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A política de dividendos das empresas

No documento A POLÍTICA DE DIVIDENDOS DAS EMPRESAS (páginas 170-180)

A POLÍTICA DE DIVIDENDOS EM PORTUGAL

3. A política de dividendos das empresas

pouca representatividade da actividade empresarial. Tudo isto traduz-se na dificuldade que os investidores têm, em diversificar as suas carteiras, na escassez de liquidez e na instabilidade das cotações, o que pode ocasionar uma menor na eficiência dos preços.

O factor fiscal pode, naturalmente, desempenhar um apoio importante ao desenvolvimento do mercado. No entanto, apesar de não parecer tratar-se de um argumento decisivo, não deixará de ser importante e existência de medidas que passem pela correcção das assimetrias fiscais existentes, quanto à forma como são tratados diferentes activos financeiros, tanto mais que é frequente ouvirem-se referências aos benefícios que a «revisão da tributação das mais valias e da dupla tributação de dividendos»19 traria à recuperação dos mercados.

Será que as políticas de dividendos normalmente praticadas podem, igualmente, contribuir para um melhor funcionamento do mercado? Comecemos por analisar o comportamento das empresas em matéria de distribuição de resultados.

3. A política de dividendos das empresas

Os dividendos representam a distribuição dos resultados da empresa aos seus accionistas e, em Portugal são, em regra, declarados numa base anual pela Assembleia-geral, no momento da apreciação e aprovação do Relatório e Contas do exercício.

No n.º 1 do artigo 294º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), estipula-se: «(...) salvo diferente cláusula contratual ou deliberação tomada por maioria de três quartos dos votos correspondentes ao capital social em assembleia-geral para o efeito convocada, não pode deixar de ser distribuído aos accionistas metade do lucro do exercício que, nos termos da lei, seja distribuível.»

Contudo, para garantir um determinado nível de solvabilidade, o CSC salvaguarda o princípio da conservação do capital e impõe limites à distribuição20. Assim, relativamente ao pagamento, estabelece-se no n.º 2 do citado artigo:

«(...) o crédito do accionista à sua parte nos lucros vence-se decorridos que sejam trinta dias sobre a deliberação de atribuição de lucros, salvo diferimento consentido pelo sócio e sem prejuízo de disposições legais que proíbam o pagamento antes de observadas certas formalidades; pode ser deliberada, com fundamento em situação excepcional da sociedade, a extensão daquele prazo até mais 60 dias, se as acções não estiverem cotadas em bolsa.»

Ainda nos termos do CSC, artigo 297º, podem, igualmente, observadas que sejam certas regras, efectuarem-se aos investidores, adiantamentos sobre lucros. Quanto ao pagamento, sublinhe-se, também, que os dividendos são devidos a todos os accionistas registados no livro de registo de acções da empresa, na data de distribuição dos lucros.

Neste contexto, tendo em vista uma adequada clarificação do processo de pagamento dos dividendos das empresas listadas na bolsa, o mercado possibilita a transacção de acções com e sem dividendo21. As acções sem dividendo são aquelas que são adquiridas entre a data ex-dividend e a do seu pagamento, ocorrendo a primeira quatro dias antes da última. Assim, a partir do momento em que se atinge a data sem dividendo, é de esperar uma queda do preço da acção, igual ao dividendo declarado, porque tal título já confere o direito a receber esse valor.

Em regra, os dividendos são pagos em dinheiro, todavia, as empresas podem optar por outras modalidades, tais como dividendos em acções, aquisição de acções próprias e dividendos em existências.

20 Art. 32º e 33º do CSC.

21 Fala-se de acções sem dividendo (ou «ex-dividend»), quando, ao serem adquiridas, não conferem ao comprador o direito aos últimos dividendos declarados. Quando se referem acções com dividendo (ou «cum dividend»), está-se a falar de acções que conferem ao investidor, que as compra, o direito aos dividendos já declarados.

Após a análise efectuada ao mercado português de acções, é agora altura de olharmos para o comportamento das empresas cotadas na Bolsa de Lisboa, analisando alguns indicadores para o período de 1990 a 1994, calculados a partir dos dados incluídos no anexo II, e considerando apenas as sociedades que actualmente se encontram listadas no Mercado de Cotações Oficiais.

O volume de resultados apresentado está compreendido entre 88.758, em 1989, e 144.629 milhões de contos, em 1994, o que se traduz numa variação de quase 63%. No mesmo período e para o mesmo universo de empresas, a parcela distribuída evidencia uma evolução distinta, situando-se entre 28.568 e os 87.992 milhões de contos, ou seja, um crescimento superior a 208%.

