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5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

5.2 Análises dos resultados dos alunos

5.2.4 Prática individual de leitura e escrita

Na pesquisa, podemos observar que boa parte dos alunos escreve, embora não leia e, quando conseguem ler, a maioria não compreende o que lê. Muitos copiam como se desenhassem as palavras. Em determinados contextos do dia-a-dia alguns alunos conseguem, com muita dificuldade, fazer uso da leitura e da escrita, como, por exemplo, anotar listas de compras (caso dos que possuem um pequeno comércio) um telefone, (caso das mulheres que trabalham como domésticas), assinar o nome, tentam identificar alguma correspondência doméstica, como contas de água, luz, telefone, Bolsa Família, efetuam pagamentos, fazem compras em supermercados e identificam, através de códigos próprios, os produtos de que precisam, ou seja, lidam com a leitura e escrita, tanto no trabalho como nas tarefas diárias. Portanto, apesar das fragilidades e das dificuldades sentidas por eles, podemos perceber o valor positivo que envolve a busca por autonomia ou independência em relação ao uso da escrita por esses sujeitos. Vejamos os exemplos nas falas de alguns alunos entrevistados:

(39) aos poucos a gente vai melhorando, ficar só é ruim, ficar sabendo mais das coisas, não depender das pessoas, isso é bom. (AL7M, 47).

(40) mudou sim, porque eu aprendi a fazer meu nome, fiz novas amizades, a gente brinca muito, só em sair de casa já é uma grande coisa. Eu resolvo tudo pra todo mundo, pago as contas de casa, o que eu não sei eu pergunto, se me soltar na aldeota eu sei ir pra todo canto, não me aperreio com nada, sou desarnada. (AL3F, 54).

Em relação ao que a leitura pode fazer por esses sujeitos, Soares (1998, p.21), ao discutir as condições sociais da leitura, ressalta a visão unilateral que vem predominando nas pesquisas em relação ao emprego da leitura. Nessa visão, as classes dominadas percebem a leitura “pragmaticamente como instrumento necessário à sobrevivência, ao acesso ao mundo do trabalho,

à luta contra suas condições de vida”, e as classes dominantes, por sua vez, a entendem como elemento de “fruição, lazer, ampliação de horizontes, de conhecimentos, de experiências”.

O livro mais lido ou desejado como leitura preferida é a Bíblia: 42,3% manifestaram o desejo de ler e conhecer seus ensinamentos. No meio religioso, a leitura de material escrito é frequente, sobretudo nas igrejas e nas famílias, sendo mediados pela oralidade. Isso justifica a leitura constante desses materiais religiosos por pessoas com baixo nível de letramento. Muitos trechos são memorizados e repetidos com freqüência, e nessa repetição os sujeitos dão sentido ao que está escrito (cf. tabelas 75 e 86).

Com relação às práticas individuais de leitura e escrita, o gráfico 11 pode ajudar na interpretação das falas dos próprios alunos. Muitos dizem que leem, mas com dificuldade, quase todos conseguem escrever, porém com alguma dificuldade e sem compreensão. Vejamos como os alfabetizandos avaliaram as próprias capacidades.

Gráfico 11 – Distribuição dos alunos em relação a saber ler

Fonte: a própria pesquisa.

Como podemos observar no gráfico 11, a maioria dos alunos diz que lê (75,0%), apesar dos alunos terem respondido sim, no gráfico 12, a seguir, podemos analisar o grau de dificuldades dos alunos, levando em consideração o grande percentual dos que leem com dificuldade e muita dificuldade. Vejamos os dados.

Gráfico 12 – Distribuição dos alunos por grau de dificuldade na leitura

Fonte: a própria pesquisa.

Observamos neste gráfico que os alunos relatam ler com dificuldade ou muita dificuldade (57,8%). E, quando indagamos o nível de compreensão dessa leitura, o próximo gráfico (13) mostra que 42,3% dos alunos afirmaram não compreender ou compreender parcialmente o que leem.

