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3.6 Espiritualidade como recurso para o enfrentamento

3.6.6 Problemas de estratégias espirituais

“Pequenos deuses” podem ser severos, incapazes de oferecer piedade e compaixão; amorosos, que não podem ser conciliados com a dor e o sofrimento; distantes, que deixam o individuo à deriva em momentos de maior necessidade ou fortalezas, cujo apoio e proteção abrangem somente aqueles que vivem dentro das fronteiras particulares dos muros religiosos. Vícios e compulsões podem ser entendidos, pelo menos em parte, como tipo de problema espiritual, o problema dos falsos deuses. Drogas, álcool, sexo, raiva, ansiedade, aspectos físicos, objetos, dinheiro, pessoas, fama, poder, relacionamentos e assim por diante. Quase tudo pode se tornar um objeto de adoração. “Falsos deuses são incapazes da realização do sagrado” (PARGAMENT, 2007, p. 281). As pessoas se aproximam deles como ídolos, confundindo os símbolos do divino com o divino em si. Em muitos casos, as pessoas desconhecem a força que são, de fato, norteadoras de suas vidas. Sob essas condições, no entanto, os terapeutas podem motivar os clientes a mudar, destacando a natureza dos deuses que eles parecem estar adorando.

Como os clientes podem não estar cientes de seus falsos deuses eles podem não ter consciência de seus pensamentos e sentimentos conflitantes sobre o sagrado. Trazer para normalidade conflitos sagrados internos é uma forma de legitimar lutas espirituais, bem como fornecer ilustrações de figuras exemplares da tradição dos clientes que também lutaram, como Jesus, Buda, Moisés ou Maomé. Há a necessidade do terapeuta abordar os medos em potencial de seus clientes, confrontando-os com seus pensamentos.

A relação de colaboração com o clero simpático também podem desempenhar um papel importante para dissipar temores da crítica religiosa para o

cliente. Os clientes também podem ser encorajados a tolerar um nível de conflito sagrado interno. Há existência de problemas nos caminhos trilhados pelos clientes em busca ao sagrado é fato. As dificuldades mais comuns nesta área são: os problemas de amplitude e profundidade, problemas de continuidade e mudança, e os problemas de ajuste.

Indivíduos que cresceram dentro de uma tradição religiosa, na maioria das vezes, podem através de uma forma seletiva abstrair crenças e práticas particulares da tradição, com base na sua educação religiosa ou nas suas necessidades e preferências pessoais. Esse processo pode deixá-los com formas incompletas, distorcidas ou desequilibradas de espiritualidade. Baseando-se nos diversos caminhos que definem cada tradição religiosa, os terapeutas podem ajudar os clientes a ampliar e equilíbrar suas abordagens à espiritualidade.

Profundidade, bem como a amplitude são pré requisitos para a integração espiritual. O terapeuta pode ajudar os clientes no desenvolvimento de maior abertura e intimidade nas suas comunicações com Deus, e em seguida, ajudá-los a aprofundar as relações com figuras em sua rede social. Como o ritual, a oração pode tornar-se pró forma para muitas pessoas, composta de recitações que mantêm pouca ligação com o mais profundo sentimento do cliente ou da relação com o sagrado. O desafio nesses casos é estimular uma mudança num monólogo espiritual para um diálogo espiritual, que é uma mudança não só para falar com Deus, mas também para imaginar e esperar a resposta de Deus. O terapeuta pode ajudar os clientes a desenvolver uma perspectiva espiritual mais profunda e diferenciada que aumente sua capacidade de lidar com os desafios da vida a definir sua relação com o com o divino. Mas, estes métodos serão eficazes apenas com clientes que têm algum grau de flexibilidade espiritual. Nem todos os clientes podem realizá-lo. Nestes casos, o terapeuta, talvez necessite ter uma postura mais desafiadora (PARGAMENT, 2008, p. 298).

