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5 ANÁLISE DO PROCESSO

5.1 FASE 1 UM OLHAR SOBRE ALGUNS DADOS

5.1.1 Primeira atividade com os licenciandos

O professor regente iniciou a disciplina (Figura 4) com uma atividade de “Júri simulado”, o objetivo de discutir o uso de tecnologias em sala de aula e, com isso, conhecer a opinião, o posicionamento e a criticidade desses licenciandos sobre a temática. Nessa análise analisamos um áudio (1: 15: 29h) de depoimento verbal dos licenciandos, produzido em 21/09/15 sobre a referida atividade.

Figura 4 – Observando a organização da turma para a realização do “Júri Simulado”

Fonte: Arquivo da pesquisadora, 2015

Esta primeira aula foi dividida em dois momentos. No primeiro, os licenciandos assistiram a dois vídeos curtos10: Um vídeo que defendia, e outro que repudiava o uso dos computadores na escola. A turma foi dividida em dois grupos: um para defesa e o outro para acusação do uso de tecnologias. Essa dinâmica foi planejada, uma vez que Behrens (2013, p. 82, grifo nosso) aponta que:

A formação inovadora exigida para atuação em todas as áreas do conhecimento demanda trabalho coletivo, discussão em grupo, espírito de entreajuda, cooperação, contribuição e parcerias para desenvolver esses processos, há necessidade de as universidades oferecerem uma prática pedagógica que propicie a conquista dessa nova proposição a partir da sala de aula.

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Disponibilizados para os licenciandos no Moodle. As formas do saber (1/4) – Pierre Levy. https://www.youtube.com/watch?v=WlmSTUMx9ws. (Pierre Levy: Filósofo Frances que defende a Cultura Virtual Contemporânea e neste vídeo defende o uso de tecnologias, cyber cultura, etc.) E uma entrevista com Waldemar Setzer para o programa Roda viva. https://www.youtube.com/watch?v=MEC0YsxzV3s. Ambos acessados em 12/08/2015. (Waldemar Setzer: Doutor em Matemática Aplicada e Prof. Titular no Depto. de Ciência da Computação do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (USP) e nesse vídeo defende o não uso de tecnologias devido ao excesso de exposição destas, a que as crianças estão sujeitas.)

Ao ter como foco uma discussão sobre a dicotomia entre o uso in/apropriado de tecnologias na educação, percebemos que na atividade os licenciandos manifestaram seus entendimentos acerca dessa temática até aquele momento, talvez até sugestionados pelos vídeos, independente da dinâmica. Então, selecionamos recortes que ilustraram algumas dessas ideias e tiveram representatividade para nós, diante desse contexto.

Nesta etapa, refletimos sobre ideias que integram as concepções desses futuros professores que pensam em inserir as tecnologias no processo educativo. Entre elas a ideia de que as tecnologias são recursos que facilitam a vida,

[...] porque imagine que você tenha que datilografar cada um dos livros que esteja na mão de cada um dos alunos. A tecnologia não é o que a ajuda a divulgar o conhecimento? Ao agilizar o processo de divulgação desse trabalho, desse conhecimento (LICENCIANDO DANILO11, AULA EM 21/09/2015) 12.

Diante disso, revisitamos a nossa prática pedagógica e percebemos as inúmeras vezes em que também utilizamos as tecnologias como recursos somente para automatizar tarefas, facilitando nossa vida. Entendemos que precisamos nos empoderar cada vez mais de distintas formas de ensinar, de maneira a efetivar realmente uma integração entre tecnologia, prática pedagógica e conhecimentos matemáticos em nossa docência na sala de aula da educação básica.

Concordamos com o entendimento do licenciando Danilo no que tange à questão da criatividade e da autonomia. Uma vez que, para esse licenciando, o estudante precisa ter outras fontes de aprendizagens que não seja somente o professor em sala de aula a lhe explicar.

[...] que ele tenha uma ampla gama onde ele pode buscar e que ele não se prender a aquilo que só o professor está ensinando aqui na frente [da sala de aula]. Se ele tem dúvida a respeito de mais alguma coisa, que contempla mais, ele pode tirar com o professor, mas ele vai poder falar e vai poder também ver no computador outras questões, outros questionamentos e isto estimula a criatividade. A criatividade é o

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Os nomes próprios (licenciandos e colégio) citados no texto são fictícios e intencionam preservar as identidades.

12 Os depoimentos foram registrados no texto com recuo de 4 cm e fonte 10, para destacar as falas e os diálogos entre os licenciandos.

que tem dominado o mundo hoje (LICENCIANDO DANILO, AULA EM 21/09/2015).

