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5.3 Práticas de compra, preparação e consumo de Slow Food

5.3.1 Prática de compra e o Slow Food

Os materiais constituintes da prática de compra de Slow Food foram aqueles associados à infraestrutura, recursos e pessoas envolvidas na prática e que estavam ligados aos significados atribuídos pelos entrevistados e às suas competências.

Os produtos (elemento material) mais procurados pertenciam a categoria de frutas e hortaliças. Observou-se que a concentração de pessoas nas feiras, em geral, se dava em torno das barracas onde esses produtos eram vendidos. Os consumidores pareciam procurar ou dedicar menos atenção aos produtos de cosméticos. Eles se mostravam curiosos em um primeiro momento, mas não compravam tanto quanto os produtos das outras barracas, principalmente a de frutas e hortaliças, conforme registro feito em diário de campo.

Foram registrados, ainda, atributos predominantes nos produtos vendidos. Descrições nos rótulos, certificações e palavras que faziam alusão direta à eles, além dos próprios produtos (materiais). A rotulagem de produtos da Feira Caroá incluía termos como “natural, regional, orgânico”, “sem conservantes, sem açúcar, sem lactose”. Esses termos ressaltavam os benefícios para a saúde e aspectos culturais da prática de Slow Food em termos

de compra. Na Feira do Benfica os produtos se destacavam por remeter à aspectos de sustentabilidade ambiental, métodos de cultivo ou certificação orgânica em alguns casos, além de termos como “artesanal”, presente na cajuína por exemplo, ou “ecológico, orgânico, produzido sem agrotóxicos, preserva o meio ambiente, aqui tem agricultura familiar”, presentes no arroz.

Figura 10: Produtos das feiras

Fonte: Dados da pesquisa (2020).

Ainda dentre os elementos materiais observados, aqueles que compõem a própria estrutura das feiras, a exemplo de suas barracas, banners e outros objetos de função informativa. A existência de plaquinhas evidenciando aspectos de sustentabilidade ambiental e social por meio de informações como “Mercado Justo e Sustentável”, “Sua lista de compras Muda o

Mundo dos agricultores familiares da rede MMM”, “Agroecologia. Produção: livre de agrotóxicos, livre de trangêneros, reflorestamento, preserva solo, água, mata e sementes nativas” e “Alimento livre de agrotóxicos, de transgêneros, de exploração”.

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Na Feira do Benfica, informativos como: “Adquirindo nossos produtos você está

ajudando a reflorestar” e “produtos agroflorestais num real respeito à natureza e você”, “livres

de agrotóxicos, trabalho infantil, adubos químicos, trigo, leite, proteína animal, adoçante,

corante, conservante industrial e tempero industrializados”, e “ovos caipira”, os quais

rementiam à produção em sítio. São apresentadas nas fotos de 1 a 4 (Feira Caroá) e 5 e 6 (Feira do Benfica) (FIGURA 11).

Figura 11: Placas e banners informativos

Fonte: Dados da pesquisa (2020)

O uso de sacolas retornáveis pelos consumidores de ambas as feiras foi marcante durante o período de observação. A principal diferença percebida foi que, na Feira Caroá, também eram fornecidas cestas e sacolas de papel da própria cooperativa (materiais), para aqueles consumidores não tivessem levado sua própria sacola. Já na Feira do Benfica, poucas eram as opções nesse sentido. Além disso, foi observada a presença de sacolas plásticas na barraca de frutas, verduras e legumes, o que acaba constituindo uma possível barreira para a perpertuação de uma prática sustentável de evitar o uso de plástico nesse ambiente. Percebeu- se que alguns consumidores usavam sacolas plásticas mesmo levando sacolas retornáveis.

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Exemplos das práticas nas feiras são apresentadas na figura 12, representando a Feira Caroá (foto 1) e a Feira do Benfica (fotos 2 e 3).

