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3 SEGURANÇA PÚBLICA, REFORMA POLICIAL E POLÍCIA COMUNITÁRIA

3.3 Polícia Comunitária e a reforma das práticas policiais

O conceito de reforma policial, utilizado no presente estudo, refere-se às mudanças protagonizadas pelas instituições de segurança pública; sobretudo, mudanças nas práticas, mesmo que não sejam reconhecidamente legalizadas pelo Estado ou aquelas originadas em qualquer ato normativo institucional. Assim, o que mais representa a crescente relação da sociedade civil com as organizações policiais são as práticas promovidas pela Polícia Comunitária, que tem estado presente nas democracias mundiais, representando “o lado progressista e avançado do policiamento” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 15). Fato é que “o policiamento comunitário está bastante vivo ao redor do mundo e parece que vem crescendo rapidamente” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 19).

Os líderes das polícias já compreenderam na prática o que já vinha sendo constatado nas pesquisas acadêmicas: que as ações tradicionais, comumente utilizadas pelo mundo, não são soluções para os crimes (SKOLNICK; BAYLEY, 2006). Os autores analisaram algumas premissas que questionavam o pensamento tradicional nas estratégias de policiamento, as quais podem ser divididas em quatro temas. Em primeiro lugar, a confiança na polícia está mais na resposta segura e não, necessariamente, na rapidez da resposta do chamado de emergência, como se pensava nas estratégias tradicionais, pois a rapidez na resposta do chamado de emergência não interessa muito ao cidadão.

Em segundo lugar, os líderes das polícias constataram e reconheceram que o orçamento e o efetivo policial é a parte menos importante na equação de combate ao crime, ou seja, uma vez que certo limiar tenha sido alcançado, não é significativo um aumento dos recursos financeiros nem de pessoal. “As condições sociais, como renda, desemprego, população e heterogeneidade social, são indicadores muito mais importantes de variação nas taxas de crime e de resolução de crimes” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 67). Por conseguinte, outra premissa é que mais policiais por viatura não promove, necessariamente, a redução do crime; e, menos policiais nas viaturas também não tornam as equipes mais vulneráveis a ataques.

Em terceiro lugar, o patrulhamento motorizado realizado à deriva não reduz o crime, nem melhora as chances de surpreender delinquentes cometendo crimes. Esse tipo de patrulhamento também não gera maior confiança nas forças policiais. Deparar com um crime com ele sendo praticado, é um evento raro; portanto, a prisão realizada nessas condições deve ser considerada como exceção. Nessa estratégia de policiamento, na maioria das vezes, os

policiais patrulham passivamente e providenciam serviços de emergência. Mesmo que, ocasionalmente, reduza-se a criminalidade de uma localidade específica nessas condições, o que ocorre de fato é o deslocamento dos fenômenos criminais para outras áreas.

Por fim, em quarto lugar, as investigações criminais sem o apoio da comunidade local não é tão eficaz como parece ser. Geralmente, os crimes são solucionados quando o autor é preso imediatamente após o fato, o que é raro, ou quando a comunidade coopera. Solicitação, denúncia ou apoio da comunidade é o mais importante na solução dos crimes. A investigação policial, por si só, isolada da comunidade, mesmo que técnica e provida de recursos de alta tecnologia, não surte o efeito esperado.

Essas constatações sugerem que as estratégias tradicionais não estão reduzindo o crime nem amparando as vítimas. A solução seria, então, reformular estratégias de policiamento, por meio de uma aproximação da polícia e da sociedade, para que juntas se tornem coprodutoras da prevenção do crime (SKOLNICK; BAYLEY, 2006). O modelo tradicional, presente nos EUA desde os anos 1930, sofreu sérias críticas, fazendo com que todos repensassem o papel da polícia (ROSENBAUM, 2012). Brodeur (2012b) também afirma que desde 1945 um grande número de experimentos tentava reformar a polícia.

Um exemplo de práticas de policiamento comunitário é analisado por Skolnick e Bayley (2006) que, considerando as iniciativas particulares, defendem que o primeiro americano a propor uma versão comunitária do policiamento foi Arthur Woods, Comissário de Polícia de Nova Iorque de 1914 a 1919. Os policiais operacionais visitavam as escolas e explicavam os alunos sobre o nobre trabalho policial, que não era apenas prender pessoas, mas também tornar o bairro um lugar melhor e mais feliz para se viver. Também presenteavam jovens ajudantes da polícia com distintivos especiais como forma de se aproximar da sociedade e conquistar reconhecimento e respeito. Como a maioria das reformas promovidas pontualmente nessa época, as iniciativas de Woods foram se enfraquecendo depois de mudanças no comando. “Infelizmente, o Departamento de Polícia de Nova Iorque teve uma recaída e novamente se viu envolvido com a máquina política associada à corrupção” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 59).

