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3. A CAUTELARIDADE NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

4.5 PRISÃO PREVENTIVA

4.5.6 Prisão domiciliar

A Lei 12.403/11 passou a prever no Código de Processo Penal, como medida a ser adotada antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, a prisão domiciliar.

Tal medida não foi prevista de forma inédita no sistema processual, uma vez que já constava na Lei de Execuções Penais ( n. 7.210/84). Todavia, a prisão domiciliar do Código de Processo Penal difere da prisão domiciliar da Lei de Execução Penal não apenas pelo momento processual em que ambas podem ser determinadas.

O art. 117 da Lei de Execução Penal, em suma, possibilita a prisão em residência particular (prisão domiciliar) quando o apenado estiver em regime aberto e, concomitantemente, enquadrar-se em uma das seguintes condições, previstas no mesmo dispositivo legal: “I - condenado maior de 70 (setenta) anos; II - condenado acometido de doença grave; III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; e IV - condenada gestante.”263

261 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 560-561.

262 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 561.

263 BRASIL. Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7210.htm>. Acesso em: 07 de março de 2013.

Já, a Lei 12.403/11, inseriu a prisão domiciliar no Código de Processo Penal com os seguintes contornos: “art. 317 - a prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.”264

E, ainda, o art. 318 do Código de Processo Penal passou a prever que ao imputado que estiver em uma das seguintes condições poderá ser imposta prisão domiciliar: “I - maior de 80 (oitenta) anos; II - extremamente debilitado por motivo de doença grave; III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; IV - gestante a partir do 7o (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto

risco.”265

Questão que salta aos olhos, decorrente da simples leitura e comparação dos arts. 117 da Lei de Execução Penal e 318 do Código de Processo Penal, é que as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar cautelar são mais fechadas, excepcionais, que aquelas presentes no art. 117, o que equivale a dizer que aquele que já recebeu condenação definitiva (e restou beneficiado com o regime aberto) possui maiores chances de ter concedida a prisão domiciliar do que aquele que ainda conserva o estado de inocência, o que no mínimo viola o princípio da proporcionalidade.

Não obstante, a Exposição de Motivos n. 00022 do Ministério da Justiça, de 25 de janeiro de 2001, que deu azo à Lei 12.403/11, visou conferir proporcionalidade entre as prisões domiciliares processual e penal, uma vez que estabeleceu que a nova prisão domiciliar, poderia ser determinada, em linhas gerais, nas hipóteses que autorizam a prisão- albergue no regime aberto (art. 117 da Lei 7.210/84 – de Execuções Penais). Todavia, conforme delineado acima, não foi bem isso que restou aprovado.

Poder-se-ia pensar que o art. 317 do Código de Processo Penal estabelece a prisão domiciliar como medida autônoma, não circunscrita às condições do art. 318 do mesmo código. Entretanto, parece mais adequado o entendimento no sentido de a medida ser cabível

264 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade

provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

265 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade

provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

apenas em substituição à prisão preventiva, ou seja, alinhada às hipóteses excepcionais do art. 318 do Código de Processo Penal.266

Porque a prisão domiciliar representa restrição total da liberdade, não se pode alargar a aplicação do instituto. Assim, a prisão domiciliar, ao que parece, não pode ser determinada de forma autônoma, diante de qualquer situação, mas sim, em substituição à prisão preventiva, sempre que o imputado se enquadrar em uma das situações trazidas entre os incs. I e IV do art. 318 do Código de Processo Penal.