Figura 12: Cestas e sacolas retornáveis nas feiras

Fonte: Dados da pesquisa (2020)

Além de observada em ambas as feiras, na qual foi registrada por meio de diário de campo e de fotografias, o uso de usar sacolas retornáveis foi mencionado por todos os participantes da pesquisa. Alguns entrevistados mencionaram ter mais de uma sacola. Dentre alguns exemplos:

“Eu tenho uma bolsinha, daquelas ecobag” (Júlia, 23, Benfica)

“Sim, sim, faz um tempo que já estou evitando sacolas plásticas” (Rebeka, 36, Benfica)

“[...] eu levo alguma sacola de tecido e tal, alguma embalagem retornável” (Sarah, 27, Caroá).

“Eu levo umas sacolas retornáveis. Eu comprei umas cinco sacolas e eu levo [...]” (Jessica, 58, Benfica).

Os entrevistados da Feira Caroá, inclusive, percebem que a feira visitada não trabalha com plástico, como apontam os seguintes trechos ilustrativos:

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“[...] quando eu não lembro de levar a própria sacola, eu uso a sacola deles, que é o que, hoje, é uma sacola de papel que eles já produzem com o nome todo bonitinho, com texto lá, tipo, ‘não sou de plástico’ [...]” (Sophia, 33, Caroá)

“[...] eles não trabalham com plástico, isso é muito importante. Todos os produtos estão lá expostos do jeito que eles foram colhidos [...]” (Nina, 44, Caroá).

Por fim, elementos materiais envolvidos na prática de compra e que foram compartilhados pelos entrevistados dizem respeito à incorporação de alimentos na rotina através da experimentação e incorporação de produtos que antes não eram consumidos e do aumento do consumo de frutas, verduras e legumes. Associado à essa incorporação de materiais à pratica da compra, identificou-se uma competência nos entrevistados: estão cientes de que o gosto dos alimentos comprados na feira é diferente, melhor, em relação ao dos produtos que não são orgânicos ou agroecológicos. Alguns exemplos ilustrativos:

“Eu passei a consumir mais frutas e verduras” (Hanna, 36, Benfica)

"[...] eu diria que tem mais alimentos que eu passei a consumir porque, hoje, eu como muita fruta e verdura, mas isso é um evento bem recente da minha vida, coisa de cinco anos pra cá. Eu comecei a comer mais depois que eu passei a frequentar a feira porque o gosto é muito diferente, é muito mais gostoso." (Nicolas, 38, Benfica)

"[..] eu acho que diferença foi provar novos sabores que eu não tinha provado, que, hoje em dia, estão fazendo parte da nossa alimentação, com algumas coisas que a gente não consumia" (Julia, 23, Benfica)

"[...] eu consegui sentir mais o sabor mesmo, sabe, tipo de gostar de consumir alimentos crus que antes eu também não imaginava comer. Tipo, abobrinha, eu como crua, eu não gostava nem dela, tipo, boa, cozida, mas eu como crua, de boas, e, também, sem ter esse medo de poder tá consumindo algo tóxico" (Diana, 25, Benfica)

A prática de compra de Slow Food está atrelada à diversos significados atribuídos pelos entrevistados. Essa prática foi percebida como uma forma de adquirir produtos saudáveis, no sentido de não conterem agrotóxicos em sua produção, se traduzindo na busca por produtos de natureza orgânica ou agroecológica. Além disso, a prática foi relacionada à aquisição de produtos da estação, frescos e naturais. Também foi associado à pratica os significados: forma de obter preços acessíveis, contribuição social e econômica, enlace social com produtores e atmosfera agradável de feira. Além disso, o prazer na aquisição de produtos, na contribuição, no enlace social e na atmosfera de feira.

