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3 SEGURANÇA PÚBLICA, REFORMA POLICIAL E POLÍCIA COMUNITÁRIA

4.6 Procedimentos para a análise dos dados

Todos os dados coletados no campo foram transcritos e analisados numa abordagem qualitativa. O conjunto desses dados formou o corpus, onde se encontram os materiais textuais da pesquisa, como as transcrições das entrevistas, os documentos capturados, as conversações on-line observadas no blog, bem como as observações feitas pelo pesquisador no diário de campo, confeccionado durante a observação participante (BAUER; AARTES, 2003; FLICK, 2009a, 2009b).

Para a análise desse material foi aplicada o método denominada como Análise de Conteúdo (BAUER, 2003; BARDIN, 1977). Em conformidade com o que recomendam os autores, a redução inicial desse material foi realizada com a codificação que abrange todos os elementos relevantes para a pesquisa. Bardin (1977) propõe as seguintes etapas: pré-análise; codificação, categorização e quantificação de informações; e, por fim, interpretação dos dados. Conforme apresentado no Quadro 6, as categorias da pesquisa guiaram as análises.

A análise das transcrições se deu com o auxílio do software Atlas.TI 7.5. Inicialmente, as 70 postagens e 1.496 comentários do blog “Abordagem Policial” foram codificados pelo que é denominado pelo software como codes, os quais foram agrupados em categorias intermediárias e, por fim, resultou em cinco categorias finais, coincidentes com as categorias da pesquisa apresentadas no Quadro 6, quais sejam: imagem, interação, gestão, objetivo e resultado. Para cada code, foram selecionados diversos quotes, utilizados também para exemplificar e justificar o elenco dos codes. As análises do blog foram relacionadas com a pesquisa documental, numa análise macro.

O processo de codificação inicial gerou uma lista de códigos, representada pelos codes e gerados pelo software, momento em que foi necessário realizar a primeira análise, com o reagrupamento dos codes. Os códigos duplicados foram fundidos, aqueles desviantes foram ignorados e os restantes foram agrupados em categorias intermediárias, surgindo, assim, os temas de análise mais relevantes, de onde se originou o primeiro referencial de codificação da pesquisa. Por meio dessa codificação, emergiram-se as Redes de Significações manifestas pelo uso da linguagem e estabelecidas nos processos interacionais, relatáveis pelos policiais

nos blogs e, também, por outras fontes de coleta dos dados, conforme a triangulação dos dados da pesquisa.

O Quadro 10 apresenta o processo de codificação utilizado pelo pesquisador no processo de análise do corpus. Essa codificação, realizada no software Atlas.TI por meio de codes, deu-se inicialmente de forma livre, ou seja, sem a definição prévia dos códigos, de forma rígida. A única limitação era que esses códigos deveriam se referir às categorias da pesquisa (imagem, interação, gestão, objetivos e resultados) e aos conceitos apresentados no referencial teórico.

Quadro 10 - Relação entre as categorias da pesquisa e os codes do Atlas.TI.

CODES (iniciais) INTERMEDIÁRIASCATEGORIAS CATEGORIAS (finais) DA

PESQUISA

• polícia cidadã • desvalorizada • valorizada

• dicotômica (polícia boa e má) • herói • homem/macho • humana e social • repressiva • temida Imagem da polícia Imagem do • descrença no modelo • crença no modelo

• imagem negativa do policial comunitário • imagem positiva do policial comunitário

Imagem do policial comunitário

policial e da sociedade civil

• imagem do cidadão “de bem” • imagem do infrator

•imagem da imprensa

•imagem de organizações públicas • imagem de organizações privadas •imagem de partidos/ideologias políticas

Imagem da sociedade civil

•conquistar amizade dos civis •produzir a legitimidade do público

•protagonizar e mediar a solução de conflitos •configurar comunidades de apoio mútuo

Configurar comunidade Interação entre a polícia e a comunidade •como apreço •como função policial

• como estratégia proximidade com o público

Incentivar agrados e favores •como moeda de troca

•como fatores que geram desconfiança •como fatores que geram habitualidade/cultura •esforço na tentativa de evitar agrados de civis

Evitar agrados e favores •frente à violência, é inevitável a repressão

•dificuldades de adaptação diversas Ação repressiva firme

(continuação)

CODES (iniciais) INTERMEDIÁRIASCATEGORIAS CATEGORIAS (finais) DA

PESQUISA

• produzir uma estrutura particular e não prevista de relacionamento com outras organizações públicas

• produzir uma estrutura particular e não prevista de funções e responsabilidades do sistema de segurança pública

• lidar com recursos estaduais escassos de forma criativa

Improvisos

Rotinas de gestão do policiamento

comunitário

• identificar e relacionar-se com lideranças civis

• favores e agrados entre organizações públicas Público Externo • voluntarismo do militar

•educação e treinamento •alto efetivo em lugares certos •salario/treinamento/valorização • dicotomia interna, oficiais e praças • problema com legitimidade da gestão