De forma geral, as reformas existentes no mundo, e apresentadas pela literatura, dão conta de que caminham, em certa harmonia, na direção do tema: Polícia Comunitária. Esse movimento de reforma da polícia começou no Reino Unido, logo após a Segunda Guerra Mundial. Como modelo seminal das propostas de Policiamento Comunitário, os primeiros

policiamentos em grupo foram realizados em Aberdeen, Escócia, e em Accrington, no condado de Coventry (SHERMAN; MILTON; KELLY, 1973; BRODEUR, 2012b).

O policiamento em grupo é uma estratégia de policiamento que acontece quando um grupo de policiais assume a responsabilidade de todos os serviços de polícia em uma determinada área, ou seja, há a descentralização do comando, com um policial responsável pelo grupo em uma área pré-determinada, considerado chefe local da polícia (GOLDSTEIN, 1977). No começo dos anos 1960 o modelo foi importado para os EUA, onde foi “adotado por várias forças policias americanas com o nome de ‘ronda policial do bairro’” (BRODEUR, 2012b, p. 60). A violência crescente e os distúrbios civis, dessa época, que levaram a uma prática de policiamento de grupo, o qual objetivava “diminuir a distância física e psicológica entre o policiamento e a comunidade” (ROSENBAUM, 2012, p. 29).

Mais ou menos na mesma época [...] desenvolveram o conceito de Vigilância de Bairro, também conhecido com o Vigilância de Quarteirão, Vigilância de Apartamento, Vigilância de Casa e Vigilância de Comunidade. A ideia básica era envolver os cidadãos na proteção de sua própria propriedade convencendo-os a se organizar e dando-lhe assistência com equipamentos, informação e perícia técnica. (BRODEUR, 2012b, p. 61).

Esse sistema de vigilância de bairro é a base conceitual da Polícia Comunitária, onde o policiamento era realizado em grupo e a patrulha era feita com o contato direto com o cidadão. Essa era a prática do novo policiamento comunitário (BRODEUR, 2012b). Foi tentada em muitos departamentos de polícia norte-americanos nos anos 1970, porém não foi executado como deveria, pois a direção da polícia resistiu à descentralização que o modelo exigia (ROSENBAUM, 2012).

Desde os anos de 1970, a literatura sobre a reforma da polícia foi frutífera (BRODEUR, 2012a). A literatura continuou a desvendar as limitações e a crescente insatisfação com o modelo tradicional que era ineficiente, ineficaz e injusto (ROSENBAUM, 2012). Segundo Brodeur (2012a), o tema surgiu, de forma clara, pela primeira vez em um relatório sobre o policiamento em grupo (SHERMAN; MILTON; KELLY, 1973); a partir de então, além de trabalhos seminais importantes como o de Eck e Spelman (1987), há também os trabalhos pioneiros de Goldstein (1977). Desde então, o policiamento comunitário e o policiamento orientado para a solução de problemas tem ficado no topo da agenda da reforma policial, tido como um novo paradigma de policiamento (BRODEUR, 2012a).

Iniciativas comunitárias de prevenção ao crime começaram a receber publicidade considerável durante os anos de 1980 nos Estados Unidos, e o conceito de envolvimento

comunitário tornou-se especialmente atraente. Já entrando nos anos de 1990, os chefes de polícia e os políticos americanos eram pressionados cada vez mais devido à violência, drogas e gangues, bem como a brutalidade policial, que recebia uma atenção cada vez maior da mídia na época (ROSENBAUM, 2012). Durante esse período, surgiram vários programas experimentais: “centenas de departamentos de polícia faziam experimentações independentes, com várias iniciativas comunitárias” (ROSENBAUM, 2012, p. 30). Dentre os mais populares, encontrava-se o policiamento a pé.

Com o passar dos anos, o conceito se proliferou e se tornou tema obrigatório em “palestras sobre o policiamento comunitário nos círculos profissionais em todo o mundo” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 15). Entretanto, o consenso acerca do significado do que seria de fato Polícia Comunitária ainda é pequeno. “Em alguns lugares, houve mudanças genuínas nas práticas policiais. Em outros, o policiamento comunitário é utilizado para rotular programas tradicionais, um caso clássico de colocar vinho velho em garrafas novas” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 15-16).