A noção de saúde associada ao orgânico, a ser livre de agrotóxico na produção, se sobressaiu enquanto significado da prática de compra. Significados de aquisição de produtos saudáveis foram centrais para a maioria dos entrevistados, conforme os depoimentos:

“A gente se importa muito hoje com essa coisa de consumir um produto que não é doente, que não adoece a gente, que não nos fará mal porque tá cheio de agrotóxico [...]” (William, 52, Caroá)

“[...] eu gosto muito de comida saudável, comer sem agrotóxico [...]” (Sarah, 27, Caroá).

Outro significado identificado foi a aquisição de produtos com atributos naturais, sazonais e frescos. As falas de Diana e Nina evidenciam a noção de sazonalidade e naturalidade buscada por meio da compra enquanto as de Hanna e Jessica tratam da busca de produtos frescos:

Isso é legal também, o lance da sazonalidade, né, que a gente vai realmente encontrar nos alimentos [...]” (Diana, 25, Benfica)

“[...] oferecer um produto de qualidade [...] uma coisa mais natural [...]” (Nina, 44, Caroá).

“[...] eu gosto de ter os produtos frescos [...]” (Hanna, 36, Benfica)

“[...] vantagem é comer alimento sem agrotóxico, fresquinho [...]” (Jessica, 58, Benfica).

O atributo local, de produtor local, foi mencionado por alguns entrevistados como um aspecto da produção que tem um significado importante enquanto atributo de produto, mas que se manisfesta mais em termos de contribuição social e econômica que o consumidor pode proporcionar aos produtores locais, uma outra categoria de significado que emergiu dos resultados e será apresentada mais à frente. Nessa lógica, os consumidores buscam menos um produto local e mais uma forma de contribuir e apoiar produtores de uma região por meio da compra de produtos locais. O relato de Nícolas é um dos exemplos que, de fato, atribui à compra um significado de aquisição de produtos locais, de origem local.

“[...] uma oportunidade de adquirir alimentos que a gente entenda que sejam orgânicos ou que, pelo menos, que tenham um tratamento diferente e de uma origem que seja um pouco diferente, de ser algo local [...]” (Nícolas, 38, Benfica).

A compra nas feiras também significa obter produtos à preços mais acessíveis para os entrevistados, conforme apontam as falas de Samuel e Nicolas.

“[...] o preço é muito bom porque são de boa qualidade, né, isso com certeza” (Samuel, 32, Caroá)

“[...] isso é importante, a diferença de preço, então, você também pode verificar isso [...]” (Nicolas, 38, Benfica).

A contribuição social e econômica para produtores locais e agricultura familiar foi um significado central relacionado à pratica de compra. Os entrevistados se referiam aos produtores locais, à agricultura familiar, à economia ou ao mercado local por meio de termos que remetiam à ideia de contribuição por meio de apoio, valorização, ajuda e fortalecimento. Dentre os exemplos ilustrativos, os de Alice, que revelou gostar de fortalecer a economia local por meio da compra, e de Nina, dando importância à ideia de ajudar o pequeno produtor cearense. Sarah e Sophia consideram que comprar de pequenos produtores é uma vantagem por estarem ajudando e valorizando o trabalho deles.

“[...] eu gosto muito dessa coisa de fortalecer a economia local” (Alice, 52, Caroá)

“Eu vejo muito esse lado do ‘eu estou ajudando alguém do meu Estado, um pequeno produtor daqui do Ceará’, alguém que, talvez, não tivesse essa oportunidade de vender se eu não tivesse consumindo ali na feira, entendeu?” (Nina, 44, Caroá).

“Comprar de quem produz pra mim é mais vantagem, você ajudar o ‘pequeno’ [produtor]” (Sarah, 27, Caroá)

“[...] tem uma questão de valorizar também o agricultor” (Sophia, 33, Caroá). O significado de enlace social com produtores também foi identificado nas entrevistas para a prática de compra. As visitas às feiras permitiram à pesquisadora observar que os consumidores pareciam conhecer alguns dos produtores, a exemplo de um homem que sorriu e cumprimentou com aperto de mão e, em seguida, começou a conversar com ele, conforme registro feito em diário de campo. Nessa lógica, entrevistados como Ana e Samuel revelaram gostar da sensação de proximidade com os produtores, assim como Hanna fala sobre a familiaridade que sente em relação à eles.