Publico interno

• implantação de novos projetos/programas • função política/apelo midiático

• gestão por resultados/metas Nova Gestão Pública • exemplos diversos de que modelos de policiamento não

funcionaram Outras dificuldades

• ser íntegra, representar/ser exemplo de moral • tratar bem as pessoas, ser cortês/educado

• falar em público, ter boa dicção, comunicar-se bem, persuasivo • saber e estar disposto a ouvir críticas

• ter paciência/ser resiliente

Perfil profissional

Objetivos da prática policial

comunitária

• mobilizar pessoas em prol da segurança •interagir com a comunidade

•ser leal, imparcial e justo

•promover uma boa imagem da polícia militar •estar ostensivo/acessível ao cidadão

•conquistar o respeito e a legitimidade de grupos específicos

Aproximação da polícia com o cidadão

“de bem”

•obter informações de civis

•conseguir apoio do público na função policial •incomodar suspeitos

•transmitir dicas de segurança individual

•a melhor maneira de ficar em segurança é nunca se sentir seguro

•reprimir o traficante de drogas •impedir que o crime ocorra

Combate ao crime e ao infrator

•não agir apenas emergencialmente •exercer atividades multifuncionais

•liderar a mobilização da comunidade, em prol de melhorias sociais ou simplesmente para promover amizades

•auxiliar na prestação de serviços públicos de forma geral •formar cidadãos “bons” e promover o bem

Defesa social diversificada

•reduzir o número de crimes •produzir resultados (metas)

•combater o tráfico de drogas e o crime violento Segurança objetiva esperados da Resultados prática policial

comunitária

•fornecer segurança a indivíduos dignos •inibir pequenos delitos

•promover a sensação de segurança Segurança subjetiva Fonte: elaborado pelo autor.

O desafio dessa técnica foi reduzir todo o material coletado no campo de pesquisa (grande) em unidades de análise (menores). Ou seja, todo o material transcrito foi reduzido para um tamanho significativo e adequado, considerando ainda o seu conteúdo e sua intenção,

para que não se perca sua essência - conforme preconiza a técnica Análise de Conteúdo (BAUER, 2003).

Em relação às características da entrevista episódica, segundo Flick (2003), essa é em si mesma uma tentativa de triangulação interna ao método, combinando diferentes enfoques em uma mesma entrevista, visto que as narrações apresentadas pelos entrevistados também precisam ser analisadas. Para a análise narrativa, utilizou-se o que Jovchelovitch e Bauer (2003) denominam como “análise temática”. Nesse procedimento, constrói-se um referencial de codificação, numa redução gradual do texto qualitativo:

Primeiro, passagens inteiras, ou parágrafos, são parafraseados em sentenças sintéticas. Estas sentenças são posteriormente parafraseadas em algumas palavras- chave. Ambas as reduções operam com generalização e condensação de sentido. Na prática, o texto é colocado em três colunas; a primeira contém a transcrição, a segunda contém a primeira redução, e a terceira coluna contém apenas palavras- chave (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2003, p. 107).

Assim, a partir deste parafrasear, as situações narradas (Figura 12; seção 4.5.3) na entrevista episódica, foram dispostas em um sistema de categorias; e, como resultado, foram apresentadas na forma de Repertórios Interpretativos. Como sugerem os autores, para a compreensão dessas narrativas, buscou-se considerá-las em seu contexto mais amplo, afinal expressam o ponto de vista dos entrevistados, em situações específicas em tempo e espaço. Ou seja, não se busca comprovar se as narrativas são verdadeiras ou falsas, afinal, a realidade de uma narrativa refere-se ao que é real para o próprio entrevistado, não para o pesquisador. Privilegia-se, portanto, “a realidade do que é experienciado pelos contadores de história [...] as narrativas não copiam a realidade do mundo fora delas: elas propõem representações/interpretações particulares do mundo” (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2003, p. 110).

Durante os procedimentos de análise dos dados, foi necessário contextualizar as análises de nível micro em seu campo de análise mais amplo de nível macro, bem como considerar que o nível macro também é traduzido para o contexto das micropráticas em suas particularidades no nível micro, quando e onde as práticas se apresentam numa tensão relacional, conforme perspectiva da SAP (JARZABKOWSKI, 2004; WILSON; JARZABKOWSKI, 2004). Assim, considerando que as práticas ocorrem em contextos amplos, mas também em micro contextos onde a ação está localizada, as micropráticas presentes nas entrevistas e no caderno de campo da observação participante, nas interações e

nas conversações do cotidiano e do senso comum, foram relacionadas ao nível de análise macro.

A triangulação dos dados foi realizada da seguinte forma: (a) processo de codificação e análise no material produzido pelo blog; (b) análise das entrevistas por meio da mesma codificação, validando-a, confirmando ou refutando os códigos e os temas emergidos no blog; (c) para prosseguir com a validação do referencial de codificação, procedeu-se a análise do caderno de campo, produzido na observação participante, incluindo os grupos de WhatsApp; (d) o mesmo processo foi realizado para a análise documental do material coletado na PMMG; e, do material coletado em fontes secundárias.