Mesmo reconhecendo uma dicotomia entre retórica e realidade, Greene (2012) e Rosenbaum (2012) afirmavam que o policiamento comunitário prometia mudar radicalmente a relação entre a polícia e a sociedade civil, enfrentando os problemas subjacentes da comunidade e melhorando as condições de vida dos bairros. Afinal, como afirma Skolnick e Bayley (2006), quanto mais próximo for o relacionamento entre polícia e comunidade, maiores são as chances de reduzir o crime, por meio da prevenção.

Este movimento de reforma [...] promete melhorar a segurança pública, mas não oferece uma formula simples ou um mapa do caminho para se chegar lá; promete reformar as agências policiais e melhorar o envolvimento da comunidade na segurança pública, mas os policiais e os residentes da comunidade são frequentemente convidados a imaginar como isso poderá ocorrer (ROSENBAUM, 2012, p. 27).

De forma geral, a “cooperação maior entre a polícia e a comunidade é o que tem sido considerado, em todo o mundo, como sendo ‘policiamento comunitário’” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 69), o que não está de todo errado; pois, a Polícia Comunitária é, sobretudo, “uma tentativa de se repensar e reestruturar o papel da polícia na sociedade” (ROSENBAUM, 2012, p. 27). Entretanto, embora não possua um conceito sólido, Polícia Comunitária deve estar ligada a uma visão mais ampla, que abrange os propósitos dessa cooperação e os resultados que se esperam, do ponto de vista da sociedade, numa abordagem

subjetiva (ROSENBAUM, 2012; SKOLNICK; BAYLEY, 2006; TROJANOWICZ; BUCQUEROUX, 1994).

O termo Policia Comunitária possui múltiplas definições; de fato, não tem um conceito sólido. Essa imprecisão teórica tem contribuído para críticas às práticas que promove. Segundo Rosenbaum (2012), distinguir o que é policiamento tradicional e policiamento comunitário já é um desafio, e, apontar as características que pertencem e aquelas que não pertencem ao termo ajudará na promoção de uma discussão produtiva dos méritos e limitações desse movimento de reforma.

Outro problema está na dificuldade de entender o impacto do conceito sobre a organização da polícia e sobre o relacionamento desta com o público. Isso porque a maioria dos esforços não tem sido avaliada. O conceito está proliferado ao redor do mundo e em muitas atividades, o que torna ainda mais difícil uma avaliação adequada. Inclusive, muitos programas são colocados como sendo de Polícia Comunitária, quando não o são de fato (GREENE, 2012).

Polícia Comunitária é um termo popular que recebe a atenção e a simpatia de todos, o que facilita a obtenção de apoio. Entretanto, o conceito tem sido usado e abusado de forma indiscriminada ao redor do mundo. Esse termo desprovido de um conceito claro, é usado para justificar todo e qualquer programa que queiram, dando uma roupagem ideológica de forma a cumprir propósitos escusos (ROSENBAUM, 2012).

Em muitos programas de policiamento comunitário assume-se simplesmente que os policiais podem agir com a “orientação da comunidade”, que as organizações policiais podem apoiar este novo estilo de policiamento, e que as comunidades podem diferenciar as ações do policiamento comunitário daquelas do policiamento tradicional. Essas suposições resultam na ilusão de que é relativamente fácil para as agencias policiais mudar do policiamento tradicional para o comunitário. Nada está mais longe da verdade (GREENE, 2012, p. 175).

O estudo de Brodeur (2012a) enfatiza a avaliação do desempenho policial: “Que tipo de evidencia existe para sugerir que o policiamento comunitário será mais eficaz do que o atual modelo de policiamento?” (BRODEUR, 2012a, p. 28). O autor mostra preocupação com o desempenho do policial individualmente, das organizações policiais e dos seus parceiros, por meio de um caso que é um exemplo claro de críticas à instabilidade do conceito aplicado à gestão da segurança pública.

Entre 1992 e 1996 houve um decréscimo de 50% nas taxas de homicídios em Nova Iorque, o que não foi explicado. Apesar das agências policiais já terem se adiantado e produzido uma literatura que reivindicasse os créditos para suas organizações, o autor afirma que “o declínio do crime relatado foi resultado de processos que ainda não foram totalmente levados em conta pela pesquisa de avaliação. A queda do crime relatado é uma história de sucesso e busca de um autor” (BRODEUR, 2012a, p. 10-11). Para que fosse possível avaliar os impactos da Polícia Comunitária na segurança pública, consequentemente dando mais solidez ao conceito, Brodeur (2012a) propôs organizar uma literatura que respondesse questões sobre como funciona o policiamento comunitário e qual sua eficácia na redução da violência; o que garante o sucesso e como avaliá-lo. O autor considera o estudo de avaliação policial bastante oportuno.

