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Capítulo III – Problemas e Dificuldades de Tradução

1. Problemas de sintaxe

Nesta secção, serão apresentados os problemas e dificuldades relativos à sintaxe. A sintaxe refere-se à parte da gramática que estuda a forma como as palavras se combinam para formar unidades maiores, sendo a frase a unidade máxima de análise sintática. Ao longo desta secção, iremos apresentar problemas relacionados com o artigo, as orações relativas, a ordem dos elementos na frase, a construção ativa e passiva, os clíticos e o sujeito nulo e o sujeito realizado, sendo estes aspetos que se revelaram importantes em termos das diferenças que se verificaram entre as línguas de trabalho.

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1.1 – O Artigo

Segundo Cunha e Cintra (1984), dá-se o nome de artigo às palavras que se antepõem aos nomes e que indicam se se trata de uma entidade já conhecida do leitor ou ouvinte ou se se trata de uma entidade da qual ele ainda não possui conhecimentos. Os artigos definidos determinam o nome de um modo preciso e individual, enquanto, por outro lado, os artigos indefinidos determinam os nomes de um modo impreciso, geral ou vago. Por sua vez, Brito (2003) define as propriedades para os artigos definidos e indefinidos:

Os artigos definidos não podem surgir isolados, quer por elipse do nome quer por movimento do nome e do complemento (ao contrário dos indefinidos e de outras formas de quantificação).

A autora acrescenta ainda:

Mas as formas o, a, os, as podem ocorrer em construções de elipse nominal se forem seguidos de um complemento, um modificador adjetival ou uma oração relativa.

Por sua vez, os artigos indefinidos “não podem preceder os nomes próprios” e “nunca

podem seguir” as palavras “todos” ou “ambos”.

Na língua portuguesa, os artigos podem variar em género e em número, concordando obrigatoriamente com o nome ao qual estão associados. Os artigos definidos têm as formas: “o”, “a”, “os”, “as”. Os artigos indefinidos têm as formas: “um”, “uma”, “uns”, “umas”.

Na língua inglesa, os artigos não exibem distinção de género e número. O artigo definido tem a forma “the”, enquanto os artigos indefinidos correspondem a “a” e “an”. Segundo Huddleston e Pullum (2012), o artigo definido é utilizado, tipicamente, “as

determiner in NP structure with the sole meaning of indicating that the head is sufficient in the context to identify the referent”. Já os artigos indefinidos são

“prototypically used as determiner in count singular NPs indicating that the content is

not sufficient to identify a specific referent”. Existem algumas regras em relação ao uso

do artigo definido e indefinido em inglês, apontadas por Coe, Harrison e Paterson (2007). O artigo indefinido é sempre utilizado para se referir a profissões. Já o artigo

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definido é utilizado com nomes de instrumentos musicais, rios, mares, cordilheiras de montanhas e nações formadas por estados. O artigo definido não é, geralmente, utilizado com nomes. Existem, contudo, algumas exceções, tais como nomes de jornais e revistas, edifícios e obras de arte emblemáticas, organizações, hotéis e restaurantes, entre outros.

A tradução destas palavras não traz ao tradutor, na generalidade, grandes dificuldades ou problemas de tradução. A dificuldade aparece quando o tradutor está perante uma língua que não possui estes elementos. Contudo, esse não é o caso do inglês. Excetuando casos particulares, o artigo definido e o indefinido são traduzidos em conformidade com os seus equivalentes na língua alvo.

Veremos, nos exemplos abaixo, algumas frases onde podemos ver, maioritariamente, a transferência do artigo definido e indefinido para a tradução. Isto é, quando no original em inglês está presente, por exemplo, um artigo definido este é, geralmente, traduzido para o artigo definido correspondente em português.

O primeiro grupo de exemplos que apresentamos ilustra a situação em que, na tradução do inglês para o português, se torna necessária a adição de um artigo a preceder os nomes.

1. (a) Realtime Raises $100M, Opens Office In Santa Monica

(b) A Realtime obtém 100 milhões de dólares e abre um escritório em Santa Mónica

(Texto nº 8)

2. (a) Systems (be it a browser or a client/server/mobile application) can subscribe to channels or publish to them.

