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A UTODETERMINAÇÃO E DIREITO À RESISTÊNCIA — Todos os instrumentos internacionais relativos à

No documento DICIONÁRIO DE POLÍTICA VOL. 1 (páginas 83-85)

APARELHO 51 monodirecionais, obrigando o fluxo do poder a

VI. A UTODETERMINAÇÃO E DIREITO À RESISTÊNCIA — Todos os instrumentos internacionais relativos à

matéria, e entre eles, em primeiro lugar, as declarações da Assembléia Geral das Nações Unidas, reconhecem, tal como o documento agora mesmo citado, aos povos que lutam pela própria Autodeterminação um direito de resistência que.se pode traduzir, em última instância, em recurso ao uso da força como aplicação do direito de legítima defesa. Na interpretação dos atos em questão, se faz comumente valer sua vinculação com o art. 51 da Carta da ONU, para se vir a reconhecer, com base em tal disposição, um direito, se não um dever, de intervir ao lado dos povos oprimidos, imposto a todos os membros das Nações Unidas.

Na realidade, longe de fazerem expressa referência à disposição em causa, as diversas declarações se limitam a reconhecer a esses povos o direito "de buscarem e receberem ajuda, de acordo com os objetivos e princípios da Carta" (assim a Declaração sobre as relações amigáveis e o art. 7.° da Res. 3314- XXIX de 14 de dezembro de 1974, relativa à definição de agressão), ou a afirmar, ainda mais genericamente, que "a restauração dos direitos fundamentais de um povo, quando forem gravemente conculcados, é um dever que incumbe a todos os membros da comunidade internacional (art. 30, Declaração de Argel), a cuja solidariedade os mesmos povos têm também direito (ponto 3 da Declaração sobre a eliminação do apartheid, adotada em 1976 pelo seminário internacional que organizou a Comissão Especial da ONU contra o apartheid).

Seria, aliás, muito grave alargar o campo de aplicação do art. 51, da hipótese de um ataque armado, a que esteve sempre rigorosamente ligado, à geral e genérica hipótese de uma agressão ou do uso da força, ou até de um comportamento contrário aos fins e aos princípios da Carta. Estender a aplicação dessa disposição à luta pela Autodeterminação dos povos seria abrir caminho à esca-lation do recurso ao uso da força e ao processo de esvaziamento de todo o sistema de segurança coletiva criado pela Carta. A legitimação da intervenção armada de um Estado não diretamente interessado na luta de libertação seria, além do

mais, perigosa, porquanto poderia levar a uma pesada ingerência da potência estrangeira na vida do novo Estado ou na condução do novo Governo, em caso de resultado positivo das hostilidades, e, sobretudo, poderia constituir base de justificação para a interferência de uma potência estrangeira nos assuntos internos de um Estado, em defesa de grupos rebeldes (verdadeiros ou imaginários, espontâneos ou oportunamente organizados), cujo direito à Autodeterminação fosse inexistente ou, quando muito, discutível. A história mais recente serve de lição.

O direito de usar a força só deve, portanto, ser reconhecido aos povos que lutam em nome próprio pela sua Autodeterminação. Este direito, porém, é de certo modo limitado, no sentido de que não se pode considerar lícito o recurso a qualquer ato de violência, mormente se dirigido contra vítimas inocentes. Não se pode por isso compartilhar a tese de que as atividades terroristas, levadas a termo por indivíduos ou grupos que lutam pela Autodeterminação, hajam de ser consideradas atos contra o terror, atos de legítima defesa, resistência ativa ao opressor, que justificariam e legitimariam os meios empregados. Mesmo que o terrorismo seja amiúde o único meio eficaz contra um inimigo muito mais forte e organizado — como acontece nas lutas de libertação — e constitua, por conseguinte, um meio de luta difícil de condenar, desde que reconhecida a legitimidade do recurso ao uso da força no exercício do direito à Autodeterminação, existem meios de ação que devem ser banidos, seja qual for o escopo qiie se tenha em vista.

O limite entre atividades lícitas e atividades ilícitas pode ser traçado em função dos meios empregados e da personalidade das vítimas dos atos terroristas. É nesta perspectiva que se enquadra também o estudo sobre o terrorismo preparado pelo secretário das Nações Unidas, no qual se observa que, embora o emprego da força seja jurídica e moralmente justificado, há certos meios que — como em toda a forma de conflito humano — não devem ser utilizados; a legitimidade de uma causa não justifica o recurso a certas formas de violência, especialmente contra os inocentes: "existem limites para aquilo que a comunidade internacional pode tolerar e aceitar".

É, pois, legítimo o uso da força, tolera-se o recurso às atividades terroristas, desde que não se dirijam contra vítimas inocentes e não se usem meios particularmente violentos e desumanos ou desproporcionados aos resultados esperados ou plausivelmente expectáveis.

