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Plano Municipal de Cultura (PMC) na perspectiva de uma implementação “de aprendizado” (policy learning)

2003-2005 Articulação política

4.2 Plano Municipal de Cultura (PMC) na perspectiva de uma implementação “de aprendizado” (policy learning)

Dado o interesse desta pesquisa ser a implementação do SNC em nível municipal, que pressupõe a construção do Plano Municipal de Cultura (PMC), nos ateremos às premissas e princípios metodológicos deste, deixando os comentários do Plano Estadual de Cultura, de certa forma,87 à parte.

Dentre os elementos do SNC, em nível de município, como já nos referimos, o PMC é o mais importante, pois é o planejamento a longo prazo e nele estarão contidos todos os compromissos do poder público para o setor cultural numa perspectiva de dez anos. Dele que decorrerá diretrizes, objetivos, metas, ações, prazos de execução e indicadores de resultados para o seu acompanhamento.

Em todas as etapas a elaboração de planos municipais deve envolver o poder público e a sociedade. Do poder público, os partícipes são os dirigentes e técnicos da prefeitura, assim como representantes de órgãos estaduais e federais com atuação no município. Sendo a versão final do documento uma lei a ser aprovada na câmara municipal, é essencial a participação dos vereadores e das frentes parlamentares voltadas à cultura. O conhecimento prévio da proposta certamente favorecerá a aprovação posterior da lei (BRITTO, 2017).

Quanto à participação da sociedade, esta é imprescindível e pode ocorrer de diversas maneiras, tais como: por meio de deliberações do conselho municipal de políticas culturais, mas, na ausência deste, poderá se organizar um fórum municipal específico para o plano, segundo os moldes de funcionamento dos conselhos. O plano será tanto mais legítimo quanto maior for a participação social no planejamento, garantindo reconhecimento e valorização e, consequentemente, maior possibilidade de êxito na execução.

Segundo Britto (2017), o processo de planejamento tem duas dimensões, uma é técnica – com procedimentos metodológicos para a organização, sistematização e hierarquização dos subsídios/dados e demandas –, e a outra é a dimensão que se constitui de escolhas e decisões das rotas a serem seguidas e sobre os objetivos e metas a serem alcançadas, daí advém a importância da participação social.

A transversalidade e a intersetorialidade são características das políticas culturais consistentes, pois, embora haja um órgão gestor que coordene a cultura, o PMC não deverá ser operado isoladamente, mas sim em integração e interatividade com os demais campos,

87 Nos referimos a pressuposição de que, sendo regido por um “sistema-mãe”, o Plano Estadual de Cultura (PEC) deve obedecer às orientações e diretrizes do PNC que, basicamente, são válidas a todas as instâncias.

setores e áreas de atuação municipal de modo a incorporar nelas, elementos atualizados e gerar outros que essas áreas possam assumir.

É necessário, ainda, o alinhamento entre os planos e sistemas municipais com os planos e sistemas estaduais e nacional de cultura. Além de que, pela natureza da cultura e sua relação com o desenvolvimento local, todos os fatores relacionados e de interesse do município e resultante de sua relação com outras esferas de governo deverão estar integrando o PMC. Portanto, o PMC deverá ser amplo e abrangente a ponto de envolver todos os segmentos e regiões do município, de modo a contemplar todo o município, sem restringir-se “a grupos mais bem organizados e estruturados, ou localizados nas regiões centrais da cidade” (BRITTO, 2017, p. 14).

Há que se ressaltar a importância de o PMC ser garantido por aparato legal, ou seja, ser instituído por lei específica, aprovada na câmara de vereadores e sancionada pelo prefeito, tornando-se, assim, parte do arcabouço legal da cultura. Eleger e observar essas premissas e princípios colabora para que o PMC adquira legitimidade – por envolver legalidade formal –, representatividade política e tenha consistência técnica.

Dessa forma, com fins ilustrativos dessa etapa da construção de um PMC, conforme prevê o SNC, consideremos a figura abaixo.

Figura 9 - Etapas de elaboração do Plano Municipal de Cultura.

Fonte: Britto (2017, p. 28).

