• Nenhum resultado encontrado

Políticas e práticas cultural e linguisticamente inclusivas

Capítulo I: Educação para a diversidade

1. Educação e diferença

1.5. Políticas e práticas cultural e linguisticamente inclusivas

Dada a importância da preservação das línguas e culturas, na Europa tem havido uma preocupação crescente no que diz respeito à preservação da diversidade linguística e cultural, tendo sido tomadas medidas que apelam ao ensino-aprendizagem de várias línguas. Como afirma Gonçalves (2011), são vários os documentos da União Europeia onde se verifica uma ideologia pluralista e o estímulo ao plurilinguismo.

Em 1982, o Comité de Ministros do Conselho da Europa organizou-se, tendo surgido desta organização a Recommendation Nº R (98) 18 (1982). Desta recomendação surgiu um conjunto de medidas de incentivo ao ensino-aprendizagem de línguas. Neste documento apelava-se a que:

 toda a população tivesse acesso a meios eficazes para conhecimento de outras línguas, bem como desenvolverem

 competências essenciais à satisfação das suas necessidades de comunicação;

 fossem promovidos, incentivados e apoiados os esforços dos professores e dos alunos em todos os níveis, para que pudessem empregar sistemas de aprendizagem de línguas assentes nas necessidades, motivações, características e recursos dos alunos;

 fossem promovidos programas de pesquisa e desenvolvimento, em todos os níveis educacionais, conducentes à criação de métodos e materiais mais

31

adequados que permitissem que todas as classes sociais desenvolvessem competências comunicativas.

(Recommendation Nº R (98), 1982).

Em 1995, foi lançado o livro branco Enseigner et apprendre. Vers la société cognitive que teve como objetivo principal identificar as principais linhas de ação nas áreas de educação e formação (Gonçalves, 2011).

Três anos após, o Comité de Ministros do Conselho da Europa organizou-se novamente, tendo surgido uma nova recomendação, Recommendation No. R (98) 6 (1998) que, apesar de reconhecer o progresso que os Estados membros desse conselho fizeram desde a anterior recomendação, definiu novas medidas relativas ao ensino-aprendizagem de línguas. Como medidas gerais, a Recommendation No. R (98) 6 definiu:

 permitir que todos os europeus se comunicassem com falantes de outras línguas maternas, sensibilizar os alunos para outras formas de vida e prepará-los para um mundo intercultural, garantindo que os recursos humanos e materiais fossem proporcionados de modo a fomentar o aumento do ensino de línguas;

 promover o plurilinguismo generalizado, ou seja, encorajando todos os europeus a atingir um grau de habilidade comunicativa em várias línguas, diversificando a oferta de línguas, incentivando programas de ensino flexíveis, entre outros.

(Recommendation No. R (98), 1998)

Por diligência conjunta do Conselho Europeu e da Comissão Europeia, em parceria com o Conselho da Europa, o ano 2001 foi considerado o Ano Europeu das Línguas, onde se pretendeu festejar a diversidade linguística e consciencializar a população em geral para a importância da aprendizagem de línguas (Ministério da Educação e Ciência, 2015). Pretendia-se festejar a diversidade linguística e cultural da Europa, significando isto que “todas as línguas europeias e todas as não europeias que, no entanto vivem na Europa são, do ponto de vista cultural, iguais em valor e em dignidade e fazem parte integrante das culturas e das civilizações europeias” (Faria, 2001, p.13).

32

Assim, em 2001 surgiram alguns documentos importantes no sentido de atingir o objetivo do Ano Europeu das Línguas. Neste sentido, foi publicada a Recommandation 1539 (2001) que veio reforçar uma série de princípios ligados à educação para as línguas, tais como: todas as línguas têm o seu valor público e são válidas como meio de expressão para os que as utilizam; o plurilinguismo é uma capacidade de comunicar em várias línguas e não necessariamente o domínio completo das mesmas; todos têm o direito de falar na sua língua materna e de aprender outras línguas. Esta recomendação também defendeu que pode e deve ser dada a oportunidade a todas as pessoas de aprender línguas ao longo da vida. Assim, neste ano foi lançado o Portfolio europeu de línguas pelo Conselho da Europa (2001), documento que pretende ajudar o aprendente a registar as suas aprendizagens e assinalar as suas experiências linguísticas e vivências interculturais relevantes.

Ainda em 2001, foi lançada a Recomendação do parlamento europeu e do conselho de

europa (2001), relativa à mobilidade na Comunidade de estudantes, formandos, voluntários,

docentes e formadores e que identificou alguns obstáculos à livre circulação de pessoas. Assim, na Recomendação do parlamento europeu e do conselho de europa (2001) foram defendidas algumas medidas, das quais destacamos as relacionadas com:

 a eliminação de obstáculos jurídicos e administrativos à mobilidade das pessoas;

 a redução os obstáculos linguísticos e culturais, nomeadamente, o incentivo da aprendizagem de pelo menos duas línguas e o incentivo à preparação linguística e cultural antes de qualquer medida de mobilidade;

 a defesa de diferentes instrumentos de apoio financeiro à mobilidade, por exemplo, subsídios, bolsas, subvenções, etc;

Um outro documento importante publicado no ano de 2001 foi o Quadro europeu

comum de referência (QECR) que faculta uma base comum para a criação de programas de

línguas, linhas de orientação curriculares, exames, manuais, entre outros, na Europa. Além disso, este documento delinea os conhecimentos e as capacidades que os aprendentes de uma língua têm de aprender para serem habilitados a comunicar nessa língua (QECR, 2001). No QECR são definidos também os níveis de proficiência que permitem avaliar quantitativamente o desenvolvimento dos aprendentes em diferentes fases de aprendizagem e ao longo da vida.

33

Em julho de 2003, foi proposto um plano de ação, intitulado Promover a aprendizagem

das línguas e a diversidade linguística: um plano de acção 2004-2006 (Comissão das

Comunidades Europeias, 2003), que veio traçar objetivos políticos a alcançar e propor medidas concretas para a introdução de melhorias no ensino de línguas, nomeadamente, por exemplo, propor a aprendizagem da língua materna e de mais duas línguas desde cedo.

A par destas medidas, a União Europeia tem vindo também a estimular a mobilidade dos cidadãos em contextos educativos formais e não formais. Exemplos desse incentivo são as iniciativas como o “Programa de aprendizagem ao longo da vida (PALV), lançado em 2006, e os seus subprogramas: Erasmus, Leonardo da Vinci, Comenius, Grundtvig, Erasmus

Mundus e Tempus, entre outros” (Coelho, 2012, p. 2). Estes programas intersetam sistemas

de ensino e instituições educativas na Europa e incentivam, simultaneamente, o desenvolvimento de competências plurilingues e interculturais nos cidadãos que neles participam (Coelho, 2012).

Como se pode verificar até ao momento, a construção de políticas educativas foi um processo complexo. Ao longo dos anos, as orientações definidas nos documentos enunciados anteriormente foram ganhando maior complexidade. Na Europa, este tem sido um percurso árduo, devido à dificuldade em definir com clareza os objetivos e devido ao facto de ser um percurso que exige sacrifícios e supõe um elevado grau de confiança no futuro sendo, no entanto, o único caminho possível (Siguan, 1996).

Em síntese, a Europa está consciente da necessidade de generalização do ensino de línguas a toda a comunidade escolar desde os primeiros anos. Como afirma Siguan (1996) ao aprender outras línguas, os aprendentes familiarizam-se com as criações culturais e os modos de vida daqueles que as falam, havendo uma aproximação de culturas, sendo esta aproximação um contributo importante para o entendimento e para a solidariedade. Além disso, o ensino de línguas desde cedo abre a possibilidade de sensibilizar as crianças para a diversidade humana e para os problemas da convivência interculturais, bem como oferece conhecimentos e experiências sobre a pluralidade cultural europeia (Siguan, 1996).

Como pudemos observar, as políticas linguisticamente inclusivas europeias visam garantir a preservação da diversidade linguística e da diferença, a partir da consciência da necessidade de respeito e valorização dessa mesma diversidade. Neste sentido, é essencial desenvolver desde cedo nas crianças competências que lhes permitam comunicar eficazmente e compreender-se mutuamente. O desenvolvimento destas competências pode

34

ser realizado através da educação para a diversidade linguística e para a diferença, concebida como um meio privilegiado para aceder ao outro, à sua identidade linguística e cultural, à sua maneira de pensar ou agir, e ainda como meio impulsionador da convivência e da inclusão sociais.

Sendo assim, sendo o tema deste capítulo a educação para a diversidade, será pertinente demonstrarmos o que se entende por língua, identidade e cultura, conceitos que nos levam a pensar em diversidade e que nos diferenciam na sociedade. Somos seres diferentes porque temos, não só, mas também, uma língua, uma identidade e uma cultura diferentes das dos outros e que necessitamos de respeitar e valorizar.

35