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A PRODUÇÃO DOS PONTOS TURÍSTICOS

Os esportes radicais emergem como objeto no campo discursivo sobre o turismo urubiciense, são práticas que sempre existiram na cidade, mas que, com o passar dos anos, tornam-se o grande atrativo turístico em Urubici. Eles emergem em um campo específico de visibilidade. Os esportes praticados em Urubici podem aparecer junto às estruturas das hospedarias. Nestes casos, algumas das aventuras oferecidas são:

[...] açudes para pesca, mini-campo de golfe, bicicletas para passeios dentro da localidade, churrasqueira e rancho rústico, cancha de bocha, fogão a lenha de uso coletivo, casa na árvore com escorregador, trilhas no meio da mata e chácara com diversas árvores frutíferas (DIÁRIO CATARINENSE, 2008b, p. 10).

Mas eles também podem acontecer junto aos acidentes geográficos encontrados em Urubici. As estruturas geomorfológicas do município aparecem nos discursos sobre o turismo em todas as edições do DC. No entanto, é com o passar dos anos, no decorrer da produção discursiva, que os esportes passam a ser relacionados a morros, cascatas etc. As cachoeiras e cascatas de Urubici não serão mais somente conhecidas pela altura da queda das águas, como o era em 2005, ou mesmo pelas belezas e baixas temperaturas. Serão conhecidas também pelos esportes que podem ser praticados nesses locais. Em 2007b, a Cachoeira do Avencal é importante para visitação, porque além dos cem

metros de queda livre, ela é um local freqüentado por praticantes de rapel e tirolesa (Figura 12).

Figura 12 – Rapel na Cascata do Avencal. Fonte: Fusuma (2010).

Em 2008a, as práticas esportivas em Urubici são produzidas junto ao Morro do Oderbeng, na Serra Geral, onde a prática turística está associada à rampa de voo livre e voo de Asa Delta e Parapente; a Cascata Véu de Noiva é outro atrativo turístico produzido, emergindo junto às estruturas para as práticas da tirolesa, do arvorismo e do rapel. Em específico relacionado à Cascata Véu de Noiva, um instrumento da produção turística que emerge é o restaurante de comida caseira, onde o turista tem o que comer durante suas aventuras.

As atividades realizadas em meio à natureza, sejam elas sustentadas por hotéis ou em meio aos pontos turísticos do município, reforçam o enunciado de Ecoturismo, ou talvez evidencie a emergência de um novo campo, domínio discursivo. Isso se justifica na medida em que o Ecoturismo associado a práticas específicas, em Urubici, ganha certa autonomia com relação ao turismo de modo geral. Ele é colocado a partir da perspectiva do desenvolvimento sustentável de base e a ele estarão, a partir desse momento, associados conceitos, discursos

específicos a esse campo. É, aliás, por meio da emergência desse campo, que Urubici está relacionado à Serra Catarinense. Em Urubici, aparece como prioridade, nas atividades e programações turísticas, a interação do turista com o ambiente, com o entorno natural.

O exame dos pontos turísticos nos arquivos do DC mostra também, no decorrer dos anos, formas diferenciadas de descrição dos mesmos, ou algumas descontinuidades discursivas. Há uma passagem do foco em características físico-geográficas, no processo de descrição dos atrativos, para uma descrição cada vez mais voltada para as sensações e emoções que o atrativo poderia despertar no turista. Nas primeiras edições da pesquisa, o atrativo são as estruturas geomorfológicas do município. Com o passar das edições o foco, passa a ser o turista e tudo que o atrativo pode provocar nele para que dele o turista possa fazer parte. Há, portanto, um deslocamento de objeto no espaço discursivo do turismo. O atrativo passa a ser uma forma de cativar o turista, de produzir efeitos de subjetividade, por meio de suas próprias sensações, por um processo de estímulo, intensificação das mesmas.

As emoções que mais aparecem são aquelas relacionadas a atividades de aventura. Há, no processo de descrição de um atrativo turístico, a relação com enunciados específicos. Estar em um atrativo turístico tem relação para aquele que vai lá com a sensação de “colocar- se em risco”. Outro enunciado que emerge nas práticas turísticas de aventura é o de que o esforço dedicado à superação de qualquer “obstáculo” traz como recompensa uma “visão” ou uma vista, extraordinária do ambiente. Alguns desses exemplos podem ser vistos quando se observam as formas de abordagem relacionadas à Serra do Corvo Branco (Figura 13) e à Pedra Furada (Figura 8), ambas estruturas geomorfológicas descritas como desafios à coragem daquele que se coloca sob uma experiência de risco.

Na edição 2007d, na reportagem “O Melhor do Inverno”, a Serra do Corvo Branco é produzida como atrativo turístico quando relacionada à afirmação de que esta provocaria “sensação de montanha- russa” (Figura 14). A Edição de Inverno de 2007 faz emergir um efeito de subjetividade específico do discurso, na medida em que, nos primeiros metros de subida, apresenta um “cenário” de “tirar o fôlego”. Com rodovia pavimentada, a Serra, localizada em Urubici, está mais ao norte da Serra Geral e é anterior à Serra do Rio do Rastro; fica a 30 quilômetros do centro da cidade. Boa parte do trajeto é feito em estrada de chão batido. A estrada SC-439 “vence” 1.460 metros de altitude entre

Urubici e Grão-pará. A Serra do Corvo Branco seria o maior corte vertical, entre duas montanhas, feito em rocha no país entre 90 metros.

Figura 13 – Serra do Corvo Branco, Urubici, SC, Brasil. Fonte: Radar Sul (2010e).

Figura 14 – Descida na Serra do Corvo Branco, Urubici, SC, Brasil. Sensação de Montanha Russa.

A maior emoção comparada a uma montanha-russa diz respeito especificamente às curvas sinuosas que se seguem uma após a outra. Em apenas duas delas, é possível descer 400 metros. As curvas são perigosas, não permitem a passagem de veículos pesados e exigem manobras de motoristas. A Serra está concentrada em um trecho de cinco quilômetros, no entanto, somente os 600 metros mais perigosos são asfaltados.

Em 2008a, visitar a Pedra Furada torna-se uma atividade de aventura. Não é mais estar diante de uma “superjanela” (DIÁRIO CATARINENSE, 2006) de 30 metros de diâmetro. Realizar uma visita à Pedra Furada implica práticas específicas, relacionadas a valores, posturas dos sujeitos diante da realidade, implica diversificado modo de vida. A Pedra Furada, porque está situada no limite dos municípios de Orleans, de Bom Jardim da Serra e de Urubici, é o atrativo artificial produzido pelo discurso a partir de um recurso natural. A trilha que leva até a Pedra Furada está relacionada a um efeito de subjetividade do discurso, aquele que relaciona turista e o atrativo à exigência de “boa dose de coragem”. Ela é íngreme e feita de terra; em dias molhados, o caminho pode ser uma perigosa armadilha. São ao todo quatro quilômetros de caminhada entre o morros e montanhas da região.

Mas tamanha dificuldade tem o esforço “inquestionavelmente” recompensado. A cada passo do turista, mais uma figura do discurso emerge. Há, junto à estrutura da Pedra Furada, a “inquestionável” vista de “encher os olhos” (Figura 8). A trilha que leva até ela é descrita como antiga e cheia de obstáculos. É um lugar que poucos conhecem. Algumas descidas são realizadas por dentro de mata fechada e pouco explorada. Imensas pedras teriam sido arrastadas pelas forças das águas e chuvas fortes há milhões de anos. O DC (2008a), por meio de um processo que caracterizaria a produção de um ponto turístico em Urubici, diria para quem se aventurasse por lá:

“[...] o verdadeiro tesouro de Urubici não teria preço, e brilharia muito mais que ouro. Esse seria o trabalho perfeito e caprichoso da natureza. Feito de forma especial para o “deleite dos sentidos” (DIÁRIO CATARINENSE, 2006a, p. 7).

A produção dos pontos turísticos é aqui associada à produção de sentidos, na medida em que interessa deixar claro que aspectos subjetivos não são naturais ou inquestionáveis. Eles são produzidos.

Mas produzidos na medida em que a Pedra Furada é desenhada pelo discurso como um espaço de mistérios, riscos, perigos a qualquer desbravador. Não significa que, ao “natural”, lá, sem a presença do discurso que a produz, que a nomeia, vá causar, de forma inquestionável sensações e emoções. Há alguns anos, a Pedra Furada era só um lugar de beleza, para ser admirado. É, somente à medida em que os esportes radicais tornam-se práticas relacionadas ao turismo, em Urubici, que o discurso sobre os atrativos turísticos irão destacar as possibilidades de exercício neles. O lugar da sensação no discurso sobre o turismo no município é importante na medida em que é uma das principais formas de atraí-lo ao lugar. Dito de outra forma, de produzir o turismo em Urubici.