Essa falta de clareza do que é um programa de policiamento comunitário causa preocupação. Por esse motivo que Skolnick e Bayley (2006) acreditam que muitos concluem que se trata de um movimento somente retórico, uma frase de efeito criada para tornar o policiamento mais gracioso. Entretanto, o autor defende e demonstra por meio da pesquisa de práticas policiais, adquiridas de experiências de policiamento comunitário pelo mundo, que há mais do que retórica no policiamento comunitário (SKOLNICK; BAYLEY, 2006). “Embora os problemas de definição sejam abundantes, seria errado dar a impressão de que este movimento de reforma é totalmente retórico e nada substancial, ou que não existe consenso sobre quais são os elementos principais deste novo modelo de policiamento” (ROSENBAUM, 2012, p. 31).

Sem querer restringir o conceito de Polícia Comunitária, Skolnick e Bayley (2006, p. 18) afirmam que a “premissa central do policiamento comunitário é que o público deve exercer um papel mais ativo e coordenado na obtenção da segurança”. Deve-se ajudar e encorajar o público na prevenção do crime e na detenção de criminosos, para isso, todo policial na linha de frente deve estar envolvido, não apenas unidades especializadas da polícia. O público deve ser visto como coprodutor de segurança pública. A Polícia Comunitária cria, portanto, uma nova responsabilidade para a polícia: “criar maneiras apropriadas de associar o público ao policiamento e à manutenção da lei e da ordem” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 18).

Para esses autores, é mais do que reconhecer que o trabalho de prevenção se torna melhor e mais fácil com a cooperação e com o apoio do público. Polícia Comunitária deve se

referir a programas que mudam as interações habituais entre a polícia e o público. Deve ser algo novo, diferente, além do que sempre tenha sido feito. Segundo o autor, se as práticas de policiamento não forem promotoras de uma nova realidade, não se caracteriza a Polícia Comunitária. “O policiamento comunitário merece ser celebrado apenas se estiver ligado a um distanciamento das práticas operacionais passadas, e somente se ele refletir uma nova realidade tática e estratégica” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 18).

Apesar de o policiamento comunitário ser concretizado através de uma variedade de práticas, Rosenbaum (2012, p. 31-32) apresenta um conjunto comum de princípios e suposições nas quais o conceito de Polícia Comunitária se fundamenta, são eles:

a) uma definição mais ampla do trabalho da polícia;

b) um reordenamento das prioridades da polícia, dando maior atenção ao crime “leve” e à desordem;

c) um enfoque na solução de problemas e prevenção, mais do que no policiamento direcionado ao incidente;

d) reconhecimento de que a comunidade executa um papel importante na solução dos problemas da vizinhança;

e) o reconhecimento de que as organizações policiais devem ser reestruturadas e reorganizadas para serem responsáveis pelas reivindicações deste novo enfoque e para encorajar um novo tipo de comportamento policial.

Skolnick e Bayley (2006) pesquisaram o policiamento em quatro continentes , por meio de observação direta, entrevistas e acompanhamento dos policiais, para: validar a realidade da política e da retórica da instituição; analisar o impacto da cena do crime sobre os policiais; e, compreender os sentimentos da polícia em relação à sociedade civil. Na pesquisa, encontraram quatro áreas de mudança no policiamento, sob a bandeira da Polícia Comunitária: “1. Organizar a prevenção do crime tendo como base a comunidade; 2. Reorientar as atividades de patrulhamento para enfatizar os serviços não-emergenciais; 3. Aumentar a responsabilização das polícias e das comunidades locais; e, 4. Descentralizar o comando” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 19). São esses “os quatro componentes programáticos que sempre se repetem quando o que se traz para a ideia de policiamento comunitário é mais do que apenas um discurso vazio” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 35). 12

12 Europa (Noruega, Suécia, Dinamarca, Finlândia e países da Grã-Bretanha); Ásia (Japão e Cingapura); Oceania (Austrália); e, América do Norte (Canadá e Estados Unidos).

