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A pesquisa de mestrado abordou o turismo sob a perspectiva das relações de poder, da rede de mecanismos e relações implicados na produção de um destino turístico. Embora tome, como ponto de partida, o turismo desenvolvido em uma localidade, a partir dos princípios difundidos pelo Ministério do Turismo, este trabalho não aborda a perspectiva econômica ligada ao turismo.

Ainda que, no Brasil, as pesquisas realizadas em torno do tema “turismo” ainda sejam em pequeno número5, as críticas caracterizado-o como indústria para o desenvolvimento não são recentes no cenário internacional. Em meados do século XX, antropologia, sociologia, geografia6 apontavam os limites do turismo em sua perspectiva economicista. Indicavam, também, a quantidade de impactos que o turismo pode ocasionar na localidade receptora, seja no tocante à relação produtores turísticos/população local ou ainda àqueles desencadeados pelo encontro entre visitantes e visitados. Em muitos casos, diferente do que afirmam as teorias econômicas e os programas de governo, os resultados nem sempre trazem benefícios sociais7.

5 No Brasil, o turismo internacional de grandes proporções é um fenômeno novo. É, principalmente a partir da década de 1950, que ele vai ter grande repercussão no país (BARRETTO, 2006). Consequentemente, os estudos desenvolvidos sobre ele serão escassos. Mas o boom do processo de estruturação da prática turística em território nacional acontece mesmo na década de 1990, quando o Governo Federal investe em qualificação da mão-de-obra, dos destinos turísticos etc. (REJOWSKI, 2001). Nesta década, aumentam os cursos de graduação e pós-graduação voltados ao turismo em específico. Banducci Jr. (2001, p. 30) ressalta que as pesquisas sobre o turismo no Brasil são bastante escassas, excetuando-se a área específica do planejamento.

6 Embora o turismo tenha grande importância no mercado mundial é somente por volta da década de 1960 que antropologia e sociologia tomam-no como objeto de trabalho. Já a geografia especificamente realiza incursões sobre a temática desde muito cedo. A expressão “geografia do turismo” de acordo com Banducci Jr. (2001, p. 24) foi cunhada em 1905. Muito embora seja somente na década de 1960 que o tema na geografia ganhará destaque.

7 Textos como aqueles elaborados por De Kadt (1979) e Krippendorf (2009) trazem estudos sob perspectivas antropológicas e sociológicas que abordam os diversos lados do desenvolvimento do turismo em países de capital periférico. Destacam que criação de empregos e entrada de divisas não implicam necessariamente qualidade de vida. Em muitos casos a localidades receptoras, comunidades autóctones têm uma participação muito pequena nos lucros e no entanto, ficam com todo o ônus quando da emergência dos problemas resultantes do desenvolvimento turístico.

A perspectiva crítica de análise do turismo relaciona-o a um

fenômeno social, de grandes proporções, decorrentes do

desenvolvimento tecnológico e industrial das sociedades ocidentais modernas. Em geral, estudam-no sob diversos olhares e não o restringem às cifras numéricas que ele pode gerar8. Baseiam seus resultados não só em teorias e expectativas, mas em análises concretas, em estudos feitos sobre as localidades em que o turismo se desenvolveu. É importante, no entanto, mencionar que operar a perspectiva crítica de análise do turismo não significa reduzi-lo a uma atividade negativa em essência. Tal perspectiva desvia-se do debate maniqueísta sobre a atividade, que situa o turismo como algo bom ou ruim, tendência geral do debate na década de 1960 (BANDUCCI JR., 2001, p. 32), para pensá-lo dependente de diversos fatores condicionantes. É nesse percurso que a presente pesquisa de mestrado veio se inscrever.

Especificamente para o desenvolvimento da presente dissertação, o referencial teórico-metodológico esteve amparado pelos estudos realizados por Michel Foucault. No entanto, para além das questões levantadas por Foucault, como aquelas que envolvem noções como território e espaço social9, o olhar metodológico teve por orientação as pesquisas cartográficas realizadas na Argentina por Briones et al (2008). Em Cartografias Indígenas: políticas indigenistas y formaciones provinciales de alteridad, Briones et al (2008) trabalham o método cartográfico para efetuar o mapa das lutas em torno das questões de cidadania para populações originais.

De uma perspectiva política e social, as cartografias traçadas são inspiradas nos trabalhos de Lawrence Groosberg e efetuam uma crítica às políticas modernas de territorialização. Por três vias, Briones et al (2008) traçam geografias de inclusão e exclusão. Para os autores, as cartografias tratam de identificar sistemas de individualização e pertença dos indivíduos por meio de maquinarias, sejam elas: estratificadoras, diferenciadoras, territorializadoras. As maquinarias estratificadoras dão acesso a certo de tipo de conhecimento do mundo e de si mesmo. Elas produzem uma subjetividade de valor universal. As maquinarias diferenciadoras estão vinculadas a regimes de verdade

8 Em Luchiari (2000) estudar o turismo sob a perspectiva econômica é demasiado genérico. Em Rejowski & Barretto (2001) abordar o turismo exclusivamente pela esfera econômica é colocar ele mais distante do domínio de estudos das ciências sociais.

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Acerca das noções de espaço e território, de acordo com Michel Foucault, assim como as noções de ruptura, descontinuidade, enunciado entre outras trabalhadas nos próximos capítulos desta dissertação, maiores esclarecimentos estão disponíveis na sessão Glossário de Termos Foucaultianos no Anexo A.

“responsables de la producción de sistemas de diferencia social e identidades - en nuestro caso, sistemas de categorización social” (p. 18). As maquinarias territorializadoras resultam de regimes de poder e implicam sistemas de circulação entre lugares10. De acordo com Briones (2008):

Alredededor de estos puntos – sustiene Grossberg – los sujetos articulan sus próprios mapas de significado, deseo e placer, aunque siempre condicionados por la movilidad estructurada que resulta de estructuras ya existentes de circulación y acceso diferencial a un determinado conjunto de prácticas históricas y politicamente articuladas (BRIONES, 2008, p. 19).

Deslocada de um interesse econômico, a presente pesquisa de mestrado esteve centrada no turismo como uma produção histórico- geopolítica, atravessada por Políticas Públicas. Esteve direcionada a mapear as relações e mecanismos de poder existentes na constituição de um destino turístico; demarcar os espaços de circulação das práticas turísticas; identificar quais os discursos disseminados sobre o turismo, a fim de observar quais práticas são produzidas em Urubici, e quais turistas estão sendo demandados para o município. Deslocado de sua perspectiva econômica, o que se pretende é observar a realidade turística que é produzida por relações de saber-poder, a partir de investimentos políticos de caráter nacional.