Quadro 4.14 - Evolução dos resultados, dividendos e taxa de distribuição das empresas cotadas (1990 a 1994)

(unidade: milhões de contos)

1990 1991 1992 1993 1994 Resultados 134.395 166.163 131.119 115.636 144.629 Variação (%) 51.4 23.6 -21.1 -0.4 25.1 Dividendos 52.671 67.529 72.272 80.435 87.992 Variação (%) 84.4 28.2 7.0 11.6 9.4 Tx distrib. (%) 39.2 40.6 55.1 69.6 60.8

Quanto à evolução do rácio de distribuição, verifica-se o seu aumento ao longo do período, o que parece traduzir um esforço desenvolvido pelas empresas para remunerarem os capitais investidos pelos seus accionistas, sob a forma de dividendos. Em 1994, a política de dividendos das empresas cotadas foi menos generosa, relativamente ao ano anterior, mas mesmo assim com valores superiores aos de 1992.

Nos gráficos 4.5 e 4.6, mostram-se, por um lado, a evolução dos resultados e dividendos para o período em análise e, por outro, o crescimento da taxa de distribuição.

Figura 4.5 - Evolução dos resultados líquidos e distribuídos

1990 1991 1992 1993 1994 0 20000 40000 60000 80000 100000 120000 140000 160000 180000 Resultados Dividendos

Figura 4.6 - Evolução da taxa de distribuição (1990-1994)

0.0% 10.0% 20.0% 30.0% 40.0% 50.0% 60.0% 70.0% 1990 1991 1992 1993 1994

O número de empresas, que em cada um dos anos procedeu à distribuição de resultados, foi de sessenta e cinco em 1990, sessenta e quatro em 1991, cinquenta e cinco em 1992, quarenta e seis em 1993, e cinquenta e dois em 1994. Ao longo do período em análise, constata-se, também, que apenas trinta e oito títulos (45.24%) pagam sempre dividendos.

A evolução, no que se refere ao sinal de variação da taxa de distribuição líquida e do benefício por acção, foi a seguinte:

Quadro 4.15 - Sinal de variação da taxa de distribuição por acção

Número de títulos 1991 1992 1993 1994 Aumento do payout 35 32 28 35 Mantiveram 12 18 27 28 Descida do payout 36 34 29 21

Quadro 4.16 - Sinal de variação do resultado por acção

Número de títulos 1991 1992 1993 1994 Aumento do EPS 39 30 34 44 Descida do EPS 45 54 50 40

Finalmente, indica-se o número de empresas que, ainda neste período, apresentaram resultados sempre positivos.

Quadro 4.17 - Número de empresas com lucro por acção positivo

1990 1991 1992 1993 1994

Total 81 76 64 61 64

Tendo em vista a análise em termos desagregados, calcularam-se alguns indicadores sectoriais, quando existiam pelo menos três sociedades dentro de cada sector. Os valores obtidos para os diferentes rácios – price book value (PBV), rendimento em dividendos (dividend yield), price earnings ratio (PER), taxas de capitalização dos investidores e taxas de distribuição (payout) – consideram o valor de cada título, ponderado pela respectiva capitalização bolsista. Todos os elementos incluídos nos quadros seguintes foram obtidos a partir dos dados individuais de cada uma das empresas.

Quadro 4.18 - Indicadores do Mercado de Cotações Oficiais

Indicadores 1990 1991 1992 1993 1994 Capitalização bolsista 1.021.103 1.076.744 1.224.113 2.029.802 2.328.177

Price Book Value 1.64 1.46 1.41 1.87 1.79

Dividend Yield 2.46% 3.09% 3.23% 2.50% 2.42%

PER 18.17 21.19 45.99 28.50 20.60

Tx capit. investidores 8.34% 9.15% 6.64% 4.58% 5.09% Tx líquida de distribuição 30.62% 28.96% 30.93% 30.99% 33.74%

Tx de crescimento EPS 42.86% -42.83% -6.97% 1.28%

* Unidade: milhões de contos.