“[...] eu gosto dessa aproximação entre quem produz, assim, entre eu, como consumidora, e quem produz, sabe?” (Ana, 24, Benfica)

“[...] você se sente como se tivesse no interior, uma coisa mais, assim, próxima” (Samuel, 32, Caroá)

“[...] eu já tenho familiaridade com eles, então, eles já sabem o que é que eu compro e, quando eu passo mais de duas semAnas sem ir por algum problema, eles já dizem ‘ei, você faltou semana passada’[...]” (Hanna, 36, Benfica).

A noção de atmosfera agradável de feira constituiu outro significado, ligado à ambientação e sensações dos entrevistados quanto a feira em si e às pessoas envolvidas. Foi registrado em diário de campo, durante as visitas às feiras, que alguns consumidores pareciam se conhecer. Por exemplo, quando uma mulher sorriu e riu para outra dizendo “Você já está

aqui batendo ponto?” e a outra riu de volta concordando. Ana e Rebeka, por exemplo,

utilizaram termos como “calor humano” e “gosto das pessoas”, respectivamente, para expressar esse significado:

“Eu sinto meio que um calor humano, eu gosto do ambiente da feira” (Ana, 24, Benfica)

“Eu gosto das pessoas que eu vejo lá, que eu encontro [...]” (Rebeka, 36, Benfica).

Vale ressaltar, a emergência de um significado vinculado aos demais. Na prática de compra de Slow Food, os significados mencionados estão sempre imersos em aspectos emotivos e afetivos. Termos como “gosto”, “gosto muito” revelam como o prazer está presente na aquisição de produtos, na contribuição, no enlace social e na atmosfera de feira, como pode ser observado nos depoimentos:

“[...] eu gosto muito de comida saudável, comer sem agrotóxico [...]” (Sarah, 27, Caroá).

“[...] eu gosto de ter os produtos frescos [...]” (Hanna, 36, Benfica)

“[...] eu gosto muito dessa coisa de fortalecer a economia local” (Alice, 52, Caroá)

“[...] eu gosto dessa aproximação entre quem produz, assim, entre eu, como consumidora, e quem produz, sabe?” (Ana, 24, Benfica)

“Eu gosto das pessoas que eu vejo lá, que eu encontro [...]” (Rebeka, 36, Benfica).

“Eu sinto meio que um calor humano, eu gosto do ambiente da feira” (Ana, 24, Benfica)

Os significados atribuídos à pratica de compra de Slow Food estão relacionados à certas competências de seus praticantes. Nesse sentido, tais competências e formas de

conhecimento identicadas nos entrevistados tratam da capacidade de avaliar um produto pelos seus atributos (sazonais, saudáveis, naturais e frescos), conhecer a proposta das feiras que frequentam e como estas funcionam, saber da existência de outras feiras ou de outros pontos de venda, perceber que os produtos têm preços mais acessíveis do que os vendidos em supermercados. Além disso, estar ciente de que, enquanto consumidores, estão contribuindo socialmente e economicamente para os pequenos produtores locais e saber como os produtores contribuem para o seu processo de aprendizagem e sensação de enlace social.