(b) Os sistemas (sejam eles um browser ou uma aplicação do cliente, do servidor ou aplicação móvel) podem subscrever os canais ou publicá-los.

(Texto nº 2)

3. (a) Users need to feel the information they are sending or receiving is secure. (b) Os utilizadores precisam de sentir que a informação que enviam ou recebem está segura.

(Texto nº 2)

4. (a) Fresh new downloads for you, just take a pick and start developing in realtime with xRTML.

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(b) Downloads novinhos em folha para si. Dê uma olhadela e comece a desenvolver em tempo-real com o xRTML.

(Texto nº 17)

Estes primeiros quatro exemplos mostram uma diferença relativamente ao uso dos artigos no inglês e no português. Em português, o uso do artigo nem sempre é obrigatório. Por exemplo, antes dos nomes de certas localidades, países ou cidades e antes de nomes de pessoas (conhecidas do público), pode não ocorrer o artigo. Existem, no entanto, vários contextos que obrigam à ocorrência de artigos. Com efeito, em português, a ocorrência de artigos está relacionada com operações de determinação, sendo frequentemente os artigos necessários para a construção de expressões com determinados valores referenciais. Por exemplo, as expressões nominais que correspondem a “descrições definidas” integram necessariamente um determinante, muitas vezes correspondente a um artigo. A presença do artigo é também importante por permitir “operações de individuação”, fazendo corresponder uma determinada expressão a um objeto concreto (Duarte e Oliveira, 2003). Nos exemplos 1 a 4, podemos ver a obrigatoriedade de uso dos artigos em português, que contrasta com o que se verifica em inglês.

Em 1 e 4, “a Realtime” e “o xRTML”, temos o artigo em português a preceder nomes próprios, a contrastar com a sua ausência em inglês. Como podemos ver em Cunha e Cintra (1984), “sendo por definição individualizante, o nome próprio deveria

dispensar o artigo. Mas no curso da história da língua, razões diversas ocorreram para que esta norma lógica nem sempre fosse observada e, hoje, há mesmo grande número de nomes próprios que exigem obrigatoriamente o acompanhamento do artigo definido”. Uma das razões dadas por Cunha e Cintra é a de o nome próprio poder ser

originalmente um nome comum. “xRTML” segue esta norma, razão pela qual foi acrescentado um artigo.

Em relação ao artigo indefinido, no exemplo 1 (“um escritório”), a sua utilização antes de um nome comum “serve principalmente para a apresentação de um ser ou de

um objecto ainda não conhecido do ouvinte ou do leitor” (Cunha e Cintra, 1984). É este o caso que podemos evidenciar neste exemplo. Nos exemplos 2 e 3, “os sistemas” e “os utilizadores”, segue-se a regra geral de utilização de um artigo antes de um nome

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comum, com a intenção de determiná-lo, “para apresentá-lo isolado dos outros

indivíduos ou objectos da espécie” (Cunha e Cintra, 1984).

No caso da língua inglesa, existe uma tendência para a não ocorrência de artigos antes de um nome próprio não qualificado por um adjetivo, caso evidenciado no exemplo 1 e 4, “Realtimes raises…” e “…with xRTML”. Também é comum, nesta língua, omitir o artigo sempre que este ocorre antes de nomes comuns no plural que são utilizados em sentido geral. Este é o caso de “systems” e “users”, nos exemplos 2 e 3.

Nos exemplos que apresentamos em seguida, ocorrem, no texto de partida, nomes precedidos de um determinante, que é mantido na língua de chegada, embora com adaptações que resultam de diferenças entre as línguas.

5. (a) Imagine this, you're browsing an online store like you're in an actual physical store. You have a question about an item or a specific purchase you can then get instant customer support, promotions on an article you're browsing, share your purchase with your friends at the same time you're viewing it. It makes shopping online a whole new experience.

(b) Imagine que está a navegar numa loja online como se estivesse numa loja verdadeira. Tem uma questão sobre uma peça ou sobre uma compra específica. Com a tecnologia Realtime® poderá receber apoio imediato ao cliente, promoções num artigo que esteja a pesquisar, partilhar a sua compra com os seus amigos ao mesmo tempo que a vê. A Realtime®Web torna as compras online numa experiência completamente nova.

