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1.2. Analisando a democracia

1.2.2. Política e desenvolvimento econômico e social

Um segundo grupo de abordagem considera que a democracia precisa ser avaliada levando em consideração sua relação direta com o nível de desenvolvimento econômico e social de um dado país.

Esse modelo de análise tem como um de seus principais referenciais Seymour M. Lipset (1959), o mesmo teria iniciado o processo de discussões sobre a importância que teriam fatores econômicos sobre a legitimidade e estabilidade da democracia. Para tanto, Lipset realizou um estudo que incluía não apenas a Europa como também os países americanos e até a Austrália e Nova Zelândia. Estes são agrupados em dois grupos distintos de países, o primeiro congrega o grupo das democracias estáveis em contraposição às democracias instáveis e ditaduras, e referem-se aos países europeus, América do Norte, bem como a Austrália e a Nova Zelândia. Já com relação ao segundo grupo, e o qual se refere aos países da América Latina, ele ainda os diferencia classificando-os como democracias e ditaduras instáveis, e ditaduras estáveis.

Tais grupos de países são diferenciados na análise de Lipset considerando-se alguns indicadores que o autor considera importantes quanto à avaliação do grau de desenvolvimento sócio-econômico. São exemplos desses indicadores: o contingente eleitoral, os recursos de difusão da informação, grau de industrialização, grau de educação e nível de urbanização.

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A partir desses indicadores, Lipset afirma que os países mais democráticos são possuidores de níveis médios de desenvolvimento, estes, por sua vez, superiores aos daqueles países que são considerados menos democráticos ou regimes ditatoriais. Obviamente, os argumentos apresentados pelo autor foram fortemente criticados.

Larry Diamonde (1992), por exemplo, chamou a atenção para o fato de que era notória a presença de algumas contradições nos resultados apresentados pelo trabalho de Lipset, uma vez que, ao analisar as variáveis identificadas com o processo de desenvolvimento, Diamonde observou que não só os países de democracias estáveis, mas também os países não democráticos da Europa apresentavam níveis médios de desenvolvimento superiores aos das democracias na América Latina. O que poderia dificultar, pelo menos a princípio, a manutenção de um argumento que tenta estabelecer uma relação de causalidade, ou mesmo uma relação direta, entre o grau de desenvolvimento econômico e a instauração de regimes democráticos.

No entanto, o próprio Diamond reconhece que o problema do trabalho de Lipset, residiria apenas na desconsideração de alguns aspectos que melhor o teríam auxiliado quando da utilização dos índices de desenvolvimento econômico e que o próprio chamou de “qualidade física de vida”. E os quais dizem respeito a aspectos como nível de analfabetismo e expectativa de vida da população dos países investigados.

Entretanto, existiriam ainda outros problemas relacionados ao tipo de explicação construída por Lipset, pois uma vez que o nível de desenvolvimento econômico é considerado como fator principal do processo de favorecimento da democracia, qualquer ação ou tentativa de aprimoramento da democracia apenas surtiria efeito a partir de uma influência indireta desse processo, ou seja, seria sempre preciso priorizar os aspectos que fortalecessem o desenvolvimento econômico. Como se essa fosse uma condição invariável a toda e qualquer situação histórica. O que remete a outro problema no trabalho de Lipset e que diz respeito à construção de seu argumento baseado em uma percepção linear da história, segundo a qual os diferentes países vivenciariam os mesmos estágios em seu processo de “evolução” ao desenvolvimento e consequentemente a democracia.

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O que levou Barrinton Moore Jr. (1966), também familiarizado com os pressupostos da concepção do desenvovimento econômico e da teoria da modernização, a discordar de uma percepção linear do processo de desenvolvimento econômico. Segundo este último, tendo como ponto de partida uma visão macrohistórica, existiriam três caminhos distintos que poderíam levar ao desenvolvimento: o caminho das revoluções burguesas, o dos regimes facistas e o do comunismo. Todos conduzindo ao mesmo fim e distinguindo-se entre si apenas pelas alianças de classe realizadas ao longo do processo de desenvolvimento dos países. O que permite a Moore Jr. afirmar que a associação encontrada em Lipset só se aplicaria a um grupo reduzido de países. Não possuindo assim, o grau de abrangência a que se propunha.

Na verdade houve quem fosse além e, não bastasse o descrédito relacionado ao grau de aplicabilidade dos modelos construídos por Lipset, defendesse a idéia de que o desenvolvimento econômico poderia surtir justamente o efeito oposto do que se esperava. Segundo Samuel P. Huntington (1968) o aumento no grau de desenvolvimento econômico ou do processo de modernização tenderia a gerar instabilidade política, conduzindo, como forma de garantir a sua própria manutenção, a eliminação da democracia. Para ele, é como se o desenvolvimento econômico e a democracia, em contextos contemporâneos fossem inversamente proporcionais. Pois, em regimes democráticos os governos são incentivados a atenderem a demandas crescentes, constantemente apresentadas pela sociedade em termos da busca por redistribuição de renda, o que inviabilizaria o processo de desenvolvimento, já que seria difícil continuar direcionando investimento para esse processo.

Ainda assim, embora passível de amplas considerações quanto aos seus limites, o argumento em defesa da conexão entre os níveis de desenvolvimento econômico e as democracias se manteve presente nas principais interpretações e estudos sobre as democracias, conforme inclusive constataram Przeworski e Limongi (1997). Senão a partir de uma relação de determinação segundo estabelecem suas concepções mais clássicas, pelo menos em termos representativos de correlação, conforme se pode perceber em Przeworski (1991) e Przeworski et al (2000).

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