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3 Programas de prevenção da violência nas relações de intimidade À medida que se analisam as variadas causas e dimensões da violência nas relações

de intimidade, maior se torna a informação disponível no sentido de intervir de forma eficaz na sua prevenção. Especialistas nesta área consideram que a educação é a forma de prevenção mais importante, sendo que expõe as causas diretas e subjacentes à violência doméstica. A informação/educação acerca do fenómeno da violência, através de programas de intervenção direcionadas para a prevenção, apresenta variados benefícios, particularmente porque permite o acesso a um grande número de jovens e incentiva à conceção de métodos de resolução de problemas sem recorrer à violência. Esta estratégia de prevenção apresenta o problema como fazendo parte do espaço público e não do privado, clarificando a sua posição como um problema de âmbito social (DGS, 2003). Os programas de educação, aos estudantes do ensino secundário, surgem como uma estratégia para prevenir a violência em diferentes contextos, podem abranger temas diversificados, como sejam direitos humanos, estereótipos de género, princípios de igualdade, capacidades de comunicação e manutenção de relações fundamentadas no respeito mútuo. É fundamental uma intervenção com os jovens desde cedo, quando iniciam as primeiras relações, reforçando a importância da desconstrução de crenças que legitimam os comportamentos violentos, e prevenindo a banalização da violência no sentido de uma maior compreensão da gravidade deste problema, sensibilizando os jovens para a utilização de comportamentos não violentos nas suas relações de intimidade (DGS, 2003; Matos et al., 2006; Mendes & Cláudio, 2010). A escola apresenta-se como um espaço importante na socialização dos jovens, assim como um local privilegiado para o aparecimento e necessária sinalização de comportamentos violentos. Diferentes formas de intervenção podem ser utilizadas no sentido da prevenção da violência nas relações de intimidade. A inclusão no currículo das escolas de programas de prevenção da violência favorece o impacto no conhecimento e consequentemente na procura de ajuda pelos jovens, contribuindo para a intervenção precoce na diminuição das condutas violentas (Coelho & Machado, 2010; Jaycox, et al., 2006; RCM, 55/1999; RCM, 88/2003; RCM, 83/2007; RCM, 100/2010; Sebastião, Alexandre & Ferreira 2010).

Nas últimas décadas, houve um aumento da consciência de que a violência pode ser prevenida e o seu impacto reduzido. Da mesma forma que os esforços de saúde pública têm impedido e reduzido complicações relacionadas com múltiplas doenças, os fatores que contribuem para respostas violentas, sejam eles fatores de atitude e de comportamento, relacionados com o meio social, condições econômicas, políticas e culturais, podem ser alterados. A prevenção da violência pode ser concretizada através de programas de informação que incluam, nomeadamente, o relacionamento seguro e estável entre as crianças e a família, o

PARTE I. 3 - PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA NAS RELAÇÕES DE INTIMIDADE

desenvolvimento de competências nas crianças e adolescentes e a promoção da igualdade de gênero. As intervenções na escola e na comunidade podem contribuir para reduzir a violência e o impacto de longo alcance que esta tem na saúde física e mental, na aprendizagem escolar e na capacidade de trabalho das pessoas, assim como, na segurança das comunidades e no desenvolvimento social e econômico dos países (WHO, 2009).

Sendo reconhecida a influência dos contextos de vida diária no padrão de saúde das pessoas, também a escola, como espaço de aprendizagem, é o local de primordial importância para o desenvolvimento de atividades educativas que contribuam para a promoção e educação para a saúde, reforçando os fatores que favorecem formas de vida saudáveis. Assim, pretende-se que os técnicos de saúde e de educação, no cumprimento das suas funções, tenham uma postura permanente de empoderamento das pessoas, disposição fundamental na promoção da saúde. Como se afirma no Programa Nacional De Saúde Escolar (DGS, 2006):

“Na escola, o trabalho de promoção da saúde com os alunos tem como ponto de partida ‘o que eles sabem’ e ‘o que eles podem fazer’ para se proteger, desenvolvendo, em cada um, a capacidade de interpretar o real e atuar de modo a induzir atitudes e/ ou comportamentos adequados. Neste processo, os alicerces são as ‘forças’ de cada um, no desenvolvimento da autonomia e de competências para o exercício pleno da cidadania“ (p. 16).

O planeamento e aplicação de programas de intervenção emergem da necessidade de agir através de estratégias que sejam eficazes na sensibilização acerca importância da utilização de comportamentos saudáveis nas relações de intimidade e que ajudem no esclarecimento e na desconstrução de mitos, crenças e estereótipos de género.

Como refere Jardim & Pereira (2006), quando falamos em programa queremos significar:

“uma intervenção intencional e sistemática, resultante da identificação de necessidades de uma determinada população ou grupo, dirigida para alguns objetivos, fundamentada em posicionamentos teóricos que dão consistência e rigor à acção e destinada para satisfazer as necessidades dos destinatários” (Jardim & Pereira, 2006, p.56).

