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Polígono das Secas e a Delimitação da Região Semiárida Brasileira

CAPÍTULO 2 – OS ELEMENTOS PRECURSORES DO CONCEITO DE

2.6 Polígono das Secas e a Delimitação da Região Semiárida Brasileira

Carvalho e Edgler (2003) assinalam que, embora a Sudene tenha suprimido o uso da representação de Polígono das Secas, no ano de 1989, como referência oficial de reconhecimento das áreas de ocorrência das secas, substituindo-a pela figura de semiárido, isso não significou uma transição paradigmática ou novo marco conceitual. Tratou-se apenas de mero formalismo institucional, uma substituição formal “de não mais usar uma figura que passara a representar interesses conservadores pautados na chamada “indústria das secas”, uma vez que a representação de semiárido passa a ser utilizada como sinônimo da representação de Polígono das Secas” (CARVALHO; EDGLER, 2003, p. 40). Como bem

observam os autores, na seca de 1983, a Sudene, ao elaborar a lista de municípios afetados, ainda utiliza a denominação de Polígono das Secas.

Com a Constituição de 1988, os critérios utilizados para delimitar as áreas de ocorrência das secas, com objetivo de intervenções planejadas das ações governamentais no Nordeste, são alterados, a partir dos novos princípios constitucionais, de acordo com o disciplinamento definido pela Lei n° 7.827, de 27 de novembro de 1989, que institui o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). A normatização constitucional define a aplicação de 50% dos recursos do Fundo no semiárido.

O Art. 5° da Lei define o semiárido23 como a região inserida na área de atuação da Sudene, com precipitação pluviométrica média anual igual ou inferior a 800mm. Determina, também, que os municípios incluídos nessa condição teriam sua aceitação como tal, mediante publicação em Portaria, da Sudene, e o espaço integrado por esses municípios passa a ser denominado de Região Semi-Árida do FNE.

A delimitação da Região Semi-Árida do FNE, como já foi dito, foi caracterizada, a partir do índice de precipitação pluviométrica, inferior a 800mm. Ela está, portanto, condicionada pelos seus determinantes climáticos e desconsidera a complexidade das outras dimensões que a compõem e permitem a sua sustentabilidade. Entre elas, podemos citar a dimensão ambiental, econômica, sociocultural e político-institucional. Perdura, deste modo, o viés naturalista/climático, o que pode nos levar a concluir que, mais uma vez, a delimitação oficial caminha distante dos aspectos crucias de semiaridez e das demandas políticas, sociais, ambientais, educacionais e culturais das populações locais. E, muito provavelmente, os resultados das políticas públicas, programas, projetos e ações terão uma menor, pouca ou eventualmente nenhuma eficácia.

23 A nova delimitação do Semiárido Brasileiro, realizada em pelo Ministério da Integração Nacional, em 2005, além dos 1.031 municípios já incorporados, passam a fazer parte do semiárido outros 102 novos municípios enquadrados em, pelo menos, um dos três critérios utilizados. Com essa atualização, a área classificada oficialmente como semiárido brasileiro aumentou de 892.309,4 km ² para 969.589,4 km², um acréscimo de 8,66%. Minas Gerais teve o maior número de inclusões na nova lista dos 40 municípios anteriores; vai para 85, variação de 112,5%. A área do Estado que fazia, anteriormente, parte da região, era de 27,2%, tendo aumentado para 51,7% Os 1.133 municípios integrantes do novo semiárido brasileiro se beneficiarão de bônus de adimplência de 25% dos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), enquanto no restante da Região Nordeste, esse percentual é de 15%. Ainda quanto ao FNE, a Constituição determina que, pelo menos, 50% dos recursos deste Fundo sejam aplicados no financiamento de atividades produtivas, em municípios do semi-árido, o que certamente representa um estímulo à atração de capitais e à geração de emprego na região.

O Ministério da Integração Nacional (MIN), em 2005, atualiza a área de abrangência oficial do semiárido, de acordo com a Portaria Ministerial n° 89, de março de 2005. Os critérios técnicos utilizados para definir a nova delimitação foram três: a) precipitação pluviométrica média anual inferior a 800mm; b) índice de aridez de até 0,5, no período histórico de 1961 a 1999, calculado pelo balanço hídrico que relaciona as precipitações e a evapotranspiração potencial e c) risco de seca maior que 60% no período entre 1970 e 1990.

Os parágrafos anteriores demonstram que substituir a denominação polígono das secas por semiárido, por si só, não representa um novo olhar para orientar a configuração das políticas governamentais para o semiárido, uma vez que ainda desconsidera a complexidade das relações e interdependências que promovem e “mantêm” a “inadaptação” do humano e de sua cultura ao SAB. Na forma como ainda é interpretado em várias instâncias governamentais, como podemos ver, a representação de SAB, mantém o mesmo caráter instrumental da representação de polígono das secas porque, na maioria das vezes, é instrumentalizado, pelos governos municipais, para incluir seu município no domínio do semiárido delimitado pelo FNE, reduzindo a questão da sustentabilidade no SAB, a uma questão técnica tal qual a proposta formulada pelo combate à seca.

É fundamental, argumenta, Silva (2002), que a questão seja retomada, do ponto de vista das relações entre sustentabilidade e cultura local, contrapondo-se, desta forma, à uniformidade conceitual presente nas políticas, nos projetos e consequentemente, nas formas de conceber as políticas, os programas e intervenção no SAB. Isso garante um olhar que considere as diferentes realidades socioambientais e a diversidade cultural, a forma como se relacionam com o ambiente e enfrentam os seus dilemas cotidianos para que possam significar uma “nova” lógica e subjetividade, uma vez que, via de regra, as políticas governamentais são elaboradas fora do contexto do SAB e dentro de uma relação vertical imposta aos povos e às comunidades rurais do SAB.

2.7 Novos autores e atores sociais, uma nova proposta de sustentabilidade para o SAB e