O direito à Autodeterminação dos povos está intimamente ligado aos direitos dos indivíduos,

AUTOGESTAO de que constitui um corolário; seria clara contradição lutar pela Autodeterminação, atropelando os direitos fundamentais da pessoa humana.

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[CARLO BALDI]

Autogestão.

I. DEFINIÇÃO ESSENCIAL.— Por Autogestão. em sentido lato, se deve entender um sistema de organização das atividades sociais, desenvolvidas mediante a cooperação de várias pessoas (atividades produtivas, serviços, atividades administrativas), onde as decisões relativas à gerência são diretamente tomadas por quantos aí participam, com base na atribuição do poder decisório às coletividades definidas por cada uma das estruturas específicas de atividade (empresa, escola, bairro, etc.). São, portanto, identificáveis duas

determinações essenciais do conceito de Autogestão. A primeira é a superação da distinção entre quem toma as decisões e quem as executa, no que respeita ao destino dos papéis em cada atividade coletiva organizada com base na divisão do trabalho. A segunda é a autonomia decisória de cada unidade de atividade, ou seja, a superação da interferência de vontades alheias às coletividades concretas na definição do processo decisório.

Referidas à vida associada cotidiana, estas duas determinações qualificam a Autogestão como princípio elementar de modificação das relações sociais e pessoais, no sentido da reapropriação do poder decisório relativo a uma dada esfera de atividade contra qualquer autoridade, embora legitimada por anterior delegação, como se torna evidente em expressões como: "Autogestão dos conflitos", "seminário, passeata, greve autogeri-dos", etc. Referidas ao funcionamento de um sistema social global, especificam a Autogestão como um modelo de sociedade socialista alternativo do modelo estatista burocrático: de um lado, como superação da lógica autoritária da planificação centralizada e da conseqüente apropriação do poder por parte do aparelho burocrático, mediante a atribuição de uma plena autonomia gerencial às diversas unidades econômicas; do outro, como redefinição do caráter coletivista da organização social, quer mediante a atribuição das responsabilidades e do poder gerencial a cada uma das coletividades de trabalho, quer mediante a deses-truturação do ordenamento estatal e sua transformação num sistema de autonomias locais que permita a tais coletividades o controle direto das condições da reprodução social.

II. ORIGENS DO CONCEITO.— A individualiza-ção da matriz ideológica da noção de Autogestão constitui, como veremos, um aspecto da interpretação do seu significado. Contudo, é possível evidenciar alguns dos seus elementos prefigurati-vos no pensamento anárquico (particularmente no conceito de democracia industrial de Proudhon), nas concepções do sindicalismo revolucionário europeu e norte-americano e, mais ainda, na idéia do Autogoverno industrial aventada pelos socialistas ghildistas. A origem da problemática da Autogestão pode, em vez disso, ser atribuída, com maior certeza, ao encontro do movimento dos CONSELHOS OPERÁRIOS

(V.), difundidos por vários países da Europa no primeiro pós-guerra, com as posições dos grupos "extremistas" ou "operaris-tas", no seio dos partidos socialistas e, depois, da Terceira Internacional, sobre o problema da "socialização" da economia. De modo particular, o conceito do "sistema de conselhos" segundo os

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escritos de K. Korsch e A. Pannekoek e o grams-ciano da "ordem nova" são propostas de organização de uma sociedade pós-revolucionária segundo esquemas de todo semelhantes aos da Autoges-tão, mesmo que não sejam definidas com este termo, que aparece só ocasionalmente em publicações alemãs. Nas décadas de 20 e 30, com a diminuição do espaço para a proposta dos conselhos, é possível identificar importantes elementos da problemática da Autogestão na crítica trotskista do papel da burocracia no sistema soviético.

A difusão do termo Autogestão na cultura e na linguagem política data só dos anos 50, em conseqüência da introdução na Iugoslávia de um sistema de organização econômica e estatal assim denominado. Esta experiência levou, por um lado, a uma maior especificação do conceito de Autogestão, quando referido a um conjunto de mecanismos e procedimentos articulados a nível de empresa e de estruturas político-administrativas, e, por outro, à sua conotação não já como proposta "extremista", mas como solução prática do problema da eficiência e da democracia de um sistema socialista. Contudo, não se estabeleceu no uso do termo uma significação precisa no sentido institucional (a não ser com referência ao sistema de organização e representação por conselhos de delegados) e o seu sucesso coincide antes com a difusão de uma acepção de Autogestão muito genérica, da Autogestão como algo cujos pressupostos e condições de realização não se acham definidos de forma unívoca; daí a dificuldade de lhe demarcar uma problemática coerente.

III. A AUTOGESTÃO COMO SISTEMA DE

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