Mesmo que estejamos demonstrando essas etapas válidas para qualquer construção de PMC, enfatiza-se que a construção desse instrumento de gestão deve, impreterivelmente, apresentar uma coerência com seu local, época e fins. Assim, deve se assentar numa base territorial e um contexto histórico definidos, que é o município, as condições88 históricas deste e, as prioridades do mesmo, respectivamente (BRITTO, 2017, p. 29). Ou seja, o que se

88 Aspectos históricos, culturais, geográficos e ambientais, demográficos, econômicos, sociais, políticos e institucionais (BRITTO, 2017).

adequará à realidade local são os conteúdos das demandas e suas deliberações no local resultantes de suas conferências (considerando vocações e potencialidades, recursos, fragilidades e obstáculos e outros), assim também como deve examinar os mecanismos mais específicos e adequados a serem lançados mão para o implemento das ações.

Onde se quer chegar, como se vai chegar e, em que espaço de tempo chegar, são também importantes definições na fase de elaboração do PMC para se traçar as bases estratégicas e operacionais desse processo, tais como metas, ações e previsão de resultados. Nesse contexto, cabe prever o monitoramento e a avaliação do processo em implementação, pois “a implementação de políticas constantemente orienta novas políticas”, nos dizem Silva e Melo (2000), em consonância com Charles Lindblon (1968), em The policy-markig process.

Nesse caso, estamos nos referindo a uma concepção de implementação que concebe o ato de implementar como aprendizado, ou seja, uma gestão que se auto avalia para se renovar sempre diante da dinâmica do processo. Embora essa não seja uma atitude comum (e, por vezes nem bem vista) por parte dos gestores mais afeitos a uma visão “top-down” da implementação de políticas públicas, seja por não terem a avaliação como prática (cultura política), seja por um suposto (e tolo) constrangimento à revelação que essas possam lhes causar, seja por falta de pessoal tecnicamente capacitado para assim operar.

Como a implementação implica em tomada de decisões, ela própria se constitui em fonte de informações para a formulação de políticas e de sua inovação para renovação. Em outros termos, se entendermos que a implementação e avaliação de políticas e programas são “testes de modelos causais” (SILVA; MELO, 2000), então, elas estão sujeitas à corroboração ou ao abandono.

Daí porque monitorar e avaliar a implementação são aspectos de fundamental importância tanto para os gestores quanto para a sociedade, sobretudo em processos de implementação democráticos. No caso dos gestores, porque estes podem tê-los como “termômetro” da implementação e, desse modo, podem ajustá-la, corrigi-la a tempo ou, até mesmo abortá-la e substitui-la por outra, em caso de maior desacerto.

No caso da sociedade (beneficiários, implementadores, grupos de interesse, stakholders), porque, se a sociedade se constitui parte do “jogo político” e se sente partícipe (seja no que concerne à forma de uso ou consumo das políticas), tomar conhecimento dos problemas, até como dever e direito à informação (exercício de cidadania), pode viabilizar sugestões conjuntas (participação e controle social) para a retomada de equilíbrio em determinado processo, além de endossar a base de sustentação política. Em termos de

avaliação de implementação, essa atitude estratégica podemos denominar de policy learning que significa o aprendizado na implementação de uma política pública.

A gestão de uma política pública é preocupação também no campo cultura, pois, ao observar a trajetória das políticas culturais, compreendemos alguns dos motivos para a preocupação com a configuração da institucionalização da cultura, “a exemplo da instabilidade que caracteriza a gestão pública de governos federal, estaduais e municipais” (ROCHA, 2013, p. 1). Alguns desses problemas estão assentados na questão da centralização/descentralização e institucionalização democrática; pouca participação nas decisões; práticas viciadas no serviço público (clientelismo); ausência de eficiência, eficácia e efetividade na implementação e por aí afora.

Ter ciência dessa situação é fundamental para elaborar qualquer projeto que pretenda de forma compartilhada (envolvendo municípios, estados e União) construir políticas públicas de cultura capazes de ultrapassar períodos de governo sem prescindir da dinâmica própria da democracia, sem recair em governos autoritários e ditatoriais e realmente se efetivar como satisfação aos anseios e demandas da sociedade. Daí, “Ressalte-se que a descentralização da cultura, além de induzida pelos órgãos públicos, responde a uma demanda latente da população” (MACHADO, 2007, p. 50) e que é onde se encontra a base propositiva e intencional do Sistema Nacional de Cultura (SNC).

É preciso entender que todo esse Sistema com seu conjunto de agentes, instituições e estrutura estão intimamente vinculados às condições históricas do meio em que atua e participa de maneira específica, tanto transformando quanto sendo transformado e constituindo, portanto, um processo no qual o interesse em conhecer suas especificidades e características deve ser de todos para, assim, o avaliar em sua efetividade num período de dez anos.

5 RESULTADO DA AVALIAÇÃO DA IMPLEMENTAÇÃO DO SNC NO