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O PROCESSO DE BUROCRATIZAÇÀO NAS ATUAIS SOCIEDADES DE TRANSIÇÃO.

No documento DICIONÁRIO DE POLÍTICA VOL. 1 (páginas 144-147)

AUTORIDADE 93 da crença na legitimidade do poder do pai Pode

V. O PROCESSO DE BUROCRATIZAÇÀO NAS ATUAIS SOCIEDADES DE TRANSIÇÃO.

ALGUNS PROBLEMAS NÃOSOLUCIONADOS. — Da experiência histórica recente é fácil deduzir que as indicações acima apresentadas não são meras petições de princípio, mas medidas concretas que têm de ser inevitavelmente aplicadas, se se quiser combater eficazmente a Burocratização.

Há acontecimentos que parecem contradizer na aparência as análises dos teóricos marxistas sobre a Burocratização, mas, na realidade, tais acontecimentos só podem ser compreendidos e explicados com a metodologia de interpretação marxista da realidade histórica e social. Dito por outras palavras, a experiência demonstra que a falta de uma real democracia socialista é causa e efeito da Burocratização e que a esta só se pode pôr remédio, se se introduzirem medidas como as indicadas no parágrafo precedente.

Mas vejamos agora o fenômeno da Burocratização tal como o analisou Trotski há mais de quarenta anos e tal como se manifesta hoje, na realidade atual dos Estados operários contemporâneos. Nos seus escritos da década de 30, o revolucionário russo pôs em evidência o caráter historicamente excepcional do fenômeno de dege-neração burocrática do Estado operário soviético, fazendo ressaltar os fatores que o determinaram. Esforçou-se por definir a tipologia de uma sociedade de transição burocratizada, mas insistindo na precariedade da dominação da casta burocrática: num prazo relativamente breve, se daria a restauração do capitalismo ou se restabeleceria a democracia socialista por meio de uma revolução política das massas operárias e rurais.

Há quase meio séíulo de distância, constatamos não só que a burocracia pôde manter seu

poder por um período muito mais longo do que o imaginado por Trotski, mas também até que se impuseram novos regimes burocráticos em diversos países.

Na verdade, os problemas apresentados por Trotski nos seus escritos não concernem a um "período temporal", mas às tendências fundamentais de_ desenvolvimento do mundo contemporâneo. E, atualmente, o problema das tendências fundamentais do nosso século é e continuará sendo o mesmo que esse autor apresentou há quarenta anos, mesmo que as suas previsões temporais se tenham revelado erradas. Resta, todavia, o fato de que, embora em medida

qualitativamente diversa, ocorreram. processos de Burocratização em todos os países que derrubaram o capitalismo. Tais processos assumiram formas diferentes das que caracterizaram a URSS. Os Estados operários do Leste europeu, por exemplo, surgiram em conseqüência de um fenômeno de assimilação estrutural, depois que a presença do Exército Vermelho, dentro dos acordos de Yalta, fizera praticamente possível a destruição das antigas classes dominantes. Não existindo grandes movimentos de massa, os novos regimes estavam destinados, desde início, a sofrer uma profunda deformação burocrática, em virtude do predomínio de uma direção imposta desde fora e escassamente independente da direção da URSS.

A Iugoslávia e a China constituem variantes significativas: em ambos os países se instaurou um Estado operário por via revolucionária. Na Iugoslávia, o processo de Burocratização foi resultado de uma combinação de elementos análogos aos existentes na URSS dos anos 20 com os condicionamentos sofridos pelo grupo dirigente no período stalinlsta e nos primeiros anos de vida do novo Estado. Na China, não obstante a especificidade das condições em que se desenvolveu o processo revolucionário e a sua ampla autonomia, deu-se igualmente, desde o princípio, uma deformação burocrática que trouxe como conseqüência a expropriação política das massas e a cristalização de um estrato socialmente privilegiado. Isto vem demonstrar a não acidentalidade das tendências que os estudiosos marxistas descobriram no fenômeno burocrático. Como ficou indicado, este fenômeno se generalizou indubitavelmente. A explicação é dupla: de um lado, os países onde o capitalismo foi derrubado, salvo, em parte, a Tchecoslováquia e a Alemanha Oriental, partiram de condições de atraso análogas às da URSS (ou até mais graves), com um peso específico da classe operária muito limitado e um nível técnico-cultural totalmente insuficiente; do outro, embora os novos Estados operários não se achassem isolados dentro de um mundo

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capitalista, nenhuma revolução, contudo, havia saído vitoriosa num país industrialmente avançado. Objetivamente isto foi favorável à casta burocrática da URSS, que pôde continuar a exercer, se bem que de formas diversas, sua dominação.