Os entrevistados demonstraram conhecimento quanto à avaliação de produtos das feiras pelos seus atributos saudáveis, sazonais, naturais e frescos. Saber que está consumindo um produto saudável pelo fato dos produtos serem “limpos”, termo que faz referência à um dos princípios do Slow Food sobre a sustentabilidade ambiental no processo de produção, foi uma competência identificada nos entrevistados, além da percepção da naturalidade por meio da aparência do produto, a exemplo do depoimento de Nina:

[...] de uma maneira geral, acrescenta muito na saúde porque você tá consumindo um produto limpo de verdade, sem muita química, sem pesticida [...] eu considero que os produtos realmente são de qualidade, são produtos naturais, você percebe até pela estética do produto, é bem diferente do que você compra no supermercado [...] Eu olho muito essa questão do aspecto, né, do que eu tô comprando. Tudo, cor, textura, cheiro, eu presto atenção em tudo [...] eu sempre procuro comprar produtos que eu sei que estão na época porque, pra mim, são as coisas mais frescas” (Nina, 44, Caroá)

Segundo registro feito no diário de campo, foi observado como os consumidores avaliam os produtos da feira: eles olham, tocam e cheiram os produtos, como evidenciado:

“Esse é o processo de escolha, só de ver, de tocar, avaliar se tá numa condição boa [...]” (Diana, 25, Benfica)

Ademais, fazem perguntas sobre os produtos aos produtores. A fala de William sobre a avalição de um alimento é representativa de como o entendimento sobre a naturalidade de um produto também se dá por meio de um processo produtivo vinculado ao respeito da época de produção do alimento:

“[...] quando você tem produto que tá fora de uma época, tá parecendo que tem alguma coisa que não tá natural naquele processo” (Willliam, 52, Caroá).

Outra competência identificada trata de estar ciente da procedência dos produtos, da compra de alimentos produzidos localmente e que respeitem à sazonalidade, além do

conhecimento sobre sustentabilidade ambiental em termos de práticas sustentáveis utilizadas na produção. Alguns exemplos:

“[...] eu tô consumindo um alimento saudável, que eu sei da onde é que vem [...]” (Jessica, 58, Benfica)

“[...] conhecer a procedência e tentar comprar produtos que sejam produzidos na região e por temporada [...] práticas, tipo, de reuso de água, aí entram muitas questões [...] e, assim, em um nível mais extremo, a questão de permacultura, né, de ter uma cultura permanente, de utilizar o solo certinho, de plantar, o que vai melhorar o solo ao longo do tempo, de não precisar ficar fazendo queimadas, essas coisas, já em um nível bem hard” (Samuel, 32, Benfica).

Em geral, os entrevistados demonstraram conhecer a proposta das feiras que frequentam e como estas funcionam. O depoimento de Diana, apresentado a seguir, revela que ela está ciente da proposta agroecológica da feira que costuma frequentar, além de aspectos relacionados aos dias e periodicidade de ocorrência dessa feira e de uma outra que conhece e visita:

“Eu costumo frequentar as feiras, né, agroecológicas. A que é mais perto da minha casa, assim, a que seria mais fácil pra eu ir seria a do Benfica mesmo [...] sábado, né, de manhã, então, umas oito ou nove horas eu já tô indo pra lá, as vezes eu também vou naquela que rola lá na Frei Umberto que é a da reforma agrária, que é no segundo sábado do mês. [...] Acontece de 15 em 15 dias, né, duas vezes no mês [a do Benfica] [...]” (Diana, 25, Benfica).

Ainda nesta perspectiva, outros entrevistados afirmaram saber da existência de outras feiras, como indica Sarah, representante da feira Caroá, ou de outros pontos de venda desses produtos, presente na fala de Rebeka quando ela se refere a um supermercado próximo de sua residência:

“Tem outras que acontecem no centro do Benfica [...] mas eu não conheço muito, assim, a rotina delas. [...] Lá eu já sei que tem todo sábado, então de 15 em 15 dias eu tento me programar” (Sarah, 27, Caroá)

“Tem lá, tem lá no Alpha, [...] sabe, daquela feira Muda Meu Mundo, tem uma barraquinha lá [...]” (Rebeka, 36, Benfica).