Quanto ao primeiro componente, sabe-se que as agências policiais do mundo todo têm desenvolvido programas de educação e orientação de grupos vulneráveis com foco preventivo. Isso inclui todo tipo de orientação à comunidade, escrita ou falada, individualmente ou coletivamente, em um único episódio ou continuada. “Existem atualmente redes nacionais e mesmo internacionais de pessoal para prevenção de crime, que fazem intercambio de material, trocam especialistas e encorajam, de modo geral, umas às outras, para que lutem contra o ceticismo de seus colegas policiais” (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 23).

O segundo componente questiona se a atividade criminal e a desordem podem ser impedidas se a polícia fosse uma presença visível nas ruas e prendesse imediatamente pessoas que infringissem a lei. Em consequência dessas estratégias tradicionais, a maior parte dos policiais (aproximadamente sessenta por cento) é designada para patrulhar as ruas, e, a maioria dos restantes trabalha na investigação criminal. Consequentemente, o trabalho de patrulhamento tem sido cada vez mais realizado em veículos motorizados, de onde recebem as solicitações emergenciais por telefone ou por rádio comunicador (BAYLEY, 2001; SKOLNICK; BAYLEY, 2006). Não se questiona, aqui, o objetivo do patrulhamento (que inclusive devem ser todos preventivos), questionam-se os meios utilizados. Os autores afirmam que essa reorientação do patrulhamento tem sido realizada de várias maneiras; a mais dramática delas é a mudança dos policiais dos veículos motorizados para pequenos postos descentralizados de policiamento.

As rondas a pé constituem um estratagema para desligar do sistema de emergência os policiais, permitindo que se mesclem com o público fora de um contexto de reivindicações. As rondas a pé não podem, naturalmente, diminuir o volume de reivindicações de serviço, mas elas estendem, aprofundam e personalizam a interação (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 28).

Mesmo que o patrulhamento se assemelhe com um policiamento comunitário, mesmo que sejam feitas rondas a pé, se as atividades forem realizadas de modo autoritário (mesmo que não sejam ilegais ou violentas), ou seja, sem a responsabilização da polícia em relação à comunidade local, e vice-versa, não serão práticas de Polícia Comunitária. As reclamações do que os perturba, a indicação dos problemas e das prioridades, devem partir da comunidade. A comunidade, de uma posição ativa na relação polícia e sociedade, que realmente deveria orientar o policiamento neste caso. Para Skolnick e Bayley (2006), se as práticas de policiamento for uma resposta para os problemas que perturbam o bairro, se refletir nos desejos da maioria, então a manutenção da ordem poderá ser capaz de proporcionar um

serviço relevante de Polícia Comunitária, embora sempre seja um serviço realizado sob a ameaça explícita da lei.

Um exemplo clássico, na manutenção da ordem, é analisado por James Q. Wilson e George L. Kelling em um artigo publicado em 1982, conhecido como Broken Windows (KELLING; WILSON, 1982), ou Janelas Quebradas em sua versão traduzida. A crença era que se não fossem reprimidos, os pequenos delitos conduziriam, inevitavelmente, a condutas criminosas mais graves. Essa crença é ilustrada por uma construção que está com suas janelas quebradas, a deterioração da paisagem urbana é um fato simples que seria interpretado pela sociedade como abandono do poder coercitivo. O descaso do poder público em punir os responsáveis por desvios menos graves, enfraqueceriam os controles impostos pela comunidade de forma geral, aumentaria a insegurança coletiva e, consequentemente, motivariam delinquentes a cometer crimes mais graves. Ou seja, era preciso não tolerar nenhuma espécie de desordem, por menor que fosse. Afinal, desordem gera mais desordem.

As práticas de segurança pública defendida Kelling e Wilson (1982) estavam, portanto, reorientadas e privilegiavam o combate ao medo do crime, por meio de uma maior atenção àqueles locais onde parecia não seguir normas sociais. Dessa maneira, o objetivo do policiamento seria:

reduzir os “sinais de crime” e de desordem, tais como vandalismo, pichações, comportamentos agressivo e violento, mendigos pelas ruas, bicicletas e skates

guiados perigosamente nas calçadas, bebedeiras em público, música muito alta e vagabundos dormindo em locais públicos [...] podem evitar a decadência dos bairros [...] tentando restabelecer o equilíbrio antes que as pessoas ‘respeitáveis’ desistam de viver no local e se mudem [...] reforçar o código de comportamento público das pessoas (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 28).

Segundo Skolnick e Bayley (2006) a manutenção da ordem, no sentido proposto pelo