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Posição dos membros do partido

No documento A reação portuguesa à guerra do Kosovo (páginas 86-90)

Capítulo VII Partido Social Democrata

7.3. Posição dos membros do partido

No Expresso, Durão Barroso voltou a frisar que a intervenção militar era uma exigência ética e moral e isso era justificação suficiente para o envio de tropas nacionais para o Kosovo. Colocou toda a culpa do que estava a suceder na região em Milosevic – e no governo jugoslavo –, pois este não aceitara a autonomia de uma região que tinha uma larga maioria de étnicos albaneses, não subscrevera os acordos de Rambouillet, era o principal obreiro dos massacres e da migração em massa da população e nunca demonstrara procurar verdadeiramente a paz. Para além de um imperativo, a guerra tinha de ser declarada no momento em que foi, garantiu. Referindo-se ao exemplo bósnio, Durão advertiu que, se a NATO ou a comunidade internacional tivessem aguardado mais tempo, os resultados no Kosovo poderiam ser os mesmos que em ocasiões anteriores: mais massacres. Na sua coluna, declarou que o que se passava no Kosovo era do interesse e afetava diretamente Portugal186.

O primeiro-ministro anterior, Aníbal Cavaco Silva, admitiu que a participação numa hipotética – e nunca concretizada – ofensiva terrestre poderia não ser do interesse nacional. Explicou que o país teria sempre justificações para não se comprometer numa operação deste género, porque tinha preocupações mais prementes, em outras áreas do globo, como Angola e Timor-Leste. Cavaco Silva apoiava esta ideia na sua experiência

185 PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA, “É tempo de governar Portugal”, 1999, Lisboa, pp. 53-86. 186 José Manuel Durão BARROSO, “A nossa responsabilidade externa”, in Expresso, 10/04/1999, Lisboa.

87 ao comando do governo quando tropas nacionais se envolveram em operações no Iraque e na Bósnia187.

Francisco Azevedo e Silva alertou para a divisão que a guerra iria provocar na Europa. Criticou a hipocrisia europeia, perante a dualidade de critérios nas questões do Kosovo e Timor188.

Patinha Antão acusou os EUA de imperialismo militar. Disse não compreender o objetivo final de Washington e da NATO: se a capitulação de Milosevic, se colocar em seu lugar uma oposição democrática ou parar o genocídio de albano-kosovares. Asseverou que a NATO não estava a conseguir atingir nenhum desiderato, visto que a limpeza étnica persistia, o número de refugiados aumentava e Milosevic, que, um ano antes, tinha a população jugoslava contra si, gozava de grande popularidade189.

A 20 de Março, o Expresso noticiou que o deputado Ferreira do Amaral estava contra o envolvimento no esforço de guerra, tendo demonstrado essa opinião numa reunião do CSDN. Ferreira do Amaral não confirmou esta notícia, escudando-se no facto de as reuniões do CSDN serem de carácter privado190.

Juntamente com dois vice-presidentes da Assembleia da República, o também vice-presidente Mota Amaral subscreveu uma declaração que pedia o fim dos ataques à RFJ e o retorno à mesa de negociações191.

O nº1 da lista do PSD às eleições europeias, José Pacheco Pereira, culpou os governos socialistas da UE de não terem criado as condições para uma integração dos países da antiga URSS, criando instabilidade no leste europeu, o que era visível na guerra do Kosovo. Apesar de não concordar com a guerra, não acreditava que a Europa tivesse de enfraquecer os seus laços com os EUA, mas de criar condições para uma atuação autónoma, em matéria de defesa192.

Finda a guerra, em Novembro de 1999, Pacheco Pereira escreveu, no Público, sobre a sua oposição à guerra. Estabelecendo um paralelo entre a questão kosovar e a chechena, denunciou a hipocrisia da NATO ao proclamar que a guerra do Kosovo seguia

187 Eduardo DÂMASO, “O tabu da ofensiva terrestre”. Público, 10/04/1999. in

<http://www.publico.pt/destaque/jornal/o-tabu-da-ofensiva-terrestre-131906> (Consultado a 14/06/2015).

188 Francisco Azevedo e SILVA, “Frases”, in Expresso, 10/04/1999, Lisboa. 189 Mário Patinha ANTÃO, “A Europa é bela”, in Expresso, 02/04/1999, Lisboa.