Outra competência identificada foi em relação ao significado da compra em termos de preços acessíveis. Os depoimentos dos entrevistados demonstram que eles estão cientes da diferença entre preços dos produtos das feiras e dos de supermercado, onde são percebidos como mais caros:

“[...] compro mais na Praça das Flores, no Beta [supermercado] também tem, mas sempre é mais caro, né?” (Alice, 52, Caroá)

“Essa feira eu acho ela mais barata do que comprar no supermercado [...]” (Samuel, 32, Caroá)

“Ah, é barato também, eu esqueci de falar isso, os preços são bem mais em conta do que em supermercado quando você vai procurar produtos orgânicos ou até mesmo produtos convencionais, com agrotóxicos, são mais baratos [...]" (Nina, 44, Caroá).

Entretanto, Nicolas reclamou da falta de sinalização de preço em uma das barracas da Feira do Benfica, algo que também foi observado pela pesquisadora em registro de diário de campo:

“[...] o preço a gente fica... a gente precisa sempre tá perguntando o preço, ‘quanto é que tá isso aqui hoje?’ porque é exatamente o ponto da organização, porque você chega ali e não tem o preço ali, descrito logo em cima” (Nicolas, 38, Benfica)

Os entrevistados demonstraram estar cientes de estar contribuindo no âmbito social e econômico para produtores locais e a agricultura familiar, o que constituiu uma competência da prática. Diversas vezes os eles afirmaram “saber” que estão ajudando produtores locais, “saber” que estão contribuindo para esses trabalhadores por meio da compra de produtos locais:

“Tipo, eu tô contribuindo com alguma coisa ao consumir aquele alimento. É um alimento, assim, de um produtor local [...]” (Ana, 24, Benfica)

“[...] saber que eu tô contribuindo com alguma coisa [...]” (Jessica, 58, Benfica)

“O agricultor, ele, de fato, é remunerado com um valor justo pela produção e isso pra mim também é muito importante na hora de escolher um alimento [...]” (Sophia, 33, Caroá)

“É algo que tem sentido, que você sabe que tá ajudando alguém, que você sabe que tá [...]” (Diana, 25, Benfica).

Uma competência bastante presente no discurso dos participantes da pesquisa foi atrelada ao significado de enlace social com produtores. Uma proximidade foi estabelecida por meio de conversas, dicas, esclarecimento de dúvidas e explicações sobre os alimentos, das quais os entrevistados demonstraram estar cientes. Tal fato proporciona a incorporação de conhecimento pratico para a realizar compras mais sustentáveis pelos consumidores, uma vez que aspectos como “de onde vem”, “quem fez”, “como foi feito” são explicados pelos produtores:

“[...] são pessoas muito simpáticas, são pessoas que sabem explicar de onde é que vem, como foi feito, eles conseguem tirar essas dúvidas, sabem qual é a sazonalidade do produto, explicar o porquê não é a época” (Samuel, 32, Caroá).

“[...] coisas, tipo, sei lá, óleo de côco, essas coisas, a gente pergunta como é que foi feito, quem fez, de onde é que vem, mas, normalmente, é sobre isso, sobre a origem ou quem fez determinada coisa” (William, 52, Caroá).

Dentro desta perspectiva, os consumidores ou coprodutores vão aprendendo sobre diversos aspectos da produção dos alimentos vendidos na feira. Também estão cientes de que recebem informações sobre como escolher produtos, dicas sobre higiene, sobre como prepara- los e sobre quando estarão bons para consumo. Alguns exemplos desse processo de aprendizadem por meio da relação mais próxima e direta com os produtores:

“Tem um senhorzinho lá que eu não sei... e daí ele sempre fala ‘olha, isso aqui foi tirado tal dia’, quando, que isso aqui é de não sei quando, ‘essa daqui vai tá boa lá pra quinta-feira’. Então, é o tipo de coisa eu vou aprendendo [...]” (Sarah, 27, Caroá)

“No começo, logo quando eu vim morar eu não sabia comprar nada, né, zero conhecimento no sentido de escolher as coisas, e, aí, eu fui adquirindo prática com eles. Até quando eu vou ao supermercado, eu uso conhecimentos que