como conselhos e conferências ampliam seu poder de intervenção se são ocupados e utilizados criticamente para possibilitar a legítima atuação social na definição das prioridades da saúde. Porém, é necessário pensar em outros espaços, além dos institucionalizados, para ampliar o poder de intervenção da sociedade. É nessa perspectiva que a interação entre educação, comunicação e saúde torna-se tão importante nas diversas ações promovidas pelos coletivos organizados.

Ao discutir a comunicação em um “sistema voltado para a saúde coletiva e o bem estar social, o SUS” (p.113), Inesita Araújo (2007) propõe a aplicação dos seus princípios e diretrizes para a perspectiva da comunicação. Nessa abordagem, o princípio da universalidade propõe “a comunicação como um direito de todos” (p.114) e, aliado ao princípio da equidade, possibilita diferentes apoios para aqueles com diferentes condições, sejam elas sociais ou econômicas, de se expressar ou ter acesso aos meios necessários para tal. A integralidade propicia o acesso a todos os níveis e meios necessários da produção, bem como, às formas de circulação e às condições adequadas que possibilitem a apropriação de conteúdos circulantes. A descentralização e a participação favorecem a criação de “canais locais de expressão e circulação de mensagens” (p.120) no intuito de contemplar contextos diferenciados

e compartilhar o poder de decisão “sobre que comunicação fazer, para quê, para quem, de que forma” (p.120). Para a autora,

Podemos dizer que a comunicação tem caminhado na contramão do SUS. Enquanto este recomenda a descentralização, como diretriz, a comunicação cada vez mais se encontra centralizada, em todos os níveis. É centralizada nos níveis de gestão, na medida em que o Ministério da Saúde detém a maior parte dos recursos para desenvolver estratégias de comunicação, ficando as secretarias estaduais com uma parte menor, e as municipais, então, com pouquíssimo. E é justamente no âmbito do município que se tem maior chance de aproximação com os contextos locais. A comunicação é centralizada quando opomos as instâncias públicas às não- governamentais ou aos movimentos sociais, que poucos recursos dispõem para essas atividades. E é centralizada se considerarmos as instituições de saúde em relação à população, que não dispõe de meios para produzir e fazer circular sua comunicação (p.120).

A conquista de condições para descentralizar a comunicação e o poder de participação por parte dos membros ou grupos organizados, possibilita ampliar a autonomia e o poder de cada autor ou coletivo contar seu ponto de vista da história para ser veiculada por diversos meios, no intuito de apresentar sua cultura. Essa discussão está diretamente relacionada com uma perspectiva de promoção da saúde mais abrangente e propõe superar a concepção de um Estado que se coloca como mero mediador das pressões sociais para garantir que os grupos dominantes permaneçam no poder. Portanto, sem a pressão e o protagonismo social atuando como definidores de prioridades, o Estado não se vê “motivado” a oferecer benefícios para os grupos com maiores necessidades. A partir da descentralização da produção midiática é possível obter avanços para uma efetiva mobilização e participação social que se tornem promotoras de saúde.