190 Graça ROSENDO, e José VEGAR, “Ferreira contra Kosovo”, in Expresso, 20/03/1999, Lisboa. 191 São José ALMEIDA, e Ana HENRIQUES, “Críticas à intervenção aumentam”. Público, 01/04/1999. in

<http://www.publico.pt/destaque/jornal/criticas-a-intervencao-aumentam-131562> (Consultado a 04/07/2015).

192 Cristina FIGUEIREDO, “Pacheco Pereira e a campanha para as eleições europeias”, in Expresso,

88 imperativos morais e desconfiava da razão invocada para os bombardeamentos: parar o genocídio. Aceitava que a população albano-kosovar, que constituía a maioria, não era ouvida e desfrutava de poucos direitos cívicos, assim como a opressão e a violência eram utilizadas com frequência. Porém, não consentia que a política internacional se baseasse na ética e na moral. Segundo o cabeça-de-lista do PSD, a real politik, ou seja, a força e o poder, preenchia todas as ações políticas, a nível internacional. Logo, não admitia que a preocupação da NATO fosse uma exigência ética e moral193.

Vasco Graça Moura via a União Europeia como incapaz de definir o que pretendia e qual o seu papel, de ter autonomia e de se coordenar, na questão kosovar. Deste modo, a UE cumpria os desígnios dos EUA e aceitava que a NATO atuasse, à custa da secundarização da ONU e sem mandato do Conselho de Segurança. Julgava que os bombardeamentos, no máximo, alterariam um genocídio para um massacre mais avançado tecnologicamente, protagonizado pela NATO. Não esperava que os ataques à RFJ resolvessem ou melhorassem a situação no terreno, mas sim a piorassem e aumentassem as mortes. Isto fora, aliás, o que acontecera com intervenções dos EUA com objetivo de parar violações dos Direitos Humanos. Graça Moura desconfiava que o verdadeiro objetivo dos EUA era o desmantelamento da UE e que a guerra poderia mesmo fazer com que isso sucedesse194.

Noutro artigo, Vasco Graça Moura criticou a justificação fornecida pelo primeiro- ministro para começar uma guerra sem mandato da ONU: o receio de veto da Rússia no Conselho de Segurança. Condenou a União Europeia e a Europa, em geral, por estar dominada pelos EUA, em matéria militar e de política externa, em plena subserviência, e incapaz de descobrir um rumo autónomo. Em seu entender, a fim de alterar este quadro, a UE deveria criar uma verdadeira PESC e tornar a UEO o seu braço armado, sem estar debaixo da alçada da NATO. A UE também necessitaria de esfriar um possível ímpeto agressivo norte-americano, que poderia causar novas guerras em outras regiões195. Aliás, Vasco Graça Moura subscreveu o mesmo manifesto que Júlio Castro Caldas e Vítor Cunha Rego, reprovando a guerra196.

193 José Pacheco PEREIRA, “Porque é imoral fundar a política na moral”. Público, 18/11/1999. in

<http://www.publico.pt/espaco-publico/jornal/porque-e-imoral-fundar-a-politica-na-moral-126593> (Consultado a 17/06/2015).

194 Vasco Graça MOURA, “Vice-versa”, in Expresso, 10/04/1999, Lisboa. 195 Vasco Graça MOURA, “Vice-versa”, in Expresso, 22/05/1999, Lisboa.

196 ALCYONE. Ontem «Portugal e a tragédia do Kosovo» - Hoje «O pesadelo de uma hipotética Grande

Albânia». Consultado a 23/07/2015. in <http://skocky-alcyone.blogspot.pt/2008/11/ontem-portugal-e- tragdia-do-kosovo-hoje.html>.

89 Como aconteceu no PS, o Partido Social Democrata não um conseguiu formar consenso neste assunto, com membros importantes a insurgirem-se contra a posição oficial, com particular enfâse para o nº1 da lista do partido para as eleições europeias desse mesmo ano. Para finalizar, é relevante notar a variação da posição do PSD, pois, num primeiro momento, ainda em 1998, insinuou ser fundamental um mandato da ONU, para Portugal participar numa ofensiva no Kosovo. Com o início da guerra, colocou de parte esse requisito, defendendo que tal não era viável, por causa do poder de veto russo.

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No documento A reação portuguesa à guerra do Kosovo (páginas 86-90)