Inclusive a Exposição de Motivos do Senado Federal n. 00022 do Ministério da Justiça, de 25 de janeiro de 2001, não deixa dúvidas sobre a interpretação restritiva que deve ser conferida à prisão domiciliar processual, de forma que resta possível apenas em substituição à prisão preventiva, nas hipóteses taxativamente previstas em lei. Neste sentido, vejamos nos exatos termos da Exposição de Motivos:

[...] Sobre a prisão preventiva, abre-se a possibilidade de o juiz substituí-la por prisão domiciliar em situações bem restritas, indicadoras da inconveniência e da desnecessidade de se manter o recolhimento em cárcere.267

A prisão domiciliar constitui forma humanitária de cumprimento da prisão preventiva, adstrita às condições do art. 318 do Código de Processo Penal, bem como à existência dos requisitos e pressupostos da prisão preventiva.268

Quando decide impor a prisão domiciliar, o magistrado deve estar convencido da existência das condições que autorizam a prisão preventiva, haja vista que não seria o caso de aplicar qualquer das medidas cautelares descarcerizadoras dos arts. 319 e 320 do Código de Processo Penal. Assim, porque o legislador quis abrandar a forma de cumprimento da prisão

266 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar – A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p.101.

267 BRASIL. Projeto de Lei n. 4.208, de 2001. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal – relativos à prisão, medidas cautelares e liberdade, e dá outras providências. Disponível em:

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=D8775D42AA8160090A C2982AF3897030.node2?codteor=773516&filename=Tramitacao-PL+4208/2001>. Acesso em: 05 de março de 2013.

268 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade

provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

preventiva em algumas situações, ou seja, naquelas elencadas no art. 318 do Código de Processo Penal, é que o juiz pode decidir por impor a prisão domiciliar.269

Nessa linha, Marques da Silva e Freitas sustentam que a prisão domiciliar cautelar é restrita às hipóteses trazidas pelo legislador no art. 318, não podendo tal rol ser ampliado, sob pena de desnaturar-se o instituto. Complementam ainda que, se o magistrado entender que em outros casos, não previstos, caberia a prisão domiciliar, melhor que estabeleça a liberdade provisória, com a imposição de uma ou mais cautelares diversas da prisão.270

No mesmo norte, preleciona Pacelli de Oliveira:

A prisão domiciliar, portanto, não se inclui como alternativa à prisão preventiva, tal como ocorre com as medidas previstas no art. 319. Ela somente será aplicada como substitutivo da prisão preventiva e desde que estejam presentes algumas das hipóteses arroladas no art. 318, CPP.271

Cumpre registrar, de outra banda, que se o magistrado estiver diante de uma das situações trazidas pelo art. 318 do Código de Processo Penal, não estará obrigado a determinar a prisão domiciliar. Igualmente, caso determine a medida, havendo descumprimento da mesma, pode o magistrado determinar a prisão preventiva, já que a providência mais tênue se mostrou insuficiente no acautelamento do processo, em uma interpretação condizente com o que dispõe o parágrafo único do art. 312 do Código de Processo Penal, a saber: “Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o).”272

Sobre a faculdade de o juiz substituir a prisão preventiva por prisão domiciliar quando estiver diante de uma das hipóteses trazidas pelo art. 318 do Código de Processo Penal, cumpre citar a reflexão de Marques da Silva e Freitas:

269 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade

provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

270 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 508.

271 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 561.

272 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade

provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

Suponha uma pessoa presa em flagrante, cuja situação pessoal se insere em uma das referidas no dispositivo a ser estudado, a qual, comprovadamente, é líder de organização criminosa, ou conhecido estuprador, ou transportava quantidade expressiva de drogas etc.; teria direito ao benefício da prisão domiciliar substitutiva? O instituto da prisão domiciliar se constitui em uma faculdade judicial, e, por conseguinte, o juiz deverá analisar o caso concreto para concessão do benefício. A ordem pública restará fortemente prejudicada com a liberdade de pessoa que ostente semelhantes condições pessoais.273 De outro lado, no caso de o imputado apresentar grave doença, e demonstrar extrema debilidade, parece necessário que o juiz conceda a prisão domiciliar, porque, conforme pontuam Marques da Silva e Freitas: “[...] como o Estado não pode lhe dar um tratamento compatível, analisado detidamente o caso, é de se conceder o benefício em tela.”274