Quadro 4.19 - Evolução sectorial da taxa de distribuição líquida

CAE 1990 1991 1992 1993 1994 Alimentação e bebidas 52.12% 22.83% 30.14% 35.35% 36.15% Produtos químicos 19.24% 36.94% 50.44% 25.30% 43.01% Outros prod. min. não metál. 29.18% 26.66% 23.77% 36.29% 47.47% Construção 26.40% 23.99% 21.84% 49.38% 29.52% Alojamento e restauração 4.13% 32.33% 43.85% 6.47% 27.03% Intermediação financeira 36.68% 38.20% 35.33% 31.93% 37.69% Seguros e fundos de pensões 37.96% 33.77% 5.05% 17.77% 30.30% Outras act. serv. prest. emp. 34.26% 36.86% 27.09% 32.50% 38.89% Act recreativas, cult e desp. 13.12% 0% 9.61% 0% 0%

Restantes 19.95% -2.84% 27.53% 24.34% 14.86%

Todos os sectores, com excepção das "actividades recreativas, culturais e desportivas" e "restantes", distribuíram, em 1994, 27% ou mais dos seus resultados. É visível, ainda, que apenas os sectores de actividade "indústrias de alimentação e das bebidas", "fabricação de outros produtos minerais não metálicos", "seguros e fundos de pensões" e "outras actividades de serviços prestados às empresas", apresentam um crescimento positivo daquele indicador, ao longo dos últimos dois anos. O mercado, apesar de uma ligeira queda em 1991, tem vindo a apresentar valores bastantes razoáveis.

Analisando a evolução do número de sociedades por intervalos de taxa de distribuição, temos os seguintes dados:

Quadro 4.20 - Evolução da taxa de distribuição por intervalos (%)

Intervalo (%) 1990 1991 1992 1993 1994 0 18 20 30 36 30 0-10 1 3 1 1 0 10-20 11 6 7 2 3 20-30 18 11 8 8 10 30-40 17 17 13 10 12 40-50 8 13 16 9 12 50-60 6 6 1 4 6 60-70 3 4 1 7 3 70-80 1 3 3 3 3 80-90 0 0 0 1 1 > 90 0 0 3 2 3

Agrupando-se as diferentes empresas em seis categorias de evolução da distribuição percentual do número de sociedades, por intervalos do rácio de «payout», representadas na figura 4.7, sobressaem as classes A e C. Pode, igualmente, constatar-se que a quantidade de empresas que não distribui resultados tem vindo a aumentar.

Quadro 4.21 - Evolução da taxa de distribuição por classes (%)

Categoria Intervalo 1990 1991 1992 1993 1994 A 0 21.6 24.2 36.2 43.4 36.2 B 0 a 20% 14.5 10.8 9.6 3.6 3.6 C 20 a 40% 42.2 33.7 25.3 21.7 26.5 D 40 a 60% 16.9 22.9 20.5 15.7 21.7 E 60 a 80% 4.8 8.4 4.8 12.0 7.2 F > 80% 0.0 0.0 3.6 3.6 4.8

Figura 4.7 - Evolução da distribuição por intervalos

0 10 20 30 40 50 A B C D E F 1994 1993 1992 1991 1990

Pode-se, portanto, concluir que as empresas portuguesas cotadas, salvo algumas excepções, não têm adoptado uma política sistemática de distribuição de resultados. A ideia, de que as sociedades listadas, ou não têm distribuído qualquer rendimento, ou o têm feito em montantes muito reduzidos, pode igualmente ser analisada a partir da relação entre o dividendo e a cotação de cada título, ou seja, o «dividend yield». No anexo, apresentam-se os rendimentos em dividendos do universo de empresas seleccionado. Em termos sectoriais, a evolução consta do quadro 4.22.

Quadro 4.22 - Rendibilidade líquida em dividendos (%)

CAE 1990 1991 1992 1993 1994 15 2.81 2.73 3.28 2.34 2.58 24 2.55 2.41 3.26 1.43 1.57 26 1.82 1.77 1.53 1.34 2.61 45 1.73 2.02 2.07 1.16 1.32 55 0.85 1.38 1.72 0.44 1.44 65 3.04 3.77 3.77 3.27 3.34 66 1.04 1.19 0.12 0.22 0.93 74 2.34 3.57 3.02 2.03 2.11 92 2.62 0.00 1.49 0.00 0.00 Restantes 1.85 2.10 2.80 1.31 0.97

A partir dos dados disponíveis, verifica-se um aumento da rendibilidade dos dividendos, no período de 1990 a 1992. Contudo, o acréscimo do ano de 1992 resultou, na sua esmagadora maioria, da queda das cotações, significando, portanto, que o ganho obtido via dividendos foi perdido em termos de mais valias.

Numa perspectiva histórica, o "dividend yield" do mercado português tem vindo a evidenciar uma tendência de queda, particularmente nos períodos mais recentes, o que, como se referiu, é explicado parcialmente pela elevação geral das cotações. Todavia, é igualmente visível uma quebra, em termos absolutos, do montante de dividendos pagos pelas empresas. A conjuntura adversa nos anos de 1993 e 1994, ao afectar negativamente as contas de exploração das empresas cotadas, será mais uma justificação para a queda

do valor dos resultados distribuídos nesses anos. Contudo, a situação geral do mercado continua a ser caracterizada por uma quase ausência de políticas de dividendos estáveis e continuadas, não podendo ser apenas explicada por aqueles factos.