O acesso às informações se faz presente na vida de muitos estudantes da educação básica, porém a criatividade e a autonomia só se desenvolverão a partir do momento em que eles conseguirem imputar determinadas aplicabilidades às referidas informações, para resolver situações de seus cotidianos. Para Behrens (2013, p. 78), no ensino superior:

[...] espera-se que os docentes universitários possam contemplar dois polos em suas práticas pedagógicas: formar para a cidadania, como sujeito histórico e transformador da sociedade, e contribuir para a produção do conhecimento compatível com o desenvolvimento tecnológico contemporâneo.

Percebemos que, ao propiciar aos licenciandos acesso às TD em sala de aula com finalidade didático-pedagógica, assumimos a postura de um professor que deixou a sua zona de conforto, a qual envolvia somente ensinar, para se colocar em uma zona de risco ao utilizar tecnologias na Educação Matemática e aprender junto com estudantes universitários, buscando a construção de conhecimentos. Todavia, Moran (2013, p. 57) evidencia que:

Ensinar utilizando as tecnologias traz uma série de desafios cada vez mais complexos. De um lado, temos mais informação, variedade de materiais, canais, aplicativos, recursos. Essa variedade exige capacidade de escolha, avaliação e concentração. As tecnologias digitais, principalmente as redes sociais, podem nos ajudar ou nos atrapalhar. É muito fácil nos distrair, passear pelas telas, pelas imagens, sem que haja tempo para focar o essencial, para ler com atenção, para compreender em profundidade. O maior perigo de todos é navegar muito e conhecer pouco de verdade; distrair-nos muito e concentrar-nos pouco; saber um pouco de tudo e não compreender os fenômenos de verdade. Nunca tivemos tanta facilidade, mas elas podem complicar o processo, tanto em nível institucional quanto pessoal.

Então, ao refletir sobre a zona de risco, percebemos o quanto alguns professores ainda estão inseridos nela e isso dificulta o uso de tecnologias em sala de aula. Borba e Penteado (2012) apontam que muitos professores reconhecem que sua prática educativa, às vezes, pode não contribuir para a aprendizagem de seus educandos e até manifestam um desejo de mudança. Contudo, acabam permanecendo na zona de conforto reproduzindo atividades conhecidas, previsíveis e controladas.

A zona de risco relacionada ao uso de tecnologias pode ser desencadeada por fatores, como: falta de tempo para planejamento; problemas com laboratórios e computadores sucateados e até o receio de perguntas e questionamentos imprevisíveis por parte dos estudantes, que

podem demonstrar que o professor não domina o conteúdo ou as tecnologias utilizadas na aula (BORBA; PENTEADO, 2012). Os licenciandos Nilson e Cláudio expressam um pouco dessa ideia nos trechos a seguir.

Nilson: Em sua opinião, o maior risco das tentativas de aplicar em sala de aula o uso de recursos tecnológicos? (LICENCIANDO NILSON, AULA EM 21/09/2015). Claudio: “Acontece assim... Toda vez que você apresenta algo novo ou algo diferente pra alguém, levando em consideração que a minha formação vai ser em licenciatura, eu vou buscar ensinar pra crianças e pra crianças geralmente aquilo que você mostra, dependendo de como é mostrado, se não for de uma maneira correta, uma maneira certa, vai causar um estranhamento e vai causar uma repulsa, aquela criança vai ficar com medo. Ela não vai ficar assim pronta e toda vez que você quiser apresentar algo novo se alguma coisa der errado, ela não vai querer mais nada, ela vai sempre vai se recusar a seguir em frente”. (LICENCIANDO CLAUDIO, AULA EM 21/09/2015).

O professor não pode perder de vista que um dos focos da docência é o ato de ensinar conteúdos matemáticos, e isso requer estar sempre tentando e procurando novas metodologias e maneiras de favorecer o processo educativo. Portanto, frente às experiências não exitosas devemos prosseguir vivenciando outras situações de ensino, senão ficaremos presos em zonas de riscos, que nos impedirão de alcançar os nossos objetivos. Vale destacar que:

Ensino e educação são conceitos diferentes. No ensino, organiza-se uma série de atividades didáticas para ajudar os alunos a compreender áreas especificas de conhecimento (ciências, história, Matemática), na educação, o foco, além de ensinar, é ajudar a integrar ensino e vida, conhecimento e ética, reflexão e ação, a ter uma visão da totalidade. Educar é ajudar a integrar todas as dimensões da vida, a encontrar nosso caminho intelectual, emocional, profissional, que nos realize e que contribua para modificar a sociedade em que vivemos (MORAN, 2013, p. 21).

Portanto, a Educação, em particular a Educação Matemática, deve ser valorizada em todas as modalidades de ensino. Todavia, na licenciatura (Formação Inicial), os professores universitários precisam se valer de posturas críticas, práticas pedagógicas e metodologias de ensino que permitam aos licenciandos vivenciar e desenvolver suas potencialidades. Essas experiências na Formação Inicial habilitarão com mais propriedade esses estudantes para atuar como futuros professores no ensino fundamental e médio (BEHRENS, 2013).