(Texto nº 1)

6. (a) Económico Social was created to be much more than an online platform that aggregates the contents of Diário Económico and Económico TV

(b) O Económico Social foi criado com o intuito de ser muito mais que uma plataforma online que junta os conteúdos do Diário Económico e do Económico TV.

(Texto nº 9)

7. (a) One cannot know what a man really is by the end of a fortnight.

(b) Não se pode conhecer verdadeiramente um homem ao fim de uma quinzena. (Texto nº 22)

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Nos exemplos acima, 5 a 7, podemos ver algumas frases em que é utilizado o artigo indefinido. Este, em inglês “a” e “an”, é traduzido para português como “um”, “uma”, “uns”, “umas”, dependendo do nome que o segue. Como dito anteriormente, a língua inglesa não faz distinção, no artigo, do género e do número, contrariamente ao que acontece em português. Assim, o tradutor tem de utilizar os artigos em concordância com o nome que os segue. Podemos, pois, ver nos exemplos acima que essa variação foi levada em conta e passada para a tradução. Por exemplo “a question”, foi traduzido para “uma questão”, utilizando-se a forma feminina do artigo para concordar com o nome feminino “questão”. Também em “a man”, traduzido para “um homem”, o artigo indefinido “um” concorda com o nome masculino “homem”. Outro aspeto que podemos ver nos exemplos acima é a contração da preposição “em” com o artigo indefinido “um”, resultando nas formas “num”, “numa”, “nuns”, “numas”. Em 5, podemos ver alguns exemplos destas formas contraídas. “Navegar numa loja online” e “promoções num artigo”, por exemplo, ilustram este caso.

Finalmente, os exemplos 8 a 11 ilustram frases em que é utilizado o artigo definido, tanto no texto de partida como no texto de chegada.

8. (a) You browse the web a lot and you're probably used to the refresh button by now. Well with real-time technology that simple action becomes obsolete, that and so much more.

(b) Como navega muito na internet, está, provavelmente, habituado ao botão atualizar. Com a tecnologia real-time essa simples ação torna-se obsoleta. Essa e muitas mais.

(Texto nº 1)

9. (a) Wait for the Realtime® icon to turn green, which means there's an active Realtime® connection, and you are ready to test the demo.

(b) Espere que o ícone Realtime® fique verde, o que significa que existe uma ligação Realtime® ativa, e estará pronto para testar a demo.

(Texto nº 7)

10. (a) For a better understanding, we recommend that, if available, you watch the videos first and experiment the demos afterwards.

(b) Para compreender melhor recomendamos que, caso esteja disponível, veja primeiro os vídeos e só depois experimente as demos.

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11. (a) However little known the feelings or views of such a man may be on his first entering a neighbourhood, this truth is so well fixed in the minds of the surrounding families, that he is considered the rightful property of some one or other of their daughters.

(b) Contudo, por pouco que se saiba sobre os sentimentos e opiniões de tal homem ao entrar pela primeira vez numa vizinhança, esta verdade firma-se de tal modo no entendimento das famílias circundantes, que ele é considerado propriedade legítima das filhas de este ou daquele.

(Texto nº 22)

Como dito anteriormente, o artigo definido apresenta diversas formas, em português, dependendo do género e do número. Assim, a forma única inglesa do artigo “the” pode ser traduzida para “o”, “a”, “os”, “as”, dependendo do género e do número do nome que segue o artigo. Como podemos ver em “the Realtime® icon”, traduzido para “o ícone Realtime®”, ícone é um nome comum masculino, razão pela qual deve ser precedido pelo artigo “o”, também masculino e singular. A expressão “the feelings”, cuja tradução é “os sentimentos”, tem de incluir um artigo no plural, evidenciado em inglês pela presença da marca de plural em “feelings”. Uma vez que “sentimentos” é masculino, o artigo terá, igualmente, de ser masculino. No exemplo 8 e 11, ocorrem também dois exemplos de formas resultantes da contração de uma preposição com o artigo definido. Como podemos ver em “habituado ao botão” e “entendimento das famílias”, a preposição “a” e “de” está contraída com o artigo definido, dando origem, respetivamente, às formas “ao” e “das”.