Os autores citados consideram que os programas de intervenção envolvem 4 etapas importantes, a saber: a identificação do problema (explicitado através de necessidades), o desenho do programa (opções teóricas, metodológicas e avaliativas), a sua implementação (realização do programa desenhado) e a avaliação (evidência da sua eficácia, dos resultados obtidos).

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As primeiras referências na literatura a programas de prevenção da violência nas relações de namoro surgem a partir da década de 1990, com conteúdos e metodologias adequados às diferentes populações alvo. Os programas de intervenção devem ser planeados de acordo com as necessidades dos indivíduos ou grupos para quem se dirige a ação, sendo importante conhecer elementos como a idade, o nível de desenvolvimento e a cultura, antes da sua implementação. A sua aplicação deve ser orientada para a prevenção de conflitos nos relacionamentos, através da abordagem de conteúdos fundamentados na aprendizagem de competências, que favoreçam as mudanças de atitude e comportamento e que promovam capacidades intrapessoais como autoconceito, assertividade e independência (estas, sobretudo, para as meninas e raparigas), habilidades interpessoais como empatia e cuidado (estas mais insistentemente para os rapazes), responsabilidade, motivação e capacidade de resolução de problemas (Manso et al., 2011; Matos et al., 2006; Saavedra, 2010). A implementação de programas de prevenção da violência no namoro está relacionada com o desenvolvimento da investigação sobre o tema e o aumento da preocupação social decorrente da maior visibilidade do fenómeno da violência nas relações de intimidade (Sebastião, Alexandre & Ferreira, 2010). Este interesse surge também pelo conhecimento dos programas de ação acerca da violência sobre as mulheres, violência doméstica e/ou conjugal, cuja intervenção e prevenção realçaram a necessidade de desenvolver este tipo de programas, a partir de idades mais precoces.

Os programas devem incluir estratégias diversificadas e ativas, adequadas ao grupo a que se dirige, nomeadamente com grupos de discussão, debate, brainstorming. Metodologias com maior participação por parte dos/as adolescentes são importantes e alteram a forma de perceber os jovens somente como recetores passivos da informação, para os identificar como agentes ativos e participantes da aprendizagem (Ribeiro 2008; Saavedra, 2010; Sebastião, Alexandre & Ferreira, 2010).

Apesar do desenvolvimento de programas nos últimos anos acerca da prevenção da violência nas relações de intimidade, não se comprovam eficazmente os resultados do impacto dos mesmos. Existem estudos que revelam a importância deste tipo de intervenções na mudança das atitudes e na alteração das crenças legitimadoras de violência, mas, algumas limitações metodológicas e conceptuais têm sido apontadas como obstáculos na avaliação da sua eficácia (Caridade & Machado, 2008). Os programas de intervenção baseados na divulgação de informação aos/às adolescentes sobre as consequências da violência no namoro revelam que estas intervenções conduzem os/as adolescentes a refletir sobre os comportamentos violentos mas têm reduzidos efeitos na mudança das atitudes e crenças sobre a violência (Sebastião, Alexandre & Ferreira, 2010).

Contrariamente a estas opiniões, a maioria dos estudos efetuados apontam para a eficácia dos programas de intervenção. Os resultados das avaliações realizadas aos programas

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apontam, na generalidade, mudanças positivas, como o aumento dos conhecimentos e a diminuição a nível das atitudes de legitimação da violência. Indicam ainda uma maior capacidade dos jovens para detetar comportamentos de violência, uma postura mais favorável para procurar ajuda, se necessário, e um aumento das competências de comunicação e resolução de conflitos. Acrescentam ainda que os/as adolescentes que participaram nestes programas de prevenção diminuíram o seu envolvimento em comportamentos violentos, tanto no papel de vítimas como de agressores (González-Ortega, Echeburúa & Corral, 2008; Jaycox, et al., 2006; Matos et al., 2006; Ribeiro, 2008; Saavedra, 2010).

Os programas de intervenção no sentido da prevenção da violência e promoção de relações íntimas saudáveis têm sido desenvolvidos em diferentes contextos e por diferentes pessoas que se preocupam com este fenómeno. Os profissionais de enfermagem são agentes ativos na promoção da saúde e prevenção da doença e devem participar nos programas de intervenção acerca do fenómeno da violência das relações de intimidade.

Tendo como suporte a caraterização dos cuidados de enfermagem, considera-se que aos enfermeiros estão inerentes funções de orientação e supervisão, intervindo com a transmissão de informações que apontem para a mudança de comportamentos e para a utilização de estilos de vida saudáveis (REPE). Neste contexto, os enfermeiros devem participar ativamente na promoção da saúde e na prevenção de condutas de risco, particularmente os que se relacionam com a violência, tendo um papel importante na educação para a saúde nas escolas, com a aplicação de programas de intervenção, na prevenção, sinalização e acompanhamento das situações de violência. As escolas constituem um local privilegiado de intervenção não só porque podem ser aplicados programas a um número elevado de jovens mas também porque no grupo e com o grupo a informação e o debate são mais enriquecidos.