Ao utilizar tecnologias coadunadas a metodologias objetivando o processo de ensino e aprendizagem de Matemática, pode ser que os professores consigam propiciar que alguns estudantes exerçam um papel diferenciado em relação à construção de conhecimento e resolução de situações que perpassem o seu cotidiano. Para o licenciando Danilo:

A tecnologia sim, ela aumenta a nossa produtividade, ela aumenta o nosso estimulo de vida, aumenta não só isso aumenta o nosso conhecimento, criatividade, faz com que nós sejamos pessoas melhores [...] (LICENCIANDO DANILO, AULA EM 21/09/2015).

Ou seja, para ele, a tecnologia é uma ferramenta que auxilia e transforma a vida das pessoas, desenvolvendo o conhecimento e a criatividade ao utilizá-la. Vale destacar que nem todos conseguem realizar esse processo, e muitos ainda subutilizam esse recurso tanto na escola quanto em suas vidas pessoais.

Percebemos ainda que o desafio de usar tecnologias digitais para o ensino de Matemática precisa ser superado tanto na Formação Inicial quanto no cotidiano de professores. Para isso, professores precisam inserir TD em sua rotina, usado-as em sala de aula de forma consciente, bem como explorar sua ludicidade, em determinados momentos. A seguir, a fala do Cláudio vem exemplificar essa ideia.

[...] o laboratório de informática é um lugar pra ela brincar, lugar pra ela poder se divertir ter uma coisa legalzinha, pra matar o tempo, sair da chatice da sala de aula, porque eles acham chato mesmo. Então, é necessário certo cuidado com relação a isso, pra não querer fazer algo novo e acabar retrocedendo e impedindo novas, novas descobertas, novos meios de se trabalhar (LICENCIANDO CLAUDIO, AULA EM 21/09/2015).

Complementando essa ideia, Moran (2013, p. 53) diz que “é importante educar para usos democráticos, mais progressistas e participativos das tecnologias, que facilitem a evolução dos indivíduos”. Diante disso, entendemos que o uso didático-pedagógico de TD é um tema que precisa ser bem discutido e explorado em sala de aula das licenciaturas em Matemática. É preciso propiciar que esses futuros professores vivenciem experiências com tecnologias para o ensino de Matemática (CIBOTTO, 2015).

Outro elemento que faz parte do mundo digital e foi mencionado nessa atividade foi a “Não confiabilidade” de alguns conteúdos na internet, ou seja, a preocupação com o acesso de informações de forma equivocada sobre conteúdos ou conceitos matemáticos por estudantes de educação básica. Este é um fator preocupante para os licenciandos. Para eles,

A confiabilidade dos conteúdos, apesar dos filtros em alguns sites, nem todos tem esse filtro. Em... alguns eu posso postar na internet e aluno na sala de aula. O professor não vai... acompanhar ele, porque não dá conta de acompanhar numa sala cheia, pra ver o quê que ele tá pesquisando, qual a confiabilidade do site, se tem ou

não. E ele, o aluno pode realizar uma pesquisa que não é uma pesquisa verdadeira e adquirir um conhecimento que não é o conhecimento correto e que é necessário para o ensino (LICENCIANDO IAGO, AULA EM 21/09/2015).

Portanto, ao planejar aulas com tecnologias digitais, professores de Matemática devem ter condição de orientar seus educandos em relação ao acesso a sites confiáveis, no que tange a conteúdos de Matemática. Dessa forma poderão propiciar a eles oportunidade de construir conhecimentos por meio do uso de tecnologias. Serrazina (2012, p. 268), aponta que:

Quando se fala em conhecimento do professor há acordo quanto ao ser indispensável saber os conteúdos matemáticos que têm de ensinar. No entanto, este conhecimento não é suficiente, para além de conhecer os conteúdos a ensinar, é também necessário ao professor saber como ensiná-los.

Diante disso, entendemos que a formação do professor de Matemática interfere diretamente no uso de tecnologias na educação. Porém, existem outros elementos que perpassam tal uso, tais como: a curiosidade, criatividade, criticidade, interesse pelas tecnologias, entre outras. Por isso, um planejamento que contemple essas questões poderá minimizar a zona de risco ao se utilizar TD, e também favorecer que o professor procure formas distintas de propiciar construção de conhecimentos matemáticos aos seus aprendizes.

Essas ideias, inicialmente discutidas com os licenciandos, nos possibilitaram refletir sobre as nossas próprias concepções a respeito do uso de TD. Assim, baseados nelas, tentamos nos orientar adotando uma postura mais investigativa, pesquisadora, crítica e criativa para produzir conhecimentos com as tecnologias na sala de aula da licenciatura (BORBA; SILVA; GADANIDIS, 2014).