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Propósitos da responsabilidade limitada

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2015 (páginas 77-89)

2.3 Responsabilidade limitada

2.3.1 Propósitos da responsabilidade limitada

No momento da criação de uma sociedade, indivíduos tomam a decisão de alocar parte de seus bens e direitos para uma finalidade específica, dispondo desse patrimônio em troca de participação no capital social da pessoa jurídica que estão criando. Ao fazê-lo por meio de uma organização coletiva, expressam seu genuíno interesse em não mais ter o domínio sobre determinado bem, mas em expectar os lucros eventualmente decorrentes da atividade que com este bem será desenvolvida (ou, ao acabar da sociedade, o acervo que a eles também eventualmente caberá).

Trata-se de uma legítima expressão da autonomia da vontade. Como expressa Calixto Salomão Filho, “[...] é sobretudo na necessidade de permitir aos comerciantes a afetação de parte de seu patrimônio a fins específicos, permissão que de resto está absolutamente em linha com os princípios da autonomia da vontade [...]”.127

Qualquer investimento envolve riscos. Poder mensurá-los de maneira a ter certa previsibilidade da perda dele decorrente é precaução salutar. Na medida em que o investidor tem uma ferramenta eficaz para quantificar o montante a perder de seu

125 COELHO, Fábio Ulhoa. Princípios do direito comercial: com anotações ao projeto de Código Comercial cit., p. 44.

126 Idem, ibidem, p. 45.

patrimônio pessoal, o investimento se torna mais atraente. Essa é uma das funções da responsabilidade limitada: garantir que a atividade na qual o sócio investirá não o levará à bancarrota pessoal.

Por isso dizer-se que é um grande incentivo ao agente econômico, pois permite minimizar os riscos da atividade empresarial. E sua escolha se dá de maneira transparente em relação àqueles que com a sociedade negociarão. Esse agente tem diante de si escolher entre o tipo societário que não limita a responsabilidade dos sócios, ou aquele que a limita parcialmente ou ao que a limita totalmente. Uma vez exercida tal opção, estabelece de antemão as regras a ser aplicadas na relação da sociedade com terceiros. Um credor que com a sociedade de responsabilidade limitada negociar conhece previamente o patrimônio que estará à disposição para saldar o crédito concedido, o que confere segurança jurídica e não cria expectativas a respeito de riqueza a que não terá acesso.128

Ao permitir racionalização dos riscos, a responsabilidade limitada estimula a livre-iniciativa, alicerce da República Federativa do Brasil, ao lado do trabalho.

A ordem econômica tem como fundamento a valorização do trabalho humano e a livre-iniciativa, como forma de assegurar a todos existência digna. Com uma peculiaridade: a livre-iniciativa no desenvolvimento de uma atividade produtiva não apenas proporciona existência digna àquele que a exerce, mas fomenta o mercado de trabalho, promove a oferta de novos serviços e produtos para a sociedade e, evidentemente, contribui para o Estado, mediante pagamento de tributos.

Importa dizer que a livre-iniciativa é um modo de expressão do trabalho. Conforme Eros Roberto Grau, é corolário da valorização do trabalho livre; a qual, vista como expressão da liberdade e inserida no contexto social (e não apenas na sua individualidade) é atributo inalienável do homem.129

Ao afirmar a livre-iniciativa como seu alicerce, funda-se a ordem econômica não na atividade do Estado, mas no empreendedorismo do indivíduo ou de um grupo de

128 GONÇALVES, Oksandro. O recoser da autonomia patrimonial e da responsabilidade limitada no projeto do novo Código Comercial cit., p. 379.

129 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 227.

indivíduos, que, apoiado por essa liberdade, realizará atividades para a criação de riqueza. Na livre-iniciativa, esses empreendedores têm garantida a ausência de impedimentos para fazer nascer a atividade e para desenvolvê-la. Se o Estado age de maneira a impedir o surgimento ou desenvolvimento da atividade, e não apenas para regular seu exercício (inclusive para fomentá-la), atua em desacordo com a ordem constitucional.