Para avaliar da competitividade das políticas de dividendos das empresas cotadas, interessará comparar, por um lado, a rendibilidade em dividendos com a taxa de inflação, e, por outro lado, o investimento em acções com aplicações financeiras alternativas.

No que respeita à inflação, é fácil concluir que o investidor deverá considerar a distribuição de resultados atractiva, sempre que os valores do rendimento em dividendos excedam a média da taxa de inflação, ou, no mínimo, quando aqueles valores se aproximem destes.

Comparando o «dividend yield» com a inflação, mesmo tendo presente a melhoria verificada ao nível de qualquer destes indicadores, constata-se que a situação está bastante distante de mercados mais evoluídos, como é o caso dos Estados Unidos, Japão e mesmo Itália, onde a rendibilidade em dividendos tem sido, normalmente, superior em 60% à taxa de inflação.

Quadro 4.23 - Inflação e evolução da rendibilidade bruta do investimento em valores mobiliários em Portugal (%)

1991 1992 1993 1994

Dividend Yield 4.5 3.6 2.8 2.2

Variação do Índice BVL -2.3 -11.2 55.0 8.3 Yield Gap em relação à

- Dívida Pública (taxa indexada) 13.3 12.6 9.2 9.0 - Dív. Pública (taxa fixa, a 5 anos) 11.3 9.3 6.2 9.6 Taxa de inflação (IPC) 11.4 8.9 6.5 5.2

Fonte: BPI e B. Portugal

Por outro lado, confrontando os rendimentos em dividendos com as remunerações proporcionadas por outras aplicações, é evidente que, em regra, os investidores têm

contado, quase exclusivamente, com a expectativa de obtenção de mais valias nos seus investimentos.

Apesar de um elevado rendimento em dividendos poder apenas reflectir a descida de cotações da respectiva sociedade, este indicador, ponderadas as causas da sua evolução, pode ser interessante para analisar a rendibilidade total de cada acção e ajudar a perspectivar o problema numa óptica fiscal.

Verificando-se que a remuneração das acções, via dividendos, não é importante, o investidor tem vindo a encarar o seu rendimento total, como proveniente quase exclusivamente, das mais valias não incorporando, portanto, na rendibilidade esperada o valor proporcionado pelos resultados distribuídos.

Se o objectivo for o de diagnosticar a situação, em termos das políticas de dividendos normalmente praticadas pelas empresas cotadas, é possível falar de algum enviesamento, dado parecer evidente a existência de uma política de retenção algo excessiva. Estando a distribuição de resultados abaixo do nível de equilíbrio desejado pelos investidores, e faltando um elevado grau de estabilidade, podem verificar-se consequências negativas para o desenvolvimento de uma clientela individual alargada, particularmente ao nível dos pequenos accionistas que, na ausência de dividendos, poderão ver o rendimento das suas aplicações afectado.

Mesmo perante o referido, é evidente que qualquer política de dividendos deve depender da situação específica de cada empresa, o que não impede a necessidade de um maior equilíbrio entre a distribuição e a retenção de lucros. Uma maior agressividade, estabilidade e coerência da política de dividendos, particularmente se for evidente a continuação de uma forte concentração do capital, é essencial para o pequeno e anónimo accionista. Estes aspectos podem passar, por exemplo, pela constituição de "reservas de estabilização de dividendos". A este título, refira-se a atitude do Banco de Fomento e

Exterior, que anunciou no prospecto de apresentação da OPV de privatização, no final de 1994, a prossecução de uma «política competitiva, estável e continuada de dividendos», assente na «constituição de uma Reserva para a estabilização de dividendos competitivos».

Será que a ausência de uma prática de política de dividendos activa, se deve à política fiscal? Mesmo existindo algumas vozes a defenderem que «a dinamização do mercado de títulos passa por uma intensificação da política de dividendos, de maneira a que os accionistas sejam compensados pela aplicação das poupanças»22, também há quem considere que «a adopção de uma política agressiva de distribuição depende do Governo, que terá de rever os seu objectivos fiscais para dinamizar o mercado»23.

Sendo comum insistir-se no argumento, de que a política fiscal, em geral, e o regime tributário das acções, em particular, são «um elemento essencial para o bom funcionamento do mercado de capitais»24, e não tem estimulado uma prática corrente de distribuição de resultados, torna-se importante analisar o modo como tem evoluído a tributação dos dividendos em Portugal.

No documento A POLÍTICA DE DIVIDENDOS DAS EMPRESAS (páginas 170-180)