O significado da leitura envolve compreensão e recriação de significados, pressupondo um enriquecimento do leitor. A leitura deve ser colocada como instrumento de participação e renovação cultural. O que vemos nesse gráfico é um percentual muito grande de alunos que lêem com muita dificuldade, porque, se avaliarmos o que eles estão admitindo, significa, na verdade, dizer que não lêem; é a realidade que se apresenta e a concluída nesse estudo: os alunos não aprendem a ler e a escrever ao final do curso.

No gráfico 13, os alunos relatam o seu nível de compreensão, e, nas entrevistas, percebemos que a maioria, realmente, não compreende o que lê. Vejamos os percentuais.

Gráfico 13 – Distribuição dos alunos por grau de compreensão na leitura

Fonte: a própria pesquisa.

Neste gráfico, observamos que aqueles alunos que dizem saber ler, na verdade, leem mas não compreendem. Aprender a ler é um processo permanente que implica simultaneamente aprender a decodificar e aprender a compreender diferentes tipos de textos. Não foi o que aconteceu no curso, pois, quanto mais amplo e diversificado for o contato do indivíduo com a linguagem escrita, maiores serão suas oportunidades para descobrir as regularidades desta e para se familiarizar com suas características específicas; ou seja, quanto maior o grau de letramento, melhores serão as possibilidades de exercer as práticas sociais que usam a escrita, e mais, dominando também a decodificação

Soares (2004, p.68), falando sobre leitura do ponto de vista da dimensão individual de letramento (a leitura como uma tecnologia), diz que “é um conjunto de habilidades

90reqüentou90s e psicológicas, que se estendem desde a habilidade de decodificar palavras escritas até a capacidade de compreender textos escritos”. Para a autora, essas categorias não se opõem, completam-se; a leitura é um processo de relacionar símbolos escritos e unidades de som

e é também o processo de formular uma interpretação de textos escritos. A pesquisa mostrou também que aqueles que sabiam ler, não aprenderam no programa;

já sabiam quando se matricularam. Eles voltam à sala de aula com o objetivo de relembrar um pouco o que aprenderam, veem o projeto como uma oportunidade de sair um pouco de casa depois de um dia estafante de trabalho. O próprio alfabetizador procura o aluno e tenta convencê- los a retomar porque precisam formar, a cada módulo, no mínimo dez salas de aulas na zona urbana e cinco, na zona rural. Nem sempre existem alunos suficientes na localidade para formar as turmas, e, como precisam do emprego, acabam matriculando pessoas já alfabetizadas. As aulas

da AlfaSol só podem ser iniciadas após o envio dos dados de todos os alunos e das turmas formadas.

Quanto à aprendizagem da escrita dos sujeitos investigados, observamos que para esses alunos a escrita se torna um símbolo de superioridade; mesmo que eles não compreendam o que estão escrevendo, sentem-se superiores em relação àqueles que não conseguem habilidade para tal.

Assim como a leitura, a escrita na perspectiva da dimensão individual de letramento ( a escrita como uma “tecnologia”), é também um conjunto de habilidades psicológicas, mas habilidades fundamentalmente diferentes daquelas exigidas pela leitura.

Muitos alunos conseguem escrever no curso, às vezes com letras bem legíveis e de forma bem organizada. Quando perguntamos aos alunos se escreviam, 96,2% responderam que escreviam; desses, 25% disseram que o fazem bem, 50% razoavelmente, e 21,2% muito mal (cf.tabelas 48,49 e 50).

Analisando os que disseram que escreviam mal, mais os que responderam razoavelmente, obteremos um total de 71,2% de alunos que não escrevem muito bem. Somando mais 3,8% dos que não quiseram responder, ficamos com um total de 75% de alfabetizandos que não compreendem o que escrevem, portanto não leem e não escrevem muito bem.

Comparando os que leem (75,0%), com os que escrevem (96,2%), podemos observar que 57,8% leem com dificuldade ou com muita dificuldade; 71,2% escrevem com muita dificuldade. Continuando a indagação quanto ao nível de compreensão da leitura, 42,3% afirmaram não compreender ou compreender parcialmente o que leem e 75% dos alunos não compreendem o que escrevem.