Na opção de modelo econômico adotada pelo País, não haveria como ser diferente. A livre-iniciativa é a base de uma economia de mercado. Sem a iniciativa privada não há como seguir adotando um modelo capitalista, uma vez que aquela é princípio básico deste.130

Para Fábio Ulhoa Coelho, a livre-iniciativa é elemento essencial do capitalismo, não visto este somente como uma ideologia, mas como um modo de produção. Para o autor, “capitalismo depende, para funcionar com eficiência, de um ambiente econômico e institucional em que a liberdade de iniciativa esteja assegurada”.131 A eficiência desse modo de produção conta com certas condições, que

para esse mestre do Direito seriam resumidas em quatro desdobramentos do princípio da livre-iniciativa, a seguir resumidamente expostos.132

O sistema capitalista não pode prescindir da empresa privada, pois o desenvolvimento de sua atividade não se presta a apenas atender aos interesses individuais dos empresários de obter lucro, mas igualmente ao interesse de toda a comunidade na qual a empresa está inserida, pois dá acesso a bens e serviços de que todos seus integrantes necessitam.

O elemento que faz progredir eficientemente o modo de produção capitalista é a perspectiva de lucro. A atividade empresária tem por fim a obtenção de lucro, sem o qual um indivíduo não se propõe a empreender. Sem investidores, a primeira condição

130 Aqui não se contraria a assertiva de Eros Roberto Grau de que a livre-iniciativa do texto constitucional não estaria limitada à liberdade econômica ou liberdade de iniciativa econômica, tendo em vista ser um termo para um conceito bem mais amplo, com o que se concorda. Trata-se apenas de constatar de que a liberdade de iniciativa econômica é uma das faces da livre-iniciativa, sendo a empresa seu titular (GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 cit., p. 223). 131 COELHO, Fábio Ulhoa. Princípios do direito comercial: com anotações ao projeto de Código

Comercial cit., p. 28. 132 Idem, ibidem, p. 32.

não é atendida, visto que não haverá organização dos fatores de produção de bens e serviços necessários ao atendimento da comunidade. O lucro, portanto, não pode ser condenado juridica ou moralmente, ou sequer desencorajado, dado ser a força motriz do sistema.

O empreendimento privado deve ser protegido juridicamente. Cabe ao Direito estabelecer regras a viabilizar o fornecimento de produtos e serviços, bem como os mercados, visando ao desenvolvimento econômico. A tutela da empresa é a tutela do interesse de toda a comunidade.

O quarto desdobramento da liberdade de iniciativa seria o reconhecimento na empresa privada como um polo gerador de empregos e pagador de tributos, que distribui riqueza aos indivíduos da coletividade, bem como ao próprio Estado.

A limitação da responsabilidade do empreendedor ao valor investido serve de motor à iniciativa privada, limitando os riscos da atividade empresarial e viabilizando a livre-iniciativa.

E se por um lado ela é instrumento útil à afirmação do princípio da livre- iniciativa, por outro sua ausência incentiva a informalidade. Como bem assevera Oksandro Gonçalves:

a limitação da responsabilidade é um incentivo legal à constituição de um empreendimento formal, porque a adoção de outro tipo é um fator que desincentiva essa escolha ao prever a possibilidade de o patrimônio pessoal responder por dívidas oriundas da atividade empresarial. A norma cria um incentivo para o agente econômico que racionalmente optará pela hipótese mais benéfica.133

Se o resultado da constituição de uma pessoa jurídica, com inscrição no Registro de Empresas e todas as demais formalidades (e custos) atreladas à sua criação, não resultasse em algum benefício ao empreendedor, como a separação dos patrimônios envolvidos e a limitação da sua responsabilidade aos bens e direitos da sociedade, tornar-se-ia inócua a razão para se formalizar.

133 GONÇALVES, Oksandro. O recoser da autonomia patrimonial e da responsabilidade limitada no projeto do novo Código Comercial cit., p. 380.

A informalidade é total ausência de garantia ao empregado que trabalhará no negócio; ao Estado que não terá meios de controlar incidência de tributos; e à comunidade em geral que não encontrará uma porta para bater em caso de danos resultantes da oferta de produtos ou serviços nela gerados.