"Inflexibilidade Espiritual" refere-se à uma falta de vontade de mudança que se baseia em razões espirituais. O problema não é inabilidade para mudar, é uma falta de vontade de mudar. A inflexibilidade espiritual manifesta-se através da intolerância às ambiguidades, às diferenças ou novidade. A rigidez espiritual faz com que as pessoas se tornem vulneráveis às mudanças internas e externas que são parte do curso normal de desenvolvimento (PARGAMENT, 1997).

O medo está na raiz da inflexibilidade espiritual. É medo da incerteza, confusão e desorientação. Esquemas espirituais rígidos oferecem uma resposta a esses temores. Eles fornecem às pessoas um significado e sentido num mundo confuso, sujeito a transformações e preenchido com pessoas e estilos diversos de vida. Este esquema espiritual rígido pode proteger as pessoas da ansiedade, provocada por decisões difíceis da vida, o medo do abandono e isolamento social, a experiência de emoções intensamente dolorosas. A inflexibilidade espiritual serve a um propósito espiritual importante. Pensando nisso como uma forma extrema de preservar e proteger o sagrado, como expressão da tendência humana natural de manter o que mais importa. A idéia de mudança espiritual traz consigo a possibilidade de perda profunda (PARGAMENT, 2008, p. 300). É importante assegurar aos clientes que as discussões sobre as mudanças não visam tornar seu mundo um caos, mas sim, permitir a eles responder de modo efetivo às reviravoltas que fazem parte da vida de qualquer um.

O terapeuta pode também incentivar o pensamento crítico espiritual para reduzir a inflexibilidade. Grande parte do aprendizado religioso vem através dos pais, do clero ou educadores religiosos. No entanto, se as pessoas estão dispostas a alcançar suas próprias conclusões sobre questões de fé e crença, elas devem ficar face a face com a literatura sagrada.

O terapeuta precisa assegurar ao cliente que apesar das insistentes mudanças da vida, algumas coisas permanecem, mesmo em meio à transformação: o sagrado continuará constante. “O desafio para os terapeutas de todas as perspectivas, é encontrar um meio de confrontar seus clientes de forma que respeitem a autonomia e responsabilidade final para suas próprias vidas” (PARGAMENT, 2008, p. 303).

Outra maneira de desafiar a rigidez espiritual é o uso do humor, no seu melhor, ajuda as pessoas a reconhecer que há muitas maneiras de olhar para si mesmos, criando possibilidades de mudança em situações aparentemente insolúveis, inclusive espiritual. Porém, conflitos espirituais devem ser abordados de frente quando os clientes rejeitam a tentativa do terapeuta em mudar o foco do tema espiritual, quando a questão espiritual ressurge depois que outras questões foram resolvidas, quando o conflito espiritual é considerado uma preocupação significativa em si, e quando o conflito espiritual tem de ser enfrentado antes que outros problemas possam ser resolvidos.

Parte do poder da espiritualidade reside na sua diversidade. No domínio espiritual, as pessoas podem encontrar os recursos para ajudá-las a lidar com uma ampla gama de situações e contextos. Os problemas surgem, porém, quando as pessoas falham em aplicar os seus recursos espirituais criteriosamente. Nesses casos, o terapeuta pode tentar incentivar um maior discernimento por parte do seu cliente. Na construção de discernimento espiritual, o terapeuta não desafia qualquer crença particular ou prática do cliente ele, o desafio é desapropriar a crença ou prática da situação ou contexto.

Psicoterapia espiritualmente integrada traz um tema muitas vezes negligenciado, o sagrado, para o primeiro plano da conversação clínica. Neste diálogo, a espiritualidade pode surgir como um recurso não explorado, porém vital para a mudança. Por outro lado, a espiritualidade pode ser revelada como um problema significativo em si mesma. Não há garantia de que a espiritualidade do indivíduo permanecerá inalterada na psicoterapia.