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7. Atores domésticos e políticas sobre drogas na Bolívia e na Colômbia

7.2. Políticas de controle de cultivos

Os governos empregam uma combinação de medidas para controle e repressão de atividades ilegais como o tráfico de drogas e o cultivo ilegal de suas matérias primas. Eles têm a seu dispor várias opções para tentar reduzir a produção ilegal, o tráfico e o consumo de drogas. Pode-se, como é a face mais comum das políticas de segurança, reprimir fornecedores e coagir consumidores a parar de fazer uso de substâncias com penalidades severas ou induzi- los a mudar de atividade por meio de incentivos diretos que os encaminhem a produção alternativa ou a substituição de penas por tratamento psicológico e ambulatorial.

No âmbito internacional, é comum adotar-se acordos e tratados para facilitar cooperação jurídica com outros países e adotar medidas para combate à lavagem de dinheiro e o congelamento de ativos adquiridos ilegalmente. Por outro lado, estados mais poderosos não hesitam em exercer pressão diplomática, aplicar sanções econômicas ou mesmo, em última instância, invadir o território de países que desempenham um papel proeminente na produção ou no trânsito de drogas.

Nesta tese, consideraremos apenas os instrumentos voltados para controle da produção: erradicação de cultivos ilícitos, consensual ou forçada (neste último caso, inclusive, erradicação aérea), e políticas de desenvolvimento alternativo. Os níveis de esforço que os diferentes governos empregam e a ênfase que colocam sobre um ou mais desses componentes em detrimento de outros podem ser interpretados como um sinal do tipo de política sobre drogas que é adotada. A figura abaixo mostra, numa escala de um a seis, o valor da mediana

83 Uma descrição detalhada de cada uma dessas fases e dos testes pode ser consultada no anexo

estatístico “A Pesquisa dos Especialistas: definição metodológica, elaboração e aplicação do questionário e análise de consistência das respostas consolidadas”. Os nomes dos especialistas selecionados segundo os critérios de qualificação constam no anexo “Lista de especialistas selecionados para aplicação do questionário”. Aos respondentes foi expressamente garantido anonimato. Contudo, para registro, seus nomes constam na lista sem destaque ou observação que possa identificá-los. As respostas, como recebidas, podem ser acessadas e baixadas pela página <http://goo.gl/xL0fOP>. As respostas consolidadas para análise podem ser consultadas no anexo “Respostas ao questionário sobre grupos armados, movimentos cocaleiros e políticas de drogas em Bolívia e Colômbia”.

das respostas dos especialistas sobre os níveis de esforço que os governos de Bolívia e Colômbia aplicaram na implantação de programas de controle de cultivo84.

Figura 14. Níveis de esforço em políticas de controle de cultivos ilícitos em Bolívia e Colômbia, 1990-2010

Fonte: Elaboração própria com base na Pesquisa dos Especialistas.

Segundo a avaliação dos especialistas, na Bolívia, os esforços de aplicação erradicação forçada mantiveram-se em um patamar mediano entre 1990 e 1998 e alcançaram o auge no biênio 1999-2000. A partir daí, entre 2001-10, declina até um ponto intermediário entre muito fraco e fraco. As políticas de desenvolvimento alternativo, por sua vez, partiram de um nível muito fraco no biênio de 1990-1, mas mantiveram em um patamar mediano ao longo de todos os anos entre 1994-2004. Depois de 2004, acompanham a tendência de queda da erradicação forçada até retornarem ao patamar muito fraco em 2010.

Os programas de erradicação consensual, por fim, seguem uma tendência oposta aos demais: tendo oscilado em torno de em nível muito fraco ao longo de toda a década de 1990, cresce consistentemente a partir do ano 2000 até alcançar um patamar mediano em 2006, com

84 As variáveis dos níveis de esforço estão em escala ordinal. Um, equivale a esforço nulo ou

inexistente; dois, muito fraco; três, fraco; quatro, mediano; cinco, forte e seis, muito forte.

1 2 3 4 5 6 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 Niv el de esfo o Bolívia Desenv. alternativo Errad. consensual Erradicação forçada 1 2 3 4 5 6 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 Níiv el de esfo o Colômbia Desenv. alternativo Errad. consensual Errad. forçada

a ascensão do governo Evo Morales, onde permanece até o fim da série. Importa observar que o fortalecimento das políticas de erradicação forçada na Bolívia, entre 1998 e 2006, o corre concomitantemente ao enfraquecimento contínuo tanto da erradicação forçada quanto do desenvolvimento alternativo.

A Colômbia apresenta um retrato distinto. Enquanto os esforços do governo em programas de desenvolvimento alternativo e erradicação consensual permanecem em níveis inexistente e fraco, com fraca tendência de crescimento a partir de 2004, programas de erradicação forçada partem de um nível de esforço mediano e alcançam o valor máximo em 2000, coincidindo com a implantação do Plano Colômbia. O esforço do governo permanece voltado para essas medidas (especificamente, a erradicação aérea) até o fim da série, com pequena oscilação para um nível intermediário entre “forte” e “muito forte”, o que parece impedir o crescimento das demais.

Na Bolívia, as políticas de desenvolvimento alternativo e substituição compactuada de cultivos de coca remontam à década de 1980, quando foram incorporadas em um capítulo na Lei nº 1.008 do Regime da Coca e Substâncias Controladas (LEY 1008, 1988). Vigente desde 1988, com diversas modificações pontuais, a lei estabelece que os programas de desenvolvimento alternativo e a substituição de cultivos de coca estariam dirigidos principalmente para pequenos produtores de coca das zonas de produção tradicional (art. 9) e de produção excedente em transição (art. 10) excluindo assim a maior parte dos cocaleiros que se situavam em zonas de produção ilícita (art. 11), onde as plantações seriam objeto de erradicação obrigatória e sem direito a nenhum tipo de compensação.

Para financiamento dos programas de desenvolvimento alternativo, foi criado um Fundo Nacional de Desenvolvimento Alternativo com recursos provenientes do orçamento nacional e de acordos de cooperação bilateral e multilateral. Como marco institucional da política de substituição de cultivos, foi instituído o Plano Integral de Desenvolvimento e Substituição (PIDYS), a partir do qual se estabeleceriam de forma negociada as condições e prazos para redução voluntária, bem como da quantia a ser paga pelo governo em indenização (art. 23).

Os primeiros projetos desse tipo começaram em 1985 com o programa AgroYungas. Durante cinco anos, o Fundo das Nações Unidas para Controle do Abuso de Drogas

(UNFDAC, na sigla em inglês) incentivou agricultores da região a assinarem acordos comunitários para trocar o cultivo de coca por outras culturas como o café. O projeto fracassou devido a uma combinação de fatores adversos como o horizonte de tempo demasiado curto para maturação dos projetos, excessivo de controles e regulações e ausência de estudos de mercado mais adequados à realidade local (FARTHING e KOHL, 2010).

No Chapare, a Agência Americana para o Desenvolvimento (USAID, na sigla em inglês), conduziu quatro grandes projetos de desenvolvimento alternativo. Eles não apenas estavam voltados para reduzir os possíveis ganhos econômicos obtidos com a migração para zonas de cultivo, mas também ampliaram a repressão no Chapare. Contudo, ao fim da década de 1980, os programas da USAID passaram a focalizar a geração de alternativas a população empobrecida que fornecia mão de obra à produção de coca. Os projetos visavam incentivar a produção de bananas, maracujá, abacaxi e outros produtos voltados para a exportação. A participação dos agricultores nesses programas era condicionada à erradicação de cultivos de coca (FARTHING e KOHL, 2010).