Quer o Direito seja a livre-iniciativa exercida em sua plenitude; mas exercê- la plenamente pressupõe que o seja dentro dos limites da lei, que tutela o interesse da comunidade em geral. Incentivar a formalidade, protegendo o investidor de riscos a seu patrimônio pessoal com o desenvolvimento da atividade empresária, cria um veículo saudável ao sistema para a realização da empresa.

Uma comprovação do incentivo decorrente da responsabilidade limitada é que, até a recepção da Eireli no ordenamento, existia uma quantidade relevante de sociedades limitadas cujas quotas eram detidas por praticamente um único sócio. Isso demonstra que, mesmo sem haver o intuito de formar sociedade, diante da inexistência de limitação de responsabilidade para o empresário individual o empreendedor optava pela constituição da sociedade limitada (ainda que “pro forma”), em busca dessa imprescindível garantia.134

Sendo a limitação da responsabilidade um incentivo à formalização, possibilita o fortalecimento da preservação da empresa, objetivo muito caro à Economia e ao Direito. A personificação mantém os bens da empresa protegidos de problemas com a pessoa natural do empresário, inclusive de seu eventual interesse em não mais exercer a atividade. A venda da empresa é facilitada, bem como a partilha de bens em caso de divórcio ou morte, vez que a atividade empresarial continuará existindo e partilhadas serão somente as quotas ou as ações representativas do capital da sociedade.135

As vantagens da limitação da reponsabilidade são também apontadas pela análise econômica do Direito. Sua aplicação gera um mecanismo de alocação de riscos empresariais: na medida em que não se pode estender aos sócios a responsabilidade

134 PARGENDLER, Mariana. O direito societário em ação: análise empírica e proposições de reforma.

Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, São Paulo, ano 16, n. 59, p. 232, jan.-mar.

2013. “Verifica-se que 59,5% das sociedades da amostra tem um sócio absolutamente dominante, com 90% ou mais das ações, e 33,8% destas tem um sócio com 99% ou mais das ações”.

pelas dívidas da empresa, distribui-se o risco do negócio entre todos aqueles que com ela se relacionam – seja de maneira voluntária ou involuntária.

Para Frank H. Easterbrook e Daniel R. Fischel, a limitação da responsabilidade não pode ser vista apenas como um benefício concedido aos investidores pelo Estado, mas sim como consequência lógica das diferenças existentes entre as variadas formas de conduzir a atividade econômica.136

A primeira vantagem atribuída pelos representantes da Escola de Chicago à limitação da responsabilidade dos sócios é a redução do custo de monitoramento da administração da sociedade. Supondo a responsabilidade ilimitada dos sócios, na medida em que o Direito admite um tipo societário em que a administração da sociedade não é realizada diretamente pelos seus sócios, aquele que conferiu seu capital ao patrimônio social precisaria monitorar de perto sua administração, sob pena de ver seu patrimônio pessoal devastado. Quanto maior o risco a que está submetido, maior sua necessidade de controle, até o ponto em que o custo com essa supervisão superará o interesse econômico no investimento. À medida que o risco de seu investimento resta limitado ao valor do capital conferido, o custo desse monitoramento diminui, além de possibilitar que este mesmo sócio tenha flexibilidade para investir em tantos outros negócios.

Evidentemente que não se sustenta o desinteresse do sócio na diligência da administração. Por isso a sociedade oferece mecanismos de governança que dispensam o monitoramento direto. E quanto mais desenvolvidos tais mecanismos, mais valor agregam à participação societária, o que faz atrair um número maior de investidores.

A segunda vantagem está em que a limitação da responsabilidade reduz o custo de monitorar os outros sócios. Sustenta-se que, em um sistema de responsabilidade ilimitada, o sócio mais rico está sujeito a maior probabilidade de ser executado, em caso de responsabilização por dívidas sociais. Assim, haveria um custo do investidor em controlar a disposição de bens de seus sócios para terceiros menos ricos, de maneira a evitar venha ele a responder sozinho. A responsabilidade limitada

136 EASTERBROOK, Frank H.; FISCHEL, Daniel R. Limited Liability and the Corporation, University

torna irrelevante a condição dos outros sócios, elimina essa preocupação e facilita a transferência de participação societária.

Em terceiro lugar, ao facilitar a transferência de participação societária, a responsabilidade limitada incentiva uma administração eficiente. Apoiam-se os autores no raciocínio do takeover. O preço da participação societária reflete a conduta de sua administração. Uma má administração tende a reduzir o valor da participação societária, facilitando a aquisição por um grupo de novos sócios, que comprariam um bloco grande de participação com poder de voto suficiente para mudar a administração da sociedade. Essa “ameaça” de substituição incentivaria uma atuação eficiente para manter o preço das participações societárias alto, de forma a não facilitar mudanças na diretoria.

Evidentemente, o raciocínio aqui é construído com base no mercado acionário norte-americano, que oferece um nível de dispersão acionária em que tais movimentos são mais comuns. Entretanto, não há como desprezar que a responsabilidade limitada incentiva eficiência ao facilitar a transferência de participação societária como um bem fungível. Isso porque, em um sistema de responsabilidade ilimitada, o valor da participação societária não se constrói exclusivamente pela sua capacidade de gerar riquezas (seu valor de mercado), mas adiciona-se a esta conta a riqueza dos sócios, transformando a participação em um bem infungível, pois dependente de qualidades pessoais do comprador/vendedor.

A quarta vantagem está em viabilizar seja o preço das participações societárias marcado a mercado, tal como qualquer commodity, de maneira que a maioria dos investidores não precise fazer uma análise individual do prospecto da sociedade para avaliar se o preço é justo ou não. Eles se basearão no preço de negociação.

A limitação da responsabilidade tem ainda uma quinta vantagem, que está na possibilidade de a sociedade levantar capital a custos menores em razão de ter condições de diminuir seus riscos por meio da diversificação de seu portfólio de investimentos. Trata-se da aplicação do brocardo “não coloque todos os seus ovos em uma única cesta”. A ideia é que o risco de perda se torna elevado em situação na qual todo o dinheiro e esforço está concentrado em um único negócio, pois a diversificação permite seja a perda de um lado compensada pelo ganho de outro. Em um cenário onde não há limitação da responsabilidade, em que a quebra pode levar um sócio a perder

todo seu patrimônio, o investidor não tem condições de diversificar, sendo mais razoável que detenha poucos ou apenas um investimento, para limitar seus riscos. Ao fazer isso, o benefício com a diminuição de custo de capital decorrente de um portfólio variado deixa de ser uma opção.

A sexta e última vantagem apresentada por Easterbrook e Fischel está em facilitar a tomada de decisão em relação a investimentos de alta variação de risco. Diante de um portfólio de investimentos diversificado, somente possível em cenário de responsabilidade limitada, certos investimentos funcionam como hedge, ou seja, uma proteção dos riscos que outros tantos investimentos podem apresentar. Esse mecanismo viabiliza seja o investidor encorajado a apostar em negócios de alto risco, necessários ao desenvolvimento da economia (por exemplo, em pesquisa para desenvolvimento de novos produtos, ou em novas técnicas de produção, ou ainda na atuação em novos mercados), uma vez que os negócios de menor risco darão suporte em caso de eventual fracasso. Sendo a responsabilidade ilimitada, projetos muito arriscados, ainda que de prognósticos positivos, teriam de ser rejeitados.

Bruno Meyerhof Salama afirma, nessa mesma direção, que “a ilimitação de responsabilidade de sócio pode ser considerada um entrave adicional ao empreendedorismo, isto é, à abertura de novos negócios”, pois o que se inicia apresenta riscos mais relevantes de quebra do que negócios já estabelecidos há muito tempo.137

Importante notar que em todas as vantagens apresentadas pela dupla de professores da Universidade de Chicago há uma constante: o incentivo que a responsabilidade limitada provê ao investimento em participação societária e, portanto, na aplicação de recursos em atividades produtivas, que fazem circular bens e serviços para toda a comunidade. Quanto mais arriscado o investimento, menor a chance de o investidor colocar seu dinheiro. Se o sistema não cria mecanismos de limitação desse risco, o recurso não se apresentará. A responsabilidade limitada diversifica, de forma mais eficiente, os montantes aplicados na economia.138

137 SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim da responsabilidade limitada no Brasil – História, direito e economia. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 276.

138 SZTAJN, Rachel. Sobre a desconsideração da personalidade jurídica. Revista dos Tribunais, ano 88, v. 762, p. 91, abr. 1999.

Ademais, como apontado por Fábio Konder Comparato, “não se pode esquecer de que a responsabilidade limitada é fator de progresso econômico, pois, permitindo um maior afluxo de capitais para as atividades produtivas, contribui para uma redução relativa de custos e preços”.139

Qualquer indivíduo que disponha de recursos financeiros vê-se diante de duas possibilidades: consumi-los imediatamente ou investi-los de maneira a obter retorno futuro. A decisão pelo investimento abre ao indivíduo (agora, investidor) um leque de possibilidades: depósito de valores em uma caderneta de poupança, contribuição para um plano de previdência privada, e ainda, entre tantas outras alternativas, empreendimento de uma atividade de produção ou de serviço.

Ao aplicar recursos no mercado financeiro, adota o investidor uma posição de credor, com risco nitidamente limitado ao montante que colocou. Sem a limitação da responsabilidade do sócio, o mesmo não ocorre ao realizar um empreendimento de atividade produtiva. E por que haveria de ser assim, quando aplicar capital próprio em um novo negócio gerará empregos, produção de bens e serviços para toda a comunidade e pagamento de tributos ao Estado? Por que se deveria privilegiar o rentista em face do empreendedor? A resposta a essa pergunta diretamente soluciona a importância que o Direito deve conceder à limitação da responsabilidade.

Como bem descreve Bruno Meyerhof Salama:

um empreendedor é uma pessoa que detecta uma oportunidade de realizar um negócio e assume riscos (aproximadamente) calculados. O empreendedor é peça fundamental para geração de riqueza, e acrescente-se: não trato aqui apenas da geração de riqueza para si, mas para toda a sociedade, porque o empreendedor gera empregos, paga impostos e cria (e vende) coisas úteis para outras pessoas.140

E o que é socialmente mais desejado?

Diante das opções outorgadas a um investidor – de se posicionar como credor, aplicando seus recursos em títulos cujo risco maior a correr é a perda do valor

139 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

anônima cit., p. 447.

140 SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim da responsabilidade limitada no Brasil – História, direito e economia cit., p. 275.

investido, ou de alocar seu capital no empreendimento de uma atividade produtiva, em que, na ausência de responsabilidade limitada, estará colocando em risco a totalidade de seu patrimônio pessoal –, sua decisão dependerá substancialmente de suas qualidades pessoais, ou seja, se se trata de uma pessoa com aversão a risco ou não. Ao estabelecer uma baliza para eventual perda, a responsabilidade limitada do sócio atrai ao empreendedorismo pessoas que em outras circunstâncias não estariam dispostas a isso, aquelas com maior aversão a risco.

Fica evidente que a proteção ao princípio da responsabilidade limitada é instrumento relevante na condução da política governamental, pois essa defesa tem força para direcionar a aplicação dos recursos pessoais dos cidadãos e incentivar seu uso no desenvolvimento da economia do país.

Ressalte-se que mesmo o mercado financeiro está apoiado, em última instância, na realidade dos empreendimentos produtivos. Todas as vezes em que os investimentos financeiros se afastaram demasiadamente da realidade econômica de produção de bens e serviços criaram as chamadas “bolhas econômicas”, que são consequência da circulação de muito dinheiro para poucos ativos. Estimular o empreendedorismo é criar substância também para o mercado financeiro, que precisa constantemente de estímulo para fazer circular adequadamente a riqueza.

Importante frisar que a garantia à limitação da responsabilidade dos sócios não pode amparar-se unicamente na letra fria da lei. Ela deve ser efetiva, sob pena de insegurança jurídica. Se a aplicação dessa garantia relativiza-se de tal forma a praticamente eliminá-la, sua proteção esvazia-se. As consequências são graves. Não unicamente àqueles que estariam convencidos à aplicação de seus recursos na atividade produtiva e que ficariam desencorajados de fazê-lo, mas igualmente àqueles que dela se beneficiariam, como descreve Fábio Ulhoa Coelho:

Se o nosso direito não limitar, na sociedade limitada e na anônima, a responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais – de modo

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2015 (páginas 77-89)