Isto pode ajudar a compreender por que é que, na própria União Soviética, a burocracia não desapareceu totalmente, não obstante haverem perdido valor os fatores que foram a origem da Burocratização. Os que haviam aventado a hipótese de uma possível reforma ou auto-reforma da burocracia, num contexto político, econômico e cultural novo, tanto interno como internacional, foram desmentidos pelos fatos. Na realidade, tais autores, incluído Deutscher, possuíam uma concepção mecanicista do problema. Supunham, com efeito, que o fenômeno burocrático pudesse ser superado em virtude de uma lógica interna de deterioração, logo que deixassem de agir os fatores que o originaram. Pelo contrário, quando uma realidade se cristaliza a todos os níveis, em ampla escala e ao longo de uma curva temporária completa, adquire uma autonomia própria. Por isso, é impensável que um estrato social dominante, uma vez mudado o contexto social em que lograra impor-se, reconheça já não ter qualquer função histórica (suposto que alguma vez a haja tido) e se-retire. A tendência será antes a de defender por todos os meios suas posições de hegemonia política e de privilégio econômico e social.

Isto não impede, como é natural, que no seio das castas burocráticas no poder se manifestem diferenças e conflitos mesmo profundos. Isso depende, em última análise, do fato de que, nos Estados operários até hoje surgidos, se juntaram e se juntam contradições típicas das sociedades em transição entre o capitalismo e o socialismo, e contradições causadas pela Burocratização. Impossibilitadas de modificar as primeiras, as castas dominantes de cada um dos países se viram obrigadas a agir sobre as segundas, buscando soluções parciais ou paliativos em revisões setoriais e provisórias. Temos assim acentuações variáveis das opções econômicas e político-administrativas, com oscilações entre a afirmação ou reafirmação do centralismo e o reconhecimento da necessidade de uma descentralização mais ou menos marcante; desta maneira, os apelos ao controle do mercado contra os excessos de uma gestão hipercen-tralizada se alternam com novos e rigorosos controles administrativos para contrastar as tendências centrífugas que quase inevitavelmente se desenvolvem. Esta alternância pode continuar indefinidamente, uma vez que é, por assim dizer, vital para a normalização de um sistema burocratizado.

Se tudo isto é conseqüência da falta de uma real democracia socialista, fenômenos que estariam também presentes numa sociedade não buro-cratizada assumem, no quadro de um processo involutivo, aspectos de extrema gravidade. Tomemos o exemplo do partido único. Num Estado operário existe, em geral, a necessidade de assegurar uma unidade política capaz de contrariar as inevitáveis tendências centrífugas, estimuladas pela presença de resíduos da velha sociedade, pela permanência por longo período de duas classes diversas (operários e camponeses) e de estratos sociais menores, por eventuais pressões internacionais e pelas próprias contradições típicas de uma sociedade de transição. Esta unidade, num processo "normal", há de ser o resultado de uma dialética múltipla e articulada, cujo coroamento está nos órgãos centrais de uma democracia socialista institucionalizada (enquanto que é ao partido de vanguarda que cabe a função da iniciativa política e da tomada de consciência teórica, subordinada, em todo caso, à soberania das instituições democrático- revolucionárias, expressão de toda a sociedade). Faltando tais estruturas e mecanismos, é o partido, aliás totalmente integrado no aparelho estatal, que deve fazer de elemento unificador, de cimento das estruturas tanto econômicas como políticas, subordinando a si quaisquer outras instâncias. O caráter monolítico do partido é uma imposição da própria lógica. Se, com efeito, existisse no partido uma vida democrática efetiva, as diferenças e contradições da sociedade acabariam por manifestar- se em seu seio como um perigo para a dominação burocrática, inerente a toda a forma de democracia socialista. É justamente por isso que a casta dominante não pode aceitar uma dialética democrática, nem mesmo no partido. Daí resulta uma grave alienação política das massas e o aprofundamento da contradição entre estas e aqueles que dirigem efetivamente o Estado e a economia. Nos períodos de normalidade, tal contradição se traduz em manifestações de apatia, como esterilização do potencial criativo dos produtores; nos momentos de crise, explode em conflitos abertos pela distribuição da renda e pelo poder de decisão econômica e política. Em outros termos, enquanto numa sociedade de transição não burocratizada o fator subjetivo, constituído pela direção consciente ou autodireção, atua como fator essencial de superação das contradições herdadas da velha sociedade e das que são próprias da nova, numa sociedade burocratizada esse fator é lacerado, por sua vez, por contradições e atua contraditoriamente. Se, de um lado, a burocracia surgiu e pode exercer a sua hegemonia no quadro de uma economia coletivista, do outro, os burocratas, individualmente ou por setores, tendem a

consolidar e a aumentar os seus privilégios em formas que envolvem em sua dinâmica uma restauração do capitalismo. A burocracia como tal deve, porém, combater toda a tendência restau-racionista por minar as bases estruturais da sua dominação, assim como tem de combater eventuais tendências que levem algum dos seus setores a declarar-se favorável às massas, principalmente em períodos de crise, pois isso poria em risco a sua hegemonia política. Estas contradições produzem lacerações profundas na casta dominante, debilitando-a diante dos adversários e, sobretudo, marcando-lhe o destino. Um destino que, no entanto, não poderá ser determinado senão por uma ação consciente do conjunto dos produtores e não certamente por fenômenos de progressiva deterioração ou até de auto-eliminação.

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Camadas, sociedade por. — V. Sociedade por Categorias.

Cameralismo.

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