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4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

4.1. Análise comparativa dos movimentos retóricos entre as duas produções textuais

4.1.3. Analisando o movimento 3: avaliação do artigo

4.1.3.6. Polidez na resenha

A manifestação de características negativas da obra resenhada é relevante para mostrar que houve, de fato, reflexão do resenhista sobre o objeto avaliado. O apontamento dessas críticas é importante mesmo que a avaliação final seja favorável ao livro, porque elas indicam maior capacidade analítica do graduando que, no caso, foi capaz de perceber os prós e os contras do livro. Após essa identificação, ele deve avaliar quais delas predominam na obra, a fim de indicar ou não a leitura do texto de Bentes.

Assim sendo, é fundamental que o resenhista seja polido ao se referir aos aspectos negativos do artigo, ou seja, ele precisa utilizar elementos linguísticos capazes de atenuar as críticas desfavoráveis ao texto original. Segundo Carvalho (2005), a resenha é um gênero “ameaçador”, pois exige a emissão de julgamentos não apenas sobre o objeto resenhado, mas também sobre a reputação do autor. Além disso, o resenhista também é exposto, pois a avaliação é algo público, já que, no caso de produções de especialistas, esse gênero é publicado em revistas científicas e, consequentemente, diversos membros da área passam a ter acesso à apreciação realizada. Em função dessas particularidades da resenha, é fundamental que o graduando se conscientize da importância de ser cauteloso e elegante durante a apresentação de críticas negativas e, por isso, discutimos esse assunto no chat.

A tabela abaixo mostra o desempenho dos alunos em relação à manifestação polida das características negativas do artigo. Observe:

Gráfico 15 - Análise da polidez na avaliação 31,25%

18,75%

50% 75%

6,25% 18,75%

Sim Não Não aponta aspectos

negativos

O resenhista é polido ao mencionar

aspectos negativos do artigo?

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A tabela mostra que, na primeira versão, 50% dos alunos não citaram aspectos negativos do texto, porém esse número reduziu significativamente na segunda versão para 18,75%. Como já foi discutido em seções anteriores, verificamos que os estudantes apresentam insegurança em apontar falhas e lacunas no artigo resenhado principalmente por não serem especialistas na área de Linguística Textual e, por isso, metade da turma não realizou críticas negativas. Entretanto, houve uma redução significativa na quantidade de graduandos que não mencionou os contras do texto de Bentes. Isso ocorreu porque, nas aulas do chat, incentivamos a realização de uma leitura crítica do artigo a fim de identificarem não só os pontos positivos, mas também aspectos, por exemplo, que poderiam ser mais bem discutidos por Bentes.

Nesse momento da aula virtual, tivemos o cuidado de mostrar aos alunos a importância de mencionarem essas críticas de forma sutil. Nesse caso, apresentamos exemplos de alunos que não tinham sido muito polidos ao apontarem características negativas do texto de Bentes (2009) e, além disso, discutimos estratégias que poderiam ter sido usadas por eles para amenizarem essas críticas. Dessa forma, os estudantes conseguiram ver, na prática, os problemas que estavam sendo cometidos em relação a essa habilidade exigida na produção da resenha.

Devido a essas estratégias pedagógicas, verificamos que houve uma redução no número de alunos que não utilizou mecanismos linguístico-discursivos ligados à polidez na segunda versão, já que 18,75% dos alunos não foram polidos na primeira produção textual e somente 6,25% dos estudantes não foram na versão final. Observamos que poucos graduandos não empregaram estratégias de polidez nas duas resenhas e consideramos que esse reduzido número se justifica pelo receio em criticar a obra. Por isso, quando apresentam algum aspecto negativo do artigo parecem se sentir na obrigação de criticarem da forma mais sutil possível.

Isso demonstra certa dificuldade dos graduandos em realizar ações típicas do contexto acadêmico que permitem sua constituição como membros escritores da comunidade acadêmica cujo um dos principais objetivos é construir novos saberes científicos a partir, por exemplo, de um debate saudável com outros autores. Dessa forma, questionamentos podem e devem surgir, proporcionando sempre a inovação dos conhecimentos teóricos.

Mostraremos um exemplo no qual a resenhista não é muito educada no apontamento de aspectos negativos:

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Assim, acreditamos que se o texto em questão tivesse um pouco menos de informação, ele poderia se tornar mais eficiente para nós, estudantes do curso de Letras em fase de conclusão de curso (...), pois, além de retomar noções já adquiridas, o texto apresenta e contrasta versões e pensamentos modificados durante o desenvolvimento da LT, entretanto, é difícil chegar a essa organização. (Aluna 6, 1ª versão, grifo nosso )

Segundo a aluna 6, o artigo não é muito eficiente para os estudantes de Letras e, apesar de ela utilizar o verbo no futuro, sugerindo uma ideia de incerteza, o uso do adjetivo eficiente não é muito adequado, pois desmerece o trabalho da autora. Além disso, a resenhista não apresenta argumentos sólidos capazes de justificar a ineficiência do texto, pois mencionar que um artigo científico tem muita informação não é justificativa plausível da ineficácia de um trabalho.

A aluna também precisaria rever a generalização apresentada na avaliação, porque o fato de o artigo apresentar o conteúdo de uma forma mais aprofundada não significa que ele é ineficaz para todos os alunos de Letras, pois, ao contrário disso, ele pode ser mais adequado para os estudantes que já apresentam conhecimentos básicos sobre LT e, portanto, desejam aprimorá-los. Em contrapartida, a aluna 6 evoluiu na segunda resenha, pois ela utilizou estratégias de polidez. Observe:

(...) Para compreender a posição de Bentes, é preciso que o leitor tenha conhecimentos sobre os estudos iniciais da LT (...); caso contrário, a compreensão do texto pode ser prejudicada pela falta de informação base. (...) Assim, consideramos que o texto (...) não é recomendado para calouros do curso de Letras ou para alunos que não possuem uma base acerca da Linguística Textual e de seus momentos, pois, as informações podem ficar soltas e sem conexão, pelo fato de não haver conhecimentos prévios sobre o assunto abordado pela autora, como já referimos. (Aluna 6, 2ª versão, grifo nosso)

A aluna 6 faz uma crítica negativa, de forma bem sutil, em relação à dificuldade de se compreender o texto de Bentes. Dessa forma, em momento algum, ela utiliza adjetivos que desmerecem a qualidade do artigo de forma grosseira. Além disso, a resenhista não faz generalizações inadequadas ao recomendar o livro, pois ela deixa claro para o leitor que tipo de público-alvo pode não ser muito beneficiado com a leitura

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que, no caso, são os leitores mais inexperientes com as teorias linguísticas. Além disso, ela usa verbos atenuantes como podem para mencionar os aspectos negativos do artigo.

Verificamos um aumento considerável no número de alunos que destacou, de forma polida, pontos negativos do texto na segunda versão da resenha, pois 75% dos estudantes foram sutis ao avaliarem o artigo. Acreditamos que esse resultado significativo ocorreu em função das discussões no chat direcionadas exclusivamente para esse aspecto. Elas possibilitaram a compreensão dos graduandos sobre a relevância de se apontar tanto características positivas quanto negativas e eles também perceberam qual a forma adequada de apresentar os contras do artigo. Essas estratégias são importantes porque demonstram respeito pelo trabalho da autora que, no caso, é uma especialista no assunto.

Os dados mostram uma grande melhora em relação à polidez, pois houve um aumento de 43,75% no número de estudantes que passou a empregar recursos capazes de amenizar as críticas negativas. Isso foi possível em virtude das aulas no chat, já que um dos aspectos discutidos foi o uso de estratégias para tornar a avaliação mais polida. Devemos ressaltar que esse assunto também foi abordado nas aulas presenciais, porém verificamos que não basta o professor limitar o ensino dos gêneros aos aspectos teóricos, já que 18,75% dos alunos ainda produziram críticas sem se preocupar em serem sutis na primeira resenha.

Acreditamos que esses alunos apresentavam dificuldades em empregar estratégias linguístico-discursivas para apontar falhas de um artigo corretamente e, por isso, talvez não tivessem consciência de que não estariam sendo sutis. Essa percepção foi alcançada pela maioria dos estudantes45 depois das aulas virtuais e, por isso, foram capazes de identificar os problemas de polidez